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Piano + Gianfranco Franchini

Em meados da década de 1970, na esteira dos movimentos estudantis de maio de 1968, surge uma nova geração de artistas e ativistas que reivindicavam o fim das

instituições culturais modernas, defendendo que estas deviam ser substituídas por espaços mais participativos. O mito do cubo branco, do espaço neutro da galeria, é atacado, e uma relação entre a arte e o espaço expositivo se estabelece. Já não é mais possível supor a autonomia do objeto artístico, porque a ação artística questiona sua própria inserção no espaço e sua relação com a arquitetura. Nessa lógica de espaços de experimentação cultural, surge na França o Centro Georges Pompidou, como um programa de museu interdisciplinar.

Inaugurado em 1977, o projeto mais polêmico da história do país foi encravado num dos bairros mais tradicionais de Paris, com um projeto de arquitetos pouco

conhecidos na época: Richard Rogers, Renzo Piano e Gianfranco Franchini. Uma enorme caixa metálica high-tech com suas estruturas aparentes e coloridas, foi erguida no bairro do Beaubourg, um dos mais tradicionais, em meio às barricadas dos moradores locais. O edifício, com 166 metros de comprimento, 45 de largura e 42 de altura, é composto por oito andares, mais dois níveis de subsolo, totalizando uma área total de 103.305 metros quadrados, incluindo as salas técnicas e o estacionamento que se estende sob a praça. O museu ou Centro de Arte Contemporânea, como é chamado, engloba ainda a Bibliothèque Publique d’Information e o Centro de Pesquisa em Música. Os pisos superiores, alcançados por escadas rolantes, oferecem vista panorâmica sobre Paris. Seu espaço interior foi concebido como um grande plano sem interrupções, adotando a concepção da planta livre, em que as exposições podem associar grandes equipamentos tecnológicos às obras expostas, conforme o programa básico do museu. Apesar de sua arquitetura polêmica o museu ganhou popularidade. Da previsão inicial de 5 mil visitantes diários, atualmente recebe 25 mil. Decorridos trinta anos de sua construção, o museu e a praça do seu entorno foram plenamente adotados pela população, em especial a mais jovem, que lotam suas instalações diariamente.

Fig. 82,83,84, Museu Georges Pompidou, França, Richard Rogers+ Renzo Piano+ Gianfranco Franchini,1977

“Se pegarmos um corte do Beaubourg, podemos perceber que ele é semelhante ao do Masp e ao do MAM do Rio, no sentido de que há uma estrutura externa, um vão livre interno, uma relação de transparência muito forte. Portanto, aquela relação de dessacralização que os modernos inauguraram arquitetonicamente é determinante no projeto do Beaubourg” 1

O impacto pela escolha dos seus materiais, especialmente aço e vidro, criaram uma linguagem tecnológica provocadora, rompendo com o modelo tradicional do museu europeu. O tema do museu como monumento urbano foi revisitado em função da escala do edifício, que ultrapassava o gabarito dos prédios do entorno, colocando-se simultaneamente como um mirante, permitindo ao público ver a cidade parisiense por um ângulo inovador.

A construção de um espaço que se associa ao uso diário, pensado para um público heterogêneo e que fruísse a arte de maneira informal, cria as condições para uma nova lógica no programa dos museus, agora mais convidativos, onde a permanência é estimulada – algo muito próximo da extensão da escola, da residência ou da ideia de praça pública. Assim, é importante ter em consideração o viés simbólico desse novo espaço e da dualidade que pode assumir, quer como transformador da cidade, quer como construtor de novos espaços de vivência.

O Centre Pompidou é recebido como um manifesto que representa a combinação improvável do comunitário e do consumismo, que permeia a maior parte da cultura dos anos 1970, reforçando a importância da tecnologia na realização de propostas arquitetônicas arrojadas, movimento que se afirmará nos anos seguintes.

A partir dos anos 1960 a ideia da exposição como um arranjo estático de obras de arte num determinado tempo e lugar, com fins didáticos é sucessivamente revista por artistas e curadores. Para os artistas da minimal art,2 por exemplo, há um momento em que o espaço expositivo, passa a ser a questão. O mito do cubo branco, do espaço neutro da galeria, é atacado, pois já não é mais possível supor a autonomia do objeto artístico, porque a ação artística questiona sua própria inserção, e sua relação com a arquitetura, que a abriga, passa a ser fundamental.

Em outro movimento, vários artistas partem para fora da galeria, seja para os espaços da natureza, seja para o espaço urbano, numa arte que se expande para o espaço circundante incorporando-o e transformando-o, em trabalhos que fivaram conhecidos como site specific.

1 G. Wisnik, Morte e ressurreição da aura, op. cit.

2 Tendência das artes visuais que ocorre no fim dos anos 1950 e início dos 1960 enfatiza as formas elementares num terreno ambíguo entre pintura e escultura. Sua expressão esta na realidade física com que expõe as obras despidas de ideias, emoções ou qualquer efeito decorativo e/ou expressivo, num vocabulário construído de ideias como despojamento, simplicidade e neutralidade em materiais industriais – vidro, aço, acrílico etc.

“A relação entre arte/vida está posta em questão, as duas instâncias não se separam mais, e aquela relação de separação que fundava uma ideia aurática da arte – e, portanto de um museu que é uma coleção de joias, um templo da cultura – está também abandonada”3

Ao invés de representar o mundo com objetos produzidos para serem expostos nos museus, alguns artistas passam a partilhar com os arquitetos a tarefa de construir um mundo próprio, criando um sentido de lugar.

Contrariando o idealismo da arte moderna de não pertencer a lugar nenhum, no site specific, o espaço de exposição, até então eleito como puro e idealista, foi substituído pela paisagem natural, pelo impuro do quotidiano e do real.

As obras de arte passam a ser feitas para um espectador, que participa do processo de criação interagindo com ele de forma a completá-lo.

“Trabalhos site-specific lidam com componentes ambientais de determinados lugares. Escala, tamanho, localização(…)são determinados pela topografia do lugar, seja esse urbano ou paisagístico ou a clausura arquitectónica. Os trabalhos tornam-se parte do lugar e reestruturam sua organização tanto conceitual quanto perceptualmente”.4 A arte torna-se algo efêmero, já que a experiência à qual esta associada torna-se irrepetível. Este modo de conceber a arte, que se afasta do museu, amplia não só a sua área de atuação, como inaugura novas experiências sensoriais da arte.

3 G. Wisnik, op. cit.

A produção heterogênea