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3 OBJETIVOS DA PESQUISA EMPÍRICA E PROPOSIÇÃO DO MODELO

3.2 DESENVOLVIMENTO DO MODELO TEÓRICO

O ponto de partida para a elaboração do modelo teórico foi a definição do conceito do luxo. A revisão da literatura acadêmica mostrou que esse conceito está longe de representar uma unanimidade entre os estudiosos, como se pode constatar pelo exame do Quadro 5 à página 78. Em vista disso, para o presente trabalho é proposta uma definição própria, apoiada nos elementos conceituais com maior nível de consenso, acrescida de alguns elementos que, na visão da autora, poderiam contribuir para uma conceptualização mais abrangente do constructo. Assim, no início da investigação empírica o conceito de luxo utilizado como fundamento para a modelagem multidimensional do Valor Percebido abrangia os seguintes elementos:

1. Dimensão Social: exclusividade, distinção social, sinalização de sucesso ou poder. 2. Dimensão Pessoal: prazer/hedonismo, composição da imagem pessoal, recompensa

pessoal.

3. Dimensão Cultural: tradição, conhecimento envolvido no uso e aquisição dos bens. 4. Dimensão das Características Tangíveis do Produto: qualidade superior, estética,

design refinado, raridade/escassez.

5. Dimensão das Características Intangíveis do Produto: know how de fabricação, inovação/criatividade, marca forte, país de origem.

Esse conceito norteou a elaboração do roteiro para a primeira fase do trabalho de campo, uma pesquisa qualitativa exploratória estruturada na forma de entrevistas em profundidade com consumidores de produtos de luxo. Os resultados dessa etapa exploratória levaram a uma revisão das dimensões inicialmente propostas para o modelo conceitual. Assim, foram redefinidas as seguintes dimensões para os Benefícios Percebidos do Valor Total:

1. Dimensão dos Benefícios Tangíveis do Produto de Luxo: estética e qualidade superior.

2. Dimensão dos Benefícios Intangíveis do Produto de Luxo: marca, país de origem da marca, país de fabricação, know how e inovação.

3. Dimensão dos Benefícios Sociais do Valor do Luxo: estilo de vida, sinal de sucesso, exclusividade, conhecimento e ostentação.

4. Dimensão dos Benefícios Psicológicos do Valor do Luxo: autoindulgência e estilo pessoal.

A dimensão cultural presente na definição inicial para o conceito de Luxo foi eliminada, porque os respondentes da pesquisa qualitativa associaram os conceitos ‘conhecimento’ ao contexto social e ‘tradição’, à marca. Estes foram, então, realocados à dimensão social e à dimensão dos benefícios, respectivamente.

Além das dimensões dos Benefícios Percebidos, diretamente derivadas da conceituação do luxo, o modelo teórico para o Valor Percebido Total contempla também as dimensões dos Sacrifícios Percebidos, caracterizados como:

1. Dimensão dos Sacrifícios Monetários: preço objetivo e preço de referência.

2. Dimensão dos Sacrifícios Não Monetários: riscos percebidos subjetivos e objetivos.

Quanto ao constructo Valor Percebido pelo Cliente (VPC), o caminho escolhido para investigação baseou-se no modelo que o considera um balanço entre os componentes benefícios e sacrifícios, estes entendidos como constructos muldimensionais de naturezas distintas e que funcionam como elementos constituintes do constructo de nível mais abstrato VPC Total. Esta concepção alinha-se à proposta de vários autores, entre os quais Churchill e Peter (2000), Woodall (2003) e Aurier et al. (2004). Segundo Lin, Sher & Shih. (2005, p.319), “a estratégia de conceitualização unidimensional

[benefícios menos sacrifícios] é eficaz e direta, mas não consegue discernir a natureza complexa do valor percebido”. Como observam Sweeney e Soutar (2001), uma medida mais sofisticada é necessária para compreender como os consumidores atribuem valor aos produtos e serviços. Em vista disso, no presente modelo, o valor percebido total é calculado não como a diferença, mas como a razão entre benefícios e sacrifícios (RAVALD & GRONROOS, 1996; NICKELS & WOOD, 1997).

