• Nenhum resultado encontrado

DINÂMICA DO PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS

3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.3 DINÂMICA DO PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO DOS RESÍDUOS

Nesta seção procura-se esclarecer a forma como se processa a classificação dos resíduos, seus pré-requisitos e objetivos.

Inicialmente, devem-se compreender três conceitos fundamentais antes de analisar as questões relacionadas à classificação dos resíduos propriamente dita.

Caracterizar: segundo Ferreira (1999), caracterizar significa “pôr em evidência o caráter de individualizar, distinguir. Referir a um traço peculiar”. As normas classificam os resíduos segundo características específicas como àquelas relacionadas ao comportamento mediante o teste de solubilidade (resíduo inerte ou não inerte), os resíduos com características de inflamabilidade, corrosividade ou toxicidade são denominados como perigosos.

Identificar: reconhecimento de coisa ou próprio. Comprovar a própria identidade. Tomar o caráter de adquirir afinidade com. As normas recomendam ensaios ou métodos de testes, considerados como instrumentos para identificação dos resíduos conforme uma característica específica. Através desses testes, comprova-se a identidade do resíduo (ex: o método de ensaio de ponto de fulgor - NBR 14.598 - é utilizado para identificação de resíduos que possuem, ou possam possuir, características de inflamabilidade). Neste caso, a identidade investigada é a inflamabilidade e o instrumento utilizado para identificação é a NBR 14.598.

Classificar: distinguir em classes ou categorias. Ordenar, agrupar segundo determinado método ou critérios. A norma brasileira atual agrupa ou ordena os resíduos com características de periculosidade na classe I e os de características de não-perigoso, nas classes II e III.

QUADRO 1: ILUSTRAÇÃO DA APLICAÇÃO DOS CONCEITOS À NORMA BRASILEIRA NBR 10.004

Classificação Denominação Características Identificação

Classe I Perigoso Inflamabilidade Corrosividade Reatividade Toxicidade Patogenicidade Métodos NBR 14.598 Medição do pH

Teste de reatividade a cianetos e sulfetos Teste de lixiviação

Classe II Não-inerte Solubilidade NBR 10.006

Classe III Inerte idem idem

Segundo Lora (2000), a classificação dos resíduos sólidos deve ter como objetivo os seguintes pontos:

Caracterização: conhecer as propriedades ou características dos resíduos que possam causar algum dano ao homem e ao meio ambiente.

Disposição: permitir a tomada de decisão técnica e econômica em todas as fases de gestão e manejo dos resíduos.

Mobilização: concentrar esforços da sociedade no controle dos resíduos cuja liberação para o meio ambiente seja problemática, de tal modo a permitir a tomada de decisões técnicas e econômicas em todas as fases do gerenciamento do resíduo (manejo, transporte e disposição).

Uma norma de classificação deve atentar para o cumprimento dos objetivos descritos acima. Devem ser claras quais as propriedades de um resíduo que se caracterizam por causar danos ao homem ou ao meio ambiente bem como a sua relevância. O objetivo da “disposição” evidencia a importância dos parâmetros empregados, o grau de perigo ou grau de risco reconhecido. A “mobilização” chama atenção para clareza e simplicidade para a devida compreensão das partes interessadas da sociedade.

Com base nos conceitos fundamentais (caracterizar, identificar e classificar) e em consonância com os objetivos descritos por Lora (2000), o processo de classificação pode ser esquematizado da seguinte forma:

FIGURA 1: SEQÜÊNCIA LÓGICA DO PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO

De acordo com a Figura 1, o primeiro estágio do processo de classificação é o instante no qual se definem as características a serem investigadas, ou aquelas de maior interesse. Por exemplo, num processo de admissão de resíduos em aterros sanitários, não são aceitos resíduos com características de inflamabilidade, corrosividade ou reatividade. Em aterros, na Europa, como proposta de decisão do Conselho que estabelece processos de admissão de resíduos nos termos do artigo 16 e do Anexo II da diretiva 1999/31/CEE, não são admitidos resíduos passíveis de transformação física, química ou biológica indesejável, resíduos cuja reação com a água produz gases inflamáveis, tóxicos ou explosivos, resíduos biodegradáveis, resíduos de odor pungente, resíduos auto-inflamáveis e resíduos que contenham ou possam gerar patógenos. Na França, conforme a lei de 18 de dezembro de 1992, serão aceitos somente “resíduos últimos” para deposição final em aterros. Essas restrições, colocadas como exemplos, podem ser tomadas justamente como aquelas características de referência no processo de classificação do resíduo.

No segundo estágio, inicia-se o processo de identificação. Este se faz através de métodos de teste e/ou listagens de resíduos. Procura-se, na identificação investigar características específicas dos resíduos. (seção 3.5 – Identificação dos resíduos perigosos).

No último estágio, procede-se a classificação. Ela pode ser feita, por exemplo, em biodegradável, descartável, reciclável ou combustível, incombustível. Outra opção seria resíduo último, não último, em perigosos e não perigosos, em classes I, II, III, como determinado pela NBR 10.004. Enfim, a escolha da forma de classificação depende de critérios pré-estabelecidos (seção 3.6 – Classes dos resíduos).

CARACTERIZAÇÃO

IDENTIFICAÇÃO

CLASSIFICAÇÃO RESÍDUOS

Definição de propriedades e características de interesse a ser investigada.

