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Capítulo III – Estágio curricular em Farmácia Comunitária

6. Dispensa de Medicamentos

Na Farmácia Comunitária, a função primordial é o atendimento ao público, onde o ato da dispensa/cedência de medicamentos é central. Segundo o MBP, entende-se por cedência

de medicamentos o “ato profissional em que o farmacêutico, após avaliação da medicação, cede medicamentos ou substâncias medicamentosas aos doentes mediante prescrição médica ou em regime de automedicação ou indicação farmacêutica, acompanhada de toda a informação indispensável para o correto uso dos medicamentos” [1]. Como tal, cabe ao

farmacêutico a responsabilidade de que o ato de dispensa seja de maior qualidade possível e proporcionar também um aconselhamento adequado sobre o uso correto, racional e seguro dos medicamentos. Além disso, existem várias normas a seguir aquando a cedência de medicamentos.

O modelo de receita médica, que é utilizado para a prescrição de medicamentos (incluindo os manipulados e medicamentos contendo estupefacientes e psicotrópicos), foi aprovado e definido pelo Despacho nº15700/2012, de 30 de novembro. Este modelo foi alterado pelo Despacho n.º11255/2013, tendo sido retirado um campo na frente do modelo da receita onde o utente poderia declarar a sua intenção de pretender, ou não, exercer o direito de opção (Anexo X e XI) [20,21]. No entanto, ainda se aceitam receitas com aquele modelo anterior devido ao sistema informático não estar totalmente atualizado. A prescrição de outros produtos, nomeadamente para o autocontrolo da diabetes mellitus, géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial (produtos dietéticos), sacos de ostomia, fraldas ou outros, também são prescritos neste modelo [22].

Atualmente, encontra-se em processo de implementação a prescrição eletrónica, com o objetivo de aumentar a segurança no ato de prescrição e de dispensa, facilitar a comunicação entre os profissionais de saúde e agilizar processos. Contudo, a desmaterialização do processo ainda não foi conseguida, sendo permitido a impressão em papel até novas informações.

As receitas podem ser simples (“normais”) ou renováveis. As receitas simples são válidas pelo prazo de 30 dias seguidos, contados a partir da data da sua emissão. Já as renováveis têm uma validade de 6 meses, devendo nestas ser impressa a indicação da respetiva via (1ª via, 2ª via e 3ªvia) [22].De realçar, que em receita renovável, apenas podem ser prescritos medicamentos que se destinem a tratamentos de longa duração (constantes na Deliberação nº 173/CD/2011, de 27 de outubro) [23]. Existem situações em que ainda é permitida a prescrição manual, onde deverá vir indicada a exceção legal que levou o prescritor a não utilizar uma receita eletrónica, seja ela por: a) Falência informática; b) Inadaptação do prescritor; c) Prescrição no domicílio; d) Até 40 receitas/mês.

6.1. Regimes de comparticipação

A comparticipação dos medicamentos varia de acordo com o organismo e o regime de comparticipação a que o utente está sujeito e com o próprio medicamento em causa. Uma parte do PVP é paga pelo regime de comparticipação, o que faz com que o encargo final do utente seja menor. No entanto, para além dos regimes de comparticipação, como é o caso do Serviço Nacional de Saúde (SNS), existem ainda regimes de complementaridade, ou seja, o utente pode beneficiar de comparticipação por duas entidades diferentes, sendo que uma parte do PVP é paga pelo regime de comparticipação, outra parte pelo regime de complementaridade e o restante pelo utente (exemplos de complementaridade de alguns organismos com o SNS: Serviços de Assistência Médico-Social do Sindicato dos Bancários (SAMS), Portugal Telecom, EDP-Sã Vida). Nestes casos de complementaridade entre um subsistema e um sistema de saúde, é necessário fotocopiar a receita com o cartão de utente do subsistema, isto para posteriormente enviar o original para o sistema principal e a cópia para a entidade complementar.

