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Distinção entre revisão e reescrita ao nível processual

2. Revisão/Reescrita de Textos

2.4. Distinção entre revisão e reescrita ao nível processual

Revisão e reescrita têm frequentemente sentidos flutuantes que se recobrem parcialmente embora ambos designem a intervenção de um escritor num texto. Estes dois termos serão distinguidos em função de três parâmetros:

2. o conteúdo sobre o qual se opera a intervenção; 3. a natureza da intervenção.

1. A intervenção do escritor pode situar-se no momento da escrita, ou após a produção de um primeiro estado do texto. No primeiro caso, considera-se que se trata da revisão do texto. É neste sentido que Maurice Mas entende a revisão quando a define em termos de competências, intervindo em diferentes momentos da produção escrita (Groupe Eva, 1996). No segundo caso, trata-se da reescrita, que consiste na produção de um outro texto a partir do texto de origem.

2. A revisão só se exerce num texto designado pelo seu autor como inacabado, enquanto que a reescrita pode-se exercer em dois tipos de produtos diferentes:

¾ Sobre um texto considerado inacabado pelo seu autor, que tenta produzir outra versão: auto-reescrita;

¾ Sobre um texto produzido por um primeiro autor e em que um segundo autor tenta elaborar uma outra versão: hetero-reescrita.

3. Em relação à reescrita, as intervenções possíveis sobre o texto fonte são inúmeras e podem ser descritas em termos de transformações estilísticas ou retóricas, ou ainda em termos de operações de escrita. No caso da revisão, a intervenção do escritor pode ser analisado de duas formas:

9 Em termos de processo mental, inacessível directamente ao observador, mas reconstituído nos modelos de produção escrita, elaborados no quadro da psicologia cognitiva, apoiada no modelo de revisão de Hayes et al de 1987, que decompõe esta actividade em diferentes sub-processos:

- avaliação;

- detecção de um disfuncionamento; - decisão de intervenção;

- intervenção.

9 Em termos observáveis, isto é, as transformações visíveis do texto já produzido.

Este procedimento, anteriormente descrito, pode ser exemplificado através do modelo de revisão de uma produção escrita, proposto por Turco e representado a seguir:

Figura 4- Modelo de revisão proposto por Turco (Groupe Eva, 1996)

Neste modelo há que realçar o papel central da tomada de decisão dentro do processo de revisão e demonstrar que nem todas as revisões efectuadas poderão levar a uma reescrita. Também se encontra bem presente o carácter interactivo e cíclico das operações de escrita, avaliação e reescrita.

Produção de um texto Avaliação Texto considerado como estando de acordo com as expectativas. Texto considerado não estando de acordo com as expectativas. Texto mantido tal e qual como ele é. Modificação do texto (supressão, junção, deslocação, substituição.) Produção de outro texto.

Dada a complexidade envolvida nos processos de revisão/reescrita, quanto mais depressa se familiarizar a criança, aprendiz da escrita, com os mesmos, maior sucesso terá na construção da sua escrita.

No entanto, se a reescrita implica a revisão, esta não implica necessariamente a primeira. O escrevente pode ser capaz de diagnosticar um erro, sem ser capaz de produzir uma reescrita apropriada ou fazer apenas correcções específicas. Rocha (1999: 73) considera que “a revisão textual contribui para que a criança, desde muito cedo, (re)elabore concepções acerca da estrutura textual, considerando aspectos relativos ao nível de informatividade do texto, à ortografia, à caligrafia, à concordância, entre outros. (…) A revisão é entendida, aqui, como um procedimento para ver melhor mas, também, ver de outra perspectiva, na medida em que se considera que, durante a produção da primeira versão do texto”. O aprendiz tem sua actividade reflexiva centrada em aspectos como:

• O que dizer; • Como dizer;

• Que palavras usar…

Durante o processo, de revisão e de reescrita, o aluno tem possibilidade de se centrar no plano textual e discursivo e preocupa-se:

• Em dizer mais;

• Dizer de outra maneira – mais adequada ao destinatário e objectivo da comunicação;

• Analisar e/ou corrigir o que foi dito.

Nesta fase, o aluno preocupa-se com o sucesso da interlocução enquanto “proposta de compreensão” feita ao leitor, tendo em conta as informações que a este são necessárias, dadas as características específicas que separam a produção escrita da oral. Também pode colocar a tónica em questões relativas às

normas gramaticais e às convenções gráficas – concordância, ortografia, caligrafia – que são igualmente importantes para o bom funcionamento da escrita.

Rocha (1999) refere que esta capacidade, por parte do aluno, só é possível pela apropriação de habilidades textuais ao nível da revisão, as quais implicam avanços e recuos e uma natural construção do “eu-autor” da criança que se constitui como sujeito da própria produção. Este autor faz alusão a Ferreiro (1996), referindo que os professores deveriam valorizar mais os progressos do que os retrocessos, pois estes podem conduzir a uma inibição da escrita e da revisão: “Não podemos esperar que as crianças saibam fazer aquilo que estão apenas aprendendo a fazer. Sobretudo é impróprio aplicar este material infantil aos juízos derivados de uma norma adulta concebida como universal, inapelável, absoluta, o que levaria a analisar os produtos infantis buscando categorizar e contar os seus erros”. Grabe e Kaplan (1996) reforçam também a ideia do elogio e da valorização dos esforços dos aprendentes: “teachers need to encourage students to continue, to feel good about their writing, and to carry the activity through the completion” (275).

Algumas investigações comprovam que trabalhar o processo de revisão e reescrita nos alunos pode modificar os seus modos de pensar e agir, ajudando-os a mobilizar os recursos linguísticos adequados para escreverem novamente aquilo que escreveram mal de início. Para que eles consigam fazer a revisão/reescrita, não só como “operação de cosmética”, é preciso organizar e sistematizar sequências de ensino que tratem os tipos de textos que os alunos têm que reescrever. Pereira (2002) sublinha a importância de serem trabalhadas as técnicas específicas da revisão: substituição, deslocamento, acrescento, resumo (...), para que os alunos não se limitem apenas a fazer a tal “limpeza” de superfície mas evoluam no sentido de realizarem transformações de profundidade. A autora cita ainda Rosat, Dolz e Schneuwly (1991) que afirmam que através das actividades de reescrita, trabalhadas na perspectiva anteriormente referida, os alunos passam não só “a representar o texto escrito como algo transformável, algo que não nasceu como verdadeiramente se

apresenta aos seus olhos, como também aprendem a distanciar-se do seu próprio texto e a ser capazes de o criticar”.