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3.1. Discussões acerca da visão física e astronômica

3.1.2. A Terra se movimenta ou está parada?

Todos os dias observamos o Sol e as estrelas se movimentarem ao redor da Terra, realizando ciclos, que chamamos atualmente de dia e noite. Considerando principalmente o movimento do Sol e das estrelas ao redor da Terra, poderíamos dizer que a Terra encontra-se estática no centro destes movimentos e todos os astros giram ao seu redor. Desta maneira, a primeira resposta que podemos obter para esta pergunta, através de evidências observacionais diretas, é que a Terra não se movimenta e o Sol e os demais astros giram ao seu redor!

Uma das condições para explicar os fenômenos que presenciamos na Terra é atribuir movimentos ao Sol e aos demais corpos celestes, de acordo com o observado. Este movimento recebe o nome de movimento aparente diurno, visto que é observado durante o dia através de um referencial localizado na superfície terrestre (BOCZKO, 1984, p.30).

Ao observarmos as estrelas durante a noite, não percebemos grandes variações de suas distâncias até a Terra ou mesmo de suas posições em relação umas às outras. Todas parecem girar em um movimento constante ao redor da Terra, aparentando estar “fixas” em uma semiesfera (a esfera celeste). Esse movimento das demais estrelas durante a noite é chamado de movimento aparente noturno (BOCZKO, 1984, p.34).

Embora o nome aparente carregue uma conotação depreciativa, este nome se deve a principalmente ao fato do movimento denominado ser constatado pelos sentidos da observação direta desde um referencial na superfície terrestre.

O modelo geocêntrico, que propõe os movimentos ao Sol e das demais estrelas em torno da Terra no centro destes movimentos, se apoia principalmente (mas não unicamente) nas observações do céu que se dão no referencial terrestre.

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Desta maneira, para constatar com a observação o modelo em que a Terra se movimenta em torno do Sol uma possibilidade seria realizar uma mudança do referencial, com o observador saindo da Terra. No entanto, esta mudança de percepção somente seria possível em uma viagem espacial ou com o uso de recursos tecnológicos no espaço.

Para essa observação direta seria necessário então realizarmos uma grande aventura no espaço e no tempo: localizarmos-nos em um referencial em que pudéssemos observar o planeta como um todo, girando em torno de si, onde poderíamos perceber sua órbita completa em torno do Sol, após aproximadamente 365 dias. Com isso, a observação dos movimentos de rotação (girar em torno de si próprio) e revolução (girar em torno de outro ponto, no caso o Sol) da Terra se daria de maneira direta, no espaço e no tempo.

Entretanto, no referencial terrestre podemos ter alguns indícios de que a Terra possui movimentos através da observação de outros astros. Com uma observação sistemática do céu noturno, podemos constatar que há algumas “estrelas” que fogem da uniformidade do movimento das demais: as “estrelas errantes”, que foram ganharam este nome em razão de seu movimento aparente distinguir do movimento dos demais corpos celestes. Estes corpos são atualmente chamados de planetas, que derivou do vocabulário Grego e que significa objetos cuja posição varia em relação às estrelas.

Um dos movimentos observáveis dos planetas é denominado “movimento retrógrado”. Tal movimento observado recebe este nome devido ao planeta realizar um deslocamento aparente oposto ao movimento aparente dos demais corpos na esfera celeste. Na figura 6, apresentamos uma figura que representa o movimento retrógrado de Marte:

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Figura 6 - Esquema do movimento retrógrado de Marte entre Áries e Touro5

Desta maneira, do ponto de vista da Terra, percebemos os movimentos aparente diurno do Sol e os movimentos das estrelas fixas e dos planetas. Dois modelos explicavam de maneiras distintas e satisfatórias estes movimentos observáveis: o modelo geocêntrico (anteriormente apresentado) e o modelo heliocêntrico.

O modelo heliocêntrico contrariava a observação direta e atribuía a Terra e aos demais planetas um movimento em torno do Sol. Neste modelo, na posição central estaria o Sol e os planetas observáveis girando em torno dele. Ainda que possamos observar alguns movimentos dos demais planetas que dão indícios de movimentos distintos ao das estrelas fixas, não observamos a Terra se mover.

Cabe-nos o seguinte problema: Como podemos constatar observacionalmente que a Terra se move em torno do Sol? Como podemos constatar que a Terra possui algum movimento?

