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Demais restrições relevantes

No documento Universidade Federal do Rio de Janeiro (páginas 128-134)

PARSE- ALLFOOT(R)

6.1.3. Demais restrições relevantes

Pudemos perceber, a partir dos dados e da atuação dos restritores postulados para a hierarquia unificada da hipocorização, que bons candidatos são aqueles que violam menos restrições no ranking de prioridades, como determina a TO Clássica e, consequentemente, o ROE, aqui entendido como desdobramento desta. Uma questão imediatamente se coloca em relação aos restritores formulados em 6.1.2: um hipocorístico que viola METRICALFAITHFULNESS(R) necessariamente satisfará ANCHOR(L) e vice-versa, já que essas demandas estão em situação de conflito.

Outra questão que envolve a abordagem unificada da hipocorização nos faz pensar em uma premissa básica e fundamental da Teoria da Otimalidade – a violabilidade. Esse conceito, que indica a possibilidade de um candidato infringir uma restrição, desde que seja para satisfazer outra mais bem cotada na hierarquia, revela que, na TO, o candidato ótimo é aquele que melhor atende às demandas do ranking de prioridades. Sendo assim, uma possibilidade de se estender o conceito de violabilidade revela-se ao conjugarmos restrições para que atuem em conjunto na análise das formas candidatas, ou seja, quando postulamos que duas ou mais restrições estão em pé de igualdade, estamos concebendo que não há prioridade entre as

129 demandas: o que está em jogo, portanto, é o melhor atendimento possível ao conjunto.

De um lado, há uma tendência linguística à manutenção de posições proeminentes, o que, por sua vez, torna o processo menos opaco e efetivamente reforça o fato de a hipocorização implicar perdas segmentais, desde que se mantenha, ainda que minimamente, uma relação formal entre o antropônimo e o hipocorístico correspondente. De outro lado, considerando o aspecto formal dos dados relativos aos padrões A e B, não há dúvidas quanto à atuação de restrições de marcação que tendem a trazer à superfície formas menos fiéis à base, mas menos marcadas no que tange à sua estrutura.

Assim, para tornar a análise mais didática, abordaremos grupos de restritores que, mais diretamente, estão em conflito, construindo, de modo gradual, a hierarquia de prioridades para a análise unificada da hipocorização em português.

Um ponto de extrema relevância na análise dos hipocorísticos decorre do fato de, por serem formas diminutas, correr o risco de se tornarem muito opacos em relação ao prenome original. No entanto, é sabido que, para construir formações hipocorísticas, a perda segmental é essencial e constitui marca desse processo morfofonológico (GONÇALVES, 2004a). Essa pressão por fidelidade, de um lado, e perda segmental, de outro, evidencia que, predominantemente, a força pelo encurtamento é maior do que a emergência de uma forma mais fiel ao antropônimo, o que fica claro ao pensarmos que as restrições que regulam o tamanho da palavra prosódica são invioláveis na hierarquia. Entretanto, o nível de opacidade do hipocorístico deve ser o menor possível. Não há, efetivamente, como afirmar que um antropônimo só possa

130 perder “x” segmentos fônicos; em contrapartida, em alguns casos, a grande perda gera a possibilidade de um hipocorístico se referir a mais de um prenome, como em ‘Rôse’, para ‘Rosemary’, ‘Rosilene’, ‘Rosane’, ‘Rosimeire’,

‘Rosalina’, dentre outros. Assim, duas restrições são de grande importância para garantir relações mínimas de fidelidade entre forma subjacente e de superfície. São elas: UNIQUENESS[subst] e IDENT-IO[+aberto 2]89

.

O restritor UNIQUENESS[subst] exige que o encurtamento do prenome não seja uma palavra homônima na língua e, mais do que isso, um homônimo de mesmo valor morfológico, no caso, substantivo – daí, a especificação [subst]

na formalização da restrição. A razão para que um restritor como esse seja postulado advém do fato de que, em alguns encurtamentos, é possível pensarmos em formas diminutas e, ao mesmo tempo, homônimas, como é o caso de ‘mar’ para ‘Itamar’. Se adotássemos, unicamente, os restritores METRICALFAITHFULNESS(R) e ANCHOR(L), ‘mar’ seria um output com grande condição de emergir como ótimo. Entretanto, teríamos uma formação bastante esdrúxula, já que ‘mar’ é um substantivo comum na língua que, por sua vez, designa um objeto/ser no mundo do mesmo modo que um hipocorístico90.

O segundo restritor – IDENT-IO[+aberto2] – inviabiliza a permuta da especificação [+aberto 2] do input para o output quando o acento recai, em vogais médias, à direita da palavra prosódica, como em ‘Alê’ para ‘Alexandre’

ou ‘Helô’ para ‘Heloísa’. Assim, o acento recai na última sílaba a fim de desfavorecer a neutralização das vogais postônicas, que fatalmente traria à

89 Cf. nota 55.

90 É sabido que o hipocorístico veicula uma carga afetiva e um substantivo comum,não, mas o papel morfológico de ambos é bem semelhante, por isso a necessidade de um restritor que regule formações homônimas.

