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As proibições de prova em processo penal apresentam fundamento jurídico-constitucional, de acordo com o disposto no artigo 32.º, n.º 8, da CRP. Em concretização desse preceito, o legislador processual penal veio prescrever no artigo 126.º quais os métodos proibidos de prova. Estas proibições, funcionarão como verdadeiros limites à descoberta da verdade material.

Para a valoração dos conhecimentos fortuitos, a escuta telefónica tem que ter sido legalmente autorizada e a violação dos pressupostos materiais de realização da escuta telefónica (prescritos no artigo 187.º, n.º 7) conduzirá a uma proibição de valoração da prova. Esta consistirá numa nulidade ao abrigo do disposto nos artigos 32.º, n.º 8, da CRP, 126.º, n.º 3, e 190.º do CPP, absoluta70 (118.º, n.º 3, e 126.º, n.º 3, do CPP), e insanável (mesmo após o

trânsito em julgado da decisão final, sendo sempre de conhecimento oficioso e fundamento de recurso extraordinário de revisão, nos termos do artigo 449.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Penal).

69 Operando este princípio como um relevante factor de correcção das medidas restritivas de direitos fundamentais, e neste caso, quanto à valoração dos conhecimentos fortuitos.

70 Pois aqueles requisitos legais violados eram os que tornavam a escuta telefónica legal e permitida do ponto de vista constitucional

VALORAÇÃO DO CONHECIMENTO DE FACTOS, NÃO INVESTIGADOS NO PROCESSO, OBTIDOS NO ÂMBITO DE UMA INTERCEPÇÃO TELEFÓNICA

1. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

Por sua vez, a violação dos procedimentos formais (prescritos no artigo 187.º, n.º 8, e 188.º do CPP) que disciplinam a concretização das mesmas escutas – e que por isso não têm como principal finalidade a protecção de direitos liberdades e garantias, mas consistem em regras de produção de prova e de formalização de como aquelas deverão ser levadas a cabo –, gerará uma nulidade (190º do CPP) sanável dependente de arguição, prevista no artigo 120.º do Código de Processo Penal.

Em caso de violação dos pressupostos de valoração dos conhecimentos fortuitos, ocorrerá uma proibição de prova por violação do disposto nos artigos 126.º, n.º 3, e 187.º n.º 7, do Código de Processo Penal, não podendo aqueles vir a ser utilizados como meio de prova noutro processo (em curso ou a instaurar). O artigo 187.º, n.º 7, do Código de Processo Penal ao admitir a valoração como meio de prova dos conhecimentos fortuitos (mesmo condicionada à verificação de certos pressupostos), restringe também aqui direitos fundamentais71, pelo que o respeito por tais pressupostos ínsitos em tal norma, traduzem

também o respeito pelo princípio da proporcionalidade (previsto constitucionalmente, em caso de compressão de um direito fundamental, cfr. artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa).

Tais pressupostos são assim o elemento garantístico de que a violação de tais direitos somente é restringida em determinadas circunstâncias justificativas, assegurando o seu núcleo essencial. Se violado o princípio da proporcionalidade, acabam como que violados os próprios direitos fundamentais em causa, culminando numa proibição de prova. Esta proibição de prova consubstancia-se numa proibição de valoração independente que emerge “a partir da

referência directa à tutela constitucional dos direitos fundamentais”72, obstando a que esse

elemento de prova seja valorado na acusação, pronúncia ou sentença, ou venha a servir de fundamento para aplicação de uma medida de coacção, de buscas, revistas ou apreensões. Tal prova será assim considerada nula de acordo com o prescrito no artigo 190.º do Código de Processo Penal em virtude da violação de requisitos previstos no artigo 187.º do Código de Processo Penal. Esta nulidade será semelhante à prevista no artigo 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal dado que ambas resultam da violação de pressupostos materiais interligados com a concreção do princípio da proporcionalidade. Esta nulidade pode ser oficiosamente conhecida e em qualquer fase do processo, não ficando sanada com o trânsito em julgado da decisão final, já que a mesma poderá ser fundamento de recurso extraordinário de revisão da sentença quando a condenação do arguido tiver sido sustentada em tais meios de prova, valorando-os, quando não o poderiam ter sido.

Nos casos em que tais conhecimentos sejam transportados para outro processo – e para tal, foi proferido despacho pelo JIC do processo em que as escutas foram autorizadas – o interessado poderá, através de recurso, impugnar tal decisão nos termos do artigo 410.º, n.º 3, 71 Repita-se, os direitos fundamentais da reserva da intimidade da vida privada, do direito à palavra falada e do direito ao sigilo das comunicações (cfr. artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e 34.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa).

72 Andrade, Costa, in Sobre as proibições de prova em Processo Penal, Coimbra: Coimbra Editora, 2000 (1.ª ed., 1992, p. 56.

VALORAÇÃO DO CONHECIMENTO DE FACTOS, NÃO INVESTIGADOS NO PROCESSO, OBTIDOS NO ÂMBITO DE UMA INTERCEPÇÃO TELEFÓNICA

1. Enquadramento jurídico, prática e gestão processual

do Código de Processo Penal73.

Asseverada a proibição de valoração dos conhecimentos fortuitos (cfr. artigos 187.º, n.º 7, 190.º, 118.º, n.º 3, 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, e 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa) e, detectada tal proibição pelo juiz do outro processo, este deverá privar-se da sua consideração. Os suportes técnicos e gravações em que os mesmos “nasceram”, deverão ser desentranhados dos autos, dado que a sua utilidade para efeitos probatórios é nula.

Nestes casos, tais conhecimentos poderão ser aproveitados como notitia criminis74 dando-se

cumprimento ao previsto no artigo 187.º, n.º 7, e 248.º do Código de Processo Penal e ao princípio da oficialidade que encontra consagração no 262.º, n.º 2, do Código de Processo Penal e que prescreve que: “Ressalvadas as excepções previstas neste código, a notícia de um

crime dá sempre lugar à abertura de inquérito“.

É esta a razão que leva a que ainda que os conhecimentos fortuitos não possam ser valorados como prova, possam ser utilizados para efeitos de abertura do novo inquérito por parte do Ministério Público, em virtude de haver notícia de prática de ilícito criminal75. Adquirida a

notícia do crime pelo OPC que efectuou a escuta telefónica e dela soube por conhecimento próprio, deve transmiti-la ao MP no mais curto prazo, que não pode exceder 10 dias com vista à abertura de inquérito (cfr. artigo 241.º e 262.º, n.º 2, do Código de Processo Penal).

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