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Uma curva no concreto de Nova York – Guggenheim NY, Frank Lloyd Wright

Do Modernismo ao período pós Segunda Guerra Mundial (1945), a produção artística manteve a busca por uma superação de sua própria capacidade criativa, o que guiou os movimentos artísticos por décadas. As novas tecnologias da informação e comunicação que surgem a partir dos anos 1950 irão influenciar decisivamente a arte do período. Essas tecnologias alavancaram o universo da arte para um público cada vez maior, e esse novo mundo informacional, descolado do territorial, passou a interferir direto nas cidades, interligando culturas totalmente diferentes. A consolidação do capitalismo de consumo e a massificação dos paramentos sociais irão provocar intensas manifestações artísticas, calcadas no esvaziamento de sentido geral da cultura.

Na arquitetura, o esgotamento da linguagem moderna e a percepção de que os seus paradigmas poderiam ser mais humanizados, levaram os arquitetos a uma nova linguagem com base num projeto menos idealizado, como disse o historiador Sigfried Giedion em sua leitura sobre a década de 1950:

“Há, em nossa época, um consenso universal quanto a necessidade de restabelecer valores perdidos: a escala humana, os direitos individuais, o direito mais primitivo de ir e vir dentro da cidade. Por trás de desejo residem as constantes imutáveis da vida humana, em sua demanda por serem atendidas”1.

Será durante essa época até o princípio dos anos 1970, que o modelo que hoje conhecemos como museu de arte se vai consolidar.

Inaugurado após dezesseis anos de construção, e mais de setecentos desenhos, em 1959, o Museu Guggenheim de Nova York, com projeto de Frank Lloyd Wright, inova ao propor uma nova concepção de espaço de exposições. O projeto de Wright leva os visitantes ao topo do museu por um elevador central, para em seguida descerem uma grande rampa-galeria em forma de espiral, aberta ao longo de um átrio central iluminado. Sua forma orgânica contrasta com o entorno construído, transformando-se rapidamente num ícone na cidade.

Essa concepção inovadora acabou por atrair as pessoas que visitavam o museu apenas para conhecer sua arquitetura independente das obras expostas, inaugurando a ideia do edifício monumento que, como uma obra de arte, compete diretamente com os quadros expostos em seu interior.

Para Argan, após a Segunda Guerra Mundial, a dinâmica da produção e circulação artística migra de Paris para Nova York, produzindo mudanças na transmissão e na recepção dos objetos artísticos, especialmente das obras modernas. Para o autor, nesse novo ciclo da arquitetura americana foi determinante a produção arquitetônica de Frank Lloyd Wright, que pensa pela primeira vez na história, numa arquitetura ligada à ação do homem. Traz como exemplo a assimetria purista e espiralada do Museu Guggenheim de Nova York de 1939. Ainda segundo Argan, quase todos os temas de pesquisa da arte moderna norte-americana, que se consolidaria mundialmente no pós guerra, já estavam presentes no racionalismo orgânico da arquitetura de Wright:

“A concepção do espaço como criação humana, dimensão da existência que a própria existência determina com sua atuação; a concepção de arte como um gesto, com a qual se afirma simultaneamente a existência indissociável do sujeito e da realidade; a adoção na imagem artística de materiais ou elementos extraídos diretamente da realidade; a tensão entre operação artística e operação tecnológica; e o poder (...) de transformar a obra de arte num ato que intensifica e aumenta o calor da existência. 2

Essa forma espacial singular de Wright reflete seus estudos anteriores sobre a

contraposição entre a espacialidade interior e a exterior de seus edifícios. No Guggenheim, o prédio se fecha totalmente ao exterior, voltando sua atenção para as relações internas. O volume arredondado do seu exterior fazia questão de não revelar sua interioridade, convidando o observador a descobri-lo. Montaner sintetiza a maneira como o museu se relaciona com a cidade e o seu tempo:

“Embora seja uma obra urbana, não se resigna em afirmar seu caráter antiurbano a autárquico, expressando seu pertencimento ao repertório das formas orgânicas(...) Por um lado a referência ao sólido, ao tectônico, às rochas e às cavernas, que se expressa essencialmente no seu interior introvertido do edifício. Por outro lado a busca de dinamismo, das formas das pontes e das plataformas, das formas esbeltas e em

movimento, em sintonia com o neoplasticismo, expressado nesse caso na rampa interior e nas faixas helicoidais que vão crescendo no exterior3

O declive do piso e a geometria curva das galerias de exposição foram severamente criticados por muitos artistas desde sua inauguração, tanto pela obrigatória linearidade de qualquer exposição, quanto pela dificuldade de exposição de obras de grande porte. Com a ampliação de 1992 e a adição de uma torre retangular de pedra calcária de dez andares, projetada pelo escritório de arquitetura de Gwathme y Siegel & Associates Architects, que 2 Giulio C. Argan Arte Moderna, São Paulo, Cia das Letras, 1998, pg. 300

3 Jose M. Montaner, Después del movimiento moderno: arquitectura de la segunda mitad del siglo XX, Barcelona: Gustavo Gili, 1993, pag.57

analisou esboços originais de Wright, novas galerias de exposição adicionais com paredes planas atenuaram esses problemas.

A grande contribuição que a obra de Wright traz para o espaço expositivo foi uma reinterpretação da lógica expositiva, na qual o museu vertical abre-se para o seu interior iluminado, dividindo a atenção do visitante entre as salas expositivas e a experiência sensorial e quase lúdica do seu espaço arquitetônico. A experiência do total domínio do espaço arquitetônico soma-se aqui à vontade de exploração de seus espaços velados.

Segundo Nuno Grande, é a partir de 1945 que a arte moderna adquire um novo potencial político no contexto da Guerra Fria como metáfora do pluralismo e da liberdade que a criação artística usufruía nas democracias ocidentais. A década de 1950 é particularmente intensa no envolvimento de museus e instituições norte-americanas não só na divulgação da arte moderna norte-americana, mas na afirmação da supremacia ideológica e metodológica do formalismo pictórico em relação à tradição europeia:

“Na década de 60, os museus de arte moderna adquiriram protagonismo como

veículos de promoção não só de uma ideia de arte mas como agentes de aculturação e normalização de um determinado tipo de sociedade”4

Ainda segundo esse autor, dentro dessa linha de museu ligado à paisagem um dos exemplos que melhor ilustra este padrão é o Louisiana Museum of Modern Art, em Copenhague, projetado pelos arquitetos Jörgen Bo e Vilhelm Wohlert, em 1958. Com esse novo conceito de museu modernista, a narrativa hermética do cubo branco bem como as galerias são colocadas à parte, elegendo-se os ambientes exteriores e a natureza como cenário de exposição das obras.

Pilotis no Japão – Museu Nacional