131 superfície formas como ‘áli’ e ‘hê.lu’ para os antropônimos citados anteriormente. Com isso, garante-se maior fidelidade e, portanto, menor opacidade das formas candidatas a output. Em (05), a seguir, apresentamos a atuação desses dois restritores:

(05) (a)

* ( * . * . )

/aleʃaNdɾI/

UNIQUENESS[subst] IDENT-IO[+aberto2]

a) [(a.’le)]

b) [(‘a.li)] *

(b)

* ( * . *)

/itamaR/

UNIQUENESS[subst] IDENT-IO[+aberto2]

a) [(‘i.tɐ)]

b) [(‘max)] *

Conforme já discutido anteriormente, o restritor de fidelidade, no caso de (05a), é IDENT-IO[+aberto2], uma vez que o encurtamento ‘á.li’, em função da posição do acento, promove a neutralização a vogal média final e, com isso, perde-se a relação mínima de identidade entre a forma subjacente e a de superfície. Desse modo, essa restrição, que, na verdade, requer identidade para as vogais médias, acaba regulando o acento: tem-se uma oxítona para preservar a vogal média da forma de base. Um hipocorístico paroxítono seria

132 fatalmente caracterizado pela presença de um [i] final, já que, em português, não há médias na posição postônica. Já em (05b), a restrição em jogo é UNIQUENESS[subst], já que ‘mar’ é um substantivo na língua e, para evitar a opacidade entre formas, ele não é um candidato potencial a output ótimo.

Além das restrições de fidelidade posicional, METRICALFAITHFULNESS(R) e ANCHOR(L), e das restrições UNIQUENESS[subst] e IDENT-IO[+aberto 2], que atuam em conjunto na hierarquia de relevância para a abordagem da hipocorização, outras demandas que precisam ser atendidas dizem respeito à estruturação silábica. Quatro restrições são fundamentais para a análise dos hipocorísticos:

NOCOMPLEX[onset]]FootBin; ONSET; NOCODA e CODACOND[+soante].

A primeira restrição, NOCOMPLEX[onset]]FootBin, de marcação contextualizada (ALDERETE, 1999), inviabiliza a complexidade estrutural no componente onset em pés binários (FootBin). A restrição ora em pauta foi proposta com base na seguinte evidência, obtida com o exame dos dados que compõem nosso corpus: se o encurtamento compõe-se de uma única sílaba, esta pode ser complexa, como é o caso de ‘Prí’ para ‘Priscila’, ‘Drí’, para

‘Adriana’ e ‘Cris’, para ‘Cristina’. Entretanto, em encurtamentos com duas sílabas, a complexidade estrutural do onset é rechaçada, como é o caso de dados como ‘Xândre’ para ‘Alexandre’ ou ‘Gabrí’ para ‘Gabriela’. Dessa maneira, em formações encurtadas de duas sílabas (isto é, um pé binário), não são licenciadas complexidades no onset91.

91 Há um único dado não-contemplado por esse restritor de marcação: ‘André’ > ‘Dé’. Nesse caso específico, embora composto por uma única sílaba, a forma ‘Dé’ emerge como output ótimo para ‘André’ e, assim como em “Priscila’ > ‘Prí’, o candidato ‘Dré’ não viola a restrição.

Como estamos tratando de generalizações, a restrição postulada dá conta da maior parte dos dados e, por isso mesmo, é prioridade na análise dos encurtamentos.

133 O segundo restritor – ONSET – proíbe que sílabas não tenham a posição de ataque silábico preenchida. É bem verdade que alguns dados do tipo B violam essa restrição (‘Alê’, ‘Edú’, ‘Íta’, ‘Helô); entretanto, isso ocorre para melhor satisfação às demais demandas, principalmente a que diz respeito à manutenção da margem esquerda da palavra-matriz (ANCHOR(L)). No caso do tipo A de hipocorização, esse restritor é sempre respeitado por todos os hipocorísticos do corpus.

Duas restrições seguintes estão em conflito direto: NOCODA requer que não haja travamento da sílaba, ou seja, impede que a posição de coda seja preenchida, uma vez que reflete uma tendência mais geral da língua;

CODACOND[+soante], por sua vez, exige que, se preenchida, a coda respeite a especificação [+soante]92. Na verdade, esse restritor impede que a posição de coda seja ocupada por segmentos que não sejam vogais, glides, laterais ou nasais. Dessa forma, o restritor inviabiliza que bons candidatos tenham a posição de travamento silábico ocupada por segmentos oclusivos, fricativos, africados e vibrantes.

Assim, em (06), a seguir, apresentamos a atuação dos restritores de marcação na análise de alguns dados de encurtamento do português:

92 Segmentos [+ soante] são produzidos com uma configuração do trato vocal que torna possível o vozeamento espontâneo. São soantes as nasais e as líquidas, além, é claro, das vogais (incluindo glides).

134 (06)

(a)

* ( * . * . )

/aleʃaNdɾI/

No documento Universidade Federal do Rio de Janeiro (páginas 128-134)