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Capítulo I QUESTÕES FUNDAMENTAIS NO LIVRO DO PROFETA

1.3 Análise complementar das fontes, datas e autoria do livro de Jeremias

1.3.1 O profeta Jeremias

Halley95 afirma que Jeremias viveu cerca de cem anos depois do Proto-Isaías (1- 39) e que teria vivido num período de muitas turbulências internacionais entre algumas nações, como: Assíria, Egito e Babilônia. Foi chamado para a atuação profética por Javé aproximadamente 626/7 a.C. E vinte anos após, em 605 a.C, Jerusalém foi parcialmente destruída pelas tropas babilônicas. A destruição de fato, entretanto, aconteceu primeiro com o cerco de deportação em 597 a.C, e, segundo, com o incêndio e segunda deportação em 586 a.C.

O profeta Jeremias nasceu96 por volta do ano 650 a.C., natural de uma aldeia

chamada Anatot97, cidade localizada à sete quilômetros de Jerusalém; esta aldeia pertencia à tribo de Benjamim.

colegar de profissão de “terem esquecido os problemas do coração humano em conflito consigo próprio, o único tema que pode resultar em boa literatura, porque só acerca dele vale a pena escrever e sofrer a agonia e o cansaço”. Pede-lhe que não deixem espaço em seus trabalhos “para nada que não seja as velhas verdades do coração, as velhas verdades universais sem as quais qualquer história é efêmera e condenada” – amor e honra, piedade e orgulho, compaixão e sacrifício? (Antonio Damásio, O erro de

Descartes, p.285).

95 Cf. HALLEY, Henry Hampton. Halley’s Bible handbook with the New International Version.

Michigan: Ed. Zondervan Publishing House, 2000, p. 316.

96 Cf. SMITH, Gary V; SCHULTZ, J. Samuel. Panorama do Antigo Testamento. 2º ed. São Paulo: Vida

Nova, 2005, p. 236.

97 Cf. ROS, Termes Pablo. Enciclopedia de La Bíblia (Primer Volumen). Barcelona: Editorial Éxito,

1980, p. 483-485. (Anatot) – Em Josué se encontra a Anatot entre as cidades levíticas. Há outras citações em Samuel e Crônicas. Anatot foi habitada por benjaminitas segundo Esdras e Nehemias após o exílio babilônico. O lugar contem elementos teofânicos ao nome da deusa “Anãt” e significa lugar de Anãt. Ao norte de Anatot estava Micmás e a sudeste estava Jerusalém (Is 10,28-32). Foi identificada com a moderna ‘Anata’, embora a cidade antiga pareça ter estado a cerca de 800 metros a sudeste, no pico de Ras el Kharrubeh, que é cerca de 50 metros mais alta que a aldeia atual. Arqueólogos encontraram aqui restos de uma antiga aldeia que resistiu desde a época da antiga Israel até o século VII a.C. Daqui é possível avistar o mar Morto na direção sudeste, as terras da Transjordânia ao leste e as montanhas ao norte. Este local está exposto aos ventos quentes e devastadores (siricos) que sopram dos desertos da Transjordânia.

Schökel98 e Mosconi99 levantam a questão de que este dado tem sua importância

porque Benjamim100 era unido politicamente a Judá. E manteve um grande vínculo com

as tribos do norte. Esta ligação trazia segurança e aproximação ao povo.

Salgado101 nos descreve que o território da tribo de Benjamim foi repartido por meio do

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(goral, sorte) 102. E tal processo se deu provavelmente por meio de pedras lançadas ao ar. É possível que o sorteio fosse apenas uma extensão ideal a todo o povo do que realmente havia sucedido no plano do clã e da família. A verdadeira propriedade era comunitária e nela cada indivíduo se comportava como possessivo na qualidade de membro da comunidade.

Para Donner103 a tribo de Benjamim se estabeleceu entre Efraim, ao Norte, e Judá, ao Sul. No território ao Oeste seu vizinho era a tribo de Dã (Js 18,11). Provavelmente Benjamim teria pertencido à tribo de Efraim. Uma vez que o nome Benjamim “filho da direita”, ou do Sul, poderia ter acontecido por uma atribuição feita pelos membros da “casa de José”, que eram vizinhos do Norte.

Por esse motivo, compreendemos o fato e o porquê de Jeremias dar tanta importância às tradições dessa localidade. Com efeito, ele nos fala de Raquel, de Efraim (Jr 31,15-18), e também do santuário de Silo (Jr 7,14; 26,6). Além disso, e partir disso, da muita importância ao Êxodo, à marcha pelo deserto e à entrada na terra prometida (Jr 2,1-7; 7,22-25; 16,14; 23,7; 31,31).

Ao contrário as tradições tipicamente judaicas (eleição divina de Jerusalém e da dinastia davídica), estas não adquirem no profeta destaques especiais. A maior parte da atuação profética de Jeremias situa-se na capital do reino do Sul, Judá. Porém, ele

98 Cf. ALONSO SCHÖKEL, Luis e SICRE DIAZ, José Luis. Isaías e Jeremias – Profetas I – Grande

Comentário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1988, p. 415.

