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Distribuindo pizas: vida estafada, a de estafeta

percursos e discursos

1. Distribuindo pizas: vida estafada, a de estafeta

Lúcio é um jovem de 24 anos cuja primeira profissão foi a de estafeta. O seu trabalho consistia na distribuição de pizas, tinha então 16 anos. Depois das muitas voltas que a vida deu, voltou à estafetagem, mas agora trabalha por conta própria, tendo cons-tituído sociedade com um amigo. Nas finanças – orgulha-se –, está registado como ge-rente de empresa.

Lúcio ganhou a vida ao nascer, em Torres Novas, mas só mais tarde veio a saber verdadeiramente o que significava ganhá-la. O pai, antigo combatente das Forças Armadas, de tantas comissões que fez na guerra colonial, ganhou o estatuto de capitão, mas não sabe se chegou a ser um capitão de Abril. O que sabe, isso sim, foi que o pai nunca quis saber muito dele e disso guarda uma grande mágoa.

Eu nasci sem conhecer o meu pai. Nasci sem nunca estar com ele. Sempre fui criado com a minha mãe, a minha mãe sempre foi mãe e pai para mim. O meu pai pouco se interessava em me ver. No fundo, digo isto sempre com um pouco de ressentimento (...). Mas, no entanto, a minha mãe nunca foi uma pessoa que me criasse contra o meu pai, do tipo ‘O teu pai não vale nada!’ não, nunca, nunca fez nada disso. A minha mãe sempre foi uma pessoa do tipo ‘É o teu pai... Mas é o teu pai’... Nunca me virou contra o meu pai, nunca teve essa tendência do tipo: ‘Ele não vale nada! Tou muita magoada com ele! Ele nunca se interessou por ti! (...) E eu adorava o meu pai, eu sentia o meu pai como um ídolo, porque eu não me apercebia das coisas.

Muito raramente, num ou noutro fim-de-semana, encontrava-se com o pai, até que, aos 14 anos, experimentou ir viver com ele e com a madrasta. Mas a experiência não resultou. O ressentimento do abandono veio ao de cima e as relações deterioraram-se, acabando por ser expulso de casa.

Tive imensos problemas com ele porque não o aceitava. Não aceitava que ele me dissesse (...) ‘Sou teu pai!’. ‘Não, tu não és meu pai. Tu apenas comeste a minha mãe!’ Pronto, falando mal é mesmo assim. ‘Porque tu nunca foste meu pai, tu nunca me criaste. Tás agora aqui, apareces-me a meio a impores-me coisas...’ e eu ressenti-me com isso. Também aprendi um pouco com isso e mudei a minha atitude. Nessa altura havia muita gente que se metia na droga, da minha idade, e eu senti-me assim um bocado naquela, desamparado, e foi assim uma fase difícil.

No momento em que realizámos a entrevista ao Lúcio, o seu pai encontrava-se no hospital, padecendo de doença grave. O ressentimento do filho, embora não desaparecendo, atenua-se.

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No fundo sou capaz de o desculpar, mas sinto que ele devia ter-me pedido desculpas por nunca ter sido um pai para mim. Não é por mais nada, por nunca ter sido um pai para mim. (...) Sempre houve essa mágoa aqui dentro! E acho que ele vai morrer e... não vai haver aquela coisa... nem que seja o pedir... ‘Eu sei que eu nunca fui um pai para ti...’ (...). Gostava de ter ouvido. Mas não ouvi, paciência.

Em contrapartida, a relação afectiva com a mãe, com quem coabita, é de profundo respeito e reconhecimento. É a mãe que o ajuda quando precisa de dinheiro e tudo ela tem feito para nada lhe faltar. Trabalhou como porteira, em creches, como mulher a dias na limpeza de escritórios.

Ela foi a minha mãe e meu pai, ela tratou sempre de tudo, sempre teve o cuidado de trabalhar de sol a sol para nunca me faltar nada. E eu, às vezes, sou um pouco injusto para ela, eu reconheço, às vezes não sou o filho que deveria ser e às vezes, quando me lembro disso ou quando reconheço isso, tento ser o melhor possível para ela, tento fazer-lhe as vontades. Mas, às vezes, não é fácil... sabes como é! Sinto mais isso agora, sinto que lhe dou mais apoio agora do que lhe dava há uns tempos atrás. Também a minha vida não permite o apoio que eu gostava de dar, mas dou-lhe o máximo que me é possível.

