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4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.4 Perceção de valores feministas nas campanhas

Foi possível confirmar que a tendência do femvertising torna-se perigosa para o movimento feminista, o que já teria sido defendido por Fineman (2014) e por Goldman (1992). Quando uma marca tenta passar os valores feministas da forma errada, corre o risco de objetificar o feminismo através do capitalismo do consumo.

No que toca à perceção de que a campanha transmite valores feministas, a campanha D, que corresponde à campanha da Pantene é a que mais referências codificadas tem para a categoria “Feminista” (ver figura 19): 56 utilizadores têm a perceção de que a campanha transmite valores feministas e dentro desses 56, 25 referem-se ao termo “feminista” como algo negativo enquanto que apenas 1 se refere ao termo de forma positiva. Os restantes não expressam nenhuma atitude em concreto. A campanha que reúne a maior parte das críticas na análise de conteúdo aos comentários do Youtube é a campanha que, para os consumidores, divulga valores feministas, o que confirma a falta de conhecimento e compreensão da ideologia. É possível confirmar o que anteriormente foi defendido por Simonsen (2015) através do seguinte comentário: “'Feminism' defines female empowerment as abandoning basic rules of politeness. Progress.” (D:8:Feminista)

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Figura 19- Frequência das referências para a categoria “Feminista” nas quatro campanhas.

Fonte: Nvivo output.

Na campanha da Always foram codificadas 21 referências na categoria “Feminista” (ver figura 19) sendo que apenas 3 referiram-se ao termo “feminista” de forma positiva e 10 referiam-se ao termo de forma negativa: “So feminism has been brought down to such a low level they make a campaign for "Like a girl"? This is just degrading.” (A:3:Feminista)

Na campanha da Dove e da Gillette Venus foram apenas codificadas 8 e 4 referências respetivamente sendo que na campanha C, que corresponde à Gillette Venus #Useyourand, nenhum consumidor se referiu ao termo “feminista” de forma negativa. Isto pode ser justificado pelo facto de a campanha da Gillette Venus ser a campanha mais bem-sucedida no que toca ao empowerment e a que estabeleceu uma relação mais emocional com os consumidores. Essa ligação emocional e a forma como o termo feminista é visto positivamente são ilustradas pelo seguinte comentário: “It's so inspiring! Many people just don't get that it's not JUST to sell their product or that this video is about feminism.” (C:1:Feminista)

Estes resultados foram confirmados no focus group onde os entrevistados revelaram que a palavra feminista é bastante controversa: “O feminismo é muito confundido com o termo machismo. Quando converso sobre este tema com os meus amigos eles revelam falta de conhecimento sobre o termo e pensam que defende a

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superioridade da mulher em relação ao homem.” (Entrevistado 3). Todos os entrevistados tiveram a perceção de que as campanhas tentavam divulgar valores feministas, no entanto, nem todas as campanhas foram bem-sucedidas. Os participantes revelaram que há campanhas que não conseguem fazer passar os valores da melhor forma, o que nos remete para o que anteriormente foi defendido por Fineman (2014) acerca da má compreensão por parte das empresas sobre o que é o feminismo e a confusão que a campanha irá criar no consumidor. Essa ideia foi defendida no focus group e é justificada na seguinte afirmação: “Uma coisa é querer igualdade, outra é tentar fazer com que as condições se invertam. Feminismo para mim é defender igualdade. Acabamos por ver campanhas que retratavam feminismo ao extremo como a campanha da Pantene. É uma má representação do termo. No anúncio da Gillete Venus cai por terra a tentativa de fazer passar valores feministas porque a própria Gillete separa os homens das mulheres com a vertente Gillete Venus para mulher. Estão a ser incoerentes. Dizem as mulheres para não se rotularem mas a própria marca rotula a Gillette “Venus” para mulher.” (Entrevistado 4).

Através da figura 20, é percetível a discrepância encontrada na análise dos comentários do Youtube entre os comentários positivos e negativos em relação ao termo “feminista”. Apesar de ser referente à análise de conteúdo, a figura 20 justifica o estudo do Yougov mencionado na revisão de literatura que foi posteriormente confirmado pelo focus group.

Figura 20- Distribuição das referências relativas a perceção dos consumidores sobre o feminismo na publicidade.

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Durante a análise de conteúdo dos comentários do Youtube e durante o focus group, os consumidores mostraram-se céticos na relação entre o marketing e o feminismo. Esta sinergia já teria sido criticada anteriormente por McRobbie (2009), McDonald (2000) e Curthoys (1997). No focus group os consumidores defenderam a mesma ideia de Curthoys (1997) quando afirmaram que algumas marcas distorcem o verdadeiro significado da ideologia procurando combinar elementos da filosofia feminista em função do capitalismo de consumo.

Tal como foi defendido por Caterrall et al. (2005), o género nem sempre é bem conceptualizado no marketing devido à facilidade de interpretações díspares entre os consumidores. O feminismo, tal como a maioria das ideologias, não possui um conjunto de princípios orientadores universais (Whelehan, 1995). Na análise de conteúdo aos comentários do Youtube foi possível compreender a diferença com que cada indivíduo interpreta o termo e consequentemente a campanha. Criar uma campanha de marketing baseada numa ideologia tão vaga é um passo arriscado para as marcas, uma vez que vai ser muito difícil de prever o comportamento do consumidor face a esse estímulo publicitário. Mesmo que as marcas não utilizem termos como o feminismo nas suas campanhas, é necessário que façam uma pesquisa prévia acerca dos valores defendidos pela ideologia de forma a não transmitirem a mensagem errada e confundir o consumidor. É importante que compreendam os objetivos e as componentes da ideologia nos dias de hoje para identificarem qual a audiência e o público-alvo que querem atingir.