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CAPÍTULO III – OPÇÕES EPISTEMOLÓGICAS E METODOLÓGICAS

3. Contexto e participantes no estudo

No âmbito da investigação qualitativa alguns autores defendem que é necessário documentar muito bem o contexto estudado (Schofield, 2002; Deslairies e Mayer, 2000), possibilitando que o conhecimento produzido num contexto particular possa ser profícuo em outros contextos análogos. Sem esta qualidade de informação é impossível fazer um julgamento informado sobre o grau possível de extrapolação das conclusões de um estudo-contexto para outros estudos-contextos. Por outro lado, para lá da questão de

aplicabilidade externa do conhecimento proveniente da investigação, a

compreensibilidade desse próprio conhecimento aumentará se ele for enquadrável no respetivo contexto de produção, uma vez que os fenómenos sociais são histórica e culturalmente condicionados (Strausse Corbin, 2003).

O presente estudo desenvolveu-se em treze Escolas Superiores de Enfermagem|Saúde de Portugal continental, públicas e privadas, que integram o Sistema Educativo Nacional, ao nível do Ensino Superior Politécnico, concretamente, duas na região norte do país, três na região centro, uma na região sul e sete na região de Lisboa e Vale do Tejo.

Na seleção das escolas que incorporaram o estudo, tivemos em consideração as advertências de Erikson (1989), quanto à importância da negociação do “acesso ao lugar” no caso da investigação interpretativa. Optou-se assim, por desenvolver o estudo em escolas acerca das quais tivéssemos algum conhecimento e|ou algum contacto formal ou informal prévio. Em alguns casos, esta opção veio a revelar-se facilitadora, no sentido em que tornou mais célere a resposta ao pedido formal de acesso ao campo de estudo formulado às respetivas Direções das Escolas. Nesse pedido foi explicitada a natureza do trabalho, seus objetivos e metodologia e, ainda, o número mínimo de participantes desejado, assegurando, desde logo, a manutenção do anonimato da instituição, dos participantes no estudo e, ainda, a confidencialidade acerca da informação recolhida (Anexo I).

A decisão de incluir professores e estudantes no grupo de sujeitos ou “informantes- chave” (Anderson, 1998), não seguiu os critérios de uma amostra representativa na sua constituição. Trata-se de uma amostra intencional ou de conveniência (Polit e Hungler, 1995; Bogdan e Biklen, 1994), construída a partir da crença de que os sujeitos, enquanto atores diretamente implicados nos processos de ensino-aprendizagem na prática em contexto de trabalho, se encontravam numa posição singular para fornecer informação relevante que pudesse facilitar a compreensão do quê, e como se ensina e se aprende

nessa componente formativa e qual o contributo dos professores para esse efeito. Em suma, tratou-se de procurar aceder aos sujeitos que estão diretamente relacionados com o fenómeno em estudo (Huberman e Miles, 1991), isto é, que tivessem informação relevante sobre o mesmo; que fossem acessíveis física e socialmente; que estivessem disponíveis e dispostos a colaborar e que fossem capazes de comunicar a informação com precisão (Gorden, 1975, citado por Valles, 1997).

Na seleção dos participantes tivemos ainda em consideração alguns critérios de inclusão com algum grau de subjetividade. No caso dos professores procurámos, por um lado, a heterogeneidade (Morgan, 1996; Krueger, 1994), designadamente, no que respeita ao género, idade, formação pós-graduada, tempo de exercício como enfermeiro, tempo de exercício docente, posição na carreira e experiência supervisiva quer enquanto enfermeiro quer enquanto docente. Atendemos ainda, à cultura diferenciada das escolas nas distintas zonas do país onde os professores desenvolvem a sua atividade profissional, considerando que “(…) as culturas dos professores diferem, não só entre as escolas, como também entre grupos de professores dentro de cada escola” (Lima, 2000:69). Por outro lado, simultaneamente procurou-se a homogeneidade (Morgan, 1996; Krueger, 1994). Neste âmbito, procurámos que em cada escola que respondeu positivamente à nossa solicitação, pudéssemos dispor de um grupo de professores, composto por um mínimo de cinco elementos que possuíssem as seguintes condições: fossem reconhecidos como peritos na área da docência em Enfermagem; tivessem um mínimo de cinco anos de exercício nas componentes teórica e prática; tivessem conhecimento e acesso à informação pretendida e quisessem fornecê-la através da técnica de focus-group.

