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CAPÍTULO 01 TERRITORIALIZAÇÃO DO CAPITAL NO

1.2 Crise estrutural do sistema capitalista

As informações já apresentadas neste capítulo demonstram o caráter hegemônico da territorialização do capital no campo, desde o domínio de transnacionais/multinacionais nos aspectos econômicos, políticos (financiamentos e consentimentos do poder político) e ideológicos (mídia, escolas e outros). Nesta base está assentada a histórica da América Latina, mas o processo atual demonstra uma intensidade jamais vista. A produção em larga escala para exportação de agrocombustíveis, derivados da soja, papel/celulose; a extração de recursos naturais através da mineração; e o hidronegócio, se integra à megaprojetos de infraestrutura para facilitar a circulação e comercialização destas mercadorias. O estabelecimento desta hegemonia provocou e provoca a desterritorialização dos povos do campo, como comunidades indígenas, quilombolas e camponeses.

24 Informação de Altino Machado e publicada por Terra Magazine / Blog da Amazônia, em 17/07/2013. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/522016-amazonia-perdeu-184-kms-de-floresta-em- junho-aumento-de-437-em-relacao-ao-ano-passado Acesso em julho de 2013

25 Reportagem disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,metade-da-madeira-retirada-de-mt- e-ilegal-,951618,0.htm . Acesso em julho de 2013.

Esta territorialização hegemônica é colocada em prática pela aliança entre empresas transnacionais / multinacionais26 (sejam elas latino-americanas ou não, estatais ou privadas) e os Estados Nacionais, explorando a natureza através também da expansão de um modelo baseado na exploração do homem como fundamento – o capitalismo.

Milton Santos (2003) e István Mézarós (2009) convergem na interpretação que o período histórico vivido é um período de crise permanente, estrutural, global do sistema capitalista e que se manifesta em diferentes aspectos, países ou setores de produção. Para Santos (2003), a relação entre a “tirania do dinheiro” e a “tirania da informação” são as bases estruturais da globalização do capital. Uma associação que forja hegemonia e pressiona processos não hegemônicos a desaparecer tanto fisicamente ou mesmo pelo processo subordinação destes à totalidade hegemônica. O autor afirma que:

O processo da crise é permanente, o que temos são crises sucessivas. Na verdade, trata-se de uma crise global, cuja evidencia tanto se faz por meio de fenômenos globais como de manifestações particulares, neste ou naquele país, neste ou naquele momento, mas para produzir o novo estagio de crise. […]. A tirania do dinheiro e a tirania da informação são pilares da produção da historia atual do capitalismo globalizado. [...]. A associação entre a tirania do dinheiro e a tirania da informação conduz desse modo, à aceleração dos processos hegemônicos, legitimados pelo pensamento único, enquanto os demais processos acabam por ser deglutidos ou se adaptam passiva ou ativamente, tornando-se hegemonizados. Em outras palavras, os processos não-hegemônicos tendem a desaparecer fisicamente, seja a permanecer, mas de forma subordinada, exceto em algumas áreas da vida social e em certas frações do território onde podem manter-se relativamente autônomos, isto é capazes de uma reprodução própria. [...] Na verdade, porém, a única crise que os responsáveis desejam afastar é a crise financeira e não qualquer outra. Aí, está, na verdade, uma causa para mais aprofundamento da crise real – econômica, social, política, moral – que caracteriza o nosso tempo. (SANTOS, 2003, p.35-36)

26 Há autores que distinguem as características de empresas multinacionais e das empresas transnacionais, como o caso de Zubizaerreta (2012). Neste caso, as transnacionais fixam-se em estratégias de produção com base internacional, ultrapassando suas fronteiras para atuar no mercado exterior, mas não mantendo vínculo com qualquer país. Não tem seu capital originário especificamente de um país e não domina necessariamente a totalidade da cadeia produtiva de uma mercadoria. Instala filiais, em diferentes países, a partir do critério de mercado consumidor, infraestrutura, matéria-prima, mão de obra barata e isenção de impostos para adquirir maior lucratividade. Já o conceito de multinacional aparece primeira vez nos anos 60, numa palestra de David E. Lilienthal, a definindo como empresas que tem sede em um país, mas operam e funcionam desde as leis de outros países. (ZUBIZAERRETA, 2012, p.18). Entretanto a maioria dos autores não coloca diferença entre as multinacionais e transnacionais. Segundo o Novíssimo Dicionário de Economia (SANDRONI, 1999), as multinacionais são estruturas empresariais básicas do capitalismo nos países altamente industrializados. “Caracteriza-se por desenvolver uma estratégia internacional a partir de uma base nacional, sob uma coordenação de uma direção centralizada”, e são conhecidas também “pela denominação de empresas internacionais ou transnacionais”. Estas resultam “da concentração do capital e da internacionalização da produção capitalista”. (SANDRONI, 1999, p. 415). Assim, o fato é de que empresas de caráter transnacionais e/ou multinacionais estão circunscritas na lógica capitalista de produção de mercadoria, de extração de mais valia e expropriação dos recursos naturais, e estão atuando em todos os países da América do Sul, independente dos governos de caráter progressista, como o caso de Venezuela, ou governos de centro-esquerda ou ainda neodesenvolvimentistas como o caso de Equador, Bolívia, Uruguai, Argentina e Brasil. Estas empresas tem uma forte atuação em plena época de crise estrutural do sistema capitalista.

