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Capítulo I QUESTÕES FUNDAMENTAIS NO LIVRO DO PROFETA

1.3 Análise complementar das fontes, datas e autoria do livro de Jeremias

1.3.2 Datação e autoria do livro

Como já relatamos em pontos anteriores, o livro de Jeremias é problemático e para identificar com exatidão a datação, as fontes e autoria do livro; a teoria mais convincente é a que apresenta Westermann114. Em relação à datação do livro o biblista se fundamenta em dois pontos:

Primeiro: ele acredita que a autoria do livro está relacionada com as expressões e o conteúdo emocional de Jeremias (Jr 1,7) e, segundo: está relacionada com a redação aprimorada em (Jr 26 e 36). Westermann115 sugere que a redação é bem elaborada e

bela, e é apresentada em formato de acróstico alfabético sugere por outro lado, um longo período de reflexão e construção literária está claramente relado em torno de todo o livro.

É possível que o profeta tivesse narrado (escrito) o livro na esteira dos acontecimentos e que adiante tenha formado o texto com os requintes de acróstico116 para melhorar a memorização. Westermann levanta a hipótese de que a redação inicial deve ter acontecido no verão de 586 a.C., ou em meados de agosto deste mesmo ano.

110 Cf. GORDON, C. T. A New Date for Jeremiah. Cambridge, 1990, p. 562

111 Cf. HYATT, J. P. The Prophetic Cristicism of Israelite Worship. Londres, 1980, p. 112 Cf. WHITLEY, F. C. The Date of Jeremiah’s Call. Berlim, 1989, p. 483.

113 Cf. WESTERMANN, Claus. Comentario al Profeta Jeremias. Madrid: Ediciones Fax, 1980, p. 24, 114 Cf. Ibid., 1980, p. 38-39.

115 Cf. Ibid., 1980, p. 40-41.

116 Cf. JÚNIOR, Nunes Magalhães Edson. Uma Introdução Geral à Poesia Hebraica Bíblica.

Dissertação (Mestrado em Letras; Literatura e Cultura Judaicas). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – Departamento de Letras Orientais – Programa de Pós-Graduação em Língua Hebraica, Universidade de São Paulo (USP), 2012, p. 111. Acróstico – Um elemento estrutural de fácil

reconhecimento. Quando uma série de linhas ou estrofes cujas letras iniciais formam o alfabeto Hebraico. Por exemplo: Sl 25; 34; 37; 11; 112; 119; 145; Pv 31,10-31; Naum 1,2-8 (meio acróstico) ou os quatro capítulos do livro de Lamentações. No Salmo 119 cada estrofe não somente é iniciada por uma das letras do alfabeto hebraico em sequência, mas é também composta de oito linhas e cada uma delas começa com a mesma letra do alfabeto.

Segundo Mowinchel117, com base na reconstrução crítica da história hebraica, o

livro surgiu quando os simpatizantes do tempo do exílio e da reforma de Josias (deuteronomista), editaram e expandiram as profecias de Jeremias e as narrativas biográficas de Baruque.

Esta reconstrução crítica impõe uma data bem mais tardia à forma final da profecia, como faz também, com o livro de Deuteronômio. É nítido que esta posição não aparenta dificuldade para explicar que importância às reforma de Josias poderia ter tido para a situação do exílio. Logo porque depois todo o assunto da “idolatria” cananita118 estava morto.

Noth119 argumenta que em oposição à evidência da profecia, alguns eruditos usaram o conceito de transmissão oral, para dizer que o livro de Jeremias somente teve sua forma final após o sétimo século a.C., principalmente os eruditos da Escandinávia. Ele indica Williams como um destes eruditos. Argumenta ainda, que por causa da escassez de material para escrever os pronunciamentos do profeta foram transmitidos de uma geração a outra por via oral, e após um longo processo no exílio babilônico os pronunciamentos foram compilados em “livro”. 120

Bright121 nos garante que há muitos materiais comparativos para deixar claro que

no antigo Oriente Próximo tudo que “era escrito era considerado importante”, mesmo que tenha sido escrito no momento ou depois do fato. A transmissão oral era usada para proclamar a profecia às pessoas da mesma geração, e somente quando estas pessoas passavam aos seus descendentes é que a transmissão oral seria vista como um caráter linear.

No antigo Oriente Próximo, as formas escritas e orais do mesmo acontecimento existiam com frequência lado a lado, e isto era possível devido à alta porcentagem de alfabetizados do povo daquela época. Para contrastar, na Grécia e na Europa, a grande parte da população era analfabeta, as sagas, as lendas, e as histórias, e dependiam do gosto e dos hábitos de bardos viajantes e de baladistas de fogueira para a sua preservação. Porém, estas pessoas não tinham o escrúpulo em modificar o conteúdo da

117 Cf. MOWINCKEL, S. Zur Komposition dês Buches Jeremia. Oslo: Jacob Dybwad, 1990, p. 76. 118 Cf. MOWINCKEL, S., 1990, p.77.

119 Cf. NOTH, Martin. Historia de Israel. 2º ed. Barcelona: Ediciones Garriga, 1988, p. 256-270. Veja

também – William, J. R. The Interpreter’s Dictionary of the Bible, p. 812.

120 Cf. Ibid., 1988, p. 275.

sua tradição de acordo com a situação. Portanto, após muito tempo na história é que sua tradição foi colocada na forma de escrita.

Para Bright122, era de suma importância aplicar os métodos corretos aos problemas no estudo do Antigo Testamento como também outros objetos científicos. Quanto à compilação e transmissão de Jeremias, o leitor consegue notar que as dificuldades são surpreendentemente complexas.

