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3 A COBERTURA DOS JORNAIS FOLHA DE SÃO PAULO E O GLOBO

3.1 Corpus e Metodologia

A presente pesquisa analisa a cobertura de dois jornais de referência em situações de conflito urbano envolvendo o crime organizado nas duas maiores capitais brasileiras: São Paulo e Rio de Janeiro. A pesquisa direciona-se exclusivamente ao texto jornalístico noticioso e não opinativo. Logo, são excluídos os artigos, os editoriais, as crônicas, as fotos, as charges e os infográficos.

Assim, estuda as matérias do Caderno Cotidiano do jornal Folha de São Paulo, que se referem aos atos de violência promovidos pelo Primeiro Comando da Capital – PCC, em 2006, no Estado de São Paulo. Os ataques deram-se em três períodos. Analisamos 15 dias de cada período, sendo o primeiro de 14 a 28 de maio (185 matérias); o segundo, de 13 a 27 de julho (115 matérias) e o terceiro de 3 a 17 de agosto (112), totalizando 412 textos. Uma amostra dessas matérias pode ser vista no Anexo A.

O mesmo foi feito com as matérias noticiosas da editoria Rio, do jornal O Globo, referente às ações do crime organizado na cidade do Rio de Janeiro em três momentos, sendo analisados 15 dias de cada período. No final de 2006 e início de 2007, entre 28 de dezembro a 11 de janeiro, quando ocorreram os atos violentos do crime organizado às vésperas do Ano Novo (61 matérias); os 15 dias que seguem ao início da ocupação do Complexo do Alemão pelas forças de segurança do Estado, entre 1º e 16 de maio (35 matérias) e os 15 dias posteriores à operação com 1350 homens junto ao Complexo do Alemão, envolvendo policiais militares, civis e a Força de Segurança Nacional, entre 28 de junho a 12 de julho, totalizando 151 matérias. Uma amostra dessas matérias pode ser vista no Anexo B.

Categorias relativas ao Jornalismo para a Paz foram criadas. A Análise de Conteúdo verificou a presença das mesmas em contraste às de Jornalismo de

Violência. Neste trabalho, utilizamos o termo Jornalismo de Violência e não Jornalismo de Guerra, pois consideramos o primeiro mais adequado à realidade

3.1.1 Análise de Conteúdo

Hercovitz (2007, p.127) compara os pesquisadores que utilizam a análise de Conteúdo a “detetives (...) que desvendam os significados aparentes e/ou implícitos dos signos e das narrativas jornalísticas, expondo tendências, conflitos, interesses, ambigüidades ou ideologias (...)”.

A Análise de Conteúdo, para Bauer (2002), é um método de análise quantitativo de texto jornalístico que dá atenção especial às suas “qualidades” e “distinções”.

a análise de conteúdo nos permite reconstruir indicadores e cosmovisões, valores, atitudes, opiniões, preconceitos e estereótipos e compará-los entre comunidades. Em outras palavras, a Análise de Conteúdo é pesquisa de opinião pública com outros meios (2002, p.192). Dessa forma, a análise de conteúdo fornece variáveis diferenciadas para o estudo sobre a mídia, permitindo a análise qualitativa dos dados. Com relação a este assunto, afirma Bardin (1977),

Na análise quantitativa, o que serve de informação é a freqüência com que surgem certas características do conteúdo. Na análise qualitativa é a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou de um conjunto de características num determinado fragmento de mensagem que é tomado em consideração (1977, p.21).

Usar este instrumento de investigação é propor-se uma investigação crítica que vai além da compreensão espontânea do que é divulgado pelas mídias. Trata-se de um olhar mais atento ou de um “enriquecimento da leitura”:

Se um olhar imediato, espontâneo, é já fecundo, não poderá uma leitura atenta, aumentar a produtividade e a pertinência? Pela descoberta de conteúdos e de estruturas que confirmam (ou infirmam) o que se procura demonstrar a propósito das mensagens, ou pelo esclarecimento de elementos de significações susceptíveis de conduzir a uma descrição de mecanismos de que a priori não detínhamos a compreensão (BARDIN, 1977, p.29).