No que respeita aos estudantes, procurou-se alguma heterogeneidade apenas, no que respeita ao género e idade. A homogeneidade foi obtida, com base na decisão de apenas incluir estudantes do 4º ano do CLE. Tal decisão baseou-se na crença de que estes, por estarem na fase final da formação e já terem tido variadíssimas experiências nos mais diversos contextos de prática clínica, seriam aqueles que “melhor posicionados” estariam para nos facultar informação relevante sobre o vivido e as aprendizagens decorrentes dessa experiência, no quadro do dispositivo de formação inicial em Enfermagem, bem como, sobre o contributo dos seus professores para esse efeito. Inicialmente era nossa intensão entrevistar dois estudantes por cada escola participante. Porém, devido a constrangimentos de ordem pessoal intrínsecos aos próprios

estudantes, à exceção de dois estabelecimentos de ensino, nos restantes, apenas foi possível entrevistar um estudante.

Em suma, o grupo de participantes no estudo é composto por um total de sessenta e oito professores e quinze estudantes de treze Escolas Superiores de Enfermagem|Saúde de Portugal continental, cuja distribuição se apresenta na Figura 6.

Seguidamente apresentam-se as principais caraterísticas sócio-demográficas dos grupos docente e discente. Uma análise mais detalhada pode ser obtida pela consulta do Anexo II.

Grupo Docente

No que respeita ao género, da totalidade dos sujeitos, 10 (15%) são do género masculino e 58 (85%) são do género feminino. Verifica-se assim que há uma predominância do género feminino, situação esperada, na medida em que a docência em Enfermagem teve a sua génese na própria profissão, e esta, historicamente, está associada à mulher (Colliére, 1989). Tais resultados parecem ainda ser corroborados pelos dados disponibilizados pelo Departamento de Estatística da OE em 2015, segundo

os quais, dos 66.452 enfermeiros registados, 54.374 (81,8%) são do género feminino e apenas 12.078 (18,2%) são do género masculino (OE, 2015).

Quanto à variável idade, verifica-se que esta oscila entre os 28 e os 62 anos. A média de idades é de 46,1 anos e a moda 44 anos, valores que encontram correspondência aos dados publicados pelo PORDATA em 2015, relativos aos docentes do ensino superior por subsistema de ensino.

No que concerne à categoria profissional dos sujeitos, verifica-se uma predominância de professores adjuntos, num total de 38 (55,9%). A segunda categoria profissional mais expressiva é a dos professores coordenadores que compreende 12 indivíduos (17,6%). Pode ainda constatar-se que o número de Assistentes e Equiparados a Assistente de 2º triénio é semelhante, 9 indivíduos, o que corresponde a 13,2% da amostra. Esta constatação não deixa de ser curiosa, uma vez que em 2009 foi publicado o Decreto-Lei que procedeu à Alteração do Estatuto Carreira do Pessoal Docente do Ensino Superior Politécnico (Decreto-Lei nº 207/2009 de 31 de Agosto) que extingue a categoria de Assistente e coloca como exigência de qualificação para a entrada na carreira o grau de Doutor ou o título de Especialista.

O grupo docente apresenta um tempo de exercício profissional que varia entre 5 e 28 anos, sendo a média de 13,04 anos e a moda de 6 anos. Em termos carreira docente, poder-se-á afirmar que estamos perante um grupo de professores que, maioritariamente, se encontra entre as fases de “estabilização, consolidação de um reportório pedagógico” e de “serenidade, conservantismo; Distanciamento afetivo” se nos ativermos à tipologia estabelecida nos estudos de Huberman (2005).

No âmbito das suas funções enquanto docentes, todos os participantes revelaram ter experiência no acompanhamento e supervisão de estudantes. Genericamente, os professores referem ter entre 5 e 28 anos de experiência supervisiva, situando-se a média nos 12,4 anos e a moda nos 5 anos. Numa análise mais detalhada podemos ainda constatar que 50% (34) dos sujeitos tem entre 5 e 10 anos de experiência supervisiva, situação que de acordo com o Modelo de Desenvolvimento Socioprofissional proposto por Benner (2000), lhes confere a condição de peritos na área supervisiva.