Lin et al. (2005) sugerem que os componentes benefícios e sacrifícios não devem ser modelados como preditores em um modelo estrutural reflexivo para o Valor Percebido Total, mas em um modelo formativo de segunda ordem: “os componentes benefícios e sacrifícios, cada qual manifestado por múltiplos indicadores reflexivos, atuam como indicadores formativos do Valor Percebido” (LIN et al., 2005, p. 323). Lin et al. (2005) baseiam-se nas recomendações de Jarvis, MacKenzie e Podsakoff (2003) para identificar um constructo como formativo ou reflexivo, resumidas a seguir:

1. Segundo a definição teórica do conceito Valor Percebido como um trade-off entre o que é dado e o que é recebido, a direção da causalidade vai dos componentes benefícios e

sacrifícios para o constructo Valor Percebido Total, e não vice-versa. “Os consumidores

começam com suas percepções dos benefícios e sacrifícios, para então fazer cálculos mentais do trade-off e finalmente chegar a percepções sobre o valor total” (LIN et al., 2005, p. 324). Há, claramente, uma ordem temporal. Assim, o modelo para o Valor Percebido Total deveria ser especificado como formativo de segunda ordem, no qual os componentes dar-receber constituem os indicadores causais de primeira ordem. Assim, benefícios e sacrifícios definem e fazem parte integral do constructo Valor Percebido, não sendo, destarte, suas causas externas ou antecedentes.

2. Os componentes benefícios e sacrifícios são claramente distintos, mas não intercambiáveis, pois seu conteúdo e suas implicações sobre o valor percebido são diferentes (positivas versus negativas). Por exemplo, como observam Roig, Garcia, Tena & Monzonis (2006), qualidade percebida, preço ou características funcionais não possuem um conteúdo comum. No modelo formativo, cada subdimensão constitui um componente do todo, o qual se torna incompleto se algum deles for retirado. No modelo reflexivo, os indicadores são intercambiáveis, pois a validade se mantem mesmo quando um deles for retirado, uma vez que os indicadores possuem conteúdos similares (JARVIS et al., 2003).

3. O modelo reflexivo pressupõe correlações entre os índices. No entanto, os componentes do Valor Percebido Total são teoricamente independentes (SHETH et al., 1991), e não é necessário presumir que haja covariância entre eles. Prova disso é que, para posicionar estrategicamente os produtos, diferentes combinações de benefícios e sacrifícios são possíveis (uma combinação de benefícios altos com preços baixos, ou benefícios altos com preços altos, por exemplo). A variação em indicadores como a qualidade ou o design do produto não necessariamente está vinculada a variações no preço (ROIG et

al., 2006).

A partir da discussão acima, define-se o modelo teórico proposto para a investigação empírica como sendo do tipo reflexivo-formativo, onde: (1) o constructo Valor Percebido Total é considerado uma abstração, ou variável latente, de segunda ordem, (2) cujos componentes sacrifícios e benefícios são variáveis latentes ou constructos formativos de primeira ordem, (3) manifestados por múltiplos indicadores reflexivos (JARVIS et al., 2003; DIAMANTOPOULOS & SIGUAW, 2006; WHITTAKER et al., 2007). Cada dimensão dos benefícios e sacrifícios é medida por uma escala própria, com índices específicos (ROIG et al.,2006).

Woodruff (1997), assim como Day e Crask (2000), lembram que o valor percebido pode ser formado em diferentes momentos: antes da compra, durante ou depois do uso do produto. Os consumidores realizam um processamento independente em cada estágio do processo de compra, de forma a avaliar o valor recebido em cada etapa (PARASURAMAN, 1997). No estágio pré-compra, o consumidor pode pesar os custos percebidos de um produto em relação aos benefícios esperados e decidir-se a comprar, se o balanço for positivo. Na etapa pós-compra, o consumidor reavalia o valor do produto mensurando os custos reais contra os benefícios efetivos e pode inclinar-se à recompra, caso os benefícios ultrapassem os custos. As dimensões específicas que o comprador tenta equilibrar no estágio de pós-compra não são necessariamente as mesmas incluídas no processo de avaliação do valor antes da compra. Dado que a natureza e os antecedentes do valor podem variar com o tempo e o estágio do processo aquisitivo, a avaliação do valor esperado ou desejado antes da aquisição e a do valor recebido após a compra podem não ser comparáveis (JENSEN, 2001). Tendo em vista essas considerações, no contexto deste trabalho, o valor que se pretende medir é o valor

recebido e experimentado pelo consumidor a posteriori, ou seja, após a compra e o uso do bem.

Com base nos conceitos levantados na revisão da literatura, em discussões com o orientador e coorientador, e nos achados fornecidos pela Análise de Conteúdo das entrevistas realizadas durante a fase exploratória qualitativa da pesquisa de campo, foi elaborado o modelo conceitual e suas respectivas hipóteses (Figura 38).