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Museu transparente – O Museu do Século 21 de Arte Contemporânea de Kanazawa –

Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, Sanna.

Inaugurado em 2004 na cidade de Kanazawa, no Japão, O Museu do Século 21 de Arte Contemporânea da dupla de arquitetos japoneses Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, do escritório Sanaa, surpreendeu a todos pela sua forma totalmente circular e plana e pelo fato de ser implantado numa área junto ao centro da pequena cidade japonesa. Com um diâmetro de mais de cem metros e área de 17 mil metros quadrados, o programa misto de áreas públicas e privadas, abriga obras do acervo e exposições temporárias, centro comunitário com espaços gratuitos voltados para a comunidade, como biblioteca, área de convivência, jardins internos, sala de ateliê, café e loja.

Sua grande fachada de vidro convida convida os visitantes a explorar o local por várias entradas livres. Os espaços de exposição são situados no meio do círculo e compreende catorze salas expositivas de variados tamanhos e alturas, incluindo quatro pátios que, fechados de vidro, são totalmente abertos na sua cobertura. As áreas de exposição podem ser modificadas por meio do uso dos corredores, abrindo ou cercando espaços. O programa ainda utiliza o subsolo para salas expositivas, além da administração e salas técnicas.

Esse aparente amontoado aleatório de blocos quadrados e circulares contidos no grande cilindro de vidro acaba por desconstituir o conceito de fachada, pois não existe um acesso principal, e sim a possibilidade de qualquer percurso pela obra numa lógica meio labiríntica, em que os espaços de circulação se tornam espaços de vivência e onde a perspectiva da descoberta parece fazer parte do programa. Como diz Sejima:

“Os visitantes podem seguir o percurso que quiserem pelos vários espaços que constituem a seção do museu de arte, permitindo maior flexibilidade à programação museológica. (…) Os interiores das galerias e as paisagens urbanas do lado de fora parecem conectar-se por meio de corredores ininterruptos e paredes de vidro. (…) A cidade e o muconectar-seu de arte tornam-se campos magnéticos de conscientização, encetando programas simbióticos dos quais ambos se alimentam. Aos espectadores, por sua vez, cabe engajarem-se com o espaço como sujeitos. O que esse museu de arte mostra é que, para o Sanaa, um “programa” não requer a pré-existência de um espaço programado e articulado, mas sim

Fig 99 Museu do Século 21 de Arte Contemporânea de Kanazawa, Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, Sanna, 2004.

um mecanismo para criação, segundo a ocasião exigir, do tipo de “espaço de convivência” que reflete as atividades de usuários individuais.” 1

Sejima iniciou nos anos 1980 sua carreira junto ao escritório de Toyo Ito, que foi justamente quem nos anos 2000, encontrou a melhor definição para a produção do escritório Sanaa, definido como “arquitetura diagrama”, conceito que acabou sendo chave na arquitetura dos anos 2000, “como um princípio de integração entre função e espaço a partir de uma nova matriz informacional.“2

Ainda segundo Ito, a arquitetura do Sanaa, estabelece uma relação inédita entre o corpo e o espaço da obra em seus edifícios sinuosos e espectrais, onde dissolvem as hierarquias arquitetônicas, como estrutura e vedação, ou espaços de circulação e de estar, criando um novo mundo distante mas aconchegante, segundo a analogia feita por Toyo Ito, com proximidade com o imaginário do mundo digital. Ou como diz Wisnik:

“Nos seus retratos mais conhecidos, os arquitetos japoneses Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa nos encaram com um olhar lívido e ausente, e com roupas neutras, cinzas ou pretas, sobre um fundo branco. Espontâneas ou construídas, suas personas públicas demonstram uma frieza pálida e uma desdramaticidade que espelha os traços de sua própria arquitetura, que, a meu ver, retrata de maneira vertical um certo espírito do nosso tempo. Com um traço de autoria marcante, seus edifícios extraem um sensualismo imprevisto da inexpressividade, fundindo o racionalismo cartesiano ao contorno orgânico das formas naturais.”3

Sobre o método e o processo de trabalho da dupla, diz Hasegawa:

“Não me interesso pelo espaço que a arquitetura cria, mas pelo tipo de espaço que aparece e desaparece, suavemente, de um momento para outro (...) A abordagem do Sanaa ao programa arquitetônico é a seguinte: enquanto arquitetos do mundo ocidental concebem uma arquitetura que começa com a construção de paredes espessas, o Sanaa “imagina um tipo de espaço no qual a luz e o vento penetram o ambiente pelas portas e janelas.” 4

Em outros projetos posteriores da dupla, como o New Art Museum em Nova York, de 2007, e Towada Art Center, Towada, Japão, de 2010, podemos ver novas experimentações, nas quais a explosão centrífuga dos blocos retangulares de alturas e 1 Fala de Kazuyo Sejima citada em Hasegawa, Yuko, Transparência, flexibilidade, leveza: a arquitetura do Sanaa. São

Paulo: Instituto Tomie Ohtake, 2008

2 Toyo Ito, “Arquitectura diagrama”, El Croquis, Madri, nº 77,2001 3 Kazuyo Sejima, op. cit.

Fig 100 Museu do Século 21 de Arte Contemporânea de Kanazawa, Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa, Sanna, 2004.

perspectivas diferentes não se dá mais dentro do contentor de vidro, mas se abre para a cidade, integrando-se ao entorno pelos interstícios dos blocos e pelo jogo de cheios e vazios que sua arquitetura cria. Sobre o jogo sábio dos blocos e o vazio Galiano declara:

“Frente à solidez solar das arquiteturas do jogo sábio e magnífico de volumes sob a luz, essas obras etéreas ostentam a palidez lunar dos espíritos noturnos, e uma fragilidade evanescente que a sensibilidade romântica denominou de feminina.”5

A arquitetura translúcida do Sanaa, em que paredes quase sem espessura e pilares esbeltos constroem uma nova materialidade, acaba por reduzir a referência à tectônica, enfatizando a riqueza espacial interior, as micro-relações dos usuários, as novas possibilidades de vivência em espaços inusitados e o rico jogo entre a transparência e a opacidade. Mantém assim nossa atenção presa à visão de sua superfície, convidando nosso espírito a um mergulho em seu interior.

Museu percurso – MH Young Memorial Museum,