Declara ainda Bardin que “a intenção da análise de conteúdo é a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção (ou, eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não)” (1977, p.38). Este aspecto inferencial da análise de conteúdo pode responder sobre as causas ou antecedentes da mensagem, como também sobre as conseqüências ou efeitos das mensagens. A leitura sobre o conteúdo das

comunicações não é uma leitura à letra, mas busca um sentido que está em segundo plano (1977, p.43).

De acordo com Herscovitz (2007, p.126) a tendência atual da pesquisa desfavorece a divergência entre a vocação qualitativa e quantitativa da análise de conteúdo, ou seja, promove uma integração entre as duas visões: os conteúdos manifestos (visíveis) e latentes (ocultos, subentendidos) são incluídos em um mesmo estudo. Como explica a referida autora, dessa forma, pode-se compreender:

não somente o significado aparente de um texto, mas também o significado implícito, o contexto onde ele ocorre, o meio de comunicação que o produz e o público ao qual ele é dirigido.

3.1.2 As categorias utilizadas.

Tendo como base o quadro criado por Galtung (1997), apresentado no primeiro capítulo, e na leitura das matérias, foram criadas categorias que são utilizadas na análise. Ao todo são oito categorias das quais quatro são de

Jornalismo para a Paz (Destaque do Contexto do Conflito, Pluralidade, Fontes

Oficiais e Não-Oficiais e Abordagem de Soluções Não-Violentas para o Conflito), e quatro são de Jornalismo de Violência (Destaque da Violência do Conflito, Maniqueísmo, Fontes Oficiais e Não-Abordagem da Resolução do Conflito).

Abaixo, apresenta-se o significado que se atribui a cada um desses itens: a) Jornalismo para a Paz:

- Destaque do Contexto do Conflito: a matéria apresenta o contexto, os diferentes interesses, necessidades e objetivos em disputa. Busca as causas da violência e utiliza dados estatísticos sobre o perfil de violência buscando melhor caracterizá-la;

- Pluralidade: a matéria apresenta as diversas partes envolvidas no evento, os vários personagens – criminosos, policiais, governo, Ongs, moradores de favela, população de São Paulo e do Rio de Janeiro, além de abordar as qualidades, os defeitos, as ações positivas e negativas, as forças e fraquezas de todos os lados;

- Fontes Oficiais e Não-Oficiais: a matéria utiliza fontes oficiais e não- oficiais – populares, sindicalistas, trabalhadores e minorias (cor, sexo,

raça e opção sexual). Consideram-se fonte oficial para esta análise, exclusivamente, as fontes oriundas do Poder Executivo, tais como: representantes dos governos (federais, estaduais, municipais), das policiais civil ou militar;

- Abordagem de Soluções Não-Violentas para o Conflito: a matéria busca apresentar possíveis soluções para o conflito e iniciativas para a paz.

b) Jornalismo de Violência:

- Destaque da Violência do Conflito: a matéria não contextualiza os fatos, os interesses e objetivos em disputa. O texto é apenas descritivo. O foco é no detalhamento da violência (número de mortos, feridos) sem abordar suas causas;

- Maniqueísmo: a matéria mostra apenas dois lados, um bom e um mau. Não apresenta as diversas partes envolvidas no evento, os vários personagens – criminosos, policiais, governo, Ongs, moradores de favela, população de São Paulo e do Rio de Janeiro;

- Fontes Oficiais: a matéria apresenta apenas fontes oficiais- governos, polícia. Consideram-se fonte oficial para esta análise, exclusivamente, as fontes oriundas do Estado tais como: representantes dos governos (federais, estaduais, municipais), das policias civil ou militar;

- Não-Abordagem da Resolução do Conflito: a matéria não aborda ou secundariza as soluções para o problema e as iniciativas para a paz.