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Quando as organizações passaram a ser objeto de pesquisas autônomas, isto é, um ramo específico do saber e da prática, nasceu a Sociologia das Organizações.

Descobre-se que existe uma dinâmica das organizações, assim como existe uma dinâmica dos grupos. O que implica, por hipótese, que existem traços comuns, ao nível das estruturas e do funcionamento, entre conjuntos aparentemente tão diferentes (LAPASSADE, 1989, p. 101-102).

Para Azevedo e Rojo (2005), Max Weber foi, dentre os fundadores da Sociologia, quem mais prestou atenção ao Direito. A ele devemos os primeiros elementos de uma teoria da Sociologia Jurídica.

Lapassade (1989) e Bernoux (s/d) destacam que Crozier e Friedberg foram os primeiros a propor o estudo da organização como fenômeno autônomo, isto é, que obedece às suas próprias regras de funcionamento e não determinado por constrangimentos externos. Para Friedberg e Crozier o conjunto das teorias que atribui demasiada racionalidade aos membros da organização é refutado, sendo

incorreto afirmar que os detentores de um papel se conformam a um modelo perfeito de racionalidade.

Etzioni salienta que:

[...] O problema das organizações modernas é a maneira de reunir agrupamentos humanos que sejam tão racionais quanto possível e, ao mesmo tempo, produzir um mínimo de conseqüências secundárias indesejáveis e um máximo de satisfação (1972, p. 9).

A partir de então, discute-se uma nova lógica nas organizações em que a capacidade de inovar torna-se mais importante do que a capacidade de racionalizar. Essa qualidade não depende somente de inovações tecnológicas, mas, também, e principalmente, da capacidade de mobilização dos atores das organizações, no sentido de cooperar de forma eficaz.

Entre as diversas formas de análise para a compreensão do fenômeno organizacional, Bernoux (s/d, p. 117) refere que a opção da análise estratégica aparece como a mais pertinente, salientando que o trabalho a ser desenvolvido pode ser formalizado ou não, mas alerta que: “[...] deve ser repartido entre os indivíduos duma maneira suficientemente clara para que um não tropece no outro [...]”.

A divisão de tarefas pressupõe precisão e duração; enquanto que a distribuição de papéis caracteriza a autonomia dos membros da organização, que podem “[...] comportar-se interpretando de maneira forçosamente diferente uma função idêntica [...]” (BERNOUX, s/d, p. 118).

Max Weber “é considerado pela crítica como o fundador da Sociologia das Organizações. Atualmente, a análise da organização se inspira nos conceitos weberianos de burocracia e de formas de dominação” (DELORENZO NETO, 1975, p. 42).

A Sociedade moderna, para Weber, caracterizava-se, cada vez mais, pela racionalização. Nesse contexto, a burocracia era o meio de organizar eficientemente um grande número de pessoas. Porém, na vida real, o modelo ideal-típico não existe, apenas algumas de suas características (LAPASSADE, 1989).

As principais características do modelo ideal-típico de organização de Weber foram destacadas por Delorenzo Neto (1975), nos seguintes termos:

O tipo mais puro de exercício da autoridade26 legal é aquele que emprega um quadro administrativo burocrático com funcionários nomeados e atuando conforme os seguintes critérios: a) São individualmente livres e sujeitos à autoridade apenas no que diz respeito a suas obrigações oficiais; b) Estão organizados numa hierarquia de cargos previamente definidos; c) Cada cargo possui uma esfera de competência, claramente determinada; d) O cargo é preenchido mediante uma livre relação contratual, o que possibilita a seleção; e) Os candidatos são selecionados com base em qualificações técnicas; f) São remunerados com salários fixos em dinheiro; g) O cargo é considerado como a única ou, pelo menos, principal ocupação do funcionário; h) O cargo estabelece os fundamentos de uma carreira. Existe um sistema de “promoção” baseado na antiguidade, merecimento ou em ambos; i) O funcionário trabalha inteiramente desligado da propriedade dos meios da administração e não se apropria do cargo e, j) Está sujeito a uma rigorosa disciplina e controle no desempenho do cargo.

As conseqüências principais da dominação burocrática são: a) Tendência ao nivelamento, isto é, base de recrutamento ampla em termos de qualificação pessoal; b) Tendência à plutocratização no interesse de uma formação profissional, a mais longa possível e, c) A predominância de um espírito impessoal e formalista.

