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4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.3 Desacordo e desconhecimento do produto e da marca

Fineman (2014) defendeu que a mensagem que as marcas por vezes tentam transmitir estão em desacordo com o produto, nomeadamente no que toca a produtos de beleza. Foi possível comprovar esta ideia, uma vez que a grande maioria das referências codificadas na categoria “Desacordo com o Produto Vendido” correspondem à campanha B e C, à Dove e à Gillette Venus, marcas que vendem produtos de beleza. As

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marcas são acusadas de difundirem uma mensagem que vai contra ao produto que estão a vender. No que toca à Dove, os consumidores justificam o desacordo da mensagem da campanha com o produto afirmando que, apesar de tentar apelar à beleza real das mulheres, a marca tira partido das inseguranças das mesmas para venderem produtos de beleza. Este desacordo com o produto vendido vai de encontro à capitalização da tendência do femvertising que foi referida anteriormente. Esta atitude dos consumidores perante o desacordo da campanha com o produto e consequente falta de genuinidade por parte da marca é ilustrado pelo comentário: “this is pretty ironic if you think about it, seeing as dove is trying to convey that everyone is beautiful, yet they make millions off of selling beauty products...” (B:12:Desacordo com o produto vendido)

A grande maioria das referências codificadas na categoria “Desacordo com o Produto Vendido” pertencem à campanha da Gillette Venus (ver figura 18). A campanha tenta transmitir que, desde muito cedo, as meninas são rotuladas e expostas a padrões que não permitem que estas desfrutem de todas as suas qualidades. A marca incentiva as mulheres a livrarem-se das “caixas” onde foram inseridas e a serem elas mesmas independentemente das limitações que lhes são impostas, nomeadamente relacionadas com os papéis de género. Uma das principais críticas por parte dos consumidores passa pelo facto de a Gillette Venus vender produtos de depilação, sendo que muitos consumidores consideram a depilação um rótulo e um padrão imposto ao sexo feminino. Apesar da campanha da Gillette Venus ser a campanha mais bem- sucedida no que toca à ligação emocional com os consumidores, é também a campanha mais acusada pelos consumidores de incoerência no que toca ao produto e à mensagem. Esta crítica é justificada pelo comentário: “This is ridiculous. I mean, it is a nice campaign, but it's ironical that it exists coming from a brand that sells shaving products. Women can be anything they want IF they shave their bodies. That's basically what you guys are selling. You guys are saying no woman has to live under the labels society shoves down our throats while making money from one of the biggest labels of all times. That is disgusting. You know what? I can be gorgeous, powerful, full of confidence AND have my beautiful legs and arm pits.” (C:17:Desacordo com o produto vendido).

Algumas marcas não se prestam à igualdade de género e um dos sinais de inautenticidade das campanhas passa pelo desacordo das mesmas com o produto vendido. É este desacordo com o produto que faz com que os consumidores tenham a ideia de exploração das empresas para com as mulheres. As marcas mais acusadas de

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exploração são as que vendem produtos de beleza. Para os consumidores não está claro como uma marca como a Dove, Pantene e Gillette Venus consegue combater os estereótipos negativos nos seus anúncios quando estão a vender um produto que em nada está de acordo com a mensagem. É importante que as marcas desenvolvam mensagens que estejam em acordo com o produto que vendem, mesmo que não estejam a vender um produto em específico na campanha. Quando estas mensagens não estão de acordo com o produto, a mensagem acaba por ser incoerente e a marca fica sujeita a acusações de ingenuidade por parte dos consumidores.

Figura 18- Frequência das referências para a categoria “Desacordo com o produto vendido” nas quatro campanhas.

Fonte: Nvivo output.

Tal como foi mencionado na revisão de literatura, a tendência do femvertising poderá trazer consequências para as marcas nomeadamente no que diz respeito ao desconhecimento por parte das audiências do produto que as marcas estão a vender (Hunley e Boyer 2015). O objetivo do femvertising passa por utilizar slogans de empowerment feminino onde a mensagem toma o lugar central e o nome da empresa e os próprios produtos vendidos ficam por referir (Stampler, 2014). Em todas as

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campanhas selecionadas, não é divulgado nenhum produto em específico, sendo que a principal mensagem das mesmas passa pela emancipação e capacitação das mulheres. Apesar de não serem comunicadas características e qualidades de um produto específico, na análise de conteúdo dos comentários do Youtube os consumidores revelaram conhecimento acerca dos produtos vendidos pelas marcas A, B, C e D, contrariando o que foi defendido por Hunley e Boyer (2015). Tal pode ser justificado pelo posicionamento que as marcas ocupam no mercado. Apenas foram codificadas 2 referências na categoria, 1 na campanha A e 1 na campanha B.

No focus group, o ponto de vista de Hunley e Boyer (2015) foi confirmado, uma vez que alguns entrevistados desconheciam produtos vendidos nomeadamente pela marca Always. Para além de desconhecerem o produto, os entrevistados revelaram facilidade no esquecimento das marcas por detrás destas campanhas. Todos eles conheciam campanhas similares mas revelaram que não se recordavam da marca: “Não sei até que ponto me lembraria destas marcas daqui a uns tempos. Acho que apenas me lembraria da mensagem” (Entrevistado 5). Há assim uma lembrança da mensagem mas um desconhecimento da marca e consequentemente do produto. Apesar de todos os entrevistados conhecerem a maioria das marcas correspondentes às campanhas analisadas, grande parte afirmou que uma melhor demonstração do produto poderia influenciar a sua decisão de compra. Outros entrevistados defenderam ser irrelevante uma melhor demonstração do produto tendo em conta o posicionamento das marcas em questão e a importância de focar apenas a mensagem: “Para mim, uma maior demonstração de produto era irrelevante. Estas marcas são bastante conceituadas e acabam por não ter necessidade de mostrar um produto em concreto.” (Entrevistado 4); “Estas campanhas pretendem abranger todo o tipo de pessoas. O facto de não mostrarem nenhum produto em específico acaba por ser positivo porque nem todos os produtos funcionam para toda a gente. E assim não há comentários negativos relativamente ao produto e a mensagem acaba por ser o foco principal.” (Entrevistado 1).

É possível concluir que o sucesso de uma campanha publicitária que adote o empowerment feminino dependente do posicionamento da marca. Tendo em conta que nenhuma destas campanhas vende um produto em específico, é crucial que a tendência seja adotada por marcas já conceituadas para um melhor reconhecimento não só da mensagem mas também da marca e do produto. Apesar de a mensagem ser o foco principal das campanhas, as marcas que informarem e capacitarem os seus produtos vão

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conseguir satisfazer as necessidades do consumidor e apoiar a causa. No entanto, é necessário que o produto, tal como foi visto anteriormente, esteja em concordância com a mensagem que a marca está a transmitir, ou, tal como foi defendido no focus group, a mensagem deixará de ser o foco principal e comentários negativos irão surgir acerca da falta de inautenticidade da marca.