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O termo “espiritualidade'' vem da palavra latina “spiritus'' ou '' spiritualis” que significa respiração, sopro, ar ou vento. Spiritus é definido como'' uma animação ou princípio vital realizado para dar vida ao organismo físico” (Merriam-Webster Dicionário On line - Enciclopédia Britânica). Isto implica que espírito é a força da vida que habita em nós quando estamos vivos (Garcia-Zamor, 2003). Scott (1994) oferece uma definição paralela para o espírito como sendo ''o princípio vital ou força de seres vivos”. Espiritualidade, conforme definido por Mitroff e Denton (1999), é ''o sentimento básico de estar conectado com o próprio eu, com os outros e com o universo inteiro''. (KARAKAS, 2010).

No mesmo tom, Mitroff (2003) reconhece que há algo profundo e fundamental em todos nós que necessita ser reconhecido e alimentado diariamente. Para ele, espiritualidade tem um papel legítimo a desempenhar no local de trabalho e fica difícil conceber a ideia de que as organizações possam oferecer produtos de padrão mundial ou fornecer serviços do mesmo nível com uma força de trabalho emocionalmente depauperada ou espiritualmente empobrecida. Mitroff (1998) defende que espiritualidade pode ser o mais importante componente de todos os sistemas de gestão.

Fugindo da visão mais comum de que a espiritualidade está apenas relacionada à religião, aqui é trazida uma visão diferente da compreensão cotidiana. Para elucidar essa diferença cabe tratar sobre o conceito puro de espírito. O espírito é o modo de ser. Não é uma parte do ser humano, é uma maneira de ser desse ser exótico na natureza que aparece como homem e mulher, na medida em que ele faz história, isto é, constrói a si mesmo junto com os outros. É um ser cultural, da natureza, mas que atua sobre ela, modificando-a: destruindo-a ou pilotando-a positivamente. É um ser ético, que decide os prós e os contras, que tanto pode desejar o bem do outro, associando-se a ele, como pode rejeitá-lo, eliminando-o […] espiritualidade é captar esse movimento do mundo, o seu dinamismo, a presença do Espírito nas coisas todas (BACELAR, 2009).

O crescente interesse sobre o tema espiritualidade encontra um abrigo nas empresas, salas de reuniões corporativas, no mundo dos negócios em geral e no ambiente acadêmico. Para ratificar essa afirmação uma pesquisa aberta no Google (Maio, 2012) revela a existência de 4.849.000 resultados sobre espiritualidade, com a seguinte distribuição: espiritualidade na organização, 609.000; espiritualidade no trabalho, 2.860.000 e espiritualidade na empresa, 1.380.000. Uma pesquisa no Google Acadêmico (Maio, 2012) aponta para uma produção de 41.260 resultados em português, sendo: espiritualidade na organização, 15.400; espiritualidade no trabalho, 19.800 e espiritualidade na empresa, 6.060. Os mesmos três temas ao serem pesquisados no http://www.Amazon.com, o site nos oferece mais 2.016 títulos de livros sobre espiritualidade (soma geral), embora estes estejam relacionados a uma diversidade de constructos e alguns deles necessariamente não apresentam relação direta com o contexto organizacional. A partir de uma consulta na Base Ebsco (Fev, 2012), verifica-se também a existência de 262 artigos científicos entre os anos de 1992 a 2012. A produção de

Jan/2005 a Fev/2012 aponta para o número de 182 artigos e no período de Jan/2010 a Fev/2012, 60 artigos foram produzidos.

A Espiritualidade, portanto é percebida cada vez mais como um fator importante no local de trabalho e diversos autores já direcionaram atenção focalizada ao tema (Neal 1997; Ashmos e Duchon 2000; Korac-Kakabadse, Kouzmin, e Kakabadse 2002; Krahnke, Giacalone e Jurkiewicz, 2003). Na visão de Pawinee Petchsawang and Dennis Duchon, em seu artigo Measuring workplace spirituality in an Asian context (September 2009, 459–468), as pessoas trabalham não só com suas mãos, mas também com seus corações (aqui associado ao espírito). É quando as pessoas trabalham com o coração ou espírito que encontram significado e propósito, uma espécie de satisfação e realização pelo cumprimento do trabalho. Em outras palavras, significa que o trabalho pode ser um lugar onde as pessoas podem se expressar por inteiro sendo elas mesmas, permitindo-se a expressão da experiência humana em seu mais profundo nível - o nível espiritual, o que pode não só reduzir o estresse, conflito e absentismo, mas também melhorar o desempenho do trabalho (Krahnke. (PETCHSAWANG; DUCHON, 2009).