Mészáros (2009) aponta que o capitalismo entra numa crise estrutural e sistêmica depois de vivenciar uma era de crises cíclicas. Esta crise estrutural é marcada por uma continuidade depressiva e duradoura, embora possa haver alternância em seu epicentro. Ao contrário de outros momentos históricos, que alteravam ciclos de expansão em crise, desde o final dos anos 60 e início de 70, o capitalismo entra numa crise crônica e permanente. Crise estrutural que exige uma mudança estrutural de seu núcleo central estabelecido pelo triple capital, trabalho assalariado e Estado para uma real superação.

Segundo o autor é necessário cuidar com a falsa ilusão sobre o declínio dos EUA como potencia hegemônica, como é o caso de análises realizadas por alguns autores. Esta potencia hegemônica se estabelece em processos de “extraterritorialidade”, como por exemplo, reivindicando para si o controle de exportação de sistemas de alta tecnologia como o caso da indústria de computação, assim como de uma forte atuação ideológica ocultando seu agressivo expansionismo e intervencionismo, e, deslegitimando qualquer processo de revolta social, ou de construção de sociedades de caráter socialista. Mészáros afirma:

[...] Com efeito não há nenhum indício serio do ansiosamente antecipado declínio dos Estados Unidos como potencia hegemônica, apesar do aparecimento de numerosos sintomas de crise no sistema global. As contradições que pudemos identificar dizem respeito ao conjunto interdependente do sistema do capital global no qual o capital norte-americano ocupa, mantém e, na verdade, continua a fortalecer sua posição dominante de todos os modos, paradoxalmente ate mesmo por meio de suas praticas de imperialismo de cartão de credito – à primeira vista bastante vulneráveis, até o presente momento, implantadas com sucesso e sem muita oposição. (MÉSZÁROS, 2009, p.41)

O capitalismo também se apropriou de maneira tão intensa das forças da natureza que acelera irremediavelmente sua destruição e sua autodestruição, com vistas à crescente produção de mercadorias de maneira alienada e reificada, impulsionando cegamente ao consumismo, e à descartabilidade (obsolescência planejada) desenfreada. A questão da ecologia, que alguns anos atrás era de certa forma ignorada, passa a ser uma questão central e de sobrevivência da própria humanidade.

Mészáros aponta também que a crise estrutural tem como característica uma crise de dominação, onde a crescente concentração do capital com a ciência e tecnologia abala a subordinação socioestrutural do trabalho ao capital. Os indicativos que comprovam esta questão como, por exemplo, a progressiva vulnerabilidade da organização industrial, a inter- relação econômica dos diferentes ramos da indústria em forma de oligopólios e superconglomerados, a crescente ideia de controle dos trabalhadores, a religião, a educação e

a mais considerada mais importante crise pelo autor que é a desintegração da forma da família atual, uma célula da sociedade de classes.

O autor aponta que para uma crise estrutural é necessário uma mudança estrutural, e consequentemente aponta que a transformação socialista continua sendo a radical superação do próprio capital. Para Mészàros “nenhuma conquista imediata pode oferecer saída para esse dilema”.

O objetivo estratégico real de toda transformação socialista é, e continua sendo, a radical transcendência do próprio capital, em sua complexidade global e na totalidade de suas configurações históricas dadas e potenciais, e não meramente dessa ou daquela forma particular de capitalismo mais ou menos desenvolvida (subdesenvolvida) (MÉSZÁROS, 2009, p. 80)

O único caminho para este momento histórico seria uma mudança radical econômica e política que seja orientada pela massa como precondição. Entretanto, há uma necessidade de uma teoria da transição, que em experiências anteriores de construção socialista, tiveram vários problemas, como o caso da revolução russa na era stalisnista. Mas também houve “heroicas contribuições tanto humanas como teóricas” na busca de caminhos alternativos como o caso das contribuições de Antonio Gramsci, que devido às circunstancias do fascismo na Itália foram condenadas a permanecer isoladas. Neste sentido, a revolução bolivariana, em seu espírito de determinação radical e da crítica radical da política, repercute positivamente em todo o continente latino-americano.

Faz-se necessário a construção de uma nova ordem hegemônica como alternativa histórica, com um caminho hegemônico alternativo onde a base da reprodução social seja o controle dos produtores, ideia que sempre foi parte da luta socialista. Este processo necessita de uma articulação intrínseca à construção de uma consciência social, o que envolve inclusive a importância estratégica do planejamento na busca da “igualdade substantiva” (MÉSZÁROS, 2009; 2012), que nasce da necessidade de por fim à desigualdade de classes. Neste sentido, a chave histórica encontra-se no desenvolvimento de uma “autoconsciência positiva da humanidade”, na busca de encontrar “essa dimensão positiva”. (MÉSZÁROS, 2009; 2012).

1.3 Consequências da hegemonia do Capital no Campo: Territorialização e