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Debatendo se a Terra se move ao redor do Sol ou ao revés?

6.5. Percepções nos Debates “Júri Simulado”

6.5.2. Debatendo se a Terra se move ao redor do Sol ou ao revés?

O debate se a Terra se move ao redor do Sol ou o Sol ao redor da Terra foi proposto seguindo a estratégia do Júri Simulado, como descrevemos na atividade 12 da seção 5.1.3. Este debate ocorreu de maneira bastante semelhante ao debate do formato da Terra, com dois grandes grupos (agora com 8 professores em cada) e o júri composto por 4 professores que voluntariamente se agregaram neste grupo.

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O primeiro a iniciar a argumentação foi o grupo que defendia a Terra estática e o Sol se movendo a seu redor. O argumento inicialmente exposto, ainda que de maneira muito confusa, envolveu a visão de simplicidade do modelo ao considerar a Terra sem movimentos, de acordo com nossa percepção cotidiana:

Professor 9: “Não admitem observar o que nos cerca, do nosso ponto de vista, nos levam a complicar o nosso raciocínio levando a uma visão de outra posição... Imaginem um guerreiro em cima de seu cavalo tentando atingir um outro alvo não com a sua visão, mas com a do inimigo, ele conseguiria atingir este alvo? Seria possível simplificar a vida de seus guerreiros se eles se colocassem na posição externa a dele?... Não há necessidade de ficar mudando, criando complicações, não há sentido nisso. Realmente os gregos antigos escreveram muitas coisas que nós aproveitamos, a humanidade chegou a avanços que chegou até o momento, não tem ideia complicada, não práticas, que foram sendo eliminadas. Toda essa argumentação que os objetos mais pesados têm influências sobre os mais leves...”.

Já o grupo que defendeu os movimentos da Terra apresentou como primeiro argumento a ideia relacionada à atração gravitacional de que corpos menos massivos giram ao redor dos corpos com mais massa. Este grupo associou este argumento com as ideias de Aristarco, que já teria enunciado que a Terra era menor que o Sol:

Professor 17: “Gente, quantas vezes o Sol é maior do que a Terra? 100 vezes. Certo? Então, em torno disso, uma massa maior atrai e vai dominar o resto. Certo, é fato. Então por isso o nosso centro, o maior centro, seria o Sol que é 100 vezes maior do que a Terra”.

Professor 23: “Porque Aristarco de Samos já calculou a partir de eclipses lunares que a Terra é aproximadamente 20 vezes maior... Como ele já vê igual à Lua girando ao redor da Terra, nós pensaremos isso, que ela é menor do que a Terra, então corpos menores tem a tendência de girar em torno de corpos maiores, desde a Grécia antiga esse Aristarco estava lá”. Este grupo também apresentou a ideia de relatividade dos movimentos, argumentando que o movimento do Sol poderia se tratar de uma ilusão de ótica e não seu movimento real:

Professor 10: “... E como vocês observam esse sol gigante que a gente tem, e o próprio ser humano colocar ele em qualquer lugar não é o fato de repente a gente passar pelo Sol e ver andando, significa que quem andou foi o Sol, pode ser uma simples ilusão de ótica...”.

Este grupo apresentou o argumento, que encontramos também na história da ciência a favor do heliocentrismo, da percepção das fases em Vênus e da existência de corpos celestes se movimentando em torno de outros planetas, como as luas de Júpiter:

Professor 10: “... é só a gente olhar para o próprio Vênus, que também têm fases iguais à nossa lua, ou seja, se tudo girasse em torno da Terra seria diferente...”.

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Após estes diversos argumentos a favor dos movimentos da Terra, o grupo defensor da Terra estática esclareceu sua tese central, que se trata da defesa da observação e de nossos sentidos, que percebem os movimentos do Sol e dos astros ao redor da Terra:

Professor 7: “O principal argumento que a gente defende é aquilo que a gente consegue observar daqui da Terra e a gente observa os movimentos dos astros, a gente vê andando de um lado para o outro e, além disso, como você próprio citou Deus, ele fixou a Terra, ele criou a Terra desse jeito né, o que a gente consegue observar é isso... o movimento dos astros...”.

Este grupo ainda contra atacou o argumento do tamanho do Sol afirmando não ser possível pela observação afirmar que o Sol é maior do que a Terra. Para eles, a observação nos evidencia o contrário, um Sol muito menor do que o nosso planeta:

Professor 16: “E tem uma outra coisa que eu queria questionar meu caro colega, que ela diz que o Sol é não sei quantas vezes maior do que o planeta Terra... mas eu não consigo ver isso, eu olho lá pra cima e ele está sempre do mesmo tamanho e pequenininho...”.

Professor 10: “Se algo está muito longe de mim, eu realmente vou enxergar isso muito pequeno, pode ser até uma pessoa a 50 metros de distância eu vou enxergar muito pequeno... então a questão do tamanho também tem a ver com distância e isso em qualquer época qualquer um iria saber disso... Segundo, de fato você falou assim que não vê nada caindo, tudo cai, qualquer coisa cai é só você soltar”.

