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O ranqueamento das formas candidatas a output no ROE

No documento Universidade Federal do Rio de Janeiro (páginas 40-49)

3.2. O tratamento da variação sob a perspectiva otimalista

3.2.1. O ranqueamento das formas candidatas a output no ROE

Diferentemente das abordagens de Hammond (op.cit.) e Antilla (op.cit.), Coetzee (op.cit.) não explica a variação através de alterações no ranking de prioridades; o autor propõe outro locus para a variação – ela, na verdade, reside na própria arquitetura da gramática, sendo necessário, apenas, acrescentar a essa arquitetura um mecanismo que permita o acesso a vários outputs possíveis.

24“In speech production, the language user then has access to the full candidate set via this rank-ordering. The likelihood of a candidate being selected as output depends on the position the candidate occupies on the rank-ordering – the higher a candidate appears, the more likely it is to be selected” (COETZEE, 2006:2).

41 No modelo standard da TO, o avaliador, um dos componentes da gramática, é responsável unicamente pela avaliação das formas candidatas a output. Entretanto, as informações relativas aos demais candidatos não-ótimos,

ainda que estejam presentes no tableau, são hachuradas e, portanto, não contam para a análise desses dados. Essas informações, em contrapartida, estão disponíveis no próprio tableau, como mostra a formalização exemplificativa a seguir:

(07)

/Input/ A B C

[cand 1]  * *

[cand 2] *! *

[cand 3] *! *

Em (07), as formas candidatas 1, 2 e 3 passam pelo crivo de AVAL. O candidato 1 não viola o restritor A, já os candidatos 2 e 3 o violam e estão, portanto, sumariamente eliminados da disputa. Apenas para fins de análise, seguimos com a avaliação das três formas candidatas, ainda que [cand1] seja o output ótimo. Quanto ao restritor B, o primeiro candidato o infringe, bem como

[cand3], já eliminado da disputa. A forma 1, apesar de ser ótima, e o candidato 2, já eliminado, violam o restritor C. Como se pode observar, todas as informações sobre as restrições B e C tornam-se irrelevantes para a determinação da forma ótima, visto que os candidatos 2 e 3 foram eliminados já na restrição A, a mais bem cotada da hierarquia.

Então, pode-se observar, em (07), que, após violada a restrição que elimina os candidatos 1 e 2, as células hachuradas indicam que a avaliação das formas já não tem mais validade para a seleção do output ótimo. No

42 entanto, há informações, no tableau, que são descartadas, como, por exemplo, a avaliação das formas 2 e 3 no que diz respeito ao atendimento das restrições B e C. Entre os candidatos já eliminados pelo restritor A, [cand2] satisfaz a restrição B; já [cand3], não. Desse modo, numa escala, a forma 1 é ótima, já que é a única que passa pela restrição A; a forma 2 é melhor do que a forma 3, pois [cand2], embora tenha violado A, passa pelo crivo da restrição B, o que não ocorre com [cand3]. Assim, no modelo standard da TO, há uma espécie de

“super-geração” de informações consideradas irrelevantes, segundo Coetzee (op.cit.). Para o autor, essas informações, que eram descartadas na TO Clássica, conferem ao AVALIADOR um novo papel – o de avaliador das informações relativas aos outputs não-ótimos.

De acordo com a proposta de Coetzee (op.cit.), a forma ótima é a que melhor atende às demandas do ranking, assim como postula a TO Clássica;

em contrapartida, as demais estruturas, apesar de não-ótimas, podem ser acessadas pelos falantes e, assim, ser linguisticamente possíveis em uma determinada língua. Dessa forma, o AVALIADOR, além de validar a forma ótima, também ranqueia os candidatos25, de modo que, no tableau, a forma 1 seja melhor do que a forma 2 que, também, é melhor do que a 3 e assim por diante. Dito de outra maneira, a hierarquia deve trazer à tona todas as formas de outputs possíveis para um dado fenômeno linguístico, de modo a ranqueá-las conforme o uso-acesso dos falantes e, consequentemente, em favor da gramática de cada língua. Com base no novo papel atribuído ao AVALIADOR, em (08), apresentamos um quadro comparativo entre o modelo standard da TO

25 Entende-se, pois, no ROE, que há dois tipos de ranqueamento: (a) o de restrições, já amplamente discutido em outras versões da TO, e (b) o de candidatos, que garante, por sua vez, uma escala de formas que vai da mais aceita pelos falantes a menos aceita, mas, ainda assim, gramatical.

