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3. FEDERALISMO, DESCENTRALIZAÇÃO E REGIME DE COLABORAÇÃO NO

3.3 DESCENTRALIZAÇÃO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS: O QUADRO

O conceito de “descentralização” é polissêmico e pode variar acordo com as orientações político-administrativas que amparam as ações governamentais. Desta forma pela definição de Abrúcio (2006, p.78):

“[...] descentralização é um processo nitidamente político, circunscrito a um Estado nacional, que resulta da transferência (ou conquista) efetiva a governos subnacionais, que: (a) adquirem autonomia para escolher seus governantes e legisladores; (b) para comandar diretamente sua administração; (c) para elaborar uma legislação referente às competências que lhe cabem; e por fim (d) para cuidar da sua estrutura tributária e financeira”.

É possível identificar alguns processos que são comumente confundidos com a descentralização por apresentarem algumas características similares, mas que não atendem ao conjunto total de especificidades do conceito como: (1) a delegação de funções por parte da esfera de governo a órgãos ou instituições estatais para exercerem, com alguma autonomia, determinadas funções ou desenvolver ações e (2) a desconcentração de funções que opera por meio do repasse de atribuições de uma esfera governamental para outra. Esses processos podem ser encarados como parte de uma política descentralizadora, porém, quando adotados de forma isolada, não podem ser caracterizados como descentralização. (GOHN, 2007)

Partindo de uma perspectiva histórica, é possível afirmar que a formação dos Estados Modernos foi caracterizada pelo crescente fortalecimento do poder central

com a intenção de preservar sua indivisibilidade. Qualquer menção a alguma posição de descentralização, sempre era vista como algo negativo e desestabilizador do poder soberano e da autonomia.

Essa visão de Estado Nacional forte alcançou grande visibilidade, no século XX, com o fortalecimento do Estado de Bem Estar Social (Welfare State) nos Estados Unidos e grande parte da Europa. Este modelo foi responsável pelo resgate do desenvolvimento econômico e social na Europa que se encontrava devastada pela 2ª guerra mundial.

Ocorre que, paradoxalmente, esta consolidação do Estado do Bem Estar Social, é vista também, como um dos pontos de partida para o início de movimentos de descentralização na gestão de políticas sociais; isto porque, o modelo de Estado Provedor era muito centralizado, mas, ao se expandir, terminou por promover movimentos reivindicatórios por parte da sociedade carente de ações e programas sociais.

Com a crise aguda do Petróleo - na década de 1970 - e a chegada ao poder de governantes conservadores - no início dos anos 1980 - tanto nos Estados Unidos como na Europa (Ronald Reagan nos EUA 1981-1989 e Margaret Thatcher na Inglaterra 1979-1990), este modelo estatal é colocado em xeque, marcando, de forma emblemática, o início de uma política feroz de combate ao Estado Provedor. Foi assumida, claramente, a opção pelo neoliberalismo de desenvolvimento e organização das instituições político-administrativas, tendo o mercado como agente mediador e regulador da sociedade.

O “Estado Providência” foi escolhido como principal culpado pela crise, faltava agora se achar um salvador e para isto foi “eleito” o neoliberalismo que tinha como símbolos o Estado mínimo e o mercado, que deveriam funcionar como agentes regulatórios (e como redenção) das forças produtivas e sociais.

Foi uma reação conservadora, que trouxe a ideia de Estado mínimo e não intervenção estatal, em prol da liberdade individual e da competição entre os agentes econômicos, como forma de prosperidade econômica. A única forma de regulação aceitável era aquela feita pelas forças do mercado.

Ao Estado caberia garantir a ordem e a legalidade, além de concentrar seu papel executivo nos serviços mínimos necessários: policiamento, forças armadas, poderes executivo, legislativo e judiciário etc. Abrindo mão, portanto, de toda e qualquer forma de atuação econômica direta, como é o caso das empresas estatais.

