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6. FUNDAMENTOS DO DIREITO ADMINISTRATIVO CONTEMPORÂNEO E

6.2 OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: LEGALIDADE

6.2.4 DA PUBLICIDADE

Para a Teoria da Informação, a informação tem como finalidade específica alterar o comportamento do cidadão245; é por isso que a publicidade dos atos da Administração Pública é um dever, destinado a garantir a participação democrática das pessoas na formação da vontade da Administração.

Não basta tornar pública a informação; esta tem que atender à boa qualidade informacional, ou seja, a qualidade de boa informação é diretamente proporcional ao fornecimento de conteúdos que eliminem dúvidas. É que a informação surge como um agente dissipador de incertezas e cujo objetivo é provocar uma alteração no comportamento das pessoas, sendo, assim, potencialmente, um vetor de emancipação da pessoa tanto em sua vida privada quanto em sua vida pública246.

Nos Estados de direito contemporâneos o acesso à informação tem proteção constitucional e infraconstitucional. No ordenamento jurídico e constitucional brasileiro, o acesso à informação pública é direito fundamental, protegido na expressão do artigo 5º, inciso XXXIII, combinado com os artigos 37, parágrafo 3º, inciso II e 216, parágrafo 2º, da Constituição; e, ainda, na Lei n° 12.527, de 2011, conhecida como a Lei de Acesso à Informação.

No mesmo sentido, a publicidade da atuação administrativa é um dever enunciado no artigo 37, caput combinado com o parágrafo 1º, da Constituição de 1988. O Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, em voto nos autos do processo de Suspensão de Segurança (SS) n° 3.902-AgR, destacou que o princípio da publicidade da atuação administrativa “além da simples publicidade do agir de toda a Administração Pública, propicia o controle da atividade estatal até mesmo pelos cidadãos”.

A publicidade do ato administrativo é formalidade sem a qual alguns atos administrativos sequer geram efeitos para todos, a exemplo de leis, decretos, resoluções, portarias e procedimentos licitatórios. Contratos, convênios e outros instrumentos congêneres também devem ser publicados, sendo o agente eletivo sujeito a sanção, em prestação de contas, pela ausência de publicidade de seus atos. Trata-se da estrita publicidade, cabendo à pessoa

244 NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1994. 245 COELHO NETTO, op. cit.

diretamente interessada acompanhar os murais dos órgãos públicos e o Diário Oficial, para evitar que, por falta de conhecimento, haja prejudicada por algum ato em matéria de seu interesse.

Contemporaneamente, a publicidade é um subprincípio do princípio da transparência pública ou princípio da visibilidade, para alguns doutrinadores. Visibilidade, porém, é apenas uma das faces da transparência, a verificar-se na publicidade que atinja o máximo de pessoas possíveis. A visibilidade pode ser verificada pelos meios escolhidos para dar publicidade. Atualmente, o meio que tem garantido maior visibilidade e com baixo custo à Administração Pública é a disponibilização das informações em um endereço eletrônico na rede mundial de computadores, popularmente conhecida como Internet, ambiente que possibilita a visibilidade a toda pessoa em qualquer lugar do mundo.

A outra faceta é a acessibilidade, ou seja, não basta que a informação esteja publicada em um ambiente de visibilidade, é necessário que as ferramentas utilizadas facilitem a busca da informação, e que, se possível, atenda-se tanto ao caráter informativo como ao educativo. Na dicção do artigo 37, parágrafo 1°, da Constituição de 1988:

Art. 37 ...ipsis... § 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

O caráter educativo presente na informação se reporta em a Administração Pública se apresentar como facilitadora do exercício da cidadania; isto pode ser verificado no ato de a Administração Pública explicar a informação disponibilizada, para facilitar seu entendimento à sociedade, dirimindo, preventivamente, as dúvidas sobre seu conteúdo. Enfim, é a ideia de verdade que compõe o princípio da transparência, de maneira que a presunção de veracidade recai sobre toda informação publicada cuja fonte seja um órgão público.

Sobre o dever de transparência da Administração Pública, o Ministro Gilmar Mendes, nos autos do processo de Suspensão de Segurança (SS) de nº 3.902, opina:

Processo SS 3902 SP Partes

MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, CELSO A. COCCARO FILHO, RELATORES DOS MANDADOS DE SEGURANÇA Nº S 180.176-0/7-00 E 180.589-0/3-01 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, SINDICATO DOS ESPECIALISTAS DE EDUCAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE

SÃO PAULO - SINESP, ASSOCIAÇÃO DOS ENGENHEIROS, ARQUITETOS E AGRÔNOMOS MUNICIPAIS DE SÃO PAULO E OUTRO (A/S)

Publicação

DJe-146 DIVULG 04/08/2009 PUBLIC 05/08/2009 RTJ VOL-00210-02 PP-00955 Julgamento

8 de Julho de 2009 Relator

Min. PRESIDENTE

...ipsis... [...] a Constituição abriu novas perspectivas para o exercício ampliado do controle social da atuação do Estado, com destacada contribuição da imprensa livre, de organizações não governamentais e da atuação individualizada de cada cidadão. Ao mesmo tempo, os novos processos tecnológicos oportunizaram um aumento gradativo e impressionante da informatização e compartilhamento de informações dos órgãos estatais, que passaram, em grande medida, a serem divulgados na Internet, não só como meio de concretização das determinações constitucionais de publicidade, informação e transparência, mas também como propulsão de maior eficiência administrativa no atendimento aos cidadãos e de diminuição dos custos na prestação de serviços247.

Ayres de Britto, relator no processo acima referido, em seu voto exalta o dever de publicidade administrativa como “um dos mais altaneiros modos de concretizar a República enquanto forma de governo” e destaca que, na república, o “como” administrar prevalece sobre o “quem” administra o patrimônio público:

Se, por um lado, há um necessário modo republicano de administrar o Estado brasileiro, de outra parte, é a cidadania mesma que (sic) tem o direito de ver o seu Estado republicanamente administrado. O “como” se administra a coisa pública a preponderar sobre o “quem” administra – falaria Norberto Bobbio -, e o fato é que esse modo público de gerir a máquina estatal é elemento conceitual da nossa República. O olho e a pálpebra da nossa fisionomia constitucional republicana248.

A transparência pública é um grande desafio para a administração pública dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. É, tanto mais, um desafio para a sociedade civil, pois que tendo a seu dispor tantas informações tem, por seu lado, que demonstrar que lhe são úteis para legitimar ou não o agir da administração pública, ou seja, que lhe são úteis para interferir nos rumos das decisões públicas. O acesso à vasta informação pública é uma ferramenta para que a população possa questionar administrativamente ou judicialmente seus representantes mandamentais, eleitos com o voto popular.

247 Trecho do voto do Min. Gilmar Mendes. Disponível em:

https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19135750/suspensao-de-seguranca-ss-3902-sp-stf. Acessado em 16/09/2016.

248 Trecho do voto do Min. Carlos Ayres de Britto. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22943707/suspensao-de-seguranca-ss-3902-sp-stf. Acessado em 16/09/2016.

No Estado de caráter regulador e descentralizador, e cuja Administração Pública busca elaborar políticas públicas com demonstração de resultados para as formas variadas de exclusão social, a transparência pública é, sem embargo, um dos princípios constitucionais mais contundentes para a luta pela concretização dos direitos fundamentais das pessoas, individualmente e em coletividade. Os pactos de gestão para metas e demonstração de resultados dos órgãos da Administração Pública são, evidentemente, um dever que oferta máxima efetividade ao princípio constitucional da transparência.