Para Heaton, Schmidt-Wilk, e Travis (2004), a espiritualidade pode moldar o comportamento dos indivíduos de uma maneira produtiva de dentro para fora. Estes autores defendem que a espiritualidade pode guiar empregados no sentido deles reconhecerem e compreenderem melhor o sentido da vida, portanto, podendo beneficiar o seu próprio desenvolvimento de carreira como também o desenvolvimento organizacional.

Nas contribuições de Petchsawang e Duchon (2009), o reforço da espiritualidade no local de trabalho pode ser visto também como uma abordagem para o desenvolvimento organizacional, permitindo a expressão de valores como a virtude, cidadania corporativa, a honestidade e integridade. A dimensão espitirual poderá permitir o desenvolvimento integral de toda a pessoa, e não apenas da sua 'cabeça' e 'mãos’, conforme já mencionado. Desenvolver os nossos egos espirituais significa expandir nossa consciência para que possamos ver o mundo livre das restrições normais (Howard 2002), e definindo-nos livres para ver com mais clareza, permitindo-nos oportunidades de criativamente enriquecer as nossas relações com os outros.

Dehler e Welsh (2003, p.114) descreve a espiritualidade no trabalho como "uma busca de sentido, mais profundo de autoconhecimento ou transcendência para um nível superior”. O sentido de significado e finalidade serve como uma fonte interna de energia que é então expressa exteriormente como um comportamento. Tepper (2003, p.183) define espiritualidade como "o grau em que um indivíduo está motivado para encontrar um significado sagrado e propósito para a sua existência", mas o autor faz uma observação com um comentário, semelhante a um argumento feito por Mitroff e Denton (1999), que a espiritualidade não está associada com a religião, Deus ou poderes superiores (PETCHSAWANG; DUCHON, 2009). Neck and Milliman (1994, p. 9–10) definem a espiritualidade no trabalho como "expressando um desejo de encontrar significado e propósito na vida"; "um estado transcendente e pessoal” “viver pela verdade interior para produzir atitudes positivas e relacionamentos” (PETCHSAWANG; DUCHON, 2009). Estes últimos autores enfatizam que embora as definições ofereçam grandes variações, em suas pesquisas identificam pelo menos a presença de cinco temas mais frequentes: conexão, compaixão, consciência, trabalho significativo e transcendência. A partir desses achados Petchsawang; Duchon (2009) definiram a espiritualidade no trabalho como a capacidade de se sentir conectado com ele, ter compaixão

com os outros, experimentando um estado de consciência interior na busca de trabalho significativo e que permite a transcendência. Para a elaboração de uma medida eles se apoiaram nesses cinco fatores. Para eles a espiritualidade no trabalho é multi-dimensional e cada dimensão ou componente a ela relacionada apresenta uma profunda conexão com as outras dimensões e não pode ser tratada de forma isolada.

Na visão de Kerber (2009) espiritualidade pode ser entendida como o reconhecimento do homem como um ser integral e integrante do universo cósmico, fazendo também parte desse contexto o seu trabalho. Nesse sentido, para Chanlat (2009), torna-se um imperativo que as pessoas sejam reintroduzidas no lugar que lhes pertence no universo do trabalho. E para a construção equilibrada do seu ser é indispensável resgatar o ponto de vista do sujeito, seu desejo em face das suas atividades profissionais e a contribuição essencial que o seu trabalho poderá lhe oferecer.

Em concordância com o pensamento de Kerber (2009) e Chanlat (2009), Guillory (2000), destaca que a pessoa integrada é aquela que integra o corpo, a mente e o espírito à maneira como ela vive no dia a dia a dia. E integração é o resultado da aquisição contínua de sabedoria através do aprendizado pela experiência. O corpo físico tem uma consciência que é a integração do instinto de sobrevivência e da herança cultural acumulada durante gerações. A mente é a nossa consciência pessoal, é a forma como programamos individualmente nosso conhecimento acumulado. Corresponde ao ego e é único para cada pessoa. A dimensão espiritual é nossa consciência criativa, ou seja, é a fonte da nossa sabedoria. A Figura 1, abaixo sintetiza e ilustra a visão do autor:

Figura 1 - Pessoa integrada Fonte: Guillory (2000)

ESPIRITUAL

(Eu Interior)

MENTAL FÍSICO

(Interface Cerebral) (Consciência Pessoal)

A PESSOA INTEGRADA

Para ter acesso à espiritualidade é necessário fazer perguntas fora do lugar comum e, principalmente, olhar para o nosso próprio mundo interior em busca de respostas. Esse processo não se constitui tarefa simples de ser realizada e pode ser muito frustrante, uma vez que raramente somos encorajados a buscar respostas dentro de nós mesmos. Em geral, aprendemos na nossa cultura que as melhores soluções para as nossas dificuldades são fornecidas por fontes externas. Todavia, a espiritualidade, por outro lado, sugere que essas soluções emanam de fontes internas (GUILLORY, 2000).

