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Desdobramentos das ações de gestão do território

4. CENTROS E SUBCENTROS REGIONAIS E AS DESIGUALDADES REGIONAIS

5.2 O período desenvolvimentista (1956-1985)

5.2.3 Desdobramentos das ações de gestão do território

A descrição dos possíveis desdobramentos das ações de gestão do território, para cada período, abarca dois momentos diferentes: inicialmente, uma visão do quadro regional mais amplo do Brasil, com foco nos processos próprios das macrorregiões; num segundo momento a análise em regiões mais específicas e de características similares (ainda que não idênticas, conforme já exposto) à Ride-DF, as Regiões Metropolitanas instituídas. As Regiões Metropolitanas consideradas foram aquelas correspondentes aos espaços classificados como metrópole pela última Pesquisa da Regic (IBGE, 2008), assim sendo: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza, Belém, Manaus e Goiânia (Brasília está também neste rol, mas não será aqui analisada devido seu processo específico ser estudado como foco do trabalho, nos próximos capítulos).

Desdobramentos no quadro nacional e macrorregional

A partir das ações acima descritas, os desdobramentos sobre a organização e a produção do espaço nacional foram significativos, podendo ser destacado o esforço em tornar a economia nacional unificada, o que permitiu expandir o mercado interno, algo fundamental na conformação de uma divisão regional do trabalho (MOREIRA, 2014). Este novo período é marcado, assim, por uma concentração claramente existente no Sudeste brasileiro, ocorrendo um processo de polarização das demais regiões. Santos e Silveira (2001) analisam que, pela concentração econômica em torno de Rio de Janeiro e São Paulo, houve a perda de poder de outras metrópoles e centros regionais.

Num segundo momento, a partir de meados da década de 1970, Moreira identifica um processo de reestruturação e relocalização da indústria. Esta fase ocorre, segundo ele, pois D ³GLIHUHQFLDomR-concentração industrial chega a um grau insustentável, criando efeitos FRQWUiULRVjSUySULDOyJLFDTXHHPVXDRULJHPSUHVLGLUD´ S 3RUFRQWDGDVGHVHFRQRPLDV de escala e dos problemas ambientais decorrentes da concentração demasiada, além da própria

atuação do Estado brasileiro (daí o relativo sucesso do II PND), inicia-se um período de desconcentração da produção ao redor de São Paulo (em uma escala maior, do Brasil), o que redefine a divisão regional do trabalho. Em alguns setores específicos, outras macrorregiões serão afetadas, havendo destaque para iniciativas no Nordeste fomentadas pela atuação da Sudene.

Em relação ao espaço produtivo da agropecuária, conforme já brevemente delineado na análise das ações, apresenta como desdobramento o início do processo de modernização da agropecuária nacional. Inicialmente, tal processo ocorreu a partir da incorporação de tecnologias externas, passando, a partir da década de 1970, à produção de maquinário específico para o campo no território brasileiro. Isto se deu muito pela organização da agropecuária a partir das necessidades de exportação, sendo fundamental ao equilíbrio econômico nacional (GRAZIANO DA SILVA, 1996; ELIAS, 2003). Em termos regionais, este processo levará também à ocupação da Região Centro-Oeste como fronteira agrícola, a partir do apoio do Estado ao avanço da produção de commodities. Isto passa a ocorrer a partir do uso e esgotamento das fronteiras do Sul e Sudeste, cuja ocupação e modernização ocorreu mais precocemente. Tal processo reproduziu o apoio do Estado, que se deu tanto pela via tecnológica - na qual a atuação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) foi fundamental ± quanto por meio de apoio financeiro (que acabou por controlar o processo, assim como ocorrido em outras regiões brasileiras). Contribuiu para isto a oferta de terras a preços baixos.

