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Desafios na institucionalização da Lei nº 10.639/03: Possibilidades e potencial de

iGreJA cAtÓlicA, eDUcAÇÃo e DiversiDADe: Dos eventos

4.1 Arranjo temático 1: Questões relativas à lei nº 10.639/

4.1.3 Desafios na institucionalização da Lei nº 10.639/03: Possibilidades e potencial de

enfrentamento ao racismo

De acordo com a questão sobre as possibilidades de desenvolvimen- to do ensino de história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas pesquisadas, a recorrência nas respostas é para a abertura das escolas à discussão dessa temática – dos onze entrevistados, sete apontam como capacidade natural dessas instituições. Essa abertura está relacionada às suas missões educativas, pois a educação católica reconhece a pluralida- de cultural e se apoia no respeito à diferença. Esses valores, conforme já foi informado, fundamentam as propostas pedagógicas das escolas pri- vadas confessionais.

O diferencial indicado pelos entrevistados CP3 e P8 foi o curso de Educação a Distância (EaD) sobre cultura afro-brasileira, oferecido pela Escola 2 a seus alunos do 7º ano, como uma oportunidade de desenvol- vimento da temática étnico-racial. CP3 salienta a utilização da tecnologia na EaD como mais uma ferramenta pedagógica, capaz de motivar os es- tudantes e ao mesmo tempo facilitar a aprendizagem. P8 pontua outras duas possibilidades de desenvolvimento da lei na Escola 2. Uma delas é o conteúdo de Ensino Religioso, que permite o professor trabalhar com os alunos o tema do fenômeno religioso, possibilitando conhecer as diversas manifestações religiosas, inclusive aquelas com origem na matriz africa- na, como o candomblé e a umbanda. Ressalta que é possível construir com os estudantes outro olhar mais crítico sobre a diversidade: “traz esse olhar crítico para o aluno que é exatamente o que a lei quer para que haja respeito à diversidade, haja respeito a um multiculturalismo que faz esse país tão bonito”. Outro aspecto apresentado como oportunidade por P8 na implementação da lei, trata-se da formação continuada. Os entrevista- dos P8 e P1 chamam a atenção para o potencial do investimento que suas respectivas escolas oferecem a seus professores, sendo espaço favorável para tornar seu conteúdo conhecido por eles. Na fala da entrevistada P6, já existem capacitações oferecidas pela Escola 2 que tratam do tema da

diversidade; por sua vez, a entrevistada P7 afirma que nesse tempo (quatro anos) em que é professora dessa escola, ainda não houve como tema para formação de professores a temática da diversidade étnico-racial.

Procurou-se identificar, por meio dos sujeitos pesquisados, de que modo a Lei nº 10.639/03 pode contribuir para o enfrentamento do racis- mo na sociedade brasileira. Primeiramente todos os entrevistados con- cordam que sim, essa lei é um instrumento na luta antirracista e explici- ta de que maneira isso pode ser defrontado.

Dois entrevistados, P1 e CP1, dizem ser necessário que a lei se con- cretize na mudança comportamental das pessoas por meio do reconhe- cimento da existência do racismo em nossa sociedade, para tanto, é pre- ciso o compromisso individual em erradicar posturas racistas.

Três entrevistadas, P2, P3 e P7, apontam para o compromisso de as respectivas escolas assumirem a implementação da temática étnico-ra- cial em seu interior, promovendo a discussão com toda a comunidade educativa e a formação continuada dos professores.

Quatro entrevistados, CP2, CP3, P5 e P6, salientam o aspecto do reconhecimento e valorização étnico-cultural como a principal forma de combate ao racismo, ao passo que P5 e P6 acreditam que os sujeitos, co- locados em relação com a diferença, acabam conhecendo outras realida- des e assim valorizá-las. Fazer com que a sociedade tome conhecimento da formação do povo brasileiro, isto é, de suas raízes, para CP2 e CP3, é a melhor forma de enfrentamento do racismo, pois impacta positiva- mente o aluno que, em vez de rejeitar a cultura afro-brasileira, passará a admirá-la: “Ele saber das origens, ele saber do ponto que foi formado, ele tem uma admiração e não uma rejeição”. P2 acompanha esse mesmo argumento: “Acho que a gente tem que conhecer, tem que valorizar”.

As questões sobre a Lei Federal nº 10.639/03 revelam os desafios no desenvolvimento da temática da diversidade étnico-racial nas escolas. O tema carrega em si as controvérsias e tensões da questão racial brasilei- ra. Outro fator importante a ser considerado trata-se das condições reais na implementação de políticas educacionais que, em sua maioria, chega até às escolas em um processo de decisão, em que determinados grupos sociais participam de sua discussão, elaboração, mas, uma vez nas escolas,

atingirão a todos, inclusive aqueles que por princípios, valores e por suas histórias de vida até mesmo não concordam com o dispositivo legal que deverão cumprir.

Destacam-se posições assinaladas pelos entrevistados quando analisam o sentido de obrigatoriedade da Lei nº 10.639/03 e de sua contribuição no combate ao racismo. A entrevistada P4 afirma que os professores po- dem criar resistência em trabalhar a temática, inclusive podendo burlar o processo de sua implementação por ser algo determinado pelo Estado, “porque aquilo ainda não tá introjetado na cultura do Brasil ou da cul- tura da educação escolar e você cria uma resistência pelo fato da imposi- ção”. Ou os docentes não concordam por não terem preparo necessário para lidar com o tema da política pública.

O estranhamento dos professores e das escolas, frente a essa legisla- ção específica, pode levá-los a questionarem o porquê de mais um con- teúdo a ser trabalhado ou o que esse tema tem a ver com o conteúdo que ministra; aos alunos, a pergunta de para quê mais um material a ser estudado, se já há tantos e de que forma será cobrado nos exames externos como o ENEM. Como conciliar o cumprimento do conteúdo exigido e acrescentar mais outro? Todas essas questões foram colocadas pelos entrevistados de acordo com a análise anterior e dialogam com Ball e Bowe (1992 apud MAINARDES, 2006), quando se trata de colocar em prática a política educacional, pois sua (re)interpretação por meio dos professores e demais profissionais da educação é um componente importante no cumprimento de sua obrigatoriedade.

O preceito legal e a realidade educacional, segundo Gomes (2001, p. 89), não caminham juntos, é na dinâmica social, no embate político, enfim, no dia a dia do chão da escola que a lei tenderá a ser legitimada ou não.

4.2 Arranjo temático 2: Questões relativas ao campo