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Cursos latino-americanos da Escola Nacional Florestan Fernandes – ENFF (Brasil):

CAMPESINA NA AMÉRICA DO SUL

3.1 Cursos livres ou informais e atividades de formação política:

3.1.4 Cursos latino-americanos da Escola Nacional Florestan Fernandes – ENFF (Brasil):

A Escola Nacional Florestan Fernandes é uma Escola de formação de quadros do Movimento Sem Terra. Entre os diversos cursos, seminários, encontros realizados na mesma, há um núcleo de estudos latino-americanos para organizações da Via Campesina Internacional, e um núcleo de cursos formais, onde a partir de parcerias com instituições universitárias, faculdades e instituições de pesquisa e investigação científica, projetam-se cursos de caráter latino-americano para representantes dos movimentos sociais articulados na Via Campesina Internacional.

Antes de aprofundar o que cada núcleo contempla e suas características, é necessário identificar alguns elementos históricos de sua construção. Esta escola foi inaugurada no ano de 2005, com um grande Seminário Internacional sobre Formação de Quadros, com a presença de diversas experiências de formação e educação popular. O ato de inaugurar esta escola com este evento já demonstra seu caráter de construção internacionalista. Sua construção foi realizada através de brigadas de trabalho voluntário onde participaram assentados (as), acampados (as) de todo o país, assim como voluntários de organizações parceiras nacionais e internacionais.

Conforme aponta Ana Maria Justo Pizetta (2007), a construção da ENFF ocorreu no período de 2000 a 2005 “configurando-se em torno de 12 mil horas trabalhadas por 1000 pessoas (927 homens e 63 mulheres) representando 112 assentamentos e 230 acampamentos os quais foram organizados em 25 brigadas de trabalhadores e trabalhadoras voluntárias”. (PIZETTA, 2007, p.25), Ainda segundo a autora, estas brigadas representaram 20 estados da federação onde o MST está organizado.

Em nota de rodapé a autora explica a terminologia: “brigadas de trabalho voluntario”:

Brigadas de Trabalho voluntário foi o nome que o MST escolheu para os grupos de trabalhadores e trabalhadoras dos assentamentos e acampamentos da reforma agrária, que os estados organizaram para contribuir na construção da ENFF. Elas permaneciam durante 60 dias no canteiro de obras e eram auxiliados em seu aprendizado por uma brigada permanente formada por assentados e acampados com

experiência na construção com terra, muitos dos quais capacitaram-se a partir da vivencia nos espaços de trabalho da Escola Nacional. (PIZETTA, 2007, p. 25) O significado desta metodologia, de construção coletiva, de construção com terra, do trabalho vinculado ao processo de consciência, ao processo educativo, é um princípio fundamental do próprio do MST. A autora afirma, retomando autores como Ricardo Antunes, e Georgy Lukács que o trabalho é “um ato de por consciente” exigindo assim o “conhecimento concreto” de determinadas finalidades e meios, “ainda que jamais perfeito” (PIZETTA, 2007, p. 29). Sobre a importância desta metodologia, conforme dois dos depoimentos coletado pela autora, de trabalhadores assentados que fizeram parte do processo de construção coletiva da escola.

Na escola, trabalha-se voluntariamente para construir algo que será das pessoas e, elas vão poder utilizar e dar continuidade ao trabalho que realizamos aqui. Eu aprendi não só a trabalhar na construção, aprendi a construir com terra, fazendo a analise do solo adequado para a produção dos tijolos. Aprendi a ler projetos, através dos cursos que foram ministrados na obra. Assim, aprendo na teoria e na pratica. E nos cursos de formação aprendi sobre as linhas políticas do MST, a formação, através desse processo, foi me construindo, deixei de beber, ajudado pelo coletivo. (PIZETTA, 2007, p.30)

