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4 DIÁLOGOS ENTRE A EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERPESCTIVA DA

4.1.1 Direito ao Acesso

A evocação do termo Direito, como forma de garantir uma educação que oportuniza o acesso a todos os estudantes, e principalmente aqueles que apresentam deficiência, manifestou-se como central para os grupos de atores sociais desta pesquisa. Considerando o princípio constitucional de que a educação é um direito de todos, assim sendo, em todos os níveis e etapas de ensino devem oferecer o acesso a qualquer pessoa que queira adentrar no sistema regular de ensino. De acordo com Fávero, Pantoja e Mantoan (2001) não é qualquer forma de acesso à educação que contempla a similitude de uma educação para todos. O Direito, nesse sentido, é uma oportunidade de equidade no acesso aos bens sociais para as pessoas com deficiência, que no contexto histórico da educação vivenciaram momentos de afastamento dos espaços escolares comuns a todos.

Na busca de atender o direito de equidade de oportunidades das pessoas com deficiência, e influenciado pelos movimentos sociais mundiais em torno de políticas compensatórias àqueles que historicamente foram excluídos, constitui um espaço emergente de discussões em torno das políticas afirmativas. Essas que pleiteiam temporariamente reparar a exclusão de um passado histórico de segregação, aspiram por uma inclusão, fundamentada no princípio da igualdade de oportunidades. Com isso, políticas de ações afirmativas afluem em um

intenso diálogo com contestações. Destaca-se a Lei nº 12.711/2012, conhecida como Lei das cotas, que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio.

Indiferente do sancionamento dessa Lei, o IFBA destina a reservas de vagas para pessoas com deficiência em seu processo seletivo, desde o ano de 2006. Acredita-se que essa política institucional despontou perante uma proposição do Governo Federal do Programa Educação, Tecnologia e Profissionalização para Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas (TEC NEP). Esse, objetivou fomentar ações de acesso, permanência e conclusão de cursos com formação inicial, continuada, técnico, tecnológica, bacharelado, licenciatura, pós-graduação na Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica para alunos com necessidades educacionais específicas (BRASIL, 2000).

A datar do TEC NEP, perante a intenção de alcançar os resultados das ações do mesmo, o Estado planejou a implementação de Núcleos de Apoio aos Alunos com Necessidades Educacionais Especificas (NAPNE) em cada unidade das instituições pertencentes a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Perante o programa TEC NEP os NAPNE’s apresentam como finalidade, oferecer apoio didático aos alunos com necessidades especificas e seus professores, bem como, articular ações de pesquisa, ensino e extensão na área da educação especial na perspectiva da educação inclusiva, além do engajamento para a eliminação das barreiras de acessibilidade (BRASIL, 2000).

O NAPNE do campus Salvador do IFBA foi implementado em 2004. Já no campus de Barreiras em 2009. Dos 23 campi do IFBA, 14 apresentam o núcleo instituído em portaria.

O processo seletivo para o ingresso no ensino médio integrado nos campi do IFBA, ocorre mediante a realização de uma prova de conhecimentos que englobam as disciplinas do ensino fundamental, tais como: Português; Matemática; História; Geografia; Redação. No que tange a reserva de vagas as pessoas com deficiência nos editais dos anos de 2006 a 2013, disciplinavam que a reserva de vagas para pessoas com deficiência estava em cumprimento ao Decreto Federal n°3.298/99, o qual dispõe acerca da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Essas edições do processo

seletivo mencionavam a reserva de 5% do total das vagas disponíveis, as pessoas com deficiência. A pessoa com deficiência inscrita no processo seletivo apresentava no prazo de 72h um atestado médico informando o grau da deficiência, acrescido do código correspondente da Classificação Internacional de Doenças (CID10). Nesses editais, não houve informações aos candidatos em relação a possibilidade de solicitar a correção diferenciada das provas, respeitando a diversidade de condições específicas das pessoas com deficiência. Referente a outras possibilidades de acessibilidade no processo seletivo, os editais indicavam somente no item observações importantes, os seguintes fundamentos:

O candidato, portador de deficiência física, deverá marcar, no formulário de inscrição, o campo correspondente à sua deficiência informando que o impossibilita de fazer a prova de forma convencional para que o IFBA providencie as condições legais para a realização da prova.

O candidato, portador de deficiência, deverá apresentar Laudo Médico (original), até 72:00horas após a efetivação da inscrição, atestando a espécie, o grau ou o nível de deficiência com expressa referência ao código correspondente da Classificação Internacional de Doenças- CID (IFBA, 2010).

Por meio desses editais observa-se que a Instituição manifestava conhecimentos exíguos acerca da legislação que disciplinava a respeito da inclusão, como por exemplo, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, a qual foi implementada em 2008. Entre 2006 a 2013, infere-se que o procedimento de reserva de vagas pelo IFBA não atendia o princípio de igualdades de condições para o acesso dos alunos com deficiência no ensino médio integrado. Visto que, os editais analisados não apontavam informações esclarecedoras ao público alvo da educação especial em relação ao direito das condições legais e especificas para realização das provas como por exemplo, a disponibilidade de intérpretes de LIBRAS para o(a) surdo(a), ou ledor/transcritor para o(a) cego(a), tempo a mais de prova, dentre outros.

