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Após duas semanas, eu estava em Salvador, iniciando uma nova viagem. Agora, rumo à minha primeira experiência na Arte de Viver, o Curso Parte 1. Este curso, também chamado Básico, é pré-requisito para os demais cursos da Arte de Viver. Uma porta de

entrada para aqueles que chegam buscando um alívio do estresse e suas consequências, que cada vez mais assolam o mundo moderno. É apresentado no site e no material de divulgação impresso como um programa experiencial, prático e dinâmico, cujo ensinamento central é o Sudarshan Kriya®.

Sudarshan Kriya® é a poderosa técnica respiratória criada por Sri Sri Ravi Shankar. Uma técnica que tem contribuído para a melhoria da vida de milhares de pessoas em todo o mundo, independente da idade, religião, cultura, sexo ou etnia. Segundo o Mestre Ravi Shankar, na respiração residem os segredos mais profundos da vida. A respiração é a ligação entre corpo, mente e espírito, e pode curar, rejuvenescer e transformar a vida totalmente (SHIVRATRI, 2006). O curso tem a duração de seis dias, totalizando aproximadamente 22 horas de atividades e seu conteúdo constitui-se de práticas como yoga, relaxamento e meditação e inclui, ainda, pr nayamas (técnicas respiratórias), conhecimento espiritual para a vida, processos interativos guiados e valores humanos universais que contribuem para o autodesenvolvimento. O curso Parte 1 da Arte de Viver convida a uma experiência de limpeza e purificação do corpo físico, libertação do estresse emocional, das toxinas mentais e físicas, trazendo o corpo e a mente para o momento presente, em sintonia com os ritmos naturais da vida e da natureza. Serenidade, mente clara, centramento, saúde, maior alegria e entusiasmo na vida, criatividade eficiência e produtividade, relações mais harmoniosas.

Foi a partir dessas “promessas” que eu mesma vislumbrei uma possibilidade para superação do momento de crise que eu vivia, de alívio das dores físicas e emocionais, da transformação da mente, de efetivação de um bem-estar duradouro. Para mim era uma espécie de tábua de salvação em um momento crítico e difícil.

Encontrei a instrutora, como é chamado o/a profissional que facilita o curso, logo que cheguei, ainda na entrada do local, uma escola de yoga em um bairro de classe média de Salvador. Patrícia, uma jovem alta, elegante, muito simpática, bonita e sorridente, me recebeu com alegria e surpresa, por eu estar vindo de Fortaleza, especialmente para o curso. Era um grupo pequeno de aproximadamente quinze pessoas, a maioria mulheres. Sentados no chão, em colchonetes e almofadas demos início apresentando-nos uns aos outros. Os cursos da Arte de Viver sempre iniciam desta forma: cada um se apresenta a outra pessoa, dizendo o nome e acrescentando “Eu te pertenço”. Achei uma experiência difícil. Olhar nos olhos e dizer esta frase me despertou uma grande resistência, eu queria que acabasse logo. A cada pessoa que eu encontrava era como se eu me desnudasse um pouco mais e me mostrasse em minha fragilidade. Abraçar e ser abraçada por um(a) desconhecido(a) me fazia perceber o quanto vivemos separados uns dos outros, o quanto a sociedade nos impõe um distanciamento, no

trabalho, nas relações de amizade e inclusive na família. Percebi-me uma pessoa solitária que ansiava por relações mais próximas, mais profundas e mais sinceras. Tomei consciência de que este era um dos motivos da minha tristeza. Esta foi uma experiência aparentemente simples, mas profundamente marcante.

O curso prosseguia e eu me sentia mais à vontade, experienciando e observando. A minha mente analisava tudo, concordava ou discordava, tentava acompanhar a sequência das atividades e práticas, entrou em ação “a professora-pesquisadora” que queria conhecer as razões, as explicações de cada vivência ou exercício proposto. Mas não era permitido fazer anotações, e eu tentava, então, memorizar tudo para anotar quando estivesse sozinha no hotel. Eu não aceitava e nem compreendia o que estava sendo proposto: vivenciar, deixar fluir, escutar com atenção ao momento presente, sem julgamentos, aprender mais pela experiência e menos pelo intelecto. Até o último dia eu vivi esta luta interna entre o intelecto e os sentidos, entre deixar ir e prender, entre viver o momento presente e a oscilação da mente entre o passado e o futuro.

Foi uma experiência indescritível e inesquecível. Descobri que a Arte de Viver se propõe ir muito além do gerenciamento do estresse, como é apresentado na sua estratégia de marketing. Na verdade, é o início de uma caminhada para o Ser, ou tman, o caminho da liberação, próprio do Yoga. Idealizado pelo Mestre traduz na prática a sua sabedoria e a sua intencionalidade: levar as pessoas para o centro do próprio Ser, para a espiritualidade e para a compreensão da totalidade da realidade universal. Este conhecimento vivido na prática cotidiana promove a harmonização dos indivíduos e da sociedade, constituindo um verdadeiro transformador das relações humanas e sociais no mundo contemporâneo.

Naquele dia eu ainda não tinha uma visão muito clara sobre tudo isso. O meu interesse se centrava nas técnicas de respiração e no Sudarshan Kriya® e descobri uma proposta formativa fundada na tradição hindu, divertida, que trazia o conhecimento de forma leve, simples, clara e profunda. O curso é apresentado como uma viagem da cabeça ao coração, um percurso que toca cada uma das dimensões do ser humano: corpo, respiração, mente, intelecto, memória, ego e Ser. Um conjunto multifacetado de conhecimentos que cobria vários tópicos desenrolava-se e envolvia o grupo. Cada experiência me surpreendia e tocava as minhas emoções. Cada encontro provocava uma pequena transformação, um processo sutil de desconstrução e reconstrução em várias dimensões. Poderia descrever este processo formativo como holístico, no entanto, não creio que este termo seja abrangente o suficiente para descrevê-lo. Talvez o termo Purna Yoga (Yoga Integral) seja o mais adequado, porém este não é utilizado oficialmente pela Arte de Viver.

Já no primeiro dia, como atividade introdutória, algumas questões nos foram postas: Qual o desejo da sua vida? Quais os seus aborrecimentos na vida? O que você espera deste curso? Naquele contexto, estas simples perguntas, talvez até um pouco banais e costumeiras para mim tomaram uma dimensão de reflexão sobre os últimos anos da minha vida. Percebi como tinha inúmeros desejos, como tudo para mim era um aborrecimento, e como eu colocava todas as minhas esperanças nesse curso. Como ser feliz com tamanha insatisfação!!! De onde advém a felicidade? Onde está a felicidade? É preciso fazer algo para alcançar a felicidade? Sem julgamentos e sem respostas, a instrutora nos falou o quanto a expectativa reduz a felicidade. Então convidou-nos a deixar de lado todas as expectativas sobre o curso e apenas estar ali, no momento presente. Tal convite me soou como uma loucura, afinal, eu vivia cheia de expectativas sobre tudo e todos. Como não ter nenhuma expectativa, assim de um momento para o outro? Já que eu tinha viajado milhares de quilômetros, feito uma despesa imprópria para o momento, incluindo o valor do curso, viagem aérea e hospedagem, talvez fosse melhor eu ao menos tentar. E assim começou a minha viagem de transformação.