[...] a gente se descobre politicamente e descobre a importância de ser um ser humano, faz se sentir mais humano. Fora da Escola eu era individualista e ignorante. Aqui, eu aprendi 100%, não sabia nada de construção. O exercício do trabalho voluntário faz com que a gente comece a compreender a importância de cada ação que se faz, o respeito aos limites de cada pessoa. Aprendi a doar trabalho, amizade, compreensão. (PIZETTA, 2007, p. 32)

A Escola Nacional Florestan Fernandes em princípio era um Curso Nacional de

Formação de Militantes que como mencionado anteriormente era realizado no estado de

Santa Catarina, municicpio de Chapecó, posteriormente acaba tornando-se a escola de formação de quadros do MST. Segundo Silva (2005) a campanha nacional para a construção de uma sede para a ENFF inicia em 1998, desenvolvendo junto a militancia um “sentimento de honra em participar da Escola como construtor e/ou estudante”. Uma campanha que desde o início teve um sentido de “fortalecer a dimensão coletiva do MST”, passando a ser um grande “curso de formação massiva, onde todos possuem o direito e o dever de participar, intensificando a necessidade histórica do estudo para o fortalecimento da orgnaização social”. (SILVA, 2005, p. 174).

A atual sede da ENFF é localizada no município de Guararema – SP, mas como afirmam seus documentos internos, a escola não se reduz a estrutura física, mas significa a

política de formação de quadros da organização, e nesse sentido diversos de seus cursos ocorrem espalhados nos diferentes estados do país.

A ENFF atualmente organiza seus trabalhos a partir de quatro núcleos de estudo, dos quais um especificamente é vinculado a formação de militantes e formadores latino- americanos, como se mencionou acima, o núcleo estudos latino-americanos. E outro denominado núcleo de cursos formais, onde os cursos, conforme comentado acima, são parcerias com Instituições formais de educação (Universidades, faculdades, etc.). E destes alguns são pensados para militantes de organizações sociais campesinas articuladas na VCI.

No caso do primeiro núcleo, dois cursos fazem parte deste: O Curso de Teoria

Política Latino-americana e o Curso de Formação de Formadores da América Latina. O Curso de Teoria Política Latino-Americana já foi realizado em seis edições. Num período de

três meses, militantes dos diferentes países de todo o continente americano. Numa das edições, participaram militantes da África e noutro da Palestina. Nas ultimas turmas participaram diversos militantes de organizações campesinas do Haiti. Estes em sua maioria falavam em crioulo ou francês, o que se resolveu pela tradução simultânea juntamente com participantes de fala hispânica.

Temas como economia política; filosofia política; estudo do pensamento e de pensadores latino-americanos como José Martí, Simon Bolívar, Mariátegui, Che Guevara, entre outros; historia das resistências e processos revolucionários do continente; e teoria política da organização, são parte do programa deste curso.

Quanto ao curso de Formação de Formadores da América Latina, já foram realizadas cinco edições. Voltado a militantes e dirigentes que trabalham com educação popular, formação política e/ou organizam e acompanham processos formativos, é um curso com período de trinta a quarenta dias no qual se estudam os temas do Curso de Teoria

Política Latino-Americana de maneira mais sintética, mais temas referente à educação

popular, ao trabalho de base e o trabalho organizativo de camponeses, indígenas, afrodescendentes, e assalariados do campo.

Também, vinculado a este núcleo, existe um acompanhamento sistemático das brigadas internacionalistas de solidariedade que tem o papel de fortalecer os laços da luta internacional e de contribuir voluntariamente com as organizações sociais dos diferentes países nos aspectos organizativos e da formação política. Este acompanhamento se dá inicialmente com um momento conjunto de estudo da realidade do país onde se estará realizando atividades, do princípio internacionalista, dos movimentos camponeses que ali atuam, da língua do país (casos como espanhol, inglês, crioulo, francês). No momento

existem brigadas internacionalistas de solidariedade no Haiti, na Venezuela, na Bolívia e no Paraguai com diferentes atividades vinculadas à produção e formação junto às organizações articuladas na VCI.

