• Nenhum resultado encontrado

Em oposição ao modelo liberal representativo, bem como em contraposição às ideias de Schumpeter, a democracia participativa é defendida por teóricos como Pateman (1992), com base em Rousseau, John Stuart Mill, Hannah Arendt, G. D. H. Cole; e MacPherson (2009). A democracia participativa é difundida a partir das décadas de 1960 e 1970. De Rousseau veio à inspiração para a compreensão de participação enquanto meio para aperfeiçoamento democrático do cidadão e de Stuart Mill também foi absorvido o caráter educativo da participação, além da ideia de associativismo (PEREIRA, 2007).

Os teóricos desse modelo acreditam na relevância da participação para além das eleições e que ela proporciona uma cultura participativa, ou seja, quanto mais os cidadãos veem que suas opiniões são levadas em conta no processo democrático, mais eles participarão politicamente. Nesse sentido, há uma função pedagógica da democracia participativa. Essa vertente não busca a superação de formas de representação, na verdade, pretende agregar espaços de participação com os elementos da representação (voto eleitoral e periódico). (PEREIRA, 2007, p. 426-427).

A teoria participativa é definida por Pateman (1992) como

construída em torno da afirmação central de que os indivíduos e suas instituições não podem ser considerados isoladamente. […] para que exista uma forma de governo democrática é necessária a existência de uma sociedade participativa, isto é, uma sociedade onde todos os sistemas políticos tenham sido democratizados e onde a socialização por meio da participação pode ocorrer em todas as áreas. Na teoria participativa, a “participação” refere-se à participação (igual) na tomada de decisões, e “igualdade política” refere-se à igualdade de poder na determinação das consequências das decisões (1992, p. 62).

Enquanto Pateman se volta para quantidade na participação, MacPherson (2009) vai além e discute as condições para participação e para avanço da democracia participativa. Segundo o autor (2009), antes de tudo é necessária uma mudança de postura e consciência crítica do cidadão; deixando de ser apático politicamente e participando das decisões. No entanto, somente este elemento não assegura o desenvolvimento do modelo. Para MacPherson, também é necessária a diminuição das desigualdades sociais e econômicas (PEREIRA, 2007).

Essas concepções de democracia participativa, como propôs Pereira (2007), estão situadas em uma visão de países desenvolvidos (América do Norte).8 Há ainda o modelo participativo do Sul, que está baseado nos estudos de Santos e Avritzer (2003); Dagnino (2002); Dagnino et al. (2006). Uma das principais obras do Sul é o projeto “Democratizar a Democracia: os caminhos da democracia participativa” (SANTOS, 2003).

Além das características já apontadas por Pateman (1992) e MacPherson (2009), o modelo de participação do Sul acrescenta dois importantes elementos dessa vertente: 1) a relevância de analisar também as ações diretas dos cidadãos, tais quais paralisações cívicas, passeatas, ocupações, caminhadas; e por fim a existência de um conjunto de reivindicações mais amplos, geralmente vinculado a temas culturais, identitários e reconhecimento social e político e 2) o papel dos movimentos societários na institucionalização da diversidade cultural (PEREIRA, 2007, p. 433).

A ideia de democracia participativa no modelo do Sul está associada a “um projeto de inclusão social e de inovação cultural que se coloca como tentativa de instituição de uma nova soberania democrática” (SANTOS; AVRITZER, 2003, p. 58) Ou seja, a participação é vista como essencial para “incluir” aqueles atores sociais que foram deixados à margem ou excluídos do processo democrático nos modelos tradicionais, sobretudo, são as chamadas

8

De acordo Pereira (2007, p. 421-451), há a distinção de modelos participativos do Norte e do Sul, sendo este último ancorado em autores da América Latina, que guardam similaridades entre si, sobretudo, a questão das recentes democracias instaladas pós-regimes ditatoriais.

“minorias” identitárias, que historicamente foram subjugadas pelos colonialismos e autoritarismos (PEREIRA, 2007).

Acredito, portanto, que o modelo participativo, seja ele do Norte ou do Sul (PEREIRA, 2007), pretende romper com a concepção de participação apenas em períodos eleitorais, sendo necessárias outras formas de participação na vida política e a instituição de novos espaços públicos capazes de promover as experiências participativas.

Uma crítica feita por Pereira (2007) ao modelo participativo do Sul é que alguns autores (SANTOS; AVRITZER, 2003), apesar de falarem em democracia participativa, abordam de modo explícito ou implícito a deliberação. Nesse sentido, o autor os distingue em teóricos participativos deliberativos. Como aponta Pereira, é interessante observar que mesmo no livro organizado por Santos (2003), no qual há textos de Avritzer (2003) sobre democracia participativa, encontram-se sinais, algumas vezes claros, outros interpretáveis, de processos deliberativos que ocorrem em contextos que, certamente, não se encaixariam no modelo deliberativo (PEREIRA, 2007, p. 437).

Assim, algumas das referências sobre conselhos trabalham à luz da democracia participativa, mas com elementos de deliberação (AVRITZER, 2003; DAGNINO, 2006); já outros teóricos analisam a participação sobre o prisma da democracia deliberativa. (BORGES, 2013; GOMES, 2011; MAIA, R., 2011; MARQUES, F., 2008). Nesse sentido, Maia, R. (2011) diz que os autores filiados à tradição da democracia participativa preocupam-se com novas formas de institucionalidade capazes de conferir um caráter formal às demandas oriundas dos atores civis. No entanto, ao descrever a concepção de participação à luz da democracia participativa, a autora cita elementos deliberativos.

Buscam pensar em formas de se assegurar uma participação empoderada, concebida, sobretudo, como participação sustentada por incentivos institucionais e por proteções contra vulnerabilidades econômicas ou contra outros poderes coercitivos. Preocupam-se, assim, não só em expandir a esfera pública para que todos tenham voz – entendendo “voz” como instrumento que torna os cidadãos mais potentes (empowered) – mas, também, em aperfeiçoar e imaginar desenhos institucionais, com especificações sobre quem exatamente deve deliberar, onde, quando e como (MAIA, R., 2011, p. 66).

Nessa conjuntura, cabe analisar qual o papel da participação, segundo a visão dos deliberacionistas.