Relativamente a habilitações académicas, verifica-se que 3 participantes têm o grau de Doutor (4,4%) (dois na área das Ciências de Enfermagem e um na área da Psicossociologia da Saúde); 29 (42,6%) possuem o grau de Mestre e 46 (53,0%) não detém qualquer formação ao nível do segundo e terceiro ciclos. Dos participantes que

detêm o grau de Mestre, evidencia-se uma hegemonia na área de especialização em Ciências de Enfermagem (n=16; 55%), o que de resto não constitui surpresa, se considerarmos as alterações legislativas operadas na última década, nomeadamente, com a publicação do RJIES (Lei nº 62/2007), que veio permitir a atribuição do grau de Mestre no Ensino Superior Politécnico.

No âmbito do desenvolvimento profissional como enfermeiros, os sujeitos procuraram ampliar os seus conhecimentos profissionais, sendo que 54 (79,4%) frequentaram formação especializada quer nas tradicionais áreas de especialização em Enfermagem (Reabilitação; Saúde Materna e Obstétrica; Saúde Infantil e Pediátrica; Saúde Pública; Saúde Mental e Psiquiátrica; Saúde Comunitária; Enfermagem Médico-Cirúrgica) quer em outras áreas da saúde.

Paralelamente à procura de formação profissional na área da Saúde|Enfermagem, os sujeitos referem também ter investido no seu desenvolvimento profissional enquanto docentes. Neste âmbito, 36 docentes (52,9%) têm formação na área das Ciências da Educação, sendo que 20,6% são detentores de Curso de Mestrado e os restantes possuem outras pós-graduações nessa mesma área.

Para além dos dados apresentados, acresce dizer que todos os elementos que constituem o grupo de professores, anteriormente ao exercício docente, desempenharam funções enquanto enfermeiros em hospitais ou centros de saúde. O professor que teve o menor tempo de exercício na prestação de cuidados, exerceu apenas durante um ano e o que teve mais larga experiência nesse âmbito, exerceu durante 20 anos. Ainda no âmbito das suas funções enquanto enfermeiros, à exceção de um dos sujeitos, todos os demais colaboraram na supervisão de estudantes no âmbito da formação inicial em Enfermagem, tendo sido esta a principal via de acesso à carreira docente. Em termos gerais, a experiência supervisiva oscila entre 1 e 19 anos. A média é de 9,4 anos e a moda situa-se nos 10 anos. Em suma, no conjunto dos nossos entrevistados parece imperar alguma heterogeneidade marcada pelas diferença etária, categoria profissional, formação académica e profissional, tempo de docência, experiência supervisiva e contextos de ação quer como enfermeiros quer como docentes.

Grupo Discente

Em termos de género, 7 (47%) estudantes são do género masculino e 8 (53%) são do género feminino. Apesar de no presente estudo, haver uma quase igualdade de género, tais resultados não expressam a realidade, pois, como refere Simões (2008), 90% dos

enfermeiros ao nível mundial são mulheres. Esclarece ainda a autora que dos estudos efectuados no nosso país, a regra não sofre qualquer tipo de exceção, já que a esmagadora maioria dos Enfermeiros são do sexo feminino. Tal inferência vai de encontro aos dados publicados pelo PORDATA em 2015, sendo que, dos 349.658 estudantes matriculados no ensino superior nesse ano, 187.335 (53,57%) são do género feminino e 162.323 (46,43%) são do género masculino. Verificámos ainda, que por área de educação é o género feminino que está maioritariamente inscrito na área da Saúde e Proteção Social (77,4%), logo a seguir à área da educação (82,8%).

Quanto à idade, verifica-se que as mesmas se situam entre os 22 e os 37 anos, a média é de 26,2 anos e a moda de 23 anos. A classe etária que apresenta maior representatividade corresponde a idades inferiores a 25 anos (46%), seguida da classe entre os 25 e os 30 anos (27%). Este último intervalo de idades revela que uma das modalidade de acesso ao Ensino Superior em Enfermagem é através dos “Maiores de 23 anos”.