A começar do PROSEL de 2014 houve alterações significativas nos editais. O item que aborda em relação as vagas sofreu modificações em seu conteúdo, dispondo de esclarecimentos acerca dos tipos de deficiências. Além disso, os editais do PROSEL de 2014 a 2018 expõem um item que reporta ao atendimento diferenciado no dia da prova de seleção. Os atendimentos

diferenciados disponíveis no IFBA para o dia da prova, destinados as pessoas com deficiência são: Ledor; Transcritor; Prova ampliada; prova em Braile; Intérprete de Libras; Sala acessível; Sala mais vazia. Ainda, o candidato pode utilizar seus próprios recursos de atendimento diferenciado, a exemplo de: Órteses e próteses, andadores, muletas, cadeiras de rodas (comuns ou motorizadas), aparelhos de amplificação sonora, receptor de implante coclear, máquina braille, reglete e punção, soroban, régua de assinatura, bengala, cão- guia, lupa manual, lupa manual com luz, lupa horizontal. É importante ressaltar que o atendimento diferenciado no dia da prova não está correlacionado a reserva de vagas. Desta forma, candidatos que apresentam transtornos de aprendizagem, como também, patologias não relacionadas a deficiência, mas que necessitam de algum recurso para o dia da seleção, podem solicitar, e dispor de um tempo adicional de 60 mim para a realização das provas. Salienta-se que no último PROSEL para o ingresso em 2018, a instituição publicou o edital traduzido em LIBRAS e com áudio. Nos editais analisados o único ponto que está em desconformidade com a LBI corresponde ao não apontamento da disponibilidade de uma equipe multiprofissional para homologar as inscrições. Tal atividade na instituição, está vinculada ainda ao modelo médico de deficiência, sendo analisado pelo setor competente, apenas as condições mencionadas no relatório do médico que assiste o candidato, o qual é atrelado os critérios de diagnóstico do CID-10.

Considera-se que esse procedimento da Instituição reforça uma atitude segregadora, baseada no impedimento das sequelas da deficiência e não nas possibilidades de desenvolvimento de cada candidato. Esse pensamento acerca do processo de homologação para o processo seletivo é corroborado pelo episódio narrado pela aluna com deficiência visual do campus Salvador, no qual, ela relata que a sua inscrição não foi homologada devido a condição de sua deficiência. A Instituição informou a aluna, que ela não poderia prestar a seleção para o curso médio integrado em química, uma vez que a sua condição de deficiente visual a impediria nas atividades acadêmicas realizadas no laboratório. Diante dessa negativa, a família recorreu ao judiciário para o cumprimento do direito da aluna em participar do PROSEL. Perante ao

procedimento requerido ao judiciário, a aluna prestou a seleção para o ingresso e obteve a aprovação.

Um dos professores entrevistados na pesquisa, demonstrou o mesmo comportamento estigmatizante da comissão de homologação do processo seletivo. Conduta que expressa a supremacia daqueles que estão estabelecidos (ELIAS, 2000) em um contexto social, os quais negam as potencialidades das pessoas que não se enquadram no estereótipo prescrito socialmente, que caracteriza um padrão de normalidade.

Eu acho que deveria avaliar a deficiência do aluno e ver dos cursos que o IFBA oferece, quais são os cursos que aquele aluno pode fazer. Uma coisa é ele fazer o ensino médio, mas quando ele faz o curso técnico, por exemplo, se ele não enxerga, ou ele não tem capacidade motora, ele não pode fazer a aula de topografia ou ensaio dos solos (ASPCS 6).

Essa fala do professor expressa o preconceito construído em torno de um modelo da incapacidade da pessoa com deficiência, uma generalização indevida (AMARAL, 1988), a qual transforma a condição específica do sujeito em uma inabilidade global. Tal julgamento de incapacidade é produzido culturalmente, corporificado pela falta de informação em relação a deficiência, bem como, o desconhecimento dos recursos de tecnologia assistiva que favorecem o desempenho das pessoas com deficiência em sua vida diária, proporcionando a minimização de suas limitações.

Existe um número incontável de possibilidades, de recursos simples e de baixo custo, que podem e devem ser disponibilizados nas salas de aula inclusivas, conforme as necessidades específicas de cada aluno com necessidades educacionais especiais presente nessas salas (GALVÃO FILHO, 2009 p. 207).

Mesmo com as possibilidades dos diversos recursos de TA, para além da desinformação, pressupõe-se, que esses tipos comportamentos verbais observados no cotidiano escolar estão ancorados em uma resistência em alterar o status quo da representação social da deficiência, como incapacidade total do sujeito, bem como, a dificuldade que alguns professores apresentam em ressignificar a sua prática pedagógica.

Considerando que o IFBA utiliza o CID10 como instrumento legal norteador do acesso e que a despeito da existência dos profissionais dos NAPNE’s e CAPNE’s nos campi da instituição, para o acesso, em nenhuma das etapas do processo seletivo há uma participação efetiva prevista daqueles

profissionais ou de quaisquer outros relacionados à área de AEE. Deste modo, o comportamento institucional reflete a atitude histórica dos seus núcleos sociais que reforçam o estigma que atribui à deficiência uma condição estritamente médica do sujeito. Para além dessas, é necessário que sejam consideradas as questões psicossociais a partir da implementação de equipes multiprofissionais que considerem as definições de Pessoa com Deficiência legalmente estabelecidas e anteriormente citadas ao longo deste texto.