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Descentralização da gestão pública

No documento Orçamento participativo (páginas 81-84)

Para o cidadão, o lado do orçamento público mais importante e visível é o da despesa, pois através dela se evidencia a eficiência, eficácia e efetividade da administração pública.

Gleisi H. Neves67 acrescenta que não existe uma fórmula pronta para encontrar o grau adequado de descentralização, apontando para a necessidade de encontrar uma combinação satisfatória dos vetores supracitados, a saber:

A eficiência diz respeito, principalmente, ao aproveitamento racional dos recursos humanos, materiais e financeiros disponíveis; a obtenção e uso de recursos adicionais e à redução os custos e à agilização da Administração. A eficácia, por sua vez, guarda relação mais íntima com a consecução de objetivos e resultados estabelecidos pela prefeitura em termos da ampliação da oferta e melhoria da qualidade dos serviços prestados à população. A efetividade está ligada à relevância e utilidade social das ações empreendidas, ao grau que a Administração atinge de percepção e satisfação das expectativas, anseios e necessidades da população.68

A eficiência na administração dos recursos públicos é indispensável para o desenvolvimento das atividades e o cumprimento da função do município de atender às necessidades da sociedade e elevar a qualidade de vida dos munícipes. Ocorre que, na verdade, não há critério objetivo para se evidenciar quando existe preocupação com uma maior eficiência dos gastos municipais ou se através dos mesmos resultam serviços adequados (eficácia) e ainda se os munícipes encontram-se satisfeitos com os serviços municipais (efetividade).

Pelo fato de as decisões acerca do gasto do dinheiro público serem tomadas distantes da participação popular, a despesa pública corresponde pouco às necessidades coletivas, desvirtuando-se, desviando-se ou mesmo não atingindo o requisito de validade, denominado de utilidade. Para Ladislau Dowbor,

quando as decisões são tomadas muito longe do cidadão, correspondem muito pouco às suas necessidades. Assim, a dramática centralização do poder político e econômico que caracteriza a nossa forma de organização como sociedade leva, em última instância, a um divórcio profundo entre as nossas necessidades e o conteúdo das decisões sobre o desenvolvimento econômico e social.69

Segundo o autor, não se pode negar "a multiplicação de leis que favorecem a sociedade, mas que simplesmente não se aplicam, pois o poder real se desloca para foros informais".70 Assim, resta saber como fazer para que não haja um distanciamento tão grande

67 NEVES, Gleisi H. Op. cit. p.37. 68 Id. Ibid., p. 38.

69 DOWBOR Ladislau. O que é poder local. São Paulo: Brasiliense, 1999, p. 16. 70 Id ibid., p. 17.

entre a satisfação das necessidades sociais e o gasto público, entre as necessidades coletivas e o conteúdo das decisões sobre o desenvolvimento econômico e social?

Certo é que as despesas públicas têm crescido sem que, no entanto, questões sociais sejam resolvidas. Apenas exemplificando: somos um país cujas condições para a produção agropecuária são extremamente favoráveis, mas metade da nossa população é subnutrida; o essencial do aparelho produtivo industrial do país concentra-se em três ou quatro cidades, aumentando as favelas, a pobreza, o êxodo rural, a concentração de renda, isto sem falar das várias outras questões que igualmente reclamam uma intervenção urgente, como o esgotamento da vida dos mares, o envenenamento químico do solo e da água, a destruição da camada de ozônio, o aquecimento global, dentre tantas outras questões que decorrem da própria natureza humana predatória, de forma que o gasto público venha como resposta eficaz aos problemas citados, que são crescentes e assustadores. Como diz Ladislau Dowbor,

A grande questão aqui não é privatização ou estatização, e sim, conforme vimos, o enriquecimento da densidade de organização social do espaço que compartilhamos nas cidades (...) E não se trata de mais ou menos Estado: Trata-se de um Estado mais próximo e mais controlado pela própria

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Não se pode ficar passivos frente aos problemas, esperando que a resposta venha com uma idéia de privatização e, tampouco, numa visão estatizante, pois ambas são ineficazes frente à gravidade e urgência da realidade que se apresenta.

No Brasil, até recentemente, predominou na administração pública um desequilíbrio financeiro, ou seja, gastos sistematicamente superiores às receitas, gerando conseqüências negativas para Estados e municípios, e, em alguns casos, tendo impacto sobre mais de uma geração.

Fato que se constata é que há desperdício, além de casos em que os administradores não sabem quanto, como, onde e porquê estão gastando; as necessidades públicas cada vez aumentam, o que não ocorre com relação aos recursos disponíveis. A Lei da Responsabilidade Fiscal surgiu num momento histórico, em que denúncias de irregularidades surgiam em todo o país, gerando clima de indignação nos segmentos sociais. A população, informada pelos

71 DOWBOR Ladislau. A reprodução social, propostas para uma gestão descentralizada. 2.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999, 304 p.

meios de comunicação, demonstrava insatisfação com os métodos arraigados no exercício da função pública, cobrando medidas saneadoras, revoltando-se contra a impunidade e tomando- se vigilante, não havendo mais lugar para aventuras na administração.

Segundo Edson Jacinto Silva,

A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece várias sanções institucionais e pessoais, e entre as sanções institucionais tem a suspensão das transferências voluntárias para aquele governo que não instituir, prever e arrecadar impostos de sua competência; no caso de limites de despesas com pessoal, se as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal não forem cumpridas e enquanto não forem feitos os ajustes, ou se houver excesso no primeiro quadrimestre do último ano de mandato, ficam suspensas as transferências voluntárias, a obtenção de garantias, a contratação de operações de crédito, exceto para refinanciamento da dívida e redução de despesas com pessoal.72

Assim, foi para fazer frente a esta constatação que a previsão constitucional, em 1998, e a sua regulamentação através da edição da Lei n° 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), que se implementou uma mudança institucional e cultural na Administração Pública, principalmente no trato com o dinheiro público. Os governantes terão que otimizar os recursos disponíveis para atender demandas sociais, sob pena de responsabilização através de sanções institucionais e pessoais, que fazem parte da Lei n° 10.028/00, denominada de Lei de Crimes de Responsabilidade Fiscal, a qual prevê que os governantes poderão ser responsabilizados pessoalmente e punidos com a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de emprego público, prevendo ainda prisão e multas aos governantes.

A sociedade não tolera mais conviver com administradores irresponsáveis e hoje está cada vez mais consciente de que quem paga a conta do mau uso do dinheiro público é o cidadão.

No documento Orçamento participativo (páginas 81-84)