Ex.: ponto de fulgor, poder calorífico etc.

Feito através do uso de métodos de testes padronizados ou através de listagens.

Os procedimenos são adotados de acordo com a(s) característica(s) peculiar(es) a ser investigada. Ex.: Ponto de fulgor (ISO 1523, ASTM D93, NBR 14598)

Depende de critérios determinados

Ex.: NBR 10004 - Classe I, II, III (critério de periculosidade) Lei Francesa 30 de dez. de 2002 - Resíduos últimos e não- últimos. (critério de tratabilidade e sanitários)

Nos países industrializados, os resíduos são definidos em termos de cinco fundamentos complementares (Méhu, 2001):

• Sua suposta natureza perigosa ou inócua;

• De acordo com sua origem (por setores, atividades industriais, operação da unidade geradora etc.);

• Características (combustível, fermentável, oxidável etc.);

• Sua natureza ou constituição química (resíduos plásticos, resíduos contaminados com arsênio etc.);

• Resíduo de consumação, que tem sua vida útil esgotada (bateria, solvente, embalagens etc.).

Todos os pontos acima descritos têm sua relevância e, por serem complementares, podem definir um determinado resíduo em função de mais de um critério, por exemplo, os resíduos perigosos podem ser definidos em função de sua origem, característica ou natureza. O Quadro 2 mostra a utilização dessas práticas em vários países através de seus respectivos regulamentos.

QUADRO 2 - BASE DE REFERÊNCIAS DE NORMAS E REGULAMENTOS

continua

Origem Especificação

(Referencia) Fundamento Identificação dos resíduos

Brasil NBR 10.004(1) 1. Perigo 2. Origem 3. Características 4. Natureza 5. Consumo

Lista de resíduos sólidos para fontes não especificadas; Lista de resíduos sólidos para fontes especificadas; Lista de constituintes perigosos;

Lista de substâncias que conferem periculosidade; Lista de substâncias agudamente tóxicas;

Lista de substâncias tóxicas;

Provas normalizadas para determinação de teores de substâncias orgânica e inorgânica (SW 846);

Teste de lixiviação para avaliação da toxidade.

EUA EPA (40 CFR 261)(2) 1. Perigo 2. Origem 3. Características 4. Natureza 5. Consumo

Lista de resíduos sólidos para fontes não especificadas; Lista de resíduos sólidos para fontes especificadas; Lista de constituintes perigosos;

Lista de substâncias que conferem periculosidade; Lista de substâncias agudamente tóxicas;

Lista de substâncias tóxicas;

Provas normalizadas para determinação de teores de substâncias orgânica e inorgânica (SW 846);

TCLP – Toxidade.

CEE

Diretiva 75/442/CEE(3) relativa aos resíduos Diretiva 91/689/CEE(4) relativa aos resíduos perigosos 1. Perigo 2. Origem 3. Características 4. Natureza 5. Consumo

Lista conforme a origem dos resíduos;

QUADRO 2

conclusão

País Especificação

(Referencia) Fundamento Identificação dos resíduos

Nações

Unidas Convenção de Basiléia

(5)

1. Perigo 2. Origem 3. Natureza

Lista de resíduos conforme a origem e o tipo.

Austrália e Nova Zelândia

Ministério do meio ambiente(6) Idem Basiléia Listas semelhantes a da convenção de Basiléia;

Uso de provas normalizadas (HSNO Act).

França

Resolução de 30 de dezembro de 2002 (JO de 16 de abril de 2003)

NOR: ENVP 9250387A

1. Perigo 2. Origem 3. Característica 3. Natureza

Lista de resíduos da Comunidade Européia; Uso de provas normalizadas (Integridade física); Teste de lixiviação.

NOTAS:

(1) Norma ainda em vigor é a de 1987. (2) Versão atualizada de 2001.

(3) O marco legal de resíduos é de 1975, porém várias emendas complementam essa diretiva, sendo: 18 de março de 1991, decisão de 20 de dezembro de 1993, decisão de 3 de março de 2000 e a de janeiro de 2001.

(4) O marco legal de resíduos perigosos é a diretiva 91/689/CEE, de 1991. Esta possui emendas complementares como a decisão de 22 de dezembro de 1994 (JO L 356, 31.12.1994, p.14) e a de 16 de janeiro de 2001 (JO L 47, 16.2.2001, p.32).

(5) Sua disposição foi adotada em 1989 e entrou em vigor em 5 de maio de 1992. Ela deixa a cargo dos Estados Membros a elaboração de provas normalizadas para a investigação dos perigos potenciais que os resíduos possam oferecer ao ser humano e ao meio ambiente.

(6) SWAP (Solid Waste Analisis Protocol – Protocolo de Análise de Resíduos Sólidos) publicado em 2002. O Ministério do Meio Ambiente tem, como auxílio no tratamento com os resíduos perigosos, o HSNO Act (Hazardous Substances and New Organisms, 1996)

Nota-se (Quadro 2) que os cincos fundamentos descritos por Méhu (2001) são utilizados pela maioria dos regulamentos estrangeiros. Existe ainda uma preocupação notória na questão referente à periculosidade dos resíduos, utilizando-se de vários meios de identificação (listas e provas normalizadas). É importante frisar que esses fundamentos estão em harmonia com o esquema de classificação ilustrado, dividido nas três fases: caracterização, identificação e classificação.