• Nenhum resultado encontrado

Descrição e avaliação

No documento A Linguagem da Moral (diniz) - R. M. Hare.pdf (páginas 130-146)

7.1. De todos os problemas levantados pela argumentação precedente, o problema-chave é o seguinte: há dois tipos de coi­ sas que podemos dizer, por exemplo, sobre morangos; o pri­ meiro tipo é geralmente chamado descritivo, o segundo tipo

avaliatório. Exemplos do primeiro tipo de comentário são “Es­

te morango é doce” e “Este morango é grande, vermelho e suculento” . Exemplos do segundo tipo de comentário são “Este é um bom m orango” e “Este morango é justam ente como os morangos devem ser”. O primeiro tipo de comentário é muitas vezes dado como uma razão para fazer o segundo tipo de comentário; mas o primeiro tipo não implica, sozinho, o segun­ do tipo, nem vice-versa. Não obstante, parece haver alguma estreita conexão lógica entre eles. Nosso problema é: “O que é essa conexão?” ; pois nada é esclarecido quando se diz que há uma conexão, a menos que possamos dizer o que ela é.

O problema também pode ser colocado desta forma: se conhecêssemos todas as propriedades descritivas que tinha um morango particular (se soubéssemos, de cada sentença descriti­ va relacionada ao morango, se são verdadeiras ou falsas), e se soubéssemos também o significado da palavra “bom”, então, o que mais precisaríamos saber para sermos capazes de dizer se um morango é bom ou não? Uma vez colocada a questão dessa forma, a resposta deveria ser evidente. ^ecjsaTÍamosi-sàfeer

120 A LINGUAGEM DA MORAL

quais sãt os critérios, em virtude -'¡os^quais,.um morango, d é w ser. chamado bom, quais s ã o ^ c m c te n s jtic a s que tornaimboigy um ím orango-rou-quat é o padxão.jdé bondade em morangos? Precisaríamos que nos dessem a premissa maior. Já vimos que podemos conhecer o significado de “bom m orango” sem co­ nhecer quaisquer dessas coisas - embora tam bém exista um sentido da sentença “O que significa denominar bom um m orango?” em que não saberíamos a resposta, a não ser que também soubéssemos a resposta a essas outras questões. Agora é o momento de elucidar e distinguir essas duas formas em que se pode dizer que sabemos o que significa denominar um obje­ to um bom membro de sua classe. Isso nos ajudará a perceber mais claramente as diferenças e as similaridades entre “bom” e palavras como “vermelho” e “doce” .

Já que nos detivemos por algum tempo nas diferenças, não fará mal mencionar agora algumas das similaridades. Para esse propósito, consideremos as duas sentenças, “A é um auto­ móvel verm elho” e “A é um bom automóvel” . Observar-se-á que “autom óvel” , ao contrário de “m orango” , é uma palavra funcional, tal como definida no capítulo precedente. A refe­ rencia -a© Skorte.K O x^rd.E jtrgU sli^ictíonary mostra que uiji automóvel é um veículo^e um vefcuío um m eio/de transporte? Portanto, se um autom óvel não transporta nada, sabemos, a partir da definição de automóvel, que ele não é bom. Mas quando sabemos isso, sabemos tão pouco, em comparação com o que se exige para conhecer os critérios completos de um bom automóvel, que proponho no que se segue ignorar, com vista à simplicidade, este fator complicador. Tratarei “automó­ vel” como se não tivesse de ser definido funcionalmente: isto é, assumirei que podemos aprender o significado de “automó­ vel” (como, em certo sentido, podemos) sim plesm ente pela apresentação de exemplos de automóveis. Nem sempre, é claro, é fácil dizer se uma palavra é ou não um a palavra funcio­ nal; depende, com o todas as questões de significado, de como^ a/palavra é considerada-por um falante particular/)

A primeira similaridade entre “A é um automóvel verme­ lho” e “A é um bom automóvel” é que ambas podem ser, e mui­ tas vezes são, usadas para comunicar informações de caráter puramente factual ou descritivo. Se digo a alguém “A é um bom automóvel”, e ele mesmo não viu e não sabe nada de A, mas, por outro lado, sabe efetivamente que tipos de automóvel esta­ mos acostumados a denominar “bons” (sabe qual é o padrão de bondade aceito para automóveis), ele indubitavelmente recebe de minha observação informações sobre que tipo de automóvel é esse. Ele reclam ará que eu o enganei se, subseqüentemente, descobrir que A não faz m ais de 30 milhas por hora, consome óleo e gasolina na mesma proporção, está coberto de ferrugem ou tem grandes buracos no teto. Seu motivo para reclamar será o mesmo que teria sido se eu tivesse dito que o carro era verme­ lho e ele descobrisse subseqüentemente que era preto. Eu o teria levado a esperar que o automóvel fosse de determinada descrição quando, na verdade, era de uma descrição completa­ mente diferente.

