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DESENVOLVIMENTO COMO PROGRESSO SOCIAL E ECONÔMICO

No documento Open Empoderamento e planejamento para o . (páginas 40-46)

2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO DESENVOLVIMENTO

2.3 DESENVOLVIMENTO COMO PROGRESSO SOCIAL E ECONÔMICO

A terceira categoria do pensamento de Celso Furtado é a ideia de desenvolvimento como progresso social e econômico. Apesar das teorias clássicas terem a perspectiva de desenvolvimento como acúmulo e geração de excedente através da divisão do trabalho, a ideia de progresso emerge no século XX, sendo Celso Furtado um dos pioneiros ao detectar a pluridimensionalidade do desenvolvimento e sua construção como um processo social.

Assim, define Celso Furtado46 o desenvolvimento como um processo de

transformação, englobando a sociedade, através da introdução de métodos mais eficazes e produtivos, resultando em um aumento de fluxo de bens e de serviços finais à disposição da coletividade. Para isso, entretanto, é preciso partir da apreensão da realidade social, identificando-se as relações de causalidade entre a produção, a inovação e as estruturas sociais, valorizando a capacidade humana e objetivando a satisfação das necessidades coletivas.

Essa compreensão de desenvolvimento como processo social é pressuposta da integração entre empoderamento e de planejamento, pois o processo de mudança da sociedade, que gera e é gerada pelo desenvolvimento, tem como principal motor o empoderamento dos atores sociais e integração na gestão pública da esfera privada, conforme será aprofundado no próximo capítulo.

46 FURTADO, Celso. Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Nacional, 1980, p.41-45.

Entende Celso Furtado47 que a proposta de sistema de forças produtivas da teoria de Karl Marx projeta luz sobre a complementariedade das atividades produtividades, vistas como um processo social e não como introdução de elementos discretos. Isso porque Marx48 defende que "o modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral”. Nesse sentido, Edgar Morin49 expõe que na produção social da

própria existência, os homens entram em relações determinadas e independentes de sua vontade, que correspondem a um grau determinado de desenvolvimento das forças produtivas materiais. Assim, a estrutura econômica da sociedade é formada pelo conjunto das relações de produção.

Segundo a interpretação de Edgar Morin50, o pensamento marxista é fundado na crença da racionalidade profunda e na missão histórica do proletariado, ao acreditar que, através do materialismo histórico, surgiria uma sociedade sem classes. Na atualidade, os fatos demonstraram não ser lineares e que esta responsabilidade do proletariado, não é científica, porém messiânica e inalcançável; adquiriram caráter metafísico. Ainda explica que muitas ideias do materialismo histórico de Marx, são essenciais para compreensão do capitalismo atual, como a crítica à globalização econômica e as regras do livre mercado.

Em contraponto, José Paulo Netto51 entende que a questão não se coloca em termos de pretensas soluções definitiva do marxismo, mas de expor seu pensamento no enfrentamento dos novos problemas. Esta perspectiva assenta-se no ponto de vista de classe; a classe trabalhadora enquanto sujeito histórico revolucionário. Assim, ainda que a teoria marxista não cumpra com a “missão histórica”, o proletariado, enquanto classe em si, pela sua mera existência, viabiliza a dialética social a partir da perspectiva do processo do trabalho.

Apesar da contribuição da teoria marxista, a ideia de progresso, entretanto, foi aprofundada no século XX, sendo analisadas por cientistas, anteriores e contemporâneos a Furtado, dentre os quais se destacam os autores da Escola Neoclássica, Joseph Schumpeter e de Walt Rostow.

47 FURTADO, Celso. Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Nacional, 1980, p.30-31.

48 MARX, Karl. Contribuição à Crítica da Economia Política . Traduzido por Florestan Fernandes. São Paulo: Ed. Flama, 1946, p.276-277.

49 MORIN, Edgar. O pensamento socialista em ruínas. O que se pode esperar? In: A decadência do futuro e a construção do presente. Florianópolis:UFSC, 1993, p.23.

50 MORIN, Edgar. O pensamento socialista em ruínas. O que se pode esperar? In: A decadência do futuro e a construção do presente. Florianópolis:UFSC, 1993, p.23.

51 NETTO, José Paulo. Para a crítica da vida cotidiana. In: CARVALHO, M.C. Brant; NETTO, J.P. Cotidiano: conhecimento e crítica. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2000, p.77-79.

Joseph Schumpeter publicou uma teoria do desenvolvimento econômico em 1911. Foi pioneiro ao reconhecer o papel central do crescimento econômico para a justiça social, porém distinguindo, que aumento de riqueza e de capital não significam desenvolvimento.