Desdobramentos na organização e estruturação das Regiões Metropolitanas

Para a compreensão dos desdobramentos específicos sobre as Regiões Metropolitanas, é necessário considerar, inicialmente que o processo de urbanização que resultou das ações de gestão do território ocorreu, no período, de forma rápida, movido pelas correntes migratórias que se moviam para as principais cidades. Isto levou a que as ações de planejamento urbano e metropolitano tenham surtido menor efeito, não conseguindo ³DFRPSDQKDU´RULWPRGDXUEDQL]DomRTXHRFRUULD$VVLPQXPSULPHLURPRPHQWRRHVSDoR das metrópoles foi organizado a partir do modelo clássico fordista, com acentuação de uma periferia do capitalismo global: concentração excessiva de funções em um centro único e expansão periférica em espaços economicamente deprimidos e dependentes. Mais o término do período, este modelo apresentou algumas fissuras, por conta da redução da pressão demográfica das migrações, e por desgastes na estrutura de forte concentração e dependência de um centro único (atuou também a desconcentração produtiva que se verificava em nível nacional). As

metrópoles, a partir de então, perdem a compactação que antes possuíam, expandindo-se a partir dos principais eixos rodoviários e apresentado mesmo a ocupação das periferias por segmentos da classe média (este último processo viria a ser aprofundado posteriormente), o que atraiu atividade antes concentradas no centro principal.

Desta forma, muito pela atuação do Estado (a partir, principalmente do II PND), inicia-se, no âmbito dos espaços das Regiões Metropolitanas, um processo de desconcentração produtiva, reproduzindo a tendência do que já ocorria em escala nacional e regional. Aos municípios núcleo dos espaços metropolizados restou o papel de concentrar os equipamentos de gestão dos fluxos econômicos, ao passo que as plantas industrias passaram a migrar para municípios vizinhos, em geral no âmbito da Região Metropolitana. Em termos regionais, esta tendência foi inicialmente verificada nas metrópoles do sudeste brasileiro, o que, a partir da atuação do governo, passou a ocorrer também em outras regiões (como no caso da atuação da Sudene nas metrópoles nordestinas).

Esse processo mais geral de mudança nos espaços produtivos engendrou, também, modificações no âmbito da questão do centro principal e dos subcentros. Pintaudi (1997) aponta que, entre as décadas de 1950 e 1960 iniciou-se uma modificação no padrão de localização dos grandes equipamentos de consumo, dado que anteriormente havia uma tendência de fusão destes com os usos residenciais, nas áreas centrais principais. A partir, inicialmente, de uma desconcentração dos espaços de moradia, o comércio varejista realiza movimento parecido, acompanhando a expansão dos novos bairros que iam surgindo. Aos centros caberá, desta forma, o exercício de outras funções, como a prestação de serviços de maior complexidade e a localização de grandes equipamentos comerciais, sendo, no caso brasileiro, tal processo mais evidente em São Paulo e no Rio de Janeiro, neste período.

Das duas metrópoles mencionadas, o processo mais complexo é justamente aquele da metrópole que está no topo da hierarquia urbana brasileira, a Região Metropolitana de São Paulo. O processo para seu espaço metropolitano ocorreu como desconcentração não apenas encerrado em si, mas também em uma escala maior, nacional, o que reafirmou seu papel como centro principal de gestão do capital do país. Ali passou a se concentrar a principal praça financeira do país, com a oferta de diversos setores exclusivos e de alcance nacional e internacional (GASPAR et al, 2015; SERRÃO; DIAS, 2015). Lencioni (2011) aponta que tal processo ocorre em formato linear e não aureolar, por conta da influência dos principais eixos de ligação de São Paulo com seu interior. Os municípios mais atingidos por esta nova tendência produtiva serão os do ABCD paulista (Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul e Diadema), recebendo, principalmente, a indústria automobilística.

No caso das outras Regiões Metropolitanas, o processo será muito parecido com o ocorrido em São Paulo, porém com extensão reduzida e menor envolvimento do interior de seus estados. O Rio de Janeiro, que talvez tivesse porte para reproduzir processo parecido padeceu de problemas de articulação com seu espaço interiorano, muito por conta dos problemas legais causados pela tardia fusão do Estado da Guanabara com o do Rio de Janeiro, criando barreiras a uma melhor integração e à projeção nacional (SIQUEIRA, 2015). No caso da metrópole carioca e sua região, Siqueira aponta anda para o papel do Estado no processo, induzindo a industrialização nos municípios da Baixada Fluminense.

Já sobre os outros espaços metropolitanos, estes estarão, neste momento cumprindo uma função diversa de acordo com a escala de análise: observando a questão a partir da visão nacional do processo produtivo, conforme já mencionado na subseção anterior, estas metrópoles (especialmente as do Sul) são o lócus do processo de desconcentração originado na metrópole paulista; ao se observar a escala metropolitana, o processo ocorre de forma desconcentrada em relação ao centro principal, que abriga de pronto as funções de gestão. De forma específica, há a desconcentração de algumas atividades na Região Metropolitana de Curitiba, especialmente no município de Araucária, por meio de novas indústrias (MOURA et al, 2015; FIRKOWSKI, 2002). No caso desta, não houve grande envolvimento com outros municípios, restando a eles a atividade agropecuária. Porto Alegre apresenta o surgimento de indústrias nos principais eixos rodoviários de integração, com destaque para o município de Novo Hamburgo (SOARES, 2015).