A segunda similaridade entre as duas sentenças é a seguin­ te. Algumas vezes, nós as utilizamos, não para efetivamente comunicar informações, mas para pôr nosso ouvinte em posi­ ção de usar subseqüentemente a palavra “bom” ou “vermelho” para dar ou receber informação. Suponha, por exemplo, que ele não esteja nem um pouco familiarizado com automóveis, da mesma maneira como a maioria de nós não está familiarizada com cavalos hoje, e não saiba mais sobre automóveis do que o necessário para distinguir um automóvel de um cabriolé. Nesse caso, eu dizer “A é um bom automóvel” não lhe dará qualquer informação sobre A, além da informação de que é um automó­ vel. Porém, se ele puder, então ou subseqüentemente, examinar A, terá aprendido algo. Terá aprendido que algumas das carac­ terísticas que A tem são características que fazem com que as pessoas - ou, pelo menos, eu - o chamem um bom automóvel. Isso pode não ser aprender muito. Mas suponha que eu faça ju í­ zos dessa espécie a respeito de um grande número de automó-

122 A LINGUAGEM DA MORAL

veis, denominando alguns bons e outros não bons, e que ele possa examinar todos ou a m aioria dos automóveis sobre os quais estou falando; no fim, ele aprenderá um bocado, sempre presumindo que observo um padrão coerente ao chamá-los bons ou não bons. Finalmente, se prestar atenção, ele estará na posição de saber, depois de eu haver dito que um automóvel é bom, que tipo de automóvel ele pode esperar que seja - por exemplo, veloz, estável na estrada, etc.

Ora, se estivéssemos lidando, não com “bom ”, mas com “vermelho” , denominaríamos esse processo “explicar o signifi­ cado da palavra” - e realmente poderíamos, em certo sentido, dizer que o que eu tenho feito é explicar o que uma pessoa pre­ tende que signifique “um bom automóvel” . Ê esse um sentido de “significar” em relação ao qual, como vimos, devemos nos prevenir. Os processos, porém, são bastante similares. Eu pode­ ria explicar o significado de “vermelho” dizendo continuamen­ te de vários automóveis “A é um automóvel vermelho”, “B não è um automóvel verm elho” , e assim por diante. Se ele fosse atento o bastante, logo estaria em condições de poder usar a palavra “vermelho” para dar ou obter informação, pelo menos sobre automóveis. E, portanto, tanto com “bom ” como com “verm elho” , há esse processo que, no caso de “vermelho” , podemos denominar “explicar o significado” , mas que, no caso de “bom ” , podemos assim denominá-lo apenas de form a im­ precisa e num sentido secundário; para sermos claros, devemos chamá-lo “explicar, comunicar ou apresentar o padrão de bon­ dade para automóveis” ou coisa parecida.

O padrão de bondade, como o significado de “vermelho”, normalmente é algo público e comumente aceito. Quando ex­ plico a alguém o significado de “automóvel verm elho”, ele espera, a menos que eu seja considerado muito excêntrico, en­ contrar outras pessoas usando a expressão do mesmo modo. E, similarmente, pelo menos com objetos como automóveis, em que há um padrão comumente aceito, esperará, tendo aprendi­ do comigo qual é o padrão de bondade em automóveis, ser

capaz, usando a expressão “bom automóvel” , de dar informa" ção a outras pessoas e de obtê-la, sem confusão.