A concepção de Estado mínimo surge como reação ao padrão de acumulação vigente durante grande parte do século XX, em que o poder estatal financiava não só a acumulação do capital, mas também a reprodução da força de trabalho por meio das diversas políticas sociais. (SILVA JR., 2002)

Desta forma foi preciso achar um culpado para a crise que se avultava sobre os países capitalistas; e nesta busca, além de se culpar o próprio Estado Nacional, se passou também para a defesa dos postulados neoliberais na orientação das ações públicas e estatais; ou seja, Estado reduzido e o mercado livre regulando as relações sociais com privatizações e enxugamento da máquina estatal, entre tantas outras medidas que vieram a ser tomadas para “solucionar” a crise do capitalismo.

Quando pensamos em termos de Brasil observamos que este modelo chega com muita força no início dos anos 1990 a partir da chegada de Fernando Collor de Melo à Presidência da República (1990-1992) e se consolida fortemente no contexto da administração pública brasileira nos governos Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

O governo FHC assumiu o modelo neoliberal como organizador da administração pública e levou o País a assistir a responsabilização do aparato estatal por quase tudo que havia de errado para justificar a adoção de medidas como: privatização, demissões de servidores públicos, ajustes no orçamento, enxugamento da máquina pública, interrupção de concursos públicos, adoção do controle do gasto público como instrumento de combate à inflação, mercantilização dos serviços públicos, terceirizações, entre outras, como redentoras do nosso país.

Iniciativas que se mostraram, com o passar do tempo, pouco eficientes e/ou incapazes de melhorar a oferta dos serviços públicos e diminuir às desigualdades sociais. O mercado também não se mostrou eficiente na medida em que não conseguiu garantir a produtividade, sustentar o nível de empregos e melhorar os salários; neste ponto a “mão invisível” sentiu falta do “braço forte” do Estado.

Como se sabe, tal modelo, de uma forma ou de outra, foi adotado em vários países, indiscriminadamente, como a solução para a crise do capital nos anos 1980/1990. Isto impactou diretamente sobre os alicerces do Estado brasileiro e, consequentemente, na gestão pública, principalmente no que diz respeito à condução de políticas sociais.

Foi neste período que estas matrizes neoliberais foram aprofundadas e alçadas à condição norteadoras das ações administrativas e das políticas e/ou

programas governamentais, refletindo significativamente no campo da educação como um todo, e com repercussões significativas até os dias de hoje.

O governo brasileiro vendeu a ideia de que era necessário atacar o próprio aparato estatal e diminuir seu tamanho, como solução para uma crise de proporções globais, que se propagava rapidamente fora do país e que estava intrinsecamente ligada a um esgotamento do próprio sistema capitalista.

O discurso da descentralização, no Brasil, ganhou força justamente porque foi difundido como solução para esta crise do capital, em associação direta com democratização da gestão pública. Isto a partir de um fortalecimento do federalismo, que dava a entender que descentralizar significaria democratizar, fortalecer os demais entes federados e trazer maior eficiência, eficácia, efetividade21 sobre os gastos sociais, além de promover a participação da sociedade no controle e fiscalização sobre a alocação destes recursos exigindo, como contrapartida das esferas subnacionais, mais transparência sobre os gastos com os serviços públicos. (ABRÚCIO, 2006)

A ideia, em favor da descentralização, é de que a proximidade entre os governos subnacionais e os cidadãos proporcionaria melhores condições de controle social com participação da sociedade no acompanhamento dos gastos públicos, por meio de canais institucionais como os conselhos gestores.

Acontece que o Brasil ainda tinha muito por avançar do ponto de vista sociopolítico e no amadurecimento democrático da sociedade para combater às grandes desigualdades sociais. Logo se percebeu que apenas transferir responsabilidades, pela oferta de serviços públicos, não seria suficiente para que os mesmos atingissem patamares aceitáveis de acesso e qualidade para satisfazer necessidades da população brasileira.

Setores do governo pensaram, ao transferir a responsabilidade da oferta dos serviços públicos para estados e municípios, aproximaria os programas sociais dos seus beneficiários. Nesta perspectiva, acreditavam que essa aproximação facilitaria a operacionalização dos processos administrativos e contribuiria para o aperfeiçoamento dos resultados. A União - na verdade - queria ficar livre da provisão e execução direta dos serviços públicos e o caminho mais confortável - naquele momento - era adotar mecanismos de repasses desses serviços para as esferas

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subnacionais, financiando, por meio da redistribuição da arrecadação dos diversos impostos e, ainda, se livrando dos custos políticos de ofertar serviços de baixa qualidade. (ARRETCHE, 2004)

Essa lógica pode até ter algum sentido, porém se desconsiderou, por exemplo, as grandes desigualdades regionais e sociais; a fragilidade institucional das burocracias locais (em especial as dos pequenos municípios); a pouca tradição da população em participar e acompanhar as políticas sociais no País; a baixa escolaridade da maioria da população; os custos de oportunidade do cidadão em participar do acompanhamento da gestão local das políticas sociais e a pouca familiaridade da sociedade brasileira com o regime democrático recém-instaurado.