Uma das maneiras de se constatar observacionalmente o movimento de revolução da Terra em torno do Sol, a partir do referencial terrestre, é observar a posição do Sol em

5 Esta figura foi retirada do livro “A revolução Copernicana”. De acordo com a legenda do livro “a linha

tracejada é a eclíptica e a linha em cheio é o rasto dos planetas. Como podemos observar, Marte não se mantém sobre a eclíptica, o que, embora todo o seu movimento seja para leste entre as estrelas, há um período desde o meio de Junho até o princípio de Agosto, durante o qual ele se desloca para oeste” (KUHN, 1990, p.68 – fig. 15).

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instantes próximo ao pôr do Sol, com relação às estrelas de fundo. Ao longo do ano, observamos que o Sol se põe no lado oeste do horizonte observável e diferentes constelações estão ao fundo, próximas à localização do Sol.

Um observador localizado no hemisfério Sul poderia constatar, em certo mês do ano, que o Sol se põe em relação à constelação de Escorpião, por exemplo. Alguns dias após esta observação, neste mesmo referencial, seria possível observar que o Sol se põe com a constelação de Sagitário ao fundo. Essa alteração das constelações de fundo pode ser explicada de maneira clara com a Terra se movimentando em torno do Sol e as constelações fixas na eclíptica como referencial de fundo.

Perceber os movimentos da Terra também envolve intuir algumas das consequências deste movimento. Se a Terra se move, porque não podemos sentir os efeitos de seus movimentos? Tudo que existe na Terra não sofre influências de seu movimento, ou existe algo que sofre?

Podemos considerar que a Terra é esférica e o tempo que ela leva para girar em torno de si mesma é intervalo do ciclo do dia e da noite (23 horas, 56 minutos e 4 segundos, o equivalente a cerca de 86.400 segundos). Desta forma, podemos calcular sua velocidade de rotação ( o que resulta em uma velocidade muito grande, algo quase impossível de não ser percebido, caso existisse.

Desta maneira, em razão da rotação da Terra poderíamos argumentar que há uma tendência da mesma em expelir os corpos de sua superfície. No entanto, não sentimos os efeitos dos movimentos da Terra! Por quê? Atualmente sabemos que isso não ocorre, pois essa tendência é inferior de expelir os corpos da superfície terrestre se opõe à força de atração gravitacional entre a Terra e os corpos em sua superfície.

Um argumento que pode evidenciar os efeitos do movimento de rotação da Terra é a existência do achatamento nos pólos da Terra. Esse argumento foi descrito por Newton no livro Principia, para justificar o movimento da Terra, afirmando que o achatamento da forma da mesma se deve aos efeitos deste movimento. Uma discussão didática dos caminhos descritos por Newton para provar a existência do achatamento da Terra como uma causa do movimento de rotação da mesma é feita por Pinto (2003, p.134).

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Outra tentativa da física explicar a falta de sensação dos movimentos da Terra é feita com o uso dos conceitos de relatividade dos movimentos. Devido ao fato de estarmos na superfície terrestre, nos movimentamos junto com o nosso planeta, não perceberíamos seu movimento por estar em um referencial que se movem junto com a Terra (NUSSENZVEIG, 2002, p.248).

Um experimento que prova que a Terra se move em torno de seu eixo é o conhecido Pêndulo de Focault. Este experimento demonstrou que um pêndulo simples ao manter-se em oscilação constante durante um grande intervalo de tempo, o ângulo entre o plano de oscilação varia ao passar das horas, e completaria uma volta em aproximadamente 24 horas. A causa desta variação do ângulo, que depende da latitude de onde se realiza o experimento, se deve ao movimento de rotação da Terra. Essa é uma das evidencias experimentais dos efeitos da rotação da Terra.

Atualmente podemos justificar a causa do movimento de revolução da Terra e dos demais planetas em torno do Sol com a Lei da Gravitação Universal. Em razão dos planetas serem menos massivos do que o Sol, estes tem a tendência de se manter atraídos pelo Sol. Os planetas, por sua vez, descreveriam órbitas elípticas com o Sol em um dos focos. A explicação da ordem de afastamento dos planetas se dá em função da massa do planeta e da distância ao Sol.

Com isso, retomemos um dos problemas centrais da discussão se a Terra se move ou não: somente com a observação direta da Terra, utilizando nossos sentidos primeiros, é possível concluir que a Terra se move?

Caso estejamos levando em conta somente a observação primeira e ingênua, a resposta seria não é possível perceber seus movimentos com esta observação. Porém, ao considerarmos a observação de outros astros e fenômenos, explicações e experimentos físicos, como a percepção da variação das constelações de fundo próximas a posição do Sol num pôr do Sol, a relatividade dos movimentos, o achatamento dos polos da Terra, o experimento do Pendulo de Focault, seria possível perceber que a Terra se move a partir disto.

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