Um terceiro aspecto em que “bom automóvel” assemelha- se a “automóvel verm elho” é o seguinte: tanto “bom ” como “vermelho” podem variar no que diz respeito à exatidão ou im­ precisão da informação que comunicam ou que podem comuni­ car. Normalmente empregamos a expressão “automóvel ver­ melho” muito imprecisamente. Qualquer automóvel que se enquadre em algum lugar entre o inequivocamente purpúreo e o inequivocamente alaranjado pode, sem abuso da língua, ser denominado um automóvel vermelho. E, similarmente, o pa­ drão para denominar automóveis bons é comumente muito impreciso. Há certas características, como a incapacidade para exceder 30 milhas por hora que, para qualquer um, menos para um excêntrico, seriam condições suficientes para que se recu­ sasse a chamá-lo um bom automóvel; mas não há um conjunto preciso de critérios aceitos que nos permita dizer “Se um auto­ móvel satisfaz estas condições, é um bom automóvel; se não satisfaz, não é” . E, em ambos os casos, poderíamos ser precisos se quiséssemos. Poderíamos, para certos propósitos, concordar em não dizer que um automóvel é “realmente vermelho”, a não ser que a vermelhidão de sua pintura atingisse determinado grau mensurável de pureza e saturação, e, similarmente, pode­ ríamos adotar um padrão exato de bondade para automóveis. Poderíamos recusar o nome “bom automóvel” a qualquer carro que não percorresse, sem percalços, determinado circuito de corrida, dentro de um período limitado, que não se conformas­ se a outras especificações rígidas e determinadas, quanto a con­ forto, etc. Esse tipo de coisa não foi feita no caso da expressão “bom automóvel”, mas, como o Sr. Urmson destacou, foi feita pelo M inistro da Agricultura no caso da expressão “super- maçâ” 1.

É importante notar que a exatidão ou imprecisão de seus critérios nao contribui absolutamente nada para distinguir pala­ vras como “bom ” de palavras como “vermelho” . As palavras,

124 A LINGUAGEM DA MORTAL

em ambos os casos, podem ser descritivamente imprecisas ou exatas, segundo o grau de rigidez com que os critérios foram fixados pelo costume ou convenção. Certamente não é: verdade que ,as%palavras de valor- se-distingam das palavjasrdescritivas? porque são; mais •imprecisas, déscritívamente, do que estas? Há exemplos imprecisos e rígidos de ambos os tipos de palavra. Palavras como “vermelho” podem ser extremamente impreci­ sas, sem que se tornem avaliatórias, e expressões como “bom efluente^de esgoto” podem ser o objeto de critérios bastante rígidos sem, de modo algum, deixar de ser avaliatórias.

É importante notar também como é fácil, em vista dessas semelhanças entre “bom ” e “verm elho” , pensar que nao há diferenças - pensar que expor o padrão de bondade em automó­ veis é expor o significado, em todos os sentidos dessa palavra, na expressão “bom automóvel” ; pensar que “A é um bom auto­ móvel” não significa mais nem menos que “A tem determina­ das características que tem o nome de ‘bom ’

7.2. Vale a pena notar aqui que as funções da palavra “bom ” relacionadas com a informação poderiam ser desempe­ nhadas igualmente bem se “bom ” não tivesse nenhuma função aprovatória. Isso pode ser esclarecido colocando em seu lugar uma outra palavra, criada piara- esse propósito, que se deva supor desprovida da força aprovatória de “bom”. Empreguemos “m ob” como essa nova palavra. “Mob”, como “bom”, pode ser usada para comunicar informação somente se os critérios para sua aplicação forem conhecidos, mas isso a torna, ao contrário de “bom” , completamente sem significado até que esses crité­ rios sejam tornados conhecidos. Torno os critérios conhecidos apontando vários automóveis e dizendo “A é um automóvel m ob”, “B não é um automóvel mob” , e assim por diante. Deve­ mos imaginar que, embora “mob” não tenha força aprovatória, os critérios de “mobilidade” em automóveis que estou utilizan­ do são os m esm os critérios que, no exemplo anterior, utilizei para bondade em automóveis. E, portanto, como no exemplo anterior, o aprendiz, se for suficientemente atento, torna-se

capaz de usar a palavra “m ob” para dar ou obter informação; quando lhe digo “Z é um automóvel m ob”, ele sabe quais características esperar que o automóvel tenha, e se quiser comunicar a outrem que o automóvel Y tem as mesmas caracte­ rísticas, pode fazer isso dizendo “Y é um automóvel mob” .