Existem dois regimes de comparticipação de acordo com a situação económica do utente, sendo o regime geral para a população em geral e o regime especial para os indivíduos que estejam reformados e apresentem uma pensão inferior ao salário mínimo. Este fato é passível de visualizar no ato da dispensa, pois vem indicado na receita no local do regime de comparticipação (R.C) “R” para regime especial [22, 24].

Durante o estágio, pude constatar que o SNS é o principal organismo de comparticipação. As comparticipações do Estado são fixadas considerando o regime geral, que abrange todos os utentes do SNS e os trabalhadores migrantes. Dentro deste, existem ainda portarias (ou diplomas de comparticipação especial (Anexo XII)) que conferem comparticipações especiais para doentes crónicos com determinadas patologias (ex: Psoríase –

Lei nº6/2010, Alzheimer – Despacho 13020/2011), sendo que, nestes casos, imediatamente abaixo da designação do medicamento prescrito, o prescritor deve mencionar expressamente o diploma correspondente [22].

De salientar ainda que, a comparticipação dos medicamentos depende da demonstração técnico científica do seu valor terapêutico acrescentado ou da demonstração da sua vantagem económica. Assim sendo, são definidos quatro escalões de comparticipação, sendo A de 90% de comparticipação sobre o PVP, B de 69%, C de 37% e D de 15%, consoante a sua classificação farmacoterapêutica [22,25].

Existem produtos abrangidos pelo protocolo especial de comparticipação, como por exemplo, o protocolo de diabetes mellitus. Neste caso específico, devido à elevada prevalência desta patologia, o Estado introduziu um regime de comparticipações especial para os produtos de autovigilância e autoinjecção. Assim sendo, as margens de comercialização destes dispositivos da indústria e dos distribuidores grossistas é muito reduzida e as farmácias abdicam de quaisquer margens de comercialização. O valor máximo de comparticipação do Estado no custo de aquisição das tiras teste para indivíduos com diabetes corresponde a 85% do PVP e no custo de aquisição de agulhas, seringas e lancetas corresponde a 100% do PVP. O Despacho nº 4294-A/2013, de 22 de março de 2013, estabelece ainda uma redução de 15% dos PVP fixados anteriormente relativas a reagentes (tiras-testes) para a determinação de glicemia, cetonemia e cetonúria e das agulhas, seringas e lancetas destinadas a pessoas com diabetes [26,27].

6.2. Validade e autenticidade de uma receita

No ato da dispensa, é necessário certificar-se da validade e da autenticidade da receita prescrita pelo médico de modo a assegurar uma correta dispensa de medicamentos. Desta forma, é preciso ter bem a noção das regras de prescrição. O médico tem de prescrever por designação comum internacional (DCI), seguida da forma farmacêutica, dosagem, tamanho da embalagem e posologia. A prescrição por nome comercial é feita caso não existam medicamentos similares ou quando a receita é acompanhada de justificação técnica do médico.

Em cada receita só poderão ser prescritos até 4 medicamentos distintos, num total de 4 embalagens por receita, sendo que só poderão ser prescritas 2 embalagens para o mesmo medicamento. Excetua-se os casos em que os medicamentos prescritos são de embalagem unitária, onde poderão ser prescritas 4 embalagens desse mesmo medicamento (ex: metotrexato).

Segundo a Portaria nº 137-A/2012, de 11 de maio, a receita é válida pelo prazo de 30 dias a contar da data da sua emissão, sendo a receita renovável válida por 6 meses. É importante ainda referir, que a receita renovável apenas pode ser emitida através de prescrição eletrónica e que a única zona da receita que se destina a ser escrita, excetuando a assinatura do médico, é o verso desta [22,28]. Tanto a receita prescrita por via eletrónica,

como a por via manual, para serem válidas, devem incluir determinados elementos, constantes no anexo XIII. De referir ainda que, no caso de receita manual, não é admitida mais do que uma via e, havendo lugar a rasura ou correção, é importante verificar se as mesmas vêm devidamente rubricadas pelo médico prescritor [28].

