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NOTA INTRODUTÓRIA

A HISTÓRIA URBANA COMO VALORIZAÇÃO DO NÃO-URBANO: SUBURBANIZAÇÃO DA MOBILIDADE

3.2 A DEMANDA, A PROMESSA E O SONHO

O desenvolvimento de subúrbios ao longo do século XIX, a evolução em seu design com as configurações cada vez mais adequadas a novas demandas, aliada a uma maior acessibilidade promovida em uma primeira fase pela locomotiva, bonde elétrico e, posteriormente, pelo automóvel, propiciou as condições para a explosão dos subúrbios, após a segunda guerra mundial.

A ―fórmula‖ para o crescimento, em larga escala, dos subúrbios nos Estados Unidos, principalmente após a segunda guerra mundial, foi produto da demanda crescente para fornecimento de casas a baixo custo para os soldados veteranos da guerra e suas famílias (FIG. 150); menor custo da terra nas áreas periféricas; residência unifamiliar isolada em um terreno, em um subúrbio como símbolo de status e de ascensão social; automóvel e gasolina a baixo custo; um sistema de auto-estradas (FIG. P1) interligando as principais cidades norte-americanas94.

94Em 1956 o Congresso norte-americano autorizou a construção de um sistema de auto-estradas. O Highway Act,

elaborado pelo governo do Presidente Eisenhower (1953-1961) era parte do sistema de defesa na época da chamada Guerra Fria. Visava facilitar o rápido deslocamento das forças armadas e de suprimentos. Previa a construção de 41.000 milhas (cerca de 66.000 km) de auto-estradas ao custo de 25 bilhões de dólares. A implantação do sistema foi concluída em 1969. (GILLHAM, 2002, p.35)

FIGURA 150 – Propaganda de eletrodomésticos

para complementar a casa prometida a soldados veteranos da segunda guerra mundial.

Fonte: THE STATE MUSEUM OF PENNSYLVANIA, 2008

FIGURA 151- Detroit, complexo de auto-estradas ligando

a região central da cidade a subúrbios em sua região sudoeste.

Fonte: EL-KHOURY; ROBBINS, 2004, p. 93.

A conexão do subúrbio com a região central da cidade feita por automóvel e a tentativa de garantir a toda a classe média - e até eventualmente à classe trabalhadora - todos os benefícios dos subúrbios, foram os principais elementos que iriam diferenciar a história do subúrbio do século XX dos períodos antecedentes, especialmente do século XIX, quando estava restrito à elite burguesa. Inevitavelmente esta tentativa mudou a natureza básica, tanto dos subúrbios como o da cidade a qual estavam, inicialmente, vinculados.

Após a segunda guerra mundial, a economia norte-americana retomou o ritmo de crescimento. No final da década de 1940, a produção de automóveis retornou a níveis de produção anteriores à crise de 1929 e, em paralelo, a construção de unidades residenciais, que durante um período de 16 anos (1929-45) – grande depressão e segunda guerra – havia se mantido numa média de menos de 100.000 por ano, foi também retomada.

Ao final da guerra, os 16 milhões de soldados que retornavam aos Estados Unidos produziram uma enorme pressão sobre o mercado. Devido à atuação de dois órgãos, a Veterans

Administration (VA) e a Federal Home Administration (FHA) tornou-se relativamente fácil para

ex-soldados adquirirem sua casa própria. Estes órgãos / agências garantiam os empréstimos, fornecendo recursos em comodato, para que os bancos financiassem os compradores de

casas, além de estabelecerem um pagamento mínimo que, por vezes, era simbólico: U$ 1 (um dólar) 95.

Iniciou-se um intenso programa de construção de casas, prioritariamente em subúrbios, que de 114.000 unidades em 1944, passou para 937.000 em 1946, 1.183.000 em 1948 e 1.692.000 em 1950, e permaneceu em constante crescimento (JACKSON, 1985, 233). Para os construtores a oportunidade de ganhar dinheiro foi sem precedentes e um nome ficou associado à explosão de construção de casas em subúrbios nas décadas de 1940 e 1950: William J. Levitt96. Seu maior empreendimento, Levittown, tornou-se o símbolo de construção

suburbana neste período97.