Assim a palavra “m ob” faz (embora somente em relação a automóveis) metade do trabalho que faz a palavra “bom ” - a saber, todas as tarefas relacionadas com os atos de fornecer ou aprender a fornecer e a obter informação. Não faz as tarefas relacionadas com a aprovação. Assim, poderíamos dizer que “m ob” funciona exatamente como uma palavra descritiva. Primeiramente, meu aprendiz aprende a usá-la quando lhe dou exemplos de sua aplicação e, então, a emprega aplicando-a a novos exemplos. Seria perfeitamente natural dizer que o que eu estava fazendo era ensinar a meu aprendiz o significado de “m ob” , e isso, novamente, mostra-nos como é natural dizer que, quando estamos aprendendo uma lição similar para a expressão “bom automóvel” (i.e., aprendendo os critérios de sua aplicação), estamos aprendendo seu significado. Mas com a palavra “bom ” é enganoso dizer isso, pois o significado de “bom automóvel” (num outro sentido de “significado”) é algo que poderia ser conhecido por alguém que não conhecesse os critérios de sua aplicação; ele saberia, se alguém dissesse que um automóvel é bom, que ela o estaria aprovando, e saber isso seria conhecer o significado da expressão. Além disso, como vimos anteriormente (6.4), alguém pode saber sobre “bom” todas as coisas que meu aprendiz aprendeu sobre a palavra “mob” (a saber, como aplicar a palavra aos objetos certos e usá- la para fornecer e obter informação) e, não obstante, é possível dizer que não conhece seu significado, pois pode não saber que denominar bom um automóvel é aprová-lo.

7.3. Alguns leitores podem objetar que dizer que o empre­ go descritivo ou informativo de “bom ” é seu significado, em qualquer sentido, é ilegítimo. Tais opositores podem sustentar que o significado de “bom ” é adequadamente caracterizado

126 A LINGUAGEM DA MORAL

quando se diz que é usado para aprovar e que qualquer informa­ ção que obtenhamos de seu uso não é uma questão de significa­ do. Quando digo “A é um bom automóvel”, o significado que pretendo, segundo esse ponto de vista, é aprovar A; se, a partir de minha observação, juntam ente com seu conhecimento do padrão habitualmente utilizado por mim para avaliar os méritos de automóveis, um ouvinte obtém informação sobre que descri­ ção de automóvel é, isso não é parte do significado que preten­ do; tudo o que meu ouvinte fez foi um a inferência indutiva a partir de “Haré, no passado, geralmente recomendou automó­ veis de determinada descrição” e “Hare aprovou A” para “A tem a mesma descrição” . Suspeito que essa objeção seja em grande parte verbal e não desejo tomar partido contra ela. Por um lado, devemos insistir que conhecer os critérios para a apli­ cação da palavra “bom ” a automóveis não é conhecer - ao menos no sentido completo ou primário - o significado da expressão “bom automóvel”; nessa medida, deve-se concordar com a objeção. Por outro lado, a relação da expressão “bom automóvel” com os critérios para sua aplicação é muito seme­ lhante à relação de uma expressão descritiva com suas caracte­ rísticas definidoras, e essa semelhança encontra eco em nossa linguagem quando perguntamos “O que você pretende que ‘bom ’ signifique?”, e obtemos a resposta “Pretendo que signi­ fique chegar a 80 por hora e nunca quebrar” . Em vista desse fato indubitável do uso, julgo ser melhor adotar o termo “stggi- ficacio:deseritivof’. Além disso, é natural dizer que uma sen­ tença ,tem significado descritivo se o falante pretende que ela, primariamente, comunique, informação, e, quando um jornal diz que X começou o jogo com uma bola boa, sua intenção não é primariamente aprovir a 6ola, mas informar a seus leitores a descrição da jogada.

7.4. ÉâpiaidepísíiÉicarp íatp de eudizer^ípe o significado descritivo, d e -‘bom” é secundário em relação- m significado^ avaliatório. Meus motivos para fazê-lo são dois. Primeiro, o significado avaliatório é constante para toda classe de objeto