43 e o ROE, evidenciando, assim, o novo papel do avaliador na proposta de Coetzee:

(08)

Na formalização em (08), observa-se que, de um lado, na TO, as formas não-ótimas formam um grupo de dados em pé de igualdade, visto que não são destacadas informações sobre essas estruturas; de outro, no ROE, as informações contidas no tableau identificam as formas como mais adequadas formalmente, constituindo, para tanto, um ranking.

A fim de justificar o funcionamento do ROE, Coetzee (op.cit.) postula três premissas básicas que regulam a extensão do modelo otimalista. A primeira delas refere-se ao fato de que restritores são interpretados como funções que, por sua vez, “mantém o conjunto completo de candidatos sob seu domínio”26 (COETZEE, 2006:5); logo, essa premissa determina que todos os candidatos são avaliados por todos os restritores e as informações

26 “[...] with the full candidate set as their domain […]”(COETZEE, 2006:5)

OT CLÁSSICA ROE

Única forma de [output ótimo] [output ótimo]

superfície

[2º output ótimo]

Informações não- {[cand.2]; [cand.3]; [cand.4]}

relevantes. [3º output ótimo]

[4º output ótimo]

Análise descrente das formas candidatas

44 anteriormente desprezadas são responsáveis, no ROE, pelo ranking de candidatos possíveis. A segunda diz respeito ao próprio papel do AVALIADOR (doravante AVAL), ou seja, cabe a AVAL utilizar todas as informações oriundas da aplicação dos restritores (premissa 1), a fim de impor um ranking ordenado de boa-formação ao conjunto completo de candidatos. Sendo assim, os falantes acessam todas as informações presentes no tableau e estas moldam o desempenho linguístico dos usuários. Por fim, a terceira premissa afirma que o repertório de outputs emergentes através do ranking de relevância e a posição que cada um ocupa na hierarquia de candidatos é determinante no que tange ao uso-acesso dos falantes. Assim, a forma que melhor atende às demandas específicas da língua e, por conseguinte, mais acessada pelos falantes é também a de melhor formação linguística, o que não impede, entretanto, a seleção de outro output.

Como se pode observar, o modelo de ranqueamento ordenado utiliza todo o mecanismo analítico da TO Clássica, adotando, unicamente, um novo atributo ao componente AVALIADOR, que passa a construir um ranking de candidatos. No entanto, uma grande questão a ser discutida acerca do modelo de Coetzee refere-se ao modo como o ROE é capaz de limitar a variação, já que todos os outputs considerados gramaticais e, portanto, disponíveis no repertório linguístico dos falantes devem emergir como forma ótima, ainda que sejam adotadam em menor frequência na língua.

Para o autor, toda forma candidata é potencialmente uma forma de superfície, embora haja pouca probabilidade de que as estruturas menos cotadas no ranking sejam selecionadas. Dessa forma, para Coetzee, “AVAL

45 impõe um ranking ordenado harmônico sobre todo o conjunto de candidatos”27 (COETZEE, 2006:4) que passam, por sua vez, pelo crivo da hierarquia de relevância.

Uma proposta possível para limitar a variação, segundo o autor, seria o uso do ponto de corte crítico, responsável por dividir os restritores em dois níveis. As restrições de nível 1 são aquelas mais bem cotadas no ranking e, quando violadas, representam a sumária eliminação do candidato, como ocorre na TO Clássica. Esses restritores são, pois, responsáveis por descartar formas não-licenciadas pela gramática de uma determinada língua. Os restritores de nível 2, diferentemente dos primeiros, não eliminam formas candidatas; ao contrário, constituem o ranking harmônico dos outputs gramaticais e, portanto, licenciados pelas restrições de nível 1.

No tableau, o ponto de corte crítico é representado por uma linha contínua de maior espessura, como se observa em (09). As restrições mais à esquerda dessa linha representam o nível 1 e as restrições mais à direita, por sua vez, o nível 2:

(09)

/Input/ A B C D

[cand 1]  *

[cand 2]  *

[cand 3] *!

