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1.3 Nos Passos do Jornalismo para a Paz

1.3.6 Orientação para as Elites

O Jornalismo de Guerra, porém, tem o foco nas elites. Elite, de acordo com Houaiss (2007), é “o que há de mais valorizado e de melhor qualidade” ou também a “minoria que detém o prestígio e o domínio sobre o grupo social”.

Pode-se dizer que a elite para o Jornalismo de Guerra absorve os dois conceitos. O jornalista faz uma espécie de assessoria de imprensa para os “nossos” que, no caso, são os melhores. As matérias focam o sofrimento dos “nossos”, das nossas tropas de elite, dos jovens soldados treinados para defender o “nosso” lado, como relata Galtung (1997)

Há aproximadamente dez histórias a serem repetidas várias vezes: chegada das tropas; não há correio suficiente; o alimento; a água; está demasiado quente; está demasiado frio; muita areia; sujeira demais; maridos e esposas que vão guerrear; as mulheres devem ir para a guerra?

Todos esses temas são usualmente abordados nas guerras e ajudam a reforçar a imagem de piedade aos “nossos” que estão dando suas vidas em nome do bem maior. Dá voz aos “nossos”. Identifica os “fazedores do mal” do lado deles e ignora a existência de vilões do “nosso” lado. Aplica a idéia de que omitir não é mentir. Mostra e destaca os membros da elite “produtores da paz”, os que, oficialmente, representam governos ou organismos internacionais para solucionar o problema. Pessoas que não fazem parte do grupo “deles”. Os “produtores da paz” do lado “deles” não são mencionados.

Se essa análise for transposta para a realidade nacional, pode-se aludir que neste tipo de jornalismo, por exemplo, poderiam ser ignorados os esforços de moradores de uma favela ou comunidade que não apóiam grupos criminosos e que buscam contribuir com a paz. Em conseqüência, o imaginário construído sobre determinada favela seria apenas de uma massa humana que possui valores deturpados e que, por este motivo, poderia ser conivente com o crime e a violência.

1.3.6.1 Definindo as fontes.

Como dito anteriormente, a primeira tarefa do Jornalismo para a Paz é mapear o conflito, identificando os atores e seus objetivos. Em vez de relatar os

fatos de maneira, supostamente, objetiva, é preciso discutir o processo pelo qual alguns fatos são selecionados e outros suprimidos.

Atualmente, o jornalismo e, fundamentalmente, o de Guerra é baseado nas informações provenientes das fontes oficiais ou que sejam de fácil acesso para o repórter. O advento dos meios on-line, bem como as crescentes restrições ao

front, fazem com que o jornalista, muitas vezes, efetue coberturas do seu próprio front, ou seja, do quarto do hotel onde está hospedado.

Galtung (1997) relata um fato no qual a CNN, buscando transmitir a conjuntura de Bagdá durante a Guerra do Golfo, em vez de ir às ruas para entrevistar moradores utilizou, comodamente, como fonte, a proprietária do hotel onde a equipe de reportagem estava hospedada.

Pode-se considerar a fonte imprescindível para o processo jornalístico, pois mesmo quando é anônima, é ela que dá credibilidade à matéria, narra a verdade dos fatos e evita que o texto expresse a opinião do repórter. Assim, ao longo da história do jornalismo, as fontes foram se consagrando como personagens vitais para a construção de uma matéria.

Tambosi (2004, p.53) destaca que, já em 1630, na França, Teheopharste Renaudot, editor da Gazette e médico de Luís Xlll, foi o primeiro a citar as fontes como “essenciais ao trabalho jornalístico”, e que Peurce, em seu histórico trabalho sobre jornalismo, refere-se às fontes, valorizando a necessidade da pluralidade. Afirma Peurce que “é preciso averiguar se, quando um fato acontecido recentemente é anunciado imediatamente em locais diversos, é confirmado pelo testemunho de muitos” (PEURCE, In. TAMBOSI 2004, p. 54).

Em diferentes estudos realizados sobre o jornalismo, em especial os de Wolf (1995, p. 222) e Traquina (2001, p.104), encontramos referências às fontes como sendo pessoas organizadas em grupos de utilidade pública, de setores da sociedade ou individualmente. As fontes são entrevistadas por possuírem informações técnicas, políticas, econômicas ou mesmo por terem participado ou observado determinada situação que as avalizou a testemunhar um fato específico. Enfatiza Wolf (1995, p. 223): “as fontes são um fator determinante para a qualidade da informação produzida pelos mass media.”

Enquanto isso, Gans (apud TRAQUINA, 1993), ao estudar o comportamento dos jornalistas em várias redações, divide as fontes em Conhecidas (elites política, econômica, social e cultural) e Desconhecidas

(pessoas comuns). Já para Lage (2007), as fontes podem ser independentes, quando não representam alguma instituição ou um indivíduo; oficiosas, quando são ligadas a alguma entidade, mas não se pronunciam em nome desta, e oficiais, quando possuem algum tipo de vínculo com o Estado, instituição ou empresa.

Traquina destaca que, para avaliar a confiabilidade das fontes, os jornalistas observam três principais critérios: a autoridade, a produtividade e a credibilidade. A autoridade está ligada à respeitabilidade de uma fonte, característica muito valorizada pelos jornalistas que podem utilizá-la ”mais pelo que é do que pelo que sabe” (TRAQUINA, 2001, p. 105). A produtividade diz respeito principalmente à quantidade e à qualidade que uma fonte pode fornecer de materiais, documentos, provas a serem utilizadas em uma matéria.

O critério da credibilidade, talvez, seja o mais importante. Por isso, alerta (1993, p.172):

O jornalista sabe que as fontes de informação não são desinteressadas. As melhores fontes são aquelas que já demonstraram a sua credibilidade e nas quais o jornalista pode ter confiança, mesmo assim a prática demonstra que é fundamental se checar.

Sabe-se, entretanto, que o valor da fonte para a produção jornalística está relacionado, não apenas a sua credibilidade, mas também ao tipo de acontecimento noticiado. Usando a classificação dos acontecimentos públicos de Molotch e Lester (1974/1993, p.34-51),podemos ver que a atuação da fonte, bem como a sua importância jornalística, varia de acordo com o acontecimento. No caso de uma guerra, as melhores fontes podem ser aquelas que tenham informações, por estarem no local certo e na hora certa ou por, simplesmente, serem detentoras de dados oficiais que possam gerar notícia.

A partir dessa abordagem, podemos definir as fontes utilizadas no

Jornalismo de Guerra como fontes escolhidas pela informação que detém

(participaram e/ou observaram determinado fato); fontes conhecidas (integrantes de uma elite ou oficiais militares) e que atendem aos critérios de autoridade e credibilidade em função do cargo que possuem.

Isso demonstra que o acesso aos meios de comunicação é estratificado social, política e economicamente, reforçando o dito popular de que a guerra é contada pelos vencedores. O próprio motivo que faz desencadear o seu

desenvolvimento e as estratégias, o número de mortos, as armas usadas sejam psicológicas ou bélicas, são contados sob o ponto de vista do grupo dominante.