A preocupação central do Governo Federal, na época, foi com a reforma do Estado e com a reformulação das políticas e programas sociais, a partir das diretrizes das organizações multilaterais (Banco Mundial, FMI, BID, entre outras). Essas instituições impuseram medidas e práticas neoliberais para a gestão pública aos países em desenvolvimento e o Brasil não fugiu destas orientações, sobretudo a partir do governo Fernando Collor (1991/1992), quando foram dados os primeiros passos em direção da reforma administrativa do Estado que foi consolidada no período FHC (1995/2002).

Foram criadas expectativas demasiadamente positivas a respeito dos desdobramentos da descentralização no contexto do federalismo brasileiro. É importante lembrar que, mesmo sob o discurso da ampliação da descentralização das políticas educacionais, no contexto da CF/1988, a Esfera Federal manteve em seu poder o controle sobre decisões estratégicas e planejamento das ações dessas políticas, sob algumas diretrizes de gestão inspiradas em premissas neoliberais. A descentralização no Brasil, na maioria dos casos, se restringiu a repasses de recursos, serviços e transferência de responsabilidades sobre a execução de programas definidos de forma centralizada pela União, na maioria das vezes, em função dos seus próprios interesses. (REZENDE, 2000; DINIZ, 2001).

Ainda em relação ao período dos governos FHC, Azevedo (2002, p. 54) esclarece:

“[...] a descentralização é difundida como um poderoso mecanismo para corrigir as desigualdades educacionais, por meio da otimização dos gastos públicos. Apesar de os postulados democráticos serem recorrentemente reafirmados, estes se apresentam como justificativas da transferência de competências da esfera central do poder para as locais, respaldadas em

orientações neoliberais, com o objetivo de redução do Estado as suas funções mínimas”.

A descentralização que foi propagada como resultado do resgate do federalismo e o caminho necessário para a consolidação da democracia no País, na verdade, se mostrou como uma estratégia de desconcentração da execução e oferta de programas sociais por parte da União. Esse movimento em relação à educação se mostrou como uma estratégia do Governo Federal para consolidar, de uma vez por todas, o repasse da oferta de ensino básico (fundamental e médio) para as esferas subnacionais, aliviando desta maneira, sua responsabilidade em atuar diretamente nesta etapa da educação.

É fato que a descentralização se desenvolveu no contexto de retomada do federalismo a partir do fim do regime militar autoritário (1964-1985), mas, é importante frisar que esse regime no Brasil foi erguido de forma assimétrica entre os entes federados. Não existiu equidade em relação à distribuição de recursos arrecadados sobre tributos e impostos, e consequentemente faltou equilíbrio também na divisão do poder sobre o planejamento e a formulação das políticas e programas sociais. (ARRETCHE, 1999)

Em relação à educação, o que se viu na prática foi o fortalecimento do poder federal sobre os demais entes federados e o aumento das transferências de atribuições sobre a execução das políticas e programas educacionais. A descentralização terminou por sobrecarregar as esferas subnacionais (principalmente municípios) que foram “convidadas a aderir” às diretrizes determinadas pela União, no sentido de se tornarem responsáveis pela oferta direta dos serviços educacionais recebendo repasses federais relativos aos recursos da educação e linhas de crédito para investimentos disponibilizados pela União.

No caso brasileiro o modelo de descentralização das políticas sociais se propôs a atender a cinco pré-condições: (1) construção de um pacto nacional; (2) combate às desigualdades regionais; (3) montagem de boas estruturas administrativas no plano nacional; (4) democratização dos governos locais e (5) criação de um ambiente intergovernamental positivo. (ABRÚCIO, 2006).

