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2.4 Um Breve Caminhar sobre a Evolução Histórica e Conceitual da Dignidade

2.4.5 Dignidade no âmbito das organizações

O termo dignidade organizacional foi empregado pela primeira vez através do estudioso Margolis (1997). Nessa ocasião, no entanto, esse autor abordou a dignidade no contexto intra- organizacional, ao delinear condições para a promoção da dignidade de funcionários de organizações. O modelo criado por este autor ressalta que para as organizações respeitarem a dignidade de seus trabalhadores deve haver ausência de danos físicos, intelectuais e emocionais a eles e, para que promovam essa dignidade, deve ser dada atenção a três condições: autonomia, respeito por contribuições dos empregados e oportunidades para crescer e se desenvolver.

Na visão de Hodson, 2001 (apud SILVA, 2010, p. 93), assegurar a dignidade dos profissionais também é importante para as organizações, uma vez que elas poderão usufruir dos atributos e contribuições destes profissionais. O Autor ressalta que são os próprios trabalhadores agentes promotores da dignidade nas suas vidas e, quando exercem ativamente esse papel eles concretizam a dignidade no trabalho e, dessa forma, poderão experimentar novas possibilidades e desafios.

A maioria dos trabalhos já desenvolvidos no tocante ao contexto organizacional direciona a sua discussão para as relações entre empresa e empregado, ficando de fora os demais stakeholders. Trazendo uma abordagem sobre a dignidade na perspectiva das relações sociais,

Jacobson (2009) propõe em seus estudos uma classificação sobre formas de dignidade na tentativa de maior entendimento sobre o conceito e os significados atribuídos a ele. A partir de uma revisão da literatura o autor identificou duas categorias. A primeira relativa à dignidade humana já ratificada anteriormente nas concepções judaico-cristã e grega, sendo destacado o valor abstrato e universal de cada ser humano, simplesmente em virtude de sua condição humana - e por ser inerente e incondicional não pode ser violada ou destruída. A segunda categoria identificada foi a de dignidade social, sendo esta percebida como aquela que acontece na relação entre indivíduos, grupos e sociedades. Segundo o autor a prática da dignidade social pressupõe alguns elementos importantes tais como, auto-respeito, valor a si mesmo, respeito e valorização aos outros. Para o autor A ausência desses elementos implica na violação da dignidade. A Figura 5 apresenta as condições mínimas necessárias para que a dignidade esteja presente nas relações:

Figura 5 - Condições para a dignidade em uma relação Fonte: Adaptado de Jacobson (2009)

Para Surgy (1999), dignidade está ligada ao tratamento com respeito e justiça, oferecendo aos funcionários informações sobre os diversos assuntos que poderão afetar a vida dos indivíduos. Já Becker (2007), concebe a dignidade na perspectiva da relação entre o líder e o seu liderado, tanto do comportamento do líder para com o liderado, como dos comportamentos dos liderados para com o líder, onde a relação de dignidade é a base para se pensar a capacidade competitiva da organização (SURGY, 1999; BECKER, 2007 apud SILVA, 2010).

Na busca por ampliar os estudos acadêmicos em relação ao contexto organizacional, Teixeira (2008) propõe um conceito de Dignidade Organizacional que contempla, não apenas o contexto interno às organizações, mas a dignidade nas relações entre stakeholders internos e externos. ORDEM SOCIAL CONTEXTO ATORES RELACIONAMENTO ENTRE ATORES ENCONTRO DE DIGNIDADES

“A dignidade organizacional [...] consiste na relação entre pessoas da organização e outras, denominadas aqui de stakeholders, pautadas pela ação comunicativa, onde o que se diz é o que se pensa, de forma inteligível, e onde se estabelecem acordos baseados no entendimento e, portanto, não há intenção de usar o outro para o alcance dos próprios fins” (TEIXEIRA, 2008, p. 86).

Anterior à contribuição de Margolis (1997) e Teixeira (2008), já existia alguns sinais de preocupação com a dignidade humana com valorização ao trabalho quando a própria igreja, a partir da Encíclica Rerum Novarum de Leão XIII, proclamava a união entre o capital e o trabalho, pela íntima dependência um do outro, assim como, se defendia melhores condições do contrato. O trabalho era percebido como a única fonte de sobrevivência, razão pela qual não deveria ficar à mercê dos interesses exclusivos das leis de mercado (MEDEIROS, 2008, p. 19). Margolis (1997) sugere que as organizações devem se preocupar com a questão da dignidade, enfatizando que além dos objetivos econômicos, outros objetivos também são necessários, tais como, ética, contribuição à comunidade e dignidade.

Cerca de quarenta anos depois das ideias apregoadas por Leão XIII, a Encíclica Quadragésimo Ano, de 1931, através de Pio XI, já discutia, embora de forma bem restrita, apenas ideias relacionadas à justiça social e as boas relações trabalhistas. Naquela ocasião houve uma tentativa de se avançar para aspectos como a participação dos empregados na gestão dos negócios e nos lucros, fazendo-se, inclusive, um alerta para os perigos do incentivo aos monopólios da livre concorrência (MEDEIROS, 2008).

