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CAPÍTULO 2 – REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E LINGUAGEM

2.1 Representações Sociais

2.1.1 Definição de representações sociais

O que difere a teoria de Durkheim (1978) da teoria de Moscovici (1984) é o enfoque nas sociedades. As representações coletivas, relacionadas a sociedades menos complexas, são marcadas por um senso coletivo muito forte, como o das sociedades tribais, por exemplo. Em sociedades desse tipo, as representações coletivas são caracterizadas por forte fixidez e grande poder de coerção.

Por outro lado, as sociedades modernas são caracterizadas pelas representações sociais. Essas sociedades sofrem mudanças constantes e os indivíduos são submetidos a um fluxo de informações muito grande e, por isso, nesse tipo de sociedade, as representações sociais estão em constante transformação e seu poder de coerção é mais fluido e limitado a grupos específicos (FARR, 1995).

Moscovici (1984; 2003) remodelou o conceito de representações coletivas impulsionado pela necessidade de torná-lo viável às condições atuais, de sociedades contemporâneas imersas na intensa divisão do trabalho e da vida social.

O fluxo de informações e a emergência de se estar bem informad@, conciliado à necessidade de especialização no mundo do trabalho, tornaram-se componentes decisivos na vida das pessoas e dos grupos. O estudioso tornou esse conceito operacional para ser aplicável em sociedades caracterizadas pela velocidade e pelo fluxo da informação. Nessas sociedades, as informações não se sedimentam em tradição, devido ao processamento constante da novidade e por que ninguém tem acesso a todo o saber (ARRUDA, 2002).

Para Oliveira (2004), há pouca diferença entre os termos coletivas (DURKHEIM, 1978) e sociais (MOSCOVICI, 1984), pois ambos revelam a heterogeneidade das ações humanas e a presença de ideias gerais, comuns, no seio da sociedade. Essas ideias suscitam a necessidade de estudos sobre o seu impacto nos atos cotidianos e até mesmo nas mudanças históricas.

A intenção de Moscovici (2003) ao substituir o termo coletivas por sociais é aprofundar a ideia de diferenciação, de diferentes redes de pessoas e suas diferentes interações. Sua reflexão, desse modo, está estreitamente direcionada à diversidade das sociedades e não à coletividade como um todo. O próprio pesquisador afirma que não se deveria esperar que ele fosse capaz de explicar a diferença entre ‘coletivo’ e ‘social’ (MOSCOVICI, 2003, p. 348), pois essa diferença é muito tênue e se refere às diversidades das sociedades.

É pertinente afirmar, diante disso, que a definição de representações sociais remete a um conjunto de saberes socialmente construídos e partilhados por um grupo ou por uma comunidade em plena ação comunicativa (JOVCHELOVITCH, 2000). As representações são os processos de produção de significado, os processos que pertencem ao registro das atividades em que os grupos humanos produzem, dando sentido e simbolizando, as realidades nas quais eles vivem.

O registro do simbólico, ou a linguagem, é um complexo processo de ressignificação do mundo, em que os significados se transpõem rapidamente e transformam a subjetividade das pessoas, no âmbito social e na vida privada (WERBA; STREY, 2001, p. 73). Assim, uma representação social é, em sua essência, uma construção simbólica; representações coletivas e representações individuais são influenciadas pelas concepções sociais dominantes, pois:

é nesse meio que pensa ou exprime seus sentimentos. Essas representações diferem de acordo com a sociedade em que nascem e são moldadas. Portanto, cada tipo de mentalidade é distinto e corresponde a um tipo de sociedade, às instituições e às práticas que lhe são próprias. (MOSCOVICI, 1984, p. 49)

As representações sociais não são apenas opiniões sobre algum fato ou tema, pois constituem uma estrutura de implicações baseada em valores e conceitos que “determinam o campo das comunicações possíveis, dos valores ou das ideias compartilhadas pelos grupos e regem, subsequentemente, as condutas desejáveis ou admitidas” (MOSCOVICI, 1984, p. 51).

A partir dessa percepção, Guareschi (1995, p. 201) afirma que as representações sociais são ideológicas, pois seu foco é a construção de conhecimentos em um dado contexto sócio-histórico e a funcionalidade desses conhecimentos na instauração e/ou manutenção das práticas sociais. Assim, é possível compreender que as representações sociais se moldam e são moldadas em campos socialmente estruturados e refletem ideologias como visão de mundo, enquanto que nas práticas sociais possibilitam a emergência de ideologias como representações hegemônicas a serviço das relações de poder.

Tanto quanto as atitudes e as opiniões, as representações sociais preparam o indivíduo para a ação e, além de orientarem o comportamento das pessoas, reconstituem os elementos do ambiente no qual o comportamento terá lugar, integrando-o a uma rede de relações às quais seu objeto está vinculado. As representações sociais constituem uma modalidade de conhecimento particular e têm a função de elaborar comportamentos e a comunicação entre os indivíduos.

Assim, elas - as representações sociais - possibilitam que se compreenda a constituição da realidade em que as pessoas se movimentam e que se investigue o modo pelo qual os saberes populares e o senso comum, como parte da vida cotidiana, implicam construção da história individual e social, da vida efetiva e intelectual de uma comunidade, expressando resistência às mudanças ou lançando- as para que surjam novas representações.

Uma representação é a apresentação pública de uma presença, seja ela uma coisa ou uma pessoa (CHARTIER, 1991, p. 173-191). Por esse motivo, ela não surge sozinha, é criada por um sujeito social sobre algo ou sobre um objeto e

sempre envolve um sujeito, um objeto e outro sujeito24, isto é, a construção social ou a representação é sempre mediada pelo outro na relação estabelecida entre ambos. A teoria das representações sociais e a dialogicidade se aproximam do interacionismo social de Bakhtin (1992; 1997), pois essas abordagens compreendem o indivíduo e a sociedade como indissociáveis. Tanto para Moscovici (1984) quanto para Marková (2006) e Bakhtin (1992; 1997), o contato social é a matriz da construção de formas de conhecimento ligadas ao dia a dia. Esse contato social cotidiano - ou a interação social - é naturalmente mediado pela linguagem.