Após a receita ser devidamente validada e interpretada, conforme os parâmetros abordados na Portaria n.º 137-A/2012 de 11 de maio, é essencial que o farmacêutico explique sucintamente e de forma acessível, para que são utilizados os medicamentos que está a dispensar, a posologia prescrita (se necessário, escrever a posologia nas caixas), duração do tratamento, possíveis efeitos adversos, contraindicações, precauções especiais de administração (ex: bifosfonatos) e conservação (ex: insulinas) e possíveis interações com outros fármacos, alimentos ou álcool. Além disso, é importante prestar algum aconselhamento sobre medidas não farmacológicas, caso se aplique, e esclarecer alguma dúvida que o utente possa ter. Depois de todas as informações dadas ao utente, dá-se início ao processamento da receita, em que os códigos dos medicamentos são lidos e é atribuído o subsistema de saúde e/ou portaria, caso exista. De seguida, finaliza-se a venda com a impressão da fatura e do talão de faturação no verso da receita (Anexo XIV), onde o utente assina apenas uma vez, independentemente de ter exercido ou não o direito de opção, confirmando simultaneamente os medicamentos dispensados. De acordo com a situação, a frase impressa no verso da receita varia, segundo o ofício circular n.º 1162/2013 (Anexo XV).

Por fim, a fatura é carimbada e dada ao utente juntamente com os medicamentos. A receita é carimbada, datada e assinada pelo operador que fez a dispensa e permanece na farmácia para a faturação no final de cada mês, sendo conferida uma segunda vez por um dos farmacêuticos presentes na farmácia. Todas estas situações exigem uma atenção redobrada de modo a garantir a autenticidade e o correto aviamento da receita para, posteriormente, reaver o montante da comparticipação [22,29].

6.3.Dispensa de Medicamentos Sujeitos a Receita Médica

Segundo o Decreto-Lei n.º176/2006, de 30 de agosto os medicamentos são classificados, quanto à dispensa ao público, em MSRM e MNSRM. Assim consideram-se MSRM os medicamentos que preenchem uma das seguintes condições:

a) Possam constituir um risco para a saúde do doente, direta ou indiretamente, mesmo quando usados para o fim a que se destinam, caso sejam utilizados sem vigilância médica;

b) Possam constituir um risco, direto ou indireto, para a saúde, quando sejam utilizados com frequência em quantidades consideráveis para fins diferentes daquele a que se destinam;

c) Contenham substâncias ou preparações à base dessas substâncias, cuja atividade ou reações adversas sejam indispensáveis aprofundar;

Já os MNSRM são todos aqueles que não preenchem qualquer condição das referidas anteriormente, salientando que os MNSRM não são comparticipados pelo Estado. De referir ainda que, dentro deste grupo, encontram-se os medicamentos homeopáticos e os medicamentos tradicionais à base de plantas, os quais também são classificados como MNSRM [12].

A dispensa de MSRM só pode ser feita mediante apresentação de uma receita médica, uma vez que a utilização destes medicamentos sem vigilância médica pode acarretar riscos tanto para o utente, como para a saúde pública [12].

Como já referi anteriormente, a prescrição e dispensa dos medicamentos é feita obrigatoriamente por DCI. Esta obrigatoriedade privilegia a dissociação entre marcas comerciais e tratamentos nos casos em que a existência de medicamentos bioequivalentes permita que o utente beneficie de poupanças nos seus encargos, sem abdicar da indispensável confiança na qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos. Assim, esta forma de prescrição possibilita maior liberdade do utente em relação à seleção de medicamentos que cumpram a prescrição médica e, assim, poder desempenhar um papel ativo na gestão dos seus encargos com medicamentos [20].

Para tal, torna-se necessário que o doente, durante o atendimento, seja informado dos medicamentos comparticipados e da existência de outros medicamentos equivalentes, assim como dos seus preços. Segundo a Portaria nº 137-A/2012, de 11 de maio, a farmácia deve ter disponível, para venda, no mínimo, três dos cinco medicamentos mais baratos para cada grupo homogéneo ficando a cargo do doente optar pelo mais barato, isto se o médico assim o permitir. Assim sendo, o médico poderá restringir a venda ao medicamento prescrito se justificar tecnicamente esta opção pela exceção a) ou b) do nº.3 do art 6.º que indicam medicamento de margem terapêutica estreita e reação adversa, respetivamente. Uma outra condição surge com a exceção c) que indica tratamento de longa duração, no entanto, nestes casos, o doente pode optar por outro medicamento desde que mais barato [12,22,28].

