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2.5 TÉCNICAS DE PESQUISA E ANÁLISE DE DADOS

2.5.2 Da pesquisa de campo por intermédio de entrevistas

Por sua vez, como já comentado acima, constata-se que a realidade documentalmente exposta, não se afigurou suficiente para plena demonstração de todos os elementos inerentes à complexidade política da atuação da CCAI e CREDN.

Primeiramente, porque é importante lembrar que documentos constituem um recorte profissional e seletivo da realidade (MARTINS, THEÓPHILO, 2016), voltado à satisfação de um rito legal, e que, neste processo de registroformal, acaba deixando de lado diversos aspectos da subjetividade humana fundamentais à sua compreensão.

Em segundo lugar, o registro não é capaz de conter todo o teor implícito dos interesses institucionais envolvidos no jogo de interesse político inerente às comissões legislativas. Deve-se lembrar que o método adotado, nesta senda, determina uma cautela do pesquisador para compreensão dos interesses que

conduziram os parlamentares a manifestar um comportamento dentro das comissões, traduzindo, assim, um comportamento racional motivado por escolhas

racionais dos atores envolvidos no processo decisório (HALL; TAYLOR, 2003).

E, recordando ainda a fala de Teixeira (2008), deve-se asseverar que, independentemente da visão científica adotada, o presente estudo se desenvolve no âmbito das ciências sociais, com enfoque maior na área das ciências políticas, onde a subjetividade e a complexidade, são características marcantes que exigem maiores procedimentos metodológicos para triangulação de dados (MINAYO, 2002), possibilitando a afirmação de verossimilhança ou não de teorias e hipóteses.

Assim sendo, compreendendo que a subjetividade constituiria um substrato a ser levado em conta, para além da análise documental inicialmente firmada, optou- se pela realização de uma pesquisa de campo por intermédio de entrevistas, justamente, para desvelar não os aspectos contidos nas entrelinhas documentais, como, sobretudo, questões que explicassem vazios ou ausências relativas à atuação das comissões.

Inicialmente, optou-se pela entrevista a parlamentares que teriam desempenhado suas funções junto às comissões em questão, uma vez que, a rigor, se presumia que os mesmos seriam os mais indicados para a exposição das complexidades políticas inerentes à atuação da CCAI e CREDN.

Entretanto, a pesquisa se deparou com uma série de resistências formais e materiais, recursas implícitas em justificativas genéricas de sigilo da informação e proteção de assuntos de segurança nacional, que, além de incompatíveis com o teor da Lei de Acesso à Informação (Lei n. 12.527/11), ainda, não aparentavam consonância com o quantum da produção legislativa apurado na fase documental do estudo.

Na prática, percebeu-se que não era do interesse dos parlamentares tratar, ao menos em uma pesquisa científica, de sua participação concreta no teor das comissões legislativas em questão, constituindo uma barreira que, para prosseguimento da pesquisa, demandava remoção ou a busca por uma nova alternativa.

A segunda opção, acima, foi a eleita pelo pesquisador. Afinal, diante do comportamento reticente dos parlamentares (cujos reais interesses já se afiguravam escondidos por discursos genéricos, materializando o exercício da norma como

mesmos, por mais que bem-sucedida, poderia resultar na obtenção de dados

parciais, direcionados a certos interesses ou, ainda, incapazes de gozar de maiores

níveis de confiabilidade.

Valendo-se, assim, da condição de acadêmico envolvido no campo da atividade de inteligência, o pesquisador buscou junto à rede de contatos obtida ao longo de toda a aproximação com o campo e vivência com o tema, o acesso a outros profissionais que poderiam, de forma confiável, explicar subjetividades e contextos voltados aos objetivos desta pesquisa.

Após as primeiras aproximações com o campo, nessa nova perspectiva, constatou-se de uma série de potenciais sujeitos a serem entrevistados no teor desta pesquisa. Porém, em contatos iniciais, constatou-se que nem todos os sujeitos contidos nesse universo inicial seriam detentores de informações pertinentes, ou seja, deteriam percepções (decorrentes de um real acompanhamento) das comissões legislativas e sua atuação.

Em segundo lugar, nem todos deteriam conhecimentos técnicos específicos para real exposição de percepções a respeito do tema. E, principalmente, alguns dos potenciais sujeitos de entrevista não detinham experiência, a partir de um amplo

histórico institucional na atividade de inteligência para interpretação do fenômeno

buscado pela problemática de pesquisa.

Após solicitações de recomendações recíprocas, dentre vários dos potenciais entrevistáveis, finalmente, estabeleceu-se, dentre aqueles que se afiguraram acessíveis ao pesquisador, um universo de três sujeitos autodefinidos como

profissionais da atividade de inteligência, com longo histórico de vinculação à órgãos

de inteligência federais, em diversos períodos históricos e políticos do país, desde o SNI e criação da ABIN que, assim, lhes permitiu um arcabouço teórico apto à ampla análise, crítica e exposição de percepções sobre o fenômeno estudado.