(STAM, 2006) reflete que o equilíbrio entre o dar e receber, além de liberdade, tem a ver com dignidade. É notável como funciona de forma tão precisa o equilíbrio entre o dar e receber. Segundo o autor em ambientes em que existe essa prática e onde as pessoas cuidam em estar constantemente dando mais do que recebem, o saldo que se deixa é sempre de crédito em relação aos outros ao nosso redor, sendo esse raciocínio também válido para o ambiente das organizações.

Entendendo o contexto da organização além dos seus aspectos meramente racionais e tangíveis Teixeira, (2008) traz a visão da organização numa perspectiva orientada para a ação social, conforme defende Habermas (2003). “Para ele os atores sociais, ao agirem de forma comunicativa, reconhecem intersubjetivamente e assumem, em conjunto, pretensões de validade com as quais se apresentam uns perante os outros.” Baseando-se nesta acepção, a dignidade deve ser dirigida para todas as pessoas, assim como, deve preservar a conotação de auto-respeito que depende do reconhecimento social. Nesse sentido, a dignidade está ancorada no status social que deve ser igual para todas as pessoas.

Segundo Teixeira (2008), o conceito de ação comunicativa parece ser essencial se a intenção é se construir um agir organizacional pautado na confiança e na reciprocidade. Esse poderá ser um pressuposto que subjaz ao entendimento do que pode vir a ser uma empresa digna. Portanto a dignidade organizacional proposta pela autora consiste essencialmente na relação entre pessoas da organização e outras, tendo como principal eixo a ação comunicativa onde as pessoas têm espaço para dizer o que pensam, onde os acordos são baseados no entendimento mútuo e, portanto não há intenção de usufruir dos outros para alcance dos próprios fins.

A contribuição trazida por Margolis é relevante e apresenta bases de cunho existencialista, embora sua abordagem esteja mais voltada para a relação da organização com o empregado, privilegiando a dignidade do trabalho e o bem-estar pessoal do empregado, sem necessariamente contemplar o âmbito dos seus stakeholders (TEIXEIRA, 2008). Tomando como base um artigo produzido em 2010, sob o título “O conceito de empresa digna na percepção de trabalhadores brasileiros” as autoras Teixeira et al desenvolvem um modelo de empresa digna, considerando a organização como ator social. Os estudos continuam e Teixeira et al, em 2011, propõem um instrumento de pesquisa, a partir das respostas obtidas no estudo de 2010, dando origem a macro categorias referentes à dignidade organizacional: práticas, atributos e valores (TEIXEIRA et al, 2011). Em seus estudos as autoras apresentam cinco proposições (Promove o desenvolvimento do empregado, Oferece produtos e atendimento de qualidade, Respeita os direitos dos empregados, Favorece o meio ambiental e social e Não engana os stakeholders) para abordar a dignidade organizacional e defendem que a dignidade organizacional depende da congruência entre valores organizacionais esposados e compartilhados. Nessa abordagem, as práticas organizacionais relativas à stakeholders refletem a dignidade organizacional praticada.

3 METODOLOGIA DE PESQUISA

Neste capítulo serão detalhados os procedimentos metodológicos que foram adotados na condução da pesquisa, passando, em ordem de acontecimento, pela definição do problema, definição dos objetivos, determinação da natureza da pesquisa, operacionalização e análise das variáveis, elaboração de instrumento e estratégia de coleta de dados, coleta de dados, análise e interpretação de dados e produção da dissertação.

Anterior à apresentação de cada uma das etapas, convém inicialmente uma reflexão sobre o caráter de uma pesquisa científica. Luna (1988, p. 71) define a pesquisa como “uma atividade de investigação capaz de oferecer e, portanto produzir um conhecimento ‘novo’ a respeito de uma área ou de um fenômeno, sistematizando-o em relação ao que já se sabe”. Já as autoras Rosa; Arnoldi (2008) reforçam que a escolha do procedimento e das técnicas adequadas é ponto crucial para o desenvolvimento e a fidedignidade dos resultados das pesquisas.

Segundo Luna (1998, p. 72), “[...] o ponto em questão é que nenhuma técnica pode ser escolhida a priori, antes da clara formulação do problema, a menos que a própria técnica seja objeto de estudo”. Para o referido estudo foi formulada a seguinte questão de pesquisa: Qual a relação entre espiritualidade e práticas de dignidade na avaliação de gestores e não gestores de organizações da região do Nordeste do Brasil? Para responder a esse propósito definiu-se como objetivo geral: Identificar, na percepção de gestores e não gestores de organizações da região do Nordeste do Brasil, qual a relação entre espiritualidade e práticas de dignidade, com base nos modelos de REGO; CUNHA; SOUTO (2005) e TEIXEIRA et al (2011), respectivamente.