De acordo com Celso Furtado52, a influência do seu pensamento foi significativa por ter se preocupado com o problema específico do desenvolvimento e por compreender e defender que as forças sociais podem provocar mudanças, dando especificidade ao processo histórico do capitalismo, em que o conceito de desenvolvimento é vinculado, implicitamente, à história social europeia e a avanços nos processos acumulativos deste continente face ao de países com desenvolvimento retardado, o que remete a categoria de divisão internacional do trabalho.

Já na década de 1940, Joseph Schumpeter53 defendeu que o capitalismo não sobreviveria, em decorrência de um provável colapso econômico, pois o êxito do capitalismo dependia de agredir instituições sociais que o protegem e o sustentam. Desse modo, entendeu que o “New Deal”, apesar de considerá-lo um bom plano, não poderia persistir por muito tempo por afetar o rendimento da produção e do funcionamento da empresa privada.

Conceitua o Autor54 a sociedade socialista como “um conjunto institucional no qual o controle sobre os meios e sobre a própria produção está concentrado em uma autoridade central”, a qual representa a esfera pública e que “pretende atingir metas mais altas do que estômagos cheios”. Segundo Joseph Schumpeter, o processo social é um todo indivisível. Naquele momento, o desenvolvimento econômico era analisado como objeto da história econômica, que por sua vez é meramente uma parte da história universal; retratando uma dependência fundamental entre desenvolvimento e aspecto econômico. Porém o estado econômico de um povo não emerge simplesmente das condições econômicas precedentes, mas de toda a totalidade de aspectos vivenciados pela sociedade.

Deste modo, o desenvolvimento econômico não pode ser compreendido como um fenômeno a ser explicado economicamente, “mas que a economia, em si mesma sem desenvolvimento, é arrastada pelas mudanças do mundo à sua volta, e que as causas”. Por consequência, a explicação sobre desenvolvimento deve ser procurada fora do grupo de fatos

52 FURTADO, Celso. Pequena introdução ao desenvolvimento: enfoque interdisciplinar. São Paulo: Nacional, 1980, p.31-32.

53 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Traduzido por Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961, p.89-90.

54 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Traduzido por Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961, p.239-240.

descritos pela teoria econômica tradicional. Assim, não designa como um processo de desenvolvimento como mero crescimento da economia, demonstrado pelo aumento da população e da riqueza, em que é necessário perceber o desenvolvimento econômico focando em outros fenômenos55, tais como: criatividade e incentivo ao crédito para o empreendedorismo56, deste modo a função principal do mercado monetário ou de capital é o comércio de crédito com o propósito de financiar o desenvolvimento.

Na análise de valores excedentes, faz uma verificação, classificando-os em dois grandes grupos principais: o primeiro abrangendo valores excedentes que o desenvolvimento necessariamente traz consigo, explicados pela escolha de usos novos, mais vantajosos, dos bens de produção, seria o lucro empresarial; já o segundo abrange os que tem por base as repercussões do desenvolvimento, ou seja, aumentos efetivos ou esperados da demanda de certos bens provocados. Neste intercâmbio, o desenvolvimento leva uma parte do lucro capitalista, através dos juros sobre o lucro, funcionando, assim, aquele como um tributo sobre este e conclui o autor57: “o juro, enquanto um grande fenômeno social, é um produto do

desenvolvimento, que provém do lucro, e que não se prende a bens concretos, são a base de nossa teoria do juro”.

Percebe-se na perspectiva shumpeteriana que o desenvolvimento é um processo de inovação, que gera avanços sociais. Por isso, ele também foi pioneiro ao lançar as sementes de políticas de inclusão econômicas, voltadas para proposta de bancos de desenvolvimento, o que se identifica ao pensamento furtadiano.

55 SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Coleção Os Economistas. Traduzido por Maria Sílvia Possas. São Paulo: a Nova Cultural, 1997, p.71.

56 Neste sentido: “Chamamos “empreendimento” à realização de combinações novas; chamamos “empresários” aos indivíduos cuja função é realizá-las. Esses conceitos são a um tempo mais amplos e mais restritos do que no uso comum. Mais amplos porque em primeiro lugar chamamos “empresários” não apenas aos homens de negócios “independentes” em uma economia de trocas, que de modo geral são assim designados, mas todos que de fato preenchem a função pela qual definimos o conceito, mesmo que sejam, como está se tornando regra, empregados “dependentes” de uma companhia, como gerentes, membros da diretoria etc., ou mesmo se o seu poder real de cumprir a função empresarial tiver outros fundamentos, tais como o controle da maioria das ações”. (SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Coleção Os Economistas. Traduzido por Maria Sílvia Possas. São Paulo: a Nova Cultural, 1997, p.83)

57 SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Coleção Os Economistas. Traduzido por Maria Sílvia Possas. São Paulo: a Nova Cultural, 1997, p.168 e 170.