A efetividade da autoridade legal descansa na aceitação da validez das seguintes idéias interdependentes: a) Que toda norma legal dada possa ser estabelecida por acordo ou imposição, visando fins utilitários ou valores racionais – ou ambos; b) Que todo direito consiste, essencialmente, num sistema integrado de normas abstratas. A administração da lei consiste na aplicação dessas normas aos casos particulares; c) A pessoa que representa a autoridade ocupa um “cargo” e está subordinada a uma ordem impessoal que orienta suas ações nas atividades específicas e, d) A pessoa que obedece a autoridade o faz apenas na qualidade de “membro da associação”. O que é obedecido é a “lei”.

Como categorias fundamentais da autoridade legal, têm-se: a) Uma organização contínua de cargos, delimitados por normas; b) Uma área específica de competência; c) Uma organização dos cargos que obedece o princípio da hierarquia; d) No tipo racional, os membros do quadro administrativo devem estar completamente separados da propriedade, dos meios de produção e da administração; e) Uma completa ausência de apreciação do cargo pelo ocupante e, f) Atos administrativos, decisões e normas formulados e registrados em documentos, mesmo nos casos em que a discussão oral é a regra.

Já Merton (1970) buscando demonstrar que o “tipo ideal” de Weber incluía parte considerável de ineficácia, destacou a “disfunção” no nível dos aprendizados

entre os membros da organização burocrática. Longe de serem eficazes, as organizações burocráticas tinham um funcionamento pesado e rígido. As especializações das funções criadas com o propósito de aumentar a eficácia traziam conseqüências disfuncionais, constituindo círculos viciosos de burocracia e ineficácia conforme Friedberg (1993).

Etzioni destaca que para Merton:

O conhecimento especializado do burocrata representa, na verdade, ‘incapacidade treinada’, quando se processa modificação na situação: a disciplina conduz ao devotamento aos meios e não aos fins; o tratamento impessoal dos clientes e dos casos cabe a pessoas que interatuam e que, assim, desenvolvem relações ou vínculos primários. Estas relações, por sua vez, poderão ter efeitos disfuncionais. Segue-se, portanto, que a análise das organizações resultará muito deficiente se não abranger o estudo dos participantes como pessoas, limitando-se a tratá-los como elementos que desempenham papéis dentro da organização (1972, p. 16).

Refere Lapassade (1989, p. 144): “[...] Pode-se pensar, com M. Crozier que, em Merton, a disfunção aparece como resistência do fator humano a um comportamento que se procura obter de forma mecânica [...]”.

Assim, para Merton, a rigidez transforma a adaptação da pessoa. Seu pensamento é explicado por Crozier:

[...] a disciplina necessária para obter, dentro do conjunto burocrático, o comportamento estandardizado que se deseja, supõe o desenvolvimento de uma atitude ritualista dos funcionários [...] cuja rigidez resultante lhe torna difícil responder às exigências particulares da sua tarefa e que, paralelamente, essa rigidez desenvolve o espírito de casta, abrindo assim um fosso entre o funcionário e seu público (1981, p. 262-263).

Quanto à burocracia, Crozier27 (apud LAPASSADE, 1989) observa que:

a) As regras impessoais, ao mesmo tempo em que protegem contra o arbítrio e o favoritismo, também isolam, pois tendem a eliminar o caráter pessoal das relações profissionais; b) A centralização das decisões evita os riscos da iniciativa pessoal (participação sem responsabilidade), porém, causam rigidez nas instituições. Dessa forma, os que decidem estão longe dos problemas cotidianos e concretos da organização e, c) O isolamento de cada categoria hierárquica impede o desenvolvimento de redes informais e de um espírito de clã.

No dizer de Crozier:

(ETZIONI, 1972, p. 17).

[...] Uma organização desse tipo acaba sendo composta de uma série de estratos sobrepostos, comunicando-se muito pouco entre si, e as barreiras entre eles serão tais que deixarão muito pouco espaço para o possível desenvolvimento de grupos ou de clãs que possam reunir membros de vários estratos (1981, p. 278).

Dá-se o surgimento da pressão do grupo, constituído pelo conjunto dos membros do estrato, sobre o indivíduo que a ele pertence para conformá-lo à moral do grupo e provocar sua adesão a seus próprios objetivos. Dessa forma, ocorre um deslocamento de objetivos, pois, no modelo burocrático, o objetivo original da organização não é a própria sobrevivência, mas a tarefa para cujo cumprimento ela foi criada.

