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Capítulo III – Enquadramento Epistemológico e Metodológico

8. Constrangimentos e reflexões críticas sobre a metodologia

A metodologia de análise qualitativa permitiu recolher e integrar uma informação rica na sua intensidade e profundidade e proporcionou uma maior consistência para a compreensão dos processos de decisão, mas o papel do investigador, enquanto instrumento de pesquisa, torna a metodologia num processo dificilmente replicável para outras realidades organizacionais, tanto mais que a experiência do investigador no domínio do movimento desportivo associativo constituiu uma mais valia para aceder e comunicar com os participantes do estudo.

O tempo investido nas opções e decisões metodológicos tem de ser visto como um processo de colheita de frutos a longo prazo. A necessidade de revisitar certos textos e alterar as questões de investigação fez dispensar muitas energias e preocupações, mas foi essencial para criar os alicerces da “entrada no terreno”. Partilhamos o ponto de vista de Denzin e Lincoln (2000, p. 15), quando defendem que o campo da investigação qualitativa é definido, primeiramente, por uma série de tensões, contradições e hesitações e, só depois, se conquista consistência e confiança no percurso de investigação.

Em vários momentos do processo de investigação, fomos tentados a pesquisar informação acessória e complementar para a compreensão do problema central. Se, por um lado, precisamos de ter uma visão sistémica e integrada da estratégia das organizações, ainda para mais quando se estudam organizações que dependem fortemente do apoio da APR, numa outra perspectiva, não podemos perder o nosso fio condutor, isto é, centrar a nossa análise nas matérias e dados que respondem às nossas questões de investigação. Por isso, em todo o processo de investigação qualitativa em que se utilizam notas descritivas de reuniões de grupos, é essencial proceder à análise e redução dos dados, mesmo durante o processo de observação.

Também se deve realçar que uma das maiores dificuldades que se oferece ao investigador é minimizar os efeitos da subjectividade da realidade, ou seja, observar a realidade com o máximo de objectividade possível. Neste sentido, quando nos referimos à

elevada subjectividade, estamos a referirmo-nos aos comportamentos e acções dos dirigentes em contexto organizacional e que não são facilmente objectiváveis nem categorizáveis.

Num outro sentido, a subjectividade pode também ser entendida como uma limitação e dificuldade do próprio investigador. Não obstante assumir-se este como um dos principais instrumentos de recolha de informação, é preciso ter em conta que todos os investigadores qualitativos devem estar conscientes das dificuldades colocadas pela sua própria subjectividade (Vieira, 1999, p. 94). Para evitar este problema, uma das estratégias do investigador é procurar permanecer um tempo mais longo na organização, aumentar as interacções com os observados e recolher outras informações que procurem acrescentar e completar o sentido dos significados que estão a ser analisados.

As palavras não têm acção nem forma. Quando se analisam textos que traduzem a estrutura interna e as decisões, devemos considerar igualmente as condições em que eles foram produzidos. Mais, os actores podem comunicar através de símbolos, gestos, códigos, metáforas, ironias, expressões, etc. e para todos os efeitos haverá sempre uma parte invisível e intangível no acesso às informações. Por isso, mais do que analisar o conteúdo de uma entrevista ou texto, é preciso ter em atenção as características do contexto onde foi produzida essa informação. Neste sentido, as notas descritivas devem conter a possibilidade de colocar as dúvidas e os comentários do observador que servem para caracterizar e contextualizar certas intervenções. Nentwich (2001, p. 241), com base no conceito de compreensão como um jogo de linguagem, realça o seguinte:

“Talking is part of an act – or a form of life. This implies that meaning of a word is identical with its performance and cannot be found in the word it self” (p. 241).

Num percurso de pesquisa e de redução da informação durante um período superior a um ano, e segundo um processo de integração das informações que foram recolhidas a partir das várias técnicas, tivemos, em alguns casos, de actualizar as informações dos documentos em análise. Por tal razão, e tendo em conta que os documentos são apresentados e produzidos de acordo com os timings da época (de cada uma das modalidades desportivas), os resultados apurados correspondem a diferentes processos e períodos de análise. Esta consideração assume uma relevância acrescida, se tivermos em linha de conta que a tomada de decisão sobre certos programas, como, por exemplo, o Programa de Apoio a Praticantes de Elevado Potencial (PAPEP), esteve adiado no decurso da época porque estava dependente dos apoios da APR. Estivemos, assim, perante circunstâncias e adversidades que alteraram o próprio plano estratégico, confirmando a necessidade das organizações terem também uma grande visão de adaptação e de gestão das emergências.

Capítulo III – Enquadramento Epistemológico e Metodológico

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Muitos dos projectos de investigação qualitativa são percursos solitários levados a cabo por um trabalho árduo e intenso do investigador. Para além das questões da validade interna serem minimizadas pela adopção de várias técnicas e instrumentos de recolha de informação durante um processo dinâmico unitário, há que reconhecer que seria muito mais interessante, e até consistente, se tivéssemos oportunidade de fazer a investigação em equipa, particularmente nas fases de observação participante e de interacção com os dirigentes em contexto real.

Capítulo IV – Processo de Redução e Discussão dos Dados

Este capítulo, por ser extenso, optou-se por dividir em quatro grandes fases que correspondem a quatro momentos distintos de recolha e interpretação dos dados: a fase i diz respeito à análise de documentação específica das AD’s no sentido de conhecermos a missão e a estrutura organizacional deste nível de associativismo desportivo; a fase ii, corresponde à parte dos dados de natureza (predominantemente) quantitativa, na qual são descritos os principais indicadores desportivos relacionados com as modalidades desportivas do sector federado, particularmente no que diz respeito à competição; a fase iii complementa as duas anteriores e representa a análise documental e a realização de uma entrevista qualitativa ao Presidente do IDRAM sobre o papel e a relação deste organismo com as AD’S; a fase iv integra o processo de utilização das técnicas de observação das reuniões de Direcção (durante seis a sete meses), complementada pela entrevista qualitativa, e foi aquela em que se procura compreender e justificar os dados que emergiram nas fases anteriores. Esta fase, por ser a mais demorada e intensiva, foi dividida em três partes: na primeira, são descritos os procedimentos metodológicos e as técnicas de recolha de dados, incluindo as considerações e reflexões do observador, bem como o sistema de categorias; na segunda, são descritos todos os dados que explicam a estrutura organizacional e o processo e modelo de tomada de decisão; na terceira e última, encontram-se os dados referentes às fontes de poder interna e externa, a natureza da relação entre as AD’s e os clubes desportivos e ainda a visão estratégica dos dirigentes associativos, segundo uma perspectiva de análise política e organizacional.

Para além de termos remetido para o final do relatório as principais conclusões e considerações, decidimos incluir em cada uma das fases, um número específico de conclusões, uma vez que a quantidade e especificidade dos dados que foram recolhidos e analisados em cada fase, recomendava uma síntese conclusiva e apontava extensões para as etapas seguintes.

Fase i - Análise descritiva da estrutura organizacional e dos objectivos das associações