Na perspectiva de racionalidade, ou seja, no campo abstrato da teoria, entende Joseph Schumpeter58 que as metas econômicas podem mais facilmente ser alcançadas, tendo melhores condições de implantação na administração socialista do que no planejamento do progresso dentro do quadro das instituições capitalistas. Além disso, é prejudicial ao capitalismo a dicotomia entre esferas pública e privada, o que gera um antagonismo de princípios e valores e uma ruptura entre Estado e Sociedade.

Neste sentido, chama atenção posição shumpeteriana sobre a democracia, que compreendeu como método de seleção das elites, através de eleições periódicas, em que os candidatos cargos eletivos fazem propostas políticas para se elegerem e não pensando prioritariamente na população59.

Para Ele60, o capitalismo prepara para o socialismo. Assim, previu que, se adotado em um momento adequado, a transição ocorreria de modo pacífico, por meio de emenda constitucional, sem, portanto, interrupção da ordem legal, pois a maturidade política enfraqueceria a resistência e a cooperação da maioria das classes.

Porém, não foi esse quadro que se mostrou na história, até o presente. Isso porque a atividade econômica é o ponto essencial dos sistemas econômicos. Joseph Schumpeter realiza seus estudos com base nas instituições, sem considerar, contudo, que a conjuntura histórica, política e social fizeram com que o capitalismo encontrasse em si mesmo mecanismo de renovação.

Posteriormente, a II Guerra Mundial mostra-se como marco histórico mundial do período chamado (pós-) moderno61 e foi responsável pela ascensão de novos valores, tais como o da busca do bem-estar e da solidariedade, o uso da linguagem retórica e o protagonismo da sociedade civil pela proteção dos direitos coletivos e pela bipartição do mundo entre os sistemas capitalista e socialista.

58 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Traduzido por Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961, p. 244.

59 LAVALLE, Adrián G., HOUTZAGER, Peter P.CASTELLO,Graziela. Democracia, Pluralização da Representação e Sociedade Civil. In: Lua Nova: revista de cultura e política. O futuro da representação. Vol. 67. São Paulo: CEDEC, 2006, p. 59

60 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Traduzido por Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1961, p.265.

61 Explica-se que “pós” foi escrita entre parênteses, em decorrência das inúmeras divergências doutrinárias tanto com relação a própria nomenclatura, bem como sobre a possibilidade de falar-se em pós-modernidade na própria realidade brasileira.

Exposto as principais perspectivas, no mundo capitalista dos anos sessenta, o desenvolvimento foi associado à ideia de progresso, partindo-se de cinco fases lineares, conforme teoria de Walt Rostow62: sociedade tradicional; as precondições para o arranco; o arranco; a marcha para a maturidade; e, por fim, a era do consumo em massa.

Nesse sentido, explica-se que a primeira, a sociedade tradicional, pode ser entendida como aquela que empreende grande proporção de seus recursos à agricultura, propiciando uma estrutura social hierarquizada, com poucas oportunidades para ocorrência de mobilidade vertical. As precondições para o arranco ocorrem através de transformações socioeconômicas lentas, observáveis, dentre outras formas, por meio do aumento do número de investidores nas áreas de transporte, comunicações, e na produção de matérias-primas, bem como pelo fortalecimento do comércio interno e externo e a propagação da ideia de que o progresso é necessário para o alcance de objetivos comuns63.

O arranco, por sua vez, caracteriza-se pela superação de velhos bloqueios e de resistência ao crescimento continuado, tornando o crescimento condição normal da sociedade. Na marcha para maturidade, o aumento da produção supera o crescimento demográfico; há expansão do comércio internacional, o surgimento de novas indústrias e autonomia tecnológica nos processos produtivos. Por fim, na última fase, a era do consumo em massa, a população é predominantemente urbana; a renda per capita da maioria garante alto padrão de vida, o consumo é direcionado a bens duráveis e sociedade aufere anseios de bem-estar social64.

A tese do progresso linear foi refutada nos anos seguintes pela Escola Cepalina, porém exerceu grande influência na teoria do desenvolvimento em meados do século XX, principalmente, nos países da América Latina.

62 ROSTOW, Walt Whitman. As etapas do desenvolvimento econômico: um manifesto não comunista. Traduzido por Otávio Alves Velho. Rio de Janeiro: Zahar, 1961, p.11-27.

63 ROSTOW, Walt Whitman. As etapas do desenvolvimento econômico: um manifesto não comunista. Traduzido por Otávio Alves Velho. Rio de Janeiro: Zahar, 1961, p.11-27.

64 ROSTOW, Walt Whitman. As etapas do desenvolvimento econômico: um manifesto não comunista. Traduzido por Otávio Alves Velho. Rio de Janeiro: Zahar, 1961, p.11-27.

No documento Open Empoderamento e planejamento para o . (páginas 40-46)