Sainsaulieu (2006, p. 141) destaca que Crozier diagnostica a realidade das disfunções denominando-a de “círculos viciosos burocráticos, que acabam se reforçando mutuamente e impondo uma segunda natureza às relações humanas” e, d) Desenvolvem-se relações de poder paralelas (informais), em razão da permanência de zonas de incerteza: “[...] o peso da ordem oficial faz aparecer a ordem informal como ordem de oposição e de defesa” (LAPASSADE, 1989, p. 153).

Sainsaulieu ressalta:

A hipótese geral dos sociólogos da organização é que a disfunção burocrática é o resultado de uma libertação relativa dos atores afrontados a um conjunto de coações de que se servem para realizar um certo número e ajustamentos (2006, p. 142).

Complementa:

Esta análise das disfunções enriquece a compreensão do conjunto humano de trabalho revelando circuitos de relações e de reações previsíveis. Então a intervenção do sociólogo consistirá em tornar os membros do sistema social mais conscientes da realidade humana e de suas relações (SAINSAULIEU, 2006, p. 144-145).

Conforme refere Sainsaulieu (2006) Friedberg e Crozier propuseram analisar a organização como uma rede de relações de poder, onde os indivíduos e os grupos negociam a permuta de comportamentos conforme seus objetivos. Dessa forma todos os participantes dispõem de uma certa capacidade de negociação, mas

27 Lapassade (1989, p. 151) ilustra que essas regras burocráticas são particularmente visíveis na função pública e nas empresas do Estado, que constituem, aliás, o tema de pesquisa de Crozier.

alguns, porque capazes de controlar incertezas, são capazes de estruturar as negociações a seu favor.

Sob esse viés, impõe-se aceitar uma visão menos intencional da ação humana (racionalidade limitada), pois Friedberg explica que:

[...] a abordagem organizacional da ação social aposta no conhecimento, ao mesmo tempo que induz uma relação muito diferente entre este e a prática. Não procura desenvolver enunciados teóricos gerais e transferíveis de um contexto a outro, para seguidamente os impor a uma prática. Serve-se dos conhecimentos que produz num contexto de ação determinado para induzir a aprendizagem de um raciocínio junto dos atores respectivos, de modo a modificar a prazo os seus comportamentos. Em troca, ela serve-se da observação dos efeitos dessas práticas modificadas para endurecer e aprofundar os conhecimentos que produz nesse contexto e para avançar deste modo na compreensão das características estruturais do mesmo (1993, p. 23).

[...] esta não se resume aos objetivos que um indivíduo adota ou julga perseguir. Deixa também espaço a coincidências, ao acaso e à descoberta. Sem esquecer que outros mecanismos podem igualmente explicar as escolhas humanas: estas podem ser também fruto da tradição (“faço isso porque isso sempre foi feito assim!”), da fé ou da norma (“faço isso porque isso se faz assim, e ponto final!”), ou da intuição (“faço isso porque sinto que deve ser feito assim!”) (1993, p. 51).

Um dos problemas comuns das organizações, enquanto estrutura de ação coletiva, é a organização dos comportamentos de um certo número de atores cuja cooperação é indispensável. Atores, esses, que mantêm graus de autonomia e que nem sempre perseguem os mesmos interesses. Assim, partindo do pressuposto diferenciado de Weber (quanto à racionalidade como modelo ideal), Friedberg (1993 apud BERNOUX, s/d) destaca ser ilusório considerar o comportamento humano sempre refletido. Nesse contexto, as organizações não são um todo unificado e coerente. Trata-se de um conjunto onde se confrontam diversas racionalidades, assim, nada mais é do que uma arena de conflitos, onde se canalizam diferentes interesses.

A integração desse conjunto é precária. Precária porque ameaçada pelas estratégias de poder dos participantes, na medida em que as capacidades de negociação com os outros está ligada à incerteza de seu comportamento. Nessa realidade, Friedberg (1993) propõe que as organizações sejam vistas como uma rede de relações de poder e dependência, através das quais os indivíduos negociam, permutam comportamentos para levar a cabo suas tarefas, defendendo

seus interesses. O poder de cada um se dá em função da incerteza que é capaz de controlar e dominar seus parceiros.

