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Departamento de Taquigrafia 83.s Sessão Ordinária 26 de outubro de 2004 disponível no site da Assem­ bléia Estadual (RS).

No documento A previdência injusta.pdf (páginas 129-132)

Algumas pessoas enxergam isso como problema meramente de contabilidade, que seria resolvido com uma transferência de dinheiro do INSS para o sistema

O SERVIDOR NÃO PODE FAZER GREVE, FICA À MERCÊ DO GOVERNO PARA RECEBER REAJUSTE

85 Departamento de Taquigrafia 83.s Sessão Ordinária 26 de outubro de 2004 disponível no site da Assem­ bléia Estadual (RS).

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Entre todos os políticos, talvez os casos mais chamativos sejam os dos ex- governadores. Conforme um levantamento de 0 Estado de S. Paulo y das 27 uni­ dades da federação, 17 pagam aposentadorias e pensões vitalícias não só a ex-governadores, mas, também, às suas viúvas. Algumas pessoas recebem até duas vezes. Sete Estados (AL, BA, MT, PE, PI, RJ e RN) extinguiram a con­ cessão do benefício, mas os que foram beneficiados continuam ganhando até hoje. São Paulo, Amapá, Tocantins e o Distrito Federal são os únicos que não concedem aposentadorias a ex-governadores. Os mais numerosos são Mato Grosso, com 17 beneficiados, e Paraíba, com 16 beneficiados.

Entre os casos destacados pela imprensa no final de 2006, início de 200786, estão:

• Lúcio Alcântara, ex-governador do Ceará, requereu aposentadoria mesmo depois de a Assembléia Legislativa ter aprovado, em 2006, uma emenda constitucional que extinguiu o benefícios/a terceira vez. Detalhe: Alcântara enviou seu pedido da Europa, onde passava férias. Caso aceito, o valor seria de RS 10,3 mil.

• José Adauto Bezerra recebe aposentadoria há 28 anos após governar Ceará durante três anos na década de 1970. Bezerra é vice-presidente geral do Bicbanco, um dos dez maiores bancos privados brasileiros. Bezerra também é do PFL, partido que — como veremos mais à frente — rejeita “qualquer proposta de desenvolvimento que transfira para um futuro distante e indefi­ nido a redução das desigualdades sociais”.

• Francisco Aguiar, governador do Ceará por apenas 83 dias no final de 1994, tem aposentadoria de RS 22 mil.

• Pedro Pedrossian recebe dois benefícios, por ser ex-governador do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, somando quase RS 36 mil.

• Marília Pinheiro, ex-companheira do Leonel Brizola, ex-governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, herdou dois benefícios — total de RS 26,1 mil.

86 Fontes para valores - Pedrossian, Folha de S.Paulo, 22 de dezembro de 2006; Brizola, Carta Capital, 10 de dezembro de 2006; Alcântara, Bezerra e Aguiar. O Globo. 25 de janeiro de 2007. Bezerra, detalhes adicionais do

Mas é correto observar: nem sempre os ex-governadores reivindicam apo­ sentadoria, aparentemente por entender que nem todos os segmentos do eleito­ rado acham correto. Entre os que abriram mão, estão Tasso Jereissati e Ciro Gomes, do Ceará; Anthony Garotinho, do Rio de Janeiro, e Pedro Simon, do Rio Grande do Sul, que recusou aposentadoria como ex-governador e deputado estadual, e disse: “Há momentos em que não podemos ficar esperando pela mudança das leis. Embora a legislação permita, fiz o que minha consciência mandou. Sou senador da República e ganho como tal, por isso não considero justo receber as duas aposentadorias a que teria direito”.

Na sestatais, a c o n t a t a m b é m éd o p o v o...

A situação das aposentadorias nas empresas estatais é tecnicamente muito diferente da dos políticos, dos servidores, ou do INSS. Mas, ao abordar questões de previdência pela ótica do uso do dinheiro público e da justiça social, as esta­ tais devem ser incluídas.