99 Cf. MOSCONI, Luis. Profetas da Bíblia e nós hoje. 4º ed. São Paulo: Loyola, 2011, p. 99.

100 Cf. SALGADO, Samuel de Freitas. A Tribo de Benjamin como berço para a monarquia israelita..

Revista Theos. Campinas. 8º Edição, V.7 – Nº01 – Julho de 2012, pg.2-3. Disponível em: http://www.revistatheos.com.br/Artigos/Tribo%20de%20Benjamim.pdf. Acesso em: 20 de Setembro. 2013.

101 Cf. SALGADO, Freitas de Samuel., 2012, p. 3-12.

102 Cf. KIRST, Nelson; KILPP, Nelson; SCHWANTES, Milton; RAYMANN, Acir; ZIMMER, Rudi.

Dicionário Hebraico- Português & Aramaico-Português. 22º ed. São Leopoldo: Sinodal/Vozes, 2009, p.

40. (GORAL) – Pedras lançadas para decidir algo; sorteio; parcela que coube a alguém sorte ou destino; Cf. HOLLADAY, L. William. Léxico Hebraico e Aramaico do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2010, p. 79.

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, pode ser definido como divisão da terra Nm 26,55. Ou algo que cai para alguém como herança por sorte Nm 36,3, ou como cidades (territórios) sorteadas Js 18,11; 21,20. Ou porção sorteada Js 15,1. Existe uma referência a “destino” em Salmos 16,5.

103 Cf. DONNER, Hebert. História de Israel e dos povos vizinhos. São Leopoldo: Sinodal/Vozes, 1997, p.

esteve envolvido intimamente nos acontecimentos que levaram à destruição do reino e da cidade. Percebe-se isso nos oráculos e ditos ao povo de Israel.

Por isso, apesar da atuação prioritária no Sul, as raízes de Jeremias estão claramente ligadas ao Norte. Isto porque existiam indicações de que a linha sacerdotal dentro do qual ele nasceu era do Norte.

Se realmente as informações bíblicas correspondem, o profeta Jeremias era descendente de Eli, sacerdote do antigo santuário setentrional de Silo104 (1 Sm 1-4), dos sacerdotes de Nob (

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) que foram massacrados por Saul (1 Sm 22) e de Abiatar o sacerdote que foi exilado em Anatot por Salomão (1 Reis 2,26). Isso é um fato importante, pois liga Jeremias intimamente às origens da religião em Israel105 e o coloca em oposição ao santuário de Jerusalém. Anatot era uma aldeia de profetas exilados, os quais não compartilhavam com o sistema de governo da dinastia davídica de Jerusalém. Portanto, as origens de Jeremias falam por si.

Ottermann defende que esta ascendência e as medidas massacrantes de Josias contra os sacerdotes e santuários do interior de Judá (2 Rs 23,4-14), é um dos motivos porque Jeremias se opõe à monarquia. É, sobretudo, um dos motivos para vê-lo em oposição a Josias, avaliado tão positivamente pelos historiadores deuteronomistas106. Tanto é que, até conseguem “inserir” um pequeno elogio a ele em nossa perícope (Jr 22,15-16), mas isso será tratado mais adiante. Este dado de Ottermann é de suma importância, pois conseguimos entender o porquê de Jeremias remeter sua crítica a Jeoaquim e ser contra a monarquia em Israel.

Nas compreensões de Sicre107, Schökel108 e Schwantes109, Jeremias foi chamado muito cedo para ser profeta. Isso teria sido, conforme Jr 1,2, por volta do 13º ano do reinado de Josias, ou seja, 626/7 a. C.

104 Cf. CERESKO, Anthony R. Introdução ao Antigo Testamento Numa Perspectiva Libertadora. São

Paulo: Paulus, p. 213.

105 Cf. TRIGO, Castro M. C. Alessandra. O Exílio na Babilônia: um novo olhar sobre antigas tradições.

Dissertação (Mestrado em Letras; Literatura e Cultura Judaicas). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – Departamento de Letras Orientais – Programa de Pós-Graduação em Língua Hebraica, Universidade de São Paulo (USP), 2007, p. 39-40.

106 Cf. SCHWANTES, Milton (Org); OTTERMANN, Monika. Defender a vida em meio a fracassos e

catástrofes: uma introdução a Jeremias 37-45. São Paulo: Estudos Bíblicos, n.91, 2006, p.10.

107 Cf. ALONSO SCHÖKEL, Luis e SICRE DIAZ, José Luis. Profetismo em Israel. O profeta. Os

profetas. A mensagem. 3º ed. Pétropolis/Rio de Janeiro: Vozes, 2008, p. 287-288.

108 Cf. SCHÖKEL, Alonso L; SICRE, José Luiz Diaz. J. Isaías e Jeremias – Profetas I – Grande

Comentário Bíblico. São Paulo: Paulinas, 1988, p. 415.

Posteriormente, esta data foi colocada em dúvida. Para Gordon110 a vocação de

Jeremias aconteceu no ano 23 de Josias (617 a.C). E para Hyatt111 o início da sua

atividade profética ocorreu no ano (609 a.C), diferente de Whitley112 que acreditava que foi no ano 605 a.C, após a batalha de Carquemis. Por fim, Westermann113 nos garante que não existem dúvidas que a data correta seja a mencionada em Jr 1,2, no mesmo ano indicado por Schwantes.