Após essa fase de aproximação, restou solicitar a realização das entrevistas, respeitando a agenda e conveniência dos sujeitos eleitos. A entrevista se deu em salas apropriadas, constantes das sedes dos próprios órgãos indicados pelos entrevistados, ou em locais considerados como apropriados pelos mesmos. Foram tomadas, ainda, as medidas necessárias à preservação da quietude necessária, de modo a deixá-los à vontade para falar livremente a respeito das indagações formuladas.

A entrevista foi precedida pela exposição de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (Apêndice I), contendo informações a respeito da pesquisa e objeto, perguntas, e, sobretudo, garantia de sigilo a respeito das identidades e cargos (YIN, 2016). A entrevista foi orientada por um formulário (YIN, 2016) contendo um total de dez perguntas, conforme instrumento em anexo.

Finalizada a coleta, as falas foram sujeitas a um procedimento de transcrição, preservando-se, fielmente, manifestações, interjeições, interrupções etc. Assim, perpassou-se à fase de análise de conteúdo das falas (BARDIN, 2011).

Em seguida, o conteúdo transcrito foi sujeito ao um processo de leitura

flutuante (BARDIN, 2011), para classificação de cada enunciado (ou seja, unidade

linguística contendo certa informação interessante à análise realizada) conforme grupos de categorias, numa primeira aproximação classificatória.

Passou-se, em seguida, a uma etapa de leitura em profundidade (BARDIN, 2011), onde cada enunciado foi classificado e categorizado, sendo, em seguida, triangulado (comparado, quanto à informação contida), com dados teóricos (constantes do referencial da pesquisa) e documentais (obtidos na etapa documental, acima transcrita), para finalização das categorias de análise.

Ao final, foram categorizadas as seguintes espécies de informações obtidas na entrevistas: a) Percepções sobre o controle da atividade de inteligência exercidas pelo legislativo brasileiro; b) Problemas para o exercício do controle e fiscalização da atividade de inteligência pelo legislativo; c) Relação entre o executivo e as

comissões; d) Preparo dos parlamentares para ocupar cadeias na CCAI e CREDN;

e) Efeito prático possuído pelas proposições das comissões; e) Dificuldades de controle evidenciadas durante o recorte temporal da pesquisa.

Como as falas não caracterizavam diferenciações entre dados relativos à CCAI e CREDN, todos os enunciados foram organizados (em máximo respeito e fidelidade à informação obtida) em uma única tabela de dupla entrada, onde, na horizontal, foram classificadas as informações conforme as categorias expostas no parágrafo acima e, em seguida, na vertical, foram expostos os demais dados relativos aos entrevistados e datas.

Ainda, conforme propugnado por Minayo (2002), os dados mencionados foram interpretados à luz do referencial teórico e comparados com os documentos, para fins de crítica de seu conteúdo, de modo a, por fim, garantir o máximo de verossimilhança quanto ao resultado.

E por fim, a presente tese está organizada em seis Capítulos, com as seguintes divisões: Capítulo I, Introdução. Capítulo II: Metodologias, onde foi abordados os procedimentos metodológicos da pesquisa. Capítulo III: Informação e Poder; onde se trabalha as questões históricas da atividade de inteligência como uma atividade de Estado voltada ao caráter estratégico da competição entre as nações, seja na paz ou na guerra. Capítulo IV: Atividade de Inteligência e o Estado Democrático de Direito; no qual se busca descrever os aspectos da atividade de inteligência e sua relação o Estado Democrático de Direito, seus desafios no mundo contemporâneo e seu controle. Capítulo V: O Controle da Atividade de Inteligência na América Latina: Argentina e Chile, onde é feita uma análise sintética sobre a evolução dos sistemas de inteligência desses dois países, durante as décadas de 60, 70 e 80, buscando comparar suas trajetórias com o sistema de inteligência brasileiro. Capítulo VI: O Serviço de Inteligência no Brasil, onde foi feito um aprofundamento sobre a gênese do sistema de inteligência brasileiro e a construção dos mecanismos de controle do legislativo sobre a atividade de inteligência. Por fim, o Capítulo VII: O Controle da Atividade de Inteligência no Brasil; onde traz em seu bojo uma análise sobre a produção das duas Comissões Parlamentares, a CCAI e a CREDN, destinadas a fiscalização e ao controle da atividade de inteligência no Brasil, analisando seus resultados entre os anos de 2003 a 2010, período destacado por ser a primeira experiência de um governo de esquerda no Brasil, que até então, sempre foram foco das ações das agências de informação/inteligência desde a sua origem nos anos de 1927.