Levitt adquiriu, em 1946, 4.000 acres de terras de antigas fazendas de batatas na região de Hampsted, Long Island, distante 25 milhas (cerca de 40 km) de Nova York (FIG. 152). Programou um grande loteamento que, ao contrário do planejamento de Stein para Radburn, destinava-se apenas à implantação de unidades residências, configurando-se o que, posteriormente, seria designado como cidade — subúrbio — dormitório.

FIGURA 152 – Vista aérea da região onde seria

construída Levittown, 1951. Fonte: LEVITTOWNERS (1), 2008

FIGURA 153 – Vista aérea de Levittown, 1958.

Fonte: LEVITTOWNERS (1), 2008

95Inicialmente a Tafft-Ellender-Wagner housing bill de 1945 (projeto de Lei) previa a construção de casas através de

subsídios concedidos governo. Alguns congressistas, liderados pelo Senador Joseph McCarthy, discordaram deste tipo de política, qualificando-a como ―anti-americana‖. Com apoio de empresários como William Levitt, conseguiram modificar este dispositivo, através do Housing Act de 1949 (Lei), que reduziu anualmente o número de casas que seriam subsidiadas, transferindo a responsabilidade para as empreas construtoras. Como conseqüência, no final da década de 1950, as grandes construtoras eram responsáveis por 2/3 das casas construídas nos Estados Unidos (HAYDEN, 2003).

96A importância de Levitt e sua conexão com a de casas se tornou de tal forma associada que, ele se tornou capa

da revista Time na edição de 3 de julho de 1950, na qual se apresentava sua empresa como a ―General Motors da indústria da construção de casas‖ (HAYDEN, 2003, p.134).

97Segundo Jackson (1985, p. 370), Levittown foi o maior empreendimento construído por um único empreendedor,

embora outros empreendimentos tenham ultrapassado o número de unidades construídas naquela cidade, sempre envolveram várias empresas.

Levitt subdividiu a área em lotes de 60 x 100 pés (cerca de 18 x 30 metros), construiu as ruas e estradas necessárias (FIG.153), redes de distribuição de água e coleta de esgoto e construiu centenas de casas, a partir de modelos de planta padrão (FIG.154) que incluíam, como um grande apelo de vendas, um aparelho de televisão e uma máquina de lavar roupas (FIG.155) (OLSON, 2000, p.168). A designação inicial do empreendimento era Island Trees que, para fazer jus a esta designação, plantou cinco árvores para cada dois lotes. Entretanto, ainda antes da conclusão, adotou o nome Levittown. A população inicial desta cidade era de 10.000 pessoas e, no final da implantação do empreendimento, em 1960, haviam 17.400 casas e uma população de 82.000 residentes (JACKSON, 1985, p.235).

FIGURA 154 – Catálogo de vendas de Levittown

com modelos de casas. Fonte: LEVITTOWNERS (2), 2008

FIGURA 155 – Catálogo de vendas de Levittown, com

relação de eletrodomésticos entregues com as casas. Fonte: LEVITTOWNERS (2), 2008

Como Levittown, centenas de empreendimentos foram construídos, ao longo das décadas seguintes. O modelo adotado em Levittown, que, na implantação mantinha algumas premissas dos primeiros subúrbios norte americanos, como arruamento em curva e arborização, se tornou predominante. Entretanto houve propostas com diversas configurações como a adotada em Lakewood Park98, na região de San Fernando Valley,

próximo a Los Angeles. Neste empreendimento, seu modelo de implantação denota de forma inequívoca, a busca de se maximizar o rendimento da terra. Iniciado em 1949 ocupava uma área total de cerca 25,9 km² que foi dividida em quarenta glebas com 157 acres cada. A área foi loteada em forma de grelha, com lotes de 50 x 100 pés (cerca de 15 x 30), menor dimensão permitida em Los Angeles (FIG. 156). No final de sua implantação (FIG.157), contava com 17.500 casas e cerca de 80.000 residentes (HAYDEN, 2003 e FISHMAN, 1987).

FIGURA 158 – Lakewood, Califórnia. Vista aérea da construção das casas, 1950.

Fonte: KOSTOF, 1992, p.64.

FIGURA 157 – Lakewood, Califórnia, vista aérea, 1957.

Fonte: EASTERLING; PRELINGER (1), 2008