Quanto ao núcleo de cursos formais, aos cursos de caráter latino-americano, citamos o Curso de Especialização em Estudos Latino-americanos, uma parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora, e o curso de Mestrado em Desenvolvimento Territorial na América

latina e Caribe. A característica essencial destes cursos é o vínculo ou parceria com outras

Instituições devidamente regulamentadas no que diz respeito ao processo de escolarização. São cursos construídos conjuntamente com instituições de ensino superior e que ocorrem geralmente nas dependências de tal instituição. São cursos criados especialmente para integrantes dos movimentos sociais, turmas especiais com processos seletivos diferenciados, mas não menos rigorosos.

O Curso de Especialização em Estudos Latino-americanos é uma parceria da Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, Minas Gerais, com a Escola Nacional Florestan Fernandes. É realizado no Município de Juiz de Fora em Minas Gerais, nas dependências da faculdade de serviço social da Universidade, e na sede da ENFF, alternadamente. Com início em 2003 a primeira turma teve a participação de representantes das diferentes organizações campesinas do Brasil, do Paraguai, e Chile. Com metodologia de alternância, aconteciam etapas nos meses de fevereiro e julho num período de dois anos. A cada dois anos nova turma se iniciava, sendo que em 2013 se iniciou a sexta turma.

O curso proporciona a discussão de temas como metodologia da pesquisa social aplicada aos movimentos sociais; conceitos da crítica à economia política, arte e literatura na América Latina; historia político – econômica e antropológica da America Latina, historia das lutas de resistência e revoluções latino-americanas; pensamento e pensadores latino- americano; movimentos sociais na América Latina, etc.

Outro curso com esta característica é o Curso de Mestrado em Desenvolvimento

Territorial na América Latina e Caribe, cátedra construída através da parceria, Universidade

Estadual Paulista Julio de Mesquita – UNESP, campus de Presidente Prudente; a Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO; e a Escola Nacional Florestan Fernandes – ENFF do MST, Brasil. Um esforço conjunto destas três instituições para constituir este curso, strictu sensu, voltado a integrantes de movimentos sociais da Via Campesina a nível internacional. O Programa da cátedra foi oficialmente foi aprovado neste ano de 2013 e contempla temas que envolvem a discussão de questão agrária, soberania

alimentar, campesinato, resistência, educação do campo, produção familiar, relações de gênero e território na America Latina.

A primeira turma, parte deste projeto da Cátedra, realizando o mestrado regular em Geografia na UNESP com militantes da Via Campesina Brasil. São quatorze educandos/ militantes que realizam investigações em temas como: Educação do campo; disputas territoriais entre o agronegócio x campesinato; o modelo energético e capitalismo; políticas públicas; políticas do banco mundial para agricultura; construção de territórios camponeses, as relações de trabalho em assentamentos da reforma agrária, o protagonismo das mulheres na luta por política agrária; o plano camponês; a CLOC – Via Campesina; e o caráter educativo da luta pela terra.

Estes cursos fazem parte do núcleo de cursos formais da ENFF, e são experiências de formação política-profissional com características peculiares da educação formal, onde se exige uma determinada escolaridade e ao mesmo tempo escolariza.

O programa de formação da Escola Nacional Florestan Fernandes, em sua diversidade de características, tem princípios que já foram mencionados acima como, por exemplo: o internacionalismo, o estudo, o trabalho e a organicidade. Carrega também o princípio, não menos importante, que é o da educação/ formação para a transformação social, e neste sentido deve articular teoria e pratica envolvendo a construção de novos valores. A Escola Nacional conta também com uma ciranda infantil51 chamada Saci Pererê que realiza um processo de educação infantil aos filhos que participam da vida da escola, sejam estes educandos ou integrantes do corpo de trabalhadores da escola.

3.1.5 Escola de Formação de mulheres: continental, região conosur, e região andina