Numa visão bem semelhante sobre o caráter de integralidade do ser humano, Covey (2005) afirma que no ambiente de trabalho há falta de um paradigma completo de quem somos - nossa visão fundamental da natureza humana. Ele enfatiza que seres humanos não são apenas coisas que precisam ser motivadas e controladas, mas são seres movidos por quatro dimensões - corpo, mente, coração e espírito. Segundo o autor, desde os primeiros registros históricos são encontrados nos estudos das filosofias e religiões ocidentais e orientais as mesmas dimensões universais da vida: física/econômica, mental, social/emocional e espiritual. Estas dimensões representam também as quatro necessidades e motivações básicas de todas as pessoas, sendo ilustradas na Figura 2 a seguir:

Figura 2 - Paradigma da pessoa integral e as necessidades e motivações básicas Fonte: Covey (2005)

Bergamini (2008) defende a ideia de que a “vida interior” que cada pessoa possui é o fator que afeta diretamente o seu desempenho. Com base nessa perspectiva ela relata que no

(MENTE) APRENDER Crescimento e Desenvolvimento (CORAÇÃO) (CORPO) AMAR VIVER Relacionamentos Sobrevivência (ESPÍRITO) DEIXAR UM LEGADO Significado e Contribuição

ambiente de trabalho a vida interior do colaborador é incorporada por um fluxo constante de motivações, percepções e emoções. A autora destaca que o desempenho de cada um dentro da organização é o reflexo de tudo aquilo que foi incorporado a si e que faz parte integrante da sua própria identidade.

Ainda na visão de Guillory (2000), para fazer parte de um processo espiritual a única possibilidade capaz de permitir que isso aconteça está na transformação coletiva e individual, sendo a transformação o processo de abandonar crenças que não servem mais para um propósito construtivo. Um exemplo de transformação pessoal é o entendimento de que o nosso sucesso pessoal nunca deve ser conseguido colocando em risco o sucesso do grupo. Porém para se ter essa compreensão é essencial que haja uma mudança radical para a pessoa que quase ao longo de toda a sua vida praticou um individualismo extremo e conseguiu experimentar recompensas.

Lama (2000, p. 32-33), considera que “a espiritualidade esteja relacionada com aquelas qualidades do espírito humano, tais como amor e compaixão, paciência, tolerância, capacidade de perdoar, contentamento, noção de responsabilidade, noção de harmonia e que trazem felicidade tanto para a própria pessoa, como para os outros”.

A partir de algumas pesquisas realizadas, Zohar e Marshall (2006), discutiram a existência de um ponto do cérebro humano que é utilizado para resolver questões de sentido e de valor. A esse ponto os autores chamaram de inteligência espiritual. Segundo estes autores o que dá vida à humanidade é a necessidade que esta apresenta de experimentar desafios dentro de uma estrutura com maior significado e propósito. Para eles, muito além da habitual noção de capital, o capital espiritual ou inteligência espiritual é o modo como vemos as questões mais importantes da vida. É uma riqueza que ajuda a tornar o futuro da humanidade mais sustentável e que nutre e sustenta o espírito humano. A parte espiritual que existe em nós nos impele a perguntar por que estamos fazendo alguma coisa e a procurar um modo melhor de fazê-la. Ela nos impele a querer que nossa vida e empreendimentos sejam capazes de fazer diferença no mundo.

“Os seres humanos têm profundo anseio por significado e propósito em suas vidas e retribuirão a quem os ajudar a atender a esta necessidade. Eles querem acreditar que o que estão fazendo é importante, que serve a um desígnio e que agrega valor ao mundo. No fundo, as pessoas anseiam por uma vida significativa e satisfatória e, por isso, procuram por alguma coisa especial que faça aflorar o que elas têm de melhor. De preferência, elas buscam uma harmonia entre seus valores pessoais e os valores de sua organização”. (HUNTER, 2006, p.116).

É importante se ter o pensamento complexo, ecologizado, capaz de relacionar, contextualizar e religar diferentes saberes ou dimensões da vida. Segundo a visão de MORIN (2011), “a humanidade precisa de mentes mais abertas, escutas mais sensíveis, pessoas responsáveis e comprometidas com a transformação de si e do mundo”. Em seus estudos, o autor fazendo uma reflexão profunda sobre o processo de educação e sobre a condição do gênero humano, enfatiza que a ética não poderia ser ensinada por meio de lições de moral. Ela somente é

formada nas mentes, tendo como base a consciência de que o ser humano é, ao mesmo tempo, indivíduo, parte da sociedade e parte da espécie. Ele conclui que todo desenvolvimento verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das participações comunitárias e da consciência de pertencer à espécie humana.