Friedberg (1993) ressalta que o estudo da organização também pode ser voltado para um sistema mais vasto, abrindo-se um novo campo à reflexão organizacional: o campo das dinâmicas e redes organizacionais:

A partir das perspectivas de Friedberg e Crozier, têm-se vários postulados:

a) Os homens nunca aceitam ser tratados como meios a serviço de fins que as organizadores fixam para a organização. Cada um tem seus objetivos próprios (que não precisam ser, necessariamente, opostos aos da organização). Os organizadores não são dotados de uma racionalidade sem falhas, e a organização vive com esta multiplicidade mais ou menos antagônica; b) Por menores que sejam, sempre há uma relativa liberdade e autonomia dos atores.

Conforme Friedberg, os atores:

São dotados daquilo a que Michel Crozier (1990) chamou de ‘instinto estratégico’, o que significa que as suas condutas não têm que ver exclusivamente com a sua socialização passada, mas também com a percepção que têm das oportunidades e dos constrangimentos do seu contexto de ação. [...]. Nesta perspectiva, os comportamentos dos atores fazem sempre referência a duas dimensões, a dois planos. Por um lado, remetem para a história pessoal da pessoa, para os processos de aprendizagem que ela atravessou na sua família, na escola ou ao longo da sua vida profissional e nos quais pôde adquirir capacidades cognitivas [...]. Por outro lado, têm a ver com os constrangimentos e oportunidades da situação presente que provêm da participação da pessoa em jogos estruturados e na estrutura da interdependência subjacente. Esta obriga os atores, se querem ganhar, a cortarem eventualmente com os seus princípios, a infringir tal ou tal regra, em resumo, a diversificar, redefinir, enriquecer e modificar os critérios de satisfação, ou seja de racionalidade, que o seu passado lhes legou (1993, p. 217).

c) Os atores comprometem suas autonomias em zonas mal regulamentadas da organização, combinando-as com jogos de poder. O poder central tenta controlar a autonomia dos atores que procuram escapar do controle e, d) Nesses jogos de poder, a estratégia é sempre racional, mas de uma racionalidade limitada (em razão das estratégias dos outros e dos múltiplos constrangimentos do meio). O ator, geralmente, utiliza-se da solução menos insatisfatória naquele momento. Assim, face à situação diversa, há muitas soluções possíveis. Nas negociações, é importante explorar todas as soluções e sopesar suas conseqüências. Nesse contexto, valoriza-se a figura do decisor.

A análise da estratégia de poder, a partir das teorias de Crozier e Friedberg, é composta por três elementos: Sistema concreto de ação, Zona de incerteza e Poder.

A) SISTEMA CONCRETO DE AÇÃO

Define-se a organização como “um conjunto humano estruturado”. Nele, cada membro desenvolve suas estratégias particulares, que são estruturadas num conjunto de relações submetidas a constrangimentos do meio. Os membros estão sempre em constante movimento (mudança de pessoal, objetivos, etc.). Há, portanto, a necessidade de ajustes permanentes, que são realizados pelos membros que procuram reconstruir o conjunto posto em movimento, e esses “ajustes” são construídos. O sistema concreto de ação refere-se ao conjunto desses ajustamentos permanentes (BERNOUX, s/d).

Observa-se, assim, que o sistema das alianças é necessário porque a empresa confronta-se com um número muito grande de incertezas e as soluções nunca são evidentes (BERNOUX, s/d, p. 144).

Ressalte-se que não são jogos gratuitos: são constrangimentos impostos pela organização e que constituem passagem obrigatória das relações de poder, logo, do sistema concreto de ação.

B) ZONA DE INCERTEZA

Conforme Bernoux (s/d, p. 145), a zona de incerteza é um dos elementos que deve se integrado pelos atores nas estratégicas da organização. Afinal, qualquer organização está sujeita a múltiplas incertezas (exs. pela mudança das técnicas de produção ou de comunicação, evolução dos mercados, etc.). A partir desses constrangimentos, os atores reforçam ou diminuem suas autonomias, e daí o poder. O peso da incerteza recai sobre a autonomia do ator e a possibilidade deste fazer escolhas. Qualquer organização, mesmo aquelas com funções definidas precisamente, tem conhecimento que todo o esquema funciona em razão desses ajustamentos.

O recurso do poder é essa margem de liberdade dos indivíduos ou dos grupos, uns face aos outros (negociar, recusar, procurar obter algo, etc.). Essa possibilidade existe na medida em que o indivíduo consegue preservar uma zona em que o outro não domine, onde o primeiro pode tornar seu comportamento imprevisível (elemento indispensável).