A maioria das estatais tem o que se chama de sistemas fechados de previ­ dência complementar. O que quer dizer isso? Basicamente, é quando uma em­ presa ou grupo de empresas cria seu próprio fundo, só para seus funcionários e fechado ao público em geral. Os trabalhadores e as empresas contribuem, o di­ nheiro fica investido, rendendo juros, e os trabalhadores recebem uma aposen­ tadoria adicional, além da do INSS, para o qual também contribuem.

Em princípio, isso não seria relevante à nossa discussão sobre justiça social. Se uma empresa privada criar um beneficio para seus empregados, não há problema — desde que haja concorrência naquele setor. O custo do beneficio aumenta os gastos da empresa e, portanto, o custo do seu produto, e cabe aos consumidores avaliar se querem pagar o preço ligeiramente mais alto, ou mudar e comprar o produto da concorrente. Chama-se “economia de livre mercado”. O problema vem quando a sociedade fica obrigada a saldar a conta, querendo ou não. Isso pode acontecer de várias maneiras, algumas delas bastante escondidas.

Digamos, por exemplo, que uma empresa estatal de água criasse um plano supergeneroso para seus empregados — com aposentadoria alta, às vezes in­ tegral, igual ao salário final, em troca de contribuição baixa — e enfiasse a maior parte do custo na conta dos consumidores. E uma empresa monopolis­ ta, sem concorrentes. Todas as famílias daquele Estado ficariam sem opção:

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pagariam ou ficariam sem água. E a grande ironia é que raramente as pessoas obrigadas a pagar desfrutam de um benefício tão generoso.

Outra maneira que uma estatal poderia passar a conta para a sociedade seria gastar mais com benefícios, ficar com menos dinheiro para investir e receber injeções de dinheiro público. Ou isso, ou cortar investimentos e deixar a socie­ dade com serviços piores.

Hoje em dia, tais artifícios são teoricamente mais difíceis. O governo au­ mentou a fiscalização sobre a área da previdência complementar, tanto para empresas estatais quanto privadas, e se trata — teoricamente — de um proble­ ma do passado. As estatais agora estão proibidas de contribuir para os fundos de aposentadoria além de R$ 1 para cada R$ 1 contribuído pelos funcionários — uma restrição importante, dado que no passado, segundo o economista carioca Gilberto Ramos, houve caso de estatal contribuir até sete vezes mais que seus funcionários. E os planos devem mudar de “beneficio definido” para “contribui­ ção definida”, o que reduz bastante a possibilidade de rombo. Mas nem todas as estatais têm se mostrado ágeis em respeitar as novas regras, alguns sindicatos de funcionários conseguiram bloquear as reformas na Justiça — e a herança do passado continua bem viva.

No início de 2005, a Petrobras anunciou que iria cobrir um rombo de nada menos que R$ 8,3 bilhões no Petros, fundo de previdência fechada de seus em­ pregados. Segundo Suely Caldas, uma das jornalistas que mais acompanham o assunto da previdência, isso elevaria o total dos rombos naquele fundo, cobertos pela Petrobras nos últimos sete anos, ao impressionante montante de R$ 18,6 bilhões, “...que bem poderiam parar nos cofres do Tesouro e ser aplicados em programas sociais e investimentos, mas privilegiaram apenas 91 mil passivos funcionários da estatal, ativos e aposentados.”87

Agora, R$ 18,6 bilhões para beneficiar 91 mil felizardos dão exatos R$ 204 mil para cada um — um subsídio de R$ 500 por pessoa por mês durante 30 anos. Honestamente, é difícil imaginar um fundo de previdência fechada que crie um rombo atuarial desta magnitude para cada participante.

Mas a Petrobras tem concorrentes. Quem não gosta do posto BR pode ir ao posto Shell, ou Texaco, por exemplo. Então, será que é relevante, caso a Petrobras

87 Também neste momento, a Petrobras anunciou que iria cobrir outro rombo, este de RS 5 bilhões, no plano

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