É preciso atentar que havia a necessidade de se articular um ambiente político que diminuísse os conflitos entre as esferas de governo para diminuir os riscos do modelo de descentralização naufragar por conta de determinadas disputas

em torno do poder político e fiscal. A descentralização foi encarada como sinônimo de democratização da gestão pública, em face do amplo período que o Brasil esteve sob o jugo do regime autoritário, mas é preciso ter uma boa dose de cautela ao associar de forma inequívoca estes dois fenômenos. (ABRÚCIO, 2006).

Com o modelo descentralizador na gestão pública, veio também a Lei de Responsabilidade Fiscal22 que forçou as esferas governamentais a adequarem seus gastos à sua própria capacidade de arrecadação, fazendo com que suas gestões locais adquirissem uma postura responsável sobre os gastos públicos.

Os governantes locais, a partir desta lei, não poderiam mais comprometer suas finanças com excesso de gastos -com pessoal e com a máquina pública- por que foram obrigados a obedecer aos percentuais orçamentários destinados para este fim pela LRF/1996, trazendo mais racionalização para os gastos públicos e equilíbrio fiscal.

Este modelo de descentralização exige grande articulação federativa para ser posto em prática e para isto é imprescindível que a administração pública ofereça condições institucionais adequadas e estabilidade jurídica para a burocracia governamental, como instrumentos para a implementação deste modelo. É fato que isso não ocorreu nos governos Sarney (1985-1989), Collor (1990-1992) e Itamar (1992-1994) que se caracterizaram por muitas instabilidades políticas, constantes mudanças de ministros e modificações nas diretrizes das políticas públicas.

No primeiro governo FHC (1995-1999) as condições políticas foram mais favoráveis e deram estabilidade burocrática e equilíbrio fiscal necessário para garantir a agenda da descentralização em ritmo acelerado. Com isto houve uma grande adesão por parte das esferas subnacionais aos diversos programas federais.

Estados e municípios tiveram que se adaptar às exigências -para sanear suas dívidas e aumentar sua capacidade de endividamento- enxugando seus gastos

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Lei de Responsabilidade Fiscal foi criada para fiscalizar os gastos das administrações públicas das três esferas (federal, estadual e municipal), responsabilizando os governantes pelo equilíbrio fiscal das suas administrações e objetiva, ainda, cumprir o disposto no Artigo 30 da Emenda Constitucional N° 19, de 4 de junho 1998 através da a Lei Complementar N° 101/2000 onde visa estabelecer normas de finanças públicas, em todas as esferas de governo, voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, (como mostra em seu Artigo 1º,seus parágrafos e incisos) incluindo a dívida Pública externa e interna, a concessão de garantias pelas entidades públicas, a emissão e o resgate de títulos da dívida pública, bem como os orçamentos, todos previstos no Capítulo II do Título VI da Constituição Federal.

públicos como única maneira de conseguirem ter acesso a novos financiamentos e renegociações de dívidas junto ao tesouro nacional23.

A descentralização ainda contribuiu para o amadurecimento de instituições políticas locais ao incentivar a participação da sociedade civil organizada em processos de acompanhamento e fiscalização dos programas sociais. Também trouxe, para agenda governamental, questões para serem discutidas nas esferas locais como: cidadania, participação, desigualdade, exclusão social e qualidade na educação. (ARRETCHE, 2002)

Em relação à agenda educacional, especificamente, a descentralização fortaleceu a inserção das discussões sobre gestão democrática, controle social e participação da sociedade, como canais importantes para se alcançar mais qualidade no ensino oferecido e assim elevar a aprendizagem dos estudantes. Apesar de existirem argumentos desfavoráveis, é importante considerar estas observações como contribuições para os ajustes necessários ao aprimoramento do modelo de gestão democrática na educação com participação da sociedade, e não como fonte de defesa de gestões centralizadoras.

Muitas dessas críticas ou reservas à descentralização estão diretamente associadas ao quadro em que o federalismo brasileiro foi erguido com grande desequilíbrio em relação à distribuição da arrecadação fiscal, das competências e das atribuições dos entes federados. Isto veio a comprometer, significativamente, a autonomia das unidades subnacionais que terminaram ficando demasiadamente dependentes das articulações e interesses da Esfera Federal que, por ficar com a maior parte da arrecadação de impostos e tributos, determinava os caminhos e diretrizes das políticas e programas sociais com grande poder sobre os governantes subnacionais.