Ainda, o mesmo grupo contra argumenta dizendo que só seria possível provar que o Sol é maior do que a Terra com um observador localizado em outro referencial, fora da Terra:

Professor 7: “... ninguém esteve num outro plano para observar se a Terra é maior ou menor ou calcular isso... então a gente contesta esse argumento de você, ele é refutável... ninguém esteve em outra dimensão para poder fazer essa observação do modelo heliocêntrico”.

Já o grupo que defendeu a mobilidade da Terra contestou as observações dizendo que embora não sintamos a Terra girar, argumentou que isso se dá em função de estarmos nos movimentando junto a ela, em um movimento relativo:

Professor 10: “... e não é porque eu estou girando junto com a Terra, e não sozinha, que eu não estou girando... um exemplo, quando você anda a cavalo, você fica com seu cavalo, você exatamente a sua pessoa pode estar parada (cavalo é muito ruim), mas enfim, o seu movimento é fixo em cima daquilo que anda então dependendo da sua sensação se for muito devagar você não sente tanto isso, nem por isso que não está andando, porque você está indo junto...”.

Professor 13: “Tomando a frase da colega aqui a realidade, se você está num automóvel você está parado, mas está indo junto...”.

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Novamente a ideia da relatividade do movimento foi esclarecida a favor da Terra estática, agora mencionando o exemplo da percepção do movimento de queda livre de uma pedra do alto de uma torre:

Professor 7: “... Só contra argumentando a ideia da colega, se você soltar uma pedra do alto de uma torre ela vai cair longe né (aponta para baixo), e se a Terra se movesse ela cairia em outro lugar”.

Outro argumento apresentado pelo grupo defensor da Terra imóvel que, de certa maneira, se relaciona com o argumento do experimento da queda livre de um objeto de uma torre, envolve a ideia de que corpos mais massivos caem com maior aceleração do que corpos menos massivos:

Professor 9: “... Esses revolucionários ai, amigos do Galileu, que tentaram nos provar o que é mais pesado, ao mesmo tempo o que é mais leve, nos fez perder tempo olhando aquela torre de Pisa, e todos visualizaram que o mais pesado chega mais rápido na superfície da Terra”.

O grupo que defendeu os movimentos da Terra, por sua vez, apresentou um argumento de desconstrução da ideia geocêntrica de que todos os corpos celestes deveriam girar em torno da Terra, o que seria evidenciado com a observação de luas em Júpiter feitas após o uso dos telescópios de Galileu:

Professor 23: “... e outra coisa. O modelo, o geocentrismo, fala que tudo gira ao redor da Terra. Certo? Não, errado porque a partir dos telescópios de Galileu nós podemos observar que tem luas em Júpiter, que giram ao redor de Júpiter, e isso já furou o geocentrismo, porque furou, porque já tem coisa girando ao redor de Júpiter e segundo o geocentrismo tudo gira ao redor da Terra. Deu pra observar isso a partir do telescópio, se você quiser ver isso é só pegar o telescópio e observar, porque antes de questionar o telescópio, nos já sabemos o quanto o telescópio era utilizado na navegação. Quem nunca ouviu a expressão “Terra vista”, por quê? Nós vemos com o telescópio, com essa mesma luneta de Galileu”.

Para contra argumentar essa ideia, o grupo que defendia a Terra imóvel questionou o que se trata o instrumento “telescópio”, levando em conta que, na época do debate, este instrumento era de pouco conhecimento da população em geral. Eles também questionaram o fato daquilo que foi observado no telescópio poder ser luas, questionando a imagem observada:

Professor 7: “E o que é um telescópio? Pelo amor de deus... Isso eu nem conheço... pode ser uma ilusão, uma aberração a imagem... Ninguém comprova...”.

Professor 3: “Mas como se sabe que é um corpo celeste? E se estivesse sujo? Ele olhou cada dia e ficou levando o telescópio para lá e para cá...”.

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Professor 9: “Em curtas distâncias já comprovamos que ele deforma toda a imagem... E vocês citaram inúmeras vezes esse tal de Galileu...”.

Ao final do debate, o grupo defensor dos movimentos da Terra apresentou novamente a ideia da relatividade do movimento, agora ressaltando que a observação do movimento de um corpo só pode ser percebida em um referencial externo ao mesmo, pois este não estaria se locomovendo junto ao corpo:

Professor 17: “Gente olha, em movimento tudo depende do que, do ponto do observador, um ponto de referência. Aqui estamos parados porque na Terra estamos parados... quem estiver dentro de uma carruagem ta todo mundo parado com certeza, mas uma pessoa que está de fora vai ver todo mundo que está dentro da carruagem vai ver ela também andando, então depende muito do que, do observador que está olhando”.