para a qual a palavra é usada. Quando denominamos bom um automóvel, um cronômetro, um taco de críquete ou um quadro, estamos aprovando todos eles. Mas como estamos recom en­ dando todos eles por razões diferentes, o significado descritivo é diferente em todos os casos. Temos conhecimento do signifi­ cado avaliatório de “bom” desde os nossos primeiros anos, mas estamos constantemente aprendendo a usá-lo com novos signi­ ficados descritivos, à m edida que as classes de objetos cujas virtudes aprendemos a distinguir tornam-se mais numerosas. Às vezes aprendemos a empregar “bom” com um novo signifi­ cado descritivo, ensinado por um especialista num campo parti­ cular - por exemplo, um cavaleiro pode ensinar-me a reconhe­ cer um bom cavalo de caça. Às vezes, por outro lado, inventa­ mos um novo significado descritivo por nós mesmos. Isso acontece quando começamos a fp m a r uni pádraó para uma classe de objetos, quando começamos a sentir necessidade de pôr em ordem de mérito determinados membros dessa classe, para a qual não havia até então nenhum padrão, como no exem­ plo do “cacto” (6.2). Discutirei no próximo capítulo por que aprovamos coisas.

A segunda razão para denominar primário o significado avaliatório é que podemos usar a força avaliatória da palavra para modificar o significado descritivo em qualquer classe de objetos. É isso o que o reformador moral freqüentemente faz na moral, mas o mesmo processo ocorre fora da moral. Pode acon­ tecer que automóveis mudem consideravelmente em termos de projeto no futuro próximo (e.g., por meio de nossa busca de eco­ nomia à custa do tamanho). Pode ser que então deixemos de dar o nome “um bom automóvel” a um carro ao qual, corretamente e com a concordância de todos, concede-se hoje esse nome. Como, lingüísticamente falando, isso aconteceria? No presente estamos mais ou menos de acordo (embora apenas mais ou menos) quanto aos critérios necessários e suficientes para cha­ mar bom um automóvel. Se acontecer o que descrevi, podemos passar a dizer “Nenhum dos carros dos anos 50 era realmente bom; não houve nenhum realmente bom antes de 1960”. Ora,

128 A LINGUAGEM DA MORAL

aqui não podemos estar usando “bom ” com o mesmo significa­ do descritivo geralmente usado hoje, pois alguns dos carros de 1950 indubitavelmente têm características que lhes dão direito ao nome “bom automóvel”, no sentido descritivo de 1950 dessa palavra, O que está acontecendo é que o significado avaliatório da palavra está sendo empregado para alterar o significado des­ critivo; se “bom ” fosse uma palavra puram ente descritiva, poderíamos dizer que o que estamos fazendo é redefini-la. Porém não podemos dizer isso, pois o significado avaliatório permanece constante; estamos antes alterando o padrão. Isso é similar ao processo chamado pelo Professor Stevenson “defini­ ção persuasiva” 2; o processo, porém, não tem necessariamente grande influência da emoção.

Podemos reparar aqui que existem duas formas principais em que uma m udança de padrão pode ser reflexo e, em parte, efeito de uma mudança na língua. A primeira é a que acabei de exemplificar, o significado avaliatório de “bom ” é retido e utili­ zado para alterar o significado descritivo e, assim, estabelecer um novo padrão. A segunda não )corre freqüentemente com a palavra “bom ”; pois essa palavra está tão firmemente estabele­ cida como palavra^de '/alor que o procedimento sen a pratica- üiente im possível Esse procedimento é p a ra que i palavra seja gradualmente esvaziada de seu significado avaliatório pelo emprego cada vez mais freqüente numa forma que denominarei convencional ou “entre aspas”; quando perdido todo seu signi­ ficado avaliatório, passa a ser usada como palavra puramente descritiva para designar determinadas características do objetó, e, quando é necessário aprovar ou condenar objetos nessa clas­ se, alguma palavra de valor bem diferente é tomada para esse propósito. Os dois processos podem ser ilustrados e contrasta­ dos por meio de um a descrição muito esquematizada do que aconteceu nos dois últimos séculos com a expressão “eíigible

bachelor■” *. Eíigible começou como palavra de valor, signifi­ cando “que deve ser escolhido” (j?c. para marido das filhas).

Depois, como os critérios de elegibilidade vieram a tornar-se um tanto rígidos, adquiriu um significado descritivo também; no século XVIII, quando se dizia que alguém era eligible, po­ dia-se esperar que tivesse grandes propriedades e talvez um título de nobreza. No século XIX, porém, os critérios de elegi­

No documento A Linguagem da Moral (diniz) - R. M. Hare.pdf (páginas 130-146)