Complementando esta discussão observamos que a grande parte dos municípios brasileiros ainda não apresentava (e não apresenta) condições de gerar suas próprias receitas, de modo a garantir seus investimentos e gastos com manutenção da estrutura municipal. Além disto, se mostram, ainda hoje, bastantes vulneráveis a interferências externas, sendo mais passiveis de sucumbirem às

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Os estados e municípios, para cobrir seus desequilíbrios financeiros, tomavam dinheiro emprestado aos antigos bancos estaduais tendo o Governo Federal como avalista e assim conseguiam pagar suas contas e fazer investimentos o que aumentava a dívida pública sem qualquer controle. Com a adoção da LRF/2000 e a privatização dos bancos estaduais a fonte inesgotável de recursos se esvaziou. (ARRETCHE, 1999)

influencias das elites locais justamente por não possuírem instituições consolidadas e burocracias suficientemente profissionalizadas, principalmente àqueles com menos de 50.000 habitantes (89% do total de municípios).

O problema também consiste nas condições em que estes municípios são administrados. Normalmente caracterizados por gestões precárias, com pouco profissionalismo, clientelismo, nepotismo, ausência de transparência e baixo controle sobre os gastos públicos, além de pouca participação da sociedade no acompanhamento das políticas sociais.

É viável afirmar que no conjunto de explicações sobre implementação da descentralização no Brasil existiram variáveis políticas representadas pela necessidade do Governo Federal em repassar a oferta direta de serviços públicos para estados federativos e municípios, uma vez que ele próprio encontrava dificuldades para financiar e operacionalizar os programas sociais ao mesmo tempo.

Também existiram variáveis de caráter social com a retomada da democratização, que recolocou a sociedade civil numa posição de ator importante no processo decisório, passando a reivindicar mais participação no acompanhamento e fiscalização de programas sociais. E, por fim, podemos considerar a existência de variáveis econômicas resultantes da crise do modelo Estado do Bem Estar Social com a internacionalização da economia.

Devemos considerar outras barreiras que geraram efeitos perversos para a efetivação da descentralização no Brasil como falta de definição de competências entre as esferas governamentais, permeabilidade acentuada das burocracias locais em relação ao poder econômico e político dos vários interesses locais e pouca ou nenhuma estrutura de accountability24. Nos municípios, as esferas responsáveis pelo controle e pela publicização dos fatos (poder legislativo, poder judiciário, imprensa, entre outros) também se mostram mais suscetíveis às pressões locais do que os seus correlatos nacionais. (MELO, 1996)

A descentralização, no Brasil, também esteve associada ao processo de redemocratização consolidado ao final dos anos 1980 com a promulgação da CF/88. O processo de retomada democrática representou um considerável avanço para a

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Entende-se neste estudo accountability como a obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados e a própria sociedade civil organizada por força de mecanismos legais e legitimados juridicamente. (LUBAMBO e COELHO,2005)

consolidação do federalismo e da descentralização, com grande repercussão sobre os programas educacionais, que passaram a contar com instâncias plurais de participação que abrigam setores governamentais e da sociedade civil como é o caso dos conselhos que compõem o campo educacional.

Para que o processo de descentralização nos anos 1990 fosse consolidado - como instrumento efetivo de democratização em relação à oferta de serviços públicos - foi preciso ir além de mera redefinição de competências sobre arrecadação fiscal nos três níveis de governo (federal, estadual e municipal) e competência para ofertar os serviços públicos.

O governo FHC (1995-2002) montou uma agenda de incentivos com o objetivo de induzir (na prática obrigar) a adesão dos governos locais aos programas sociais descentralizados e, consequentemente, assumirem sozinhos, e diretamente, as responsabilidades na oferta destes serviços; especialmente nas áreas de educação e saúde, mediante os repasses de recursos federais.

Como contrapartida a este esforço, estes governos subnacionais conseguiram obter acesso com mais facilidade a financiamentos e empréstimos, além de terem possibilidade da obtenção de ganhos eleitorais por conta da oferta direta de alguns