6.4. Dispensa de medicamentos em urgência

Nos casos especiais de urgência, alguns medicamentos podem ser dispensados sem receita médica. A cedência de urgência consiste na avaliação e disponibilização da medicação que um doente necessita em condições de emergência [1].

Na FR, esta dispensa especial só é realizada no caso dos doentes com um perfil farmacoterapêutico conhecido através da ficha do utente. Assim, nestas situações de extrema necessidade do medicamento, é feita uma venda suspensa, na qual o doente leva o medicamento, comprometendo-se a trazer a receita médica posteriormente. Na realização de uma venda suspensa, o programa atribui um número a esta que permitirá chamá-la para a sua resolução sendo devolvido o montante da comparticipação ao doente em questão. Os exemplos comuns destes casos são os doentes asmáticos, diabéticos, hipertensos ou com outras doenças crónicas que, pelo caráter da sua doença, é indispensável a toma da

medicação regularmente de modo a controlar o seu estado. Durante o estágio, os medicamentos que mais cedi, em situação de urgência, foram Ventilan® (salbutamol utilizado nas crises de asma) e medicação para o controlo da hipertensão arterial.

6.5. Dispensa de Medicamentos Sujeitos a Receita Especial

De acordo com o artigo 117° do Estatuto do Medicamento, estão sujeitos a receita especial (RE) os medicamentos que preenchempelo menos um dos seguintes requisitos [12]:

a) Contenham, em dose sujeita a receita médica, uma substância classificada como estupefaciente ou psicotrópico nos termos da legislação aplicável;

b) Possam, em caso de utilização anormal, dar origem a riscos importantes de abuso medicamentoso, criar toxicodependência ou ser utilizados para fins ilegais

c) Contenham uma substância que, pela sua novidade ou propriedades, se considere, por precaução, dever ser incluída nas situações previstas na alínea anterior.

Face a estas condições tão peculiares e possivelmente prejudiciais para o utente, é então imposta a necessidade de uma legislação específica especial. Assim sendo, a prescrição e dispensa deste tipo de medicamentos encontram-se legisladas pelo Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com posteriores retificações, e pelo Decreto Regulamentar n.º 61/94, de 12 de outubro [30,31]. Estes medicamentos não podem ser prescritos em receitas onde constem outros medicamentos, ou seja, têm de ser prescritos isoladamente,aplicando-se na mesma as regras anteriormente referidas quanto ao número de embalagens. As receitas que apresentem a prescrição destes medicamentos deverão indicar que são do tipo RE (Anexo XVI).

Durante a dispensa destes medicamentos, o sistema informático pede automaticamente o preenchimento dos seguintes dados: número de receita médica especial, nome do médico prescritor, nome e morada completa do doente; nome, morada completa e número e data de emissão do bilhete de identidade/cartão do cidadão do adquirente [31]. Por fim, após o processamento dos medicamentos é impresso no verso da receita os dados referentes aos medicamentos e ao adquirente e são emitidos dois talões, com as diversas informações introduzidas anteriormente no sistema, que serão anexados às duas fotocópias da receita em questão. O original é enviado à entidade de comparticipação, uma cópia é acompanhada por um dos documentos e é enviada para o INFARMED até ao dia 8 do mês seguinte e a outra é arquivada com a restante documentação e requisição na FR por um período mínimo de 3 anos.

No entanto, atualmente, só são enviadas mensalmente ao INFARMED as fotocópias das receitas manuais que contenham estes fármacos. De referir ainda que, na FR, faz-se o balanço anual de entradas e saídas das benzodiazepinas para posteriormente ser enviado ao INFARMED. Os requisitos obrigatórios de entrega ao INFARMED encontram-se no Ofício Circular n.º 100/2013, da ANF [32].