C) O PODER

Enfim, Friedberg destaca:

Se quisermos compreender o funcionamento e uma organização a partir não de um modelo funcionalista a priori, mas dos comportamentos efetivamente observados dos seus membros, somos levados a alterar as prioridades. Em vez de partir de um conjunto de papéis definidos a priori como necessários ao bom funcionamento do conjunto e interiorizados pelos atores, tentaremos reconstruir as relações de poder e de negociação entre os indivíduos e os grupos através das quais esses papéis são ou não traduzidos em comportamentos efetivos, e a articulação dessas relações umas com as outras em jogos regulados (1993, p. 230-231).

Friedberg (1993, p. 119-120) define o poder: “[...] como a capacidade de um ator estruturar processos de troca mais ou menos duráveis a seu favor, explorando os constrangimentos e oportunidades da situação para impor os termos da troca favoráveis aos seus interesses”.

Por certo que dentro das organizações indivíduos e grupos, diferentes pela suas formações e funções, têm objetivos que nem sempre coincidem. As diferentes visões sobre os meios necessários para assegurar o funcionamento do conjunto vêm acompanhadas de estratégias nem sempre concordantes. Há um conflito de poder que necessita de um poder regulador para o referido conflito.

Nesse domínio, o poder é “a capacidade de certos indivíduos ou grupos de agir sobre outros indivíduos ou grupos” (BERNOUX, s/d, p. 152).

Portanto, o poder apresenta-se como uma relação e não como um atributo. Essa noção traz a característica de reciprocidade que “inclui a idéia duma pressão possível daquele que recebe uma ordem sobre aquele que a dá” (BERNOUX, s/d, p. 153).

Observa-se que, quanto maior for a importância da execução da ordem para o superior, maior é a possibilidade do inferior em obter vantagens. Porém, só pode fazê-lo até certa medida, já que a relação de poder continua uma relação desequilibrada. E, nesse contexto, o superior, antes de dar a ordem, assegura-se de que ela será cumprida, sob pena de arriscar uma má execução da mesma. Assim, a posição hierárquica não basta, deve o superior utilizar-se de estratégias suficientes para conseguir o que quer (BERNOUX, s/d, p. 155).

O poder possui dois recursos essenciais: constrangimento e legitimidade. Estrategicamente, aquele que dá a ordem e usa a força para obter a obediência, fá- lo-á mediante constrangimento físico, material, administrativo, etc., passando por

toda gama de sanções previstas ou imagináveis. Falar em “relação de forças” caracteriza uma situação de antagonismo.

Friedberg e Crozier (1977) enumeraram quatro fontes do Poder (apud BERNOUX, s/d, p. 157-160): a) Oriundo da especialização funcional. Nesse caso, a posição do especialista na negociação é melhor, pois o bom andamento da atividade depende de sua intervenção28 ; b) Domínio das relações com o meio: utilização de seus conhecimentos nos dois lados, “um ator utiliza, numa organização, as relações que tem com outra organização para fins perfeitamente estratégicos” (BERNOUX, s/d, p. 159); c) A comunicação: uma boa rede de comunicação. Uma decisão pode falhar somente em razão de informações insuficientes ou mal transmitidas. A comunicação de informações possui um grande valor estratégico e, d) Utilização das regras organizacionais: domínio das regras e conhecimento sobre a forma de utilizá- las.

Todas as quatro fontes de poder remetem para o domínio de uma zona de incerteza. Para analisar estrategicamente uma organização e verificar o seu real funcionamento, deve-se apoiar na análise do poder e das zonas de incerteza, construindo os sistemas e subsistemas concretos de ações.

A partir dessa abordagem, a organização, que inicialmente era encarada como um todo unificado e coerente, estruturada para fins preestabelecidos, integrada e racional, no final:

[...] não é mais do que uma arena política ou um mercado no qual se trocam comportamentos e se perseguem estratégias de poder específicas e cujas características (fins, estruturas, regras de jogo, “cultura”) são, por sua vez, o mero produto dessas permutas e desses confrontos (FRIEDBERG, 1995, p. 58).

No dizer de Berger e Luckmann:

A realidade da vida cotidiana é partilhada com outros (p. 46). [...] A realidade da vida cotidiana é, portanto apreendida num contínuo de tipificações, que se vão tornando progressivamente anônimas à medida que se distanciam do ‘aqui e agora’ da situação face a face (2005, p. 52).