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3 URBANISMO: EM BUSCA DE UMA DELIMITAÇÃO CONCEITUAL

5 OS PLANOS E A EXPANSÃO URBANA EM FORTALEZA: DA CIDADE PORTUÁRIA À CIDADE-METRÓPOLE

5.3 OS PLANOS DE REMODELAÇÃO URBANA E A CIDADE MODERNA

5.3.1 Os Planos de Remodelação Urbana

A modernização das cidades era um imperativo para criar as condições urbanas exigidas para a implantação da sociedade industrial e, ainda mais, representava a ideologia nacionalista ancorada na trilogia progresso-

civilidade-modernidade. Daí a motivação para a elaboração de um plano de cidade funcional e dotado de propostas de obras de infra-estrutura e equipamentos urbanos.

Na administração de Tibúrcio Cavalcante, em 1931, foi realizado um novo levantamento da cidade (Mapa 7). Contratou-se, então, o arquiteto Nestor E. de Figueiredo pela sua reconhecida experiência em outras cidades brasileiras. Este arquiteto elaborou o Plano de Remodelação da Cidade de Fortaleza (Mapa 8), primeiro plano de acordo com as diretrizes urbanísticas modernas.

Sob a alegação de insuficiência de recursos, a proposta de Nestor E. de Figueiredo foi rejeitada pelo Conselho Consultivo da Prefeitura, embora tenha sido reconhecida sua qualidade técnica. Mesmo diante do impasse criado pela comissão,

Os estudos tiveram continuidade em razão de um acordo firmado entre Raimundo Girão, Secretário da Prefeitura, e o interventor Carneiro de Mendonça. Tal fato ensejou a criação da Comissão do Plano da Cidade por meio do Decreto n° 128, de 10 de janeiro de 1934, reativada na gestão do prefeito Raimundo Alencar Araripe, pelo Decreto n° 450, de 31 de março de 1939. Como justificativa, alegava-se a “necessidade e urgência na continuação de tais trabalhos a fim de que, com a ultimação do mesmo plano, seja possível a esta cidade reformar-se e desenvolver-se socialmente, dentro de um sistema elaborado de acordo com os princípios do urbanismo” (SOUZA, 1995, p.60).O plano constitui uma primeira proposta de zoneamento urbano e apresenta muitos elementos do urbanismo formal francês, difundido no Brasil por Alfred Agache. Como observado, tais elementos estão presentes no Plano do Rio de Janeiro, elaborado por este arquiteto francês. Seu aspecto cênico, produzido pela convergência das avenidas em forma de Y e V, valoriza conjuntos e praças monumentais. Ademais, a proposta do sistema de vias radiais-

MAP A

perimetrais criava perspectivas e visuais, ao expandir o traçado para as áreas da periferia, observando o relevo do solo e retirando a barreira estabelecida pelo ramal ferroviário da avenida José Bastos.

Quando Prefeito de Fortaleza, o historiador Raimundo Girão, em virtude da sua condição profissional e cargo de secretário na gestão de Tibúrcio Cavalcante, estava ciente das dificuldades enfrentadas pela municipalidade. Imbuído do ideário do nacional desenvolvimentismo, que compartilhava com a elite intelectual brasileira, direcionou suas ações no sentido de imprimir uma racionalidade técnica às práticas administrativas.

Na década de 1940, o prefeito Clóvis de Alencar Matos, já dispondo de um novo levantamento realizado pelo Exército em 1945 (Mapa 9), contratou pelo Decreto n° 729, de 20 de fevereiro de 1947, o engenheiro urbanista José Otacílio Sabóia39. para elaborar o Plano Diretor de Remodelação e Expansão de Fortaleza 1947-1948. (Mapa 10), a primeira experiência concreta de urbanismo em Fortaleza.

Aprovado na administração do prefeito Acrísio Moreira da Rocha, primeiro prefeito eleito por voto popular, o plano não foi colocado em prática em decorrência de pressão do setor privado.

De acordo com o plano, os elementos estruturantes da proposta espacial seriam os seguintes:

• divisão da malha urbana em bairros demarcados por cintas de áreas verdes destinadas à implantação de praças, jardins, equipamentos urbanos e núcleos comerciais;implantação de parques urbanos;proposta de avenidas-canais ao longo dos talvegues, favorecendo o saneamento urbano;

• proposta de sistema viário hierarquizado, com avenidas radiais, sub-radiais e circuitos acomodados à malha ortogonal,

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Sabóia Ribeiro era cearense e formou-se na Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, integrando, posteriormente, o corpo docente desta instituição.

que daria à cidade um plano geral que a enquadraria no tipo “radial-perimetral”;

• modificações no traçado e funcionamento do sistema ferroviário, com a articulação dos sistemas de transportes ao sistema de avenidas;

• projeto específico para a reconstrução do centro urbano, a partir do alargamento progressivo das ruas;

• implantação de um centro cívico na área marginal ao riacho Pajeú, compreendido pelas ruas Governador Sampaio e Sena Madureira, Praça da Sé e Cidade da Criança;

• urbanização do Arraial Moura Brasil, como bairro popular; • elaboração de um código urbano;

Os planos de remodelação urbana apresentam uma concepção globalizante, reunindo um corpo de idéias que tenta orientar o crescimento urbano de forma racional. Nas demais cidades brasileiras, os referidos planos já faziam parte das práticas urbanísticas, desde o início do século, como no Sudeste, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em Fortaleza, o plano foi influenciado pela experiência do Rio de Janeiro, local de formação e trabalho do autor da proposta, e se caracteriza por abranger o conjunto da área urbana, onde as partes estão articuladas, compondo uma totalidade. Como elementos estruturantes da proposição espacial incluem-se circulação, saneamento e valorização do sistema de infra-estrutura. A circulação viária era elemento de articulação entre o Centro e os bairros, e condicionante da expansão urbana. Não constam neste plano os levantamentos das ocupações faveladas, embora haja a preocupação com a urbanização do Arraial Moura Brasil, caracterizado como bairro popular.

Nestes planos, existe um fato novo referente à formulação de zoneamento e à tentativa de institucionalização do urbanismo mediante a criação de órgãos na estrutura administrativa das prefeituras. O Código Urbano era orientado por princípios técnicos urbanísticos, e introduziu medidas de controle de uso e ocupação do solo, em substituição a diretrizes sanitaristas dos códigos de postura. Os planos de saneamento, em Fortaleza, não tiveram a qualidade dos desenvolvidos pela equipe técnica de Saturnino de Brito, para Santos, Recife e outras cidades brasileiras. Em Fortaleza, as obras de

saneamento foram realizadas na área central com a participação de profissionais práticos. É possível que profissionais ligados ao escritório de Saturnino de Brito tenham estado em Fortaleza e elaborado algum estudo sobre a matéria, mas não há documentos comprobatórios.