Contudo, se aplicarmos à transmissão de Jeremias um sistema arbitrário e subjetivo de unidades literárias, juntamente com uma “teoria” de transmissão textual que esteja em desarmonia com os hábitos dos escribas do antigo Oriente Próximo, multiplicaremos enormemente as dificuldades para chegarmos a uma conclusão coerente sobre os processos de compilação do livro.

Assim, precisamos entender corretamente o uso da tradição oral neste contexto e também se quisermos aplicar um método apropriado para esclarecer os problemas relacionados com o modo pelo qual Jeremias chegou a sua forma final.

Dessa forma, é saudável para nós relembrarmos o que Bright123 nos informou,

no sentido de que a redação dos pronunciamentos de Jeremias começou logo, sem levar em conta a transmissão oral. Enquanto que, Westermann, Noth e Bright são praticamente da mesma opinião em relação à datação e as fontes narrativas de compilação do livro de Jeremias. Mowinckel é de opinião divergente, relatando que a autoria e a data do livro de Jeremias foram compostas por deuteronomistas no exílio babilônico.

Holladay124 nos assegura que a evidência interna no livro de Jeremias parece nos indicar que os oráculos do profeta foram escritos pela primeira vez no quarto ano de Jeoaquim (604/5 a.C.), quando pelo que narra Baruque, Jeremias ditava para ele o que deveria escrever: “ditava-me pessoalmente todas as palavras, e eu as escrevia no livro com tinta” (Jr 36,18).

Esses acontecimentos se englobavam desde 626 a.C., até a data de 605 a.C., um dos acontecimentos desta época foram os oráculos de Jeremias que Jeoaquim mandou queimar. O que estava escrito nele não podemos saber precisamente, exceto que ele

122 Cf. BRIGHT, John., 2010, p. 173. 123 Cf. Ibid., 2010, p. 175.

124 Cf. HOLLADAY, L. William. A commentary on the Prophet Jeremiah Chapters 26-52, Philadelphia:

continha “todas as palavras que te falei contra Israel, Judá e contra todas as nações” (Jr 36,2). Seu conteúdo deve ter sido semelhante a muitas advertências e denúncias que aparecem nos primeiros vinte capítulos do livro de Jeremias que hoje temos.

Holladay125, por sua vez, nos apresenta que o livro de Jeremias em sua forma final, é obviamente, uma antologia126 dos pronunciamentos de Jeremias, mas fica claro que isto se dá de maneira bastante irregular, sem se orientar por nenhum sistema cronológico. Às vezes é difícil entender a localização de alguns oráculos. Talvez isto reflita a instabilidade do período, e a implicação na circulação do livro em sua forma escrita antes de 520 a.C.

Tanto Westermann127 como Holladay128 entende que a autoria de Jeremias é fato provado e não tem sofrido séria contestação. E pode ser confirmada por dois motivos:

Em primeiro lugar, internamente, o livro tem numerosas referências biográficas e autobiográficas de Jeremias como autor e Baruque como escrivão ou secretário. Nenhum outro profeta teve o seu nome repetido tantas vezes quanto Jeremias (131 vezes). Baruque é mencionado (23 vezes). Em segundo lugar, externamente, o livro é atribuído a Jeremias em Daniel 9,2 e Esdras 1,1, bem como em tradições judaicas.

Westermann129 conclui descrevendo que toda a formação de Jeremias é envolvida com a profecia. Por esse motivo, sabe-se mais da vida pessoal desse profeta do que de qualquer outro. Em muitos casos, suas ações tornavam-se parte da mensagem profética.

Apesar de Jeremias ser um homem compassivo e profundamente sensível, ele foi chamado para uma atuação profética em que proclamou inexorável130 julgamento contra a nação. Considerado um traidor devido a esses julgamentos, parece que não viu uma só pessoa que acreditasse em suas profecias num período de aproximadamente quarenta anos.

Embora impopular e desprezado quando profetizava insistia na submissão à Babilônia, tornou-se mais tarde o herói popular dos restantes dos judeus exilados, depois das suas predições de julgamento

125 Cf. HOLLADAY, L. William., 1986, p. 313-314.

126 Cf. Dicionário Aurélio., p.72, 2012. Antologia – Coleção ou blocos literários agrupados por temáticas,

autoria ou período. Como por exemplo, podemos encontrar uma antologia em forma de prosa, verso, oráculos, lamentações, orações e poemas. A palavra antologia vem do nome da mais antiga Antologia que se tem conhecimento, organizada pelo poeta grego “Meléagro de Gadara”.

127 Cf. WESTERMANN, Claus. Comentario al Profeta Jeremias. Madrid: Ediciones Fax, 1980, p. 25-28. 128 Cf. Ibid., 1986, p. 38-39.

129 Cf. Ibid., 1980, p. 27.

130 Cf. Dicionário Aurélio., 2012., p. 301. Inexorável – Que não se move a rogos, implacável, inabalável

a serem “cumpridas” e de o povo lembrar-se das suas predições de uma futura libertação e retorno.

Não há outro livro profético que conhecemos que nos demonstre tanta humanidade do homem como este. Jeremias é um homem, combatido, brando, e às vezes, cansado de tanta rejeição por seus ditos.

Westermann131 e Holladay132 nos asseguram que a formação e autoria do livro de Jeremias é um fato incontestável, sendo esta atribuída ao profeta Jeremias. Porém, Noth133 e Bright134 nos informam uma transmissão oral curta atribuída à autoria de Jeremias que se conclui bem depois do século VII a.C. Mowinkel135 se baseando na construção crítica da história hebraica, define que o livro surgiu entre o exílio ou depois dele.