Um ponto fundamental de análise para os resultados considerados é que o processo de desconcentração, na quase unanimidade da bibliografia consultada, aponta para os efeitos especialmente do II PND no processo de desconcentração. Isto torna-se mais claro ao analisar os casos principalmente das metrópoles nordestinas, cujos processos de industrialização (e de sua posterior desconcentração) foram objeto de importante papel da Sudene. Em maior ou menor escala, o processo favoreceu municípios próximos dos centros principais sendo que alguns já possuíam certa tradição industrial, como no caso da Região Metropolitana de Fortaleza (COSTA; AMORA, 2015; PEREIRA JR., 2015). Nesta o processo irá apontar para uma área entre o município sede e Maracanaú (ainda não emancipado), a partir de impulso da Sudene. No caso da Região Metropolitana de Salvador, são apontados os investimentos em Camaçari (Complexo Petroquímico de Camaçari) e Simões Filho (Centro Industrial de Aratu), visando o estímulo à produção industrial. Ambos atuavam como complemento ao processo industrial do Centro-Sul, produzindo bens intermediários. Para o caso da Região Metropolitana

do 5HFLIH5RVDH2OLYHLUD  DSRQWDPRSDSHOGD6XGHQHQDLQVHUomR RX³VROGDJHP´ GH Recife no contexto industrial nacional, ainda com desconcentração reduzida.

As exceções ao acima posto ficarão por conta de três espaços metropolitanos com pouca tradição industrial: Brasília (a ser analisado à frente), Goiânia e da Região Metropolitana de Belém. Os dois primeiros casos falam de espaços que à época ainda não se constituíam como metrópole (nem estavam formalizadas como Região Metropolitana, no caso de Goiânia, e Região Integrada de Desenvolvimento10, no caso de Brasília). Já Belém ocupava uma função

de articuladora da rede urbana da Amazônia Oriental, sendo fundamental aos investimentos ocorridos a partir dos grandes projetos de ocupação e aproveitamento mineral amazônicos então em curso (CARDOSO et al, 2015; FERNANDES et al, 2015). Outro caso fora deste padrão foi Manaus, cujo processo de inclusão na produção industrial nacional se fez a partir da atuação específica do governo federal, por meio da Zona Franca de Manaus, restrita ao município (LIMA, 2014).

Desta forma, na maior parte dos espaços metropolitanos nacionais no período, o que se verificou foi uma concentração das atividades notadamente de consumo (e em menor escala, produtivas), seguido de um processo de desconcentração da estrutura produtiva, que originou novos espaços produtivos (industriais) nas margens do tecido metropolitano. Tal processo lega aos espaços centrais (ou polos das Regiões Metropolitanas) novas funções, localizando em si especialmente as atividades de gestão do capital. O perfil do trabalho nestes municípios vai se alterando, ocorrendo um amplo processo de terciarização. Desta forma, neste primeiro momento, o que se percebe é o início de um processo de dispersão do consumo e mais clara dispersão dos espaços produtivos, especialmente nas Regiões Metropolitanas mais industrializadas. Por outro lado, não se verificou uma expansão da agropecuária moderna no espaço das Regiões Metropolitanas, algo que só será mais visível, em algumas delas, no período seguinte. Tal contexto leva a que na Ride-DF, a incidência se dê de forma mais clara na WHQGrQFLDGHH[SDQVmRGDViUHDVRFXSDGDVPDVTXHSRUFDUDFWHUtVWLFDVSUySULDVDLQGD³EDUURX´ a expansão dos espaços de consumo na periferia.

O próximo período demonstrará uma mobilidade maior do capital nacional, que será responsável por produzir subcentros em espaços metropolitanos e regionais ligados a cadeias produtivas externas à Região Metropolitana, com a emergência, por outro lado, de subcentros ligados ao agronegócio modernizado.

10

Feitas as ressalvas de que a Ride-DF não é oficialmente uma Região Metropolitana, conforme já exposto anteriormente.