Em (09), iniciada a avaliação das formas, [cand3] viola um restritor de nível 1 e, portanto, é, nessa língua, uma estrutura agramatical. As formas 1 e 2, em contrapartida, passam pelas restrições A e B; logo, são estruturas

27 “[...] EVAL imposes a harmonic rank-ordering on the full candidate set”. (COETZEE, 2006:4)

46 linguisticamente possíveis e disponíveis para o falante. O candidato 2 infringe a restrição C; enquanto [cand1],a D. Como C >> D nessa língua, o candidato 1 é a forma ótima e, com isso, de maior frequência de uso e o candidato 2, uma forma sub-ótima, mas igualmente gramatical nessa língua. Dessa forma, o ponto de corte crítico recorre aos mecanismos da TO Clássica e insere no

ranking um segundo grupo de restrições, que não eliminam candidatos, mas os

ranqueia.

Coetzee descreve, ainda, três situações possíveis em que se verifica a atuação dos dois níveis de restritores, como mostram as várias formalizações em (10):

47 (10)

a.

/Input/ A B C D

[cand 1]  *

[cand 2]  *

[cand 3] *!

[cand 4] *!

b.

/Input/ A B C D

[cand 1]  *

[cand 2] *!

[cand 3] *!

c.

/Input/ A B C D

[cand 1]  *

[cand 2] *!

No primeiro tableau – (10a) – os candidatos 3 e 4 violam as restrições A e B, que compõem o quadro de nível 1; as formas 1 e 2 são avaliadas por C e D, restrições de nível 2. Como o candidato 2 infringe uma restrição mais bem cotada, [cand1] reafirma-se como estrutura mais bem-formada e [cand2] como uma variante também gramaticalmente aceita na língua.

No segundo caso, apresentado através da formalização (10b), do conjunto de três candidatos, apenas o primeiro não viola um restritor de nível 1 e, por isso mesmo, não constitui um caso de variação, já que emerge uma única forma de superfície. Dessa maneira, os mecanismos formais da proposta

48 de Coetzee conseguem refletir o uso real dos falantes, mesmo que o fenômeno linguístico hipoteticamente apresentado licencie uma única forma de superfície.

Em (10c), como não há formas que passem pelo crivo dos restritores de nível 2, já que ambos os candidatos violam uma restrição de nível 1, a hierarquia funciona exatamente como na TO Clássica – o output ótimo é aquele que melhor satisfaz o ranking de prioridades e, conforme postula a teoria, não emergem dados de variação.

Como se observa através dos exemplos apresentados, postular um ponto de corte crítico não significa afirmar que todo fenômeno é variável, mas

evidencia que a variação é inerente a todas as línguas, ao passo que, se um fenômeno traz à tona mais de uma forma de superfície, esta não deve ser descartada por mais que seu uso seja menos frequente.

Com isso, o ROE determina que, para a análise de um fenômeno linguístico, devem constar, no tableau, formas possíveis segundo o funcionamento da língua em que o fenômeno ocorre, o que limita a geração de formas que contrariam princípios básicos dessa língua e, além disso, se variável, o avaliador tornará seus efeitos visíveis no ranqueamento de formas;

caso contrário, o próprio ranking de relevância eliminará formas não-usuais na língua.

O caso da hipocorização parece reforçar a presença do que Coetzee denominou ponto de corte crítico28, visto que as restrições mais cotadas seriam invioláveis por candidatos gramaticais e, por isso mesmo, aqueles que infrinjam

28 Segundo Coetzee, a existência do ponto de corte crítico é uma questão empírica a ser testada, visto que, por se tratar de um desdobramento recente da TO, poucos fenômenos linguísticos foram testados sob essa perspectiva. No português brasileiro, a análise da hipocorização é uma proposta pioneira de adoção do ROE para estudos de interface fonologia-morfologia.

49 as restrições de nível 1 são eliminados e não comporão o ranqueamento ordenado harmônico de construções bem-formadas, como se verifica em (11):

(11)

* ( * . * .)

/filomena/

No documento Universidade Federal do Rio de Janeiro (páginas 40-49)