Não apenas os problemas familiares tiveram influência negativa no percurso escolar do Lúcio. Na 4.ª classe, a ausência prolongada da professora ditou a primeira reprovação logo que entrou no 1.º ano do ciclo preparatório:

Fiz a primária normalmente como todas as crianças, não me lembro de grandes pormenores, sei que na 4.ª classe não tive professora, a professora teve muito doente e eu só tive o primeiro período de aulas, até ao Natal. Depois não tive mais aulas. Chegaram ao fim do ano, passaram--nos a todos. Depois tive um problema quando cheguei à preparatória, 1.º ano, não tinha preparação porque a 4.ª classe é o ano mais importante da primária, a mudança de escola naquela idade... se fosse a mesma turma, tipo se pegassem naquela turma e colocassem noutra escola a mesma turma era diferente porque era uma turma que sabia toda mais ou menos a mesma coisa, muito pouco não é? (...). Espalharam-nos pela escola toda. Mau resultado, encontrámos miudinhos que sabiam mais do que nós, os professores seguiram o ritmo daqueles miudinhos e a gente ficou para trás. Chumbei.

Lúcio repetiu o 6.º ano e, chegado ao 7.º ano, tudo se complicou mais, com as faltas que começou a dar às aulas para andar de skate. A mãe nessa altura sentia que já não tinha mão nele.

Entretanto é aquelas idades assim um bocado malucas, em que uma pessoa só faz asneiras e eu aulas não me apetecia, era a altura do skate e eu queria andar de skate e baldava-me até dizer

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chega e chumbei. Então tive um monte de conflitos em casa com a minha mãe visto que a minha mãe também sentia ‘Quer dizer eu tou aqui sozinha a criar este marmanjo e este marmanjo anda na brincadeira o dia todo e eu tou-me a matar para nada!’

Foi então que Lúcio foi viver com o pai e a madrasta para a outra banda do Tejo. Talvez que o pai, militar que era, tivesse mão nele. Com a madrasta não se dava muito bem, mas a sorte ainda lhe foi mais madrasta. Sentiu-se desacompanhado e, mais uma vez, as vicissitudes do sistema escolar acabariam por o afectar, quando se viu numa turma de alunos repetentes e indisciplinados que o arrastaram para novo chumbo.

Fui para um sítio onde não conhecia ninguém, fui para um ambiente completamente diferente daquele a que tava habituado aqui, foi um pouco complicado. Fui para lá, fui para a escola, fiz o sétimo ano outra vez, depois passei para o oitavo, depois no oitavo aconteceu-me outro azar. Fui parar a uma turma que era a pior turma da escola. Eu tinha quinze anos e era só pessoal de dezoito, dezanove, tudo repetentes, repetentes, repetentes, repetentes, tavam todos naquela turma encaixados e eu fui lá calhar (...). Nós tínhamos pessoal do 12.º que assistia às nossas aulas pela janela porque achavam incrível a porcaria que se passava na aula. Parecia autenticamente um jardim zoológico, berros, imitar animais, mandar os professores para aqui e para ali até eles saírem da própria sala de aula. Eram animais autênticos; andavam à porrada dentro da sala. Ainda me lembro de um professor numa aula, nunca mais me esqueço desta cena; o professor saiu da escola por causa de nós. (...) Desistiu! Não sei se foi dar aulas para outro lado, mas disse assim: ‘Eu não aguento! Vou-me embora!’ E era um professor de Matemática, espumava pelos cantos da boca quando falava (...) e toda a gente gozava. (...) Entretanto andava tudo à porrada na sala, a berrarem, a imitar animais uns para os outros e o professor a dar a aula sozinho porque ninguém tava a dar atenção, como é óbvio. Até que o professor vira-se, manda a caneta para o chão, e diz: ‘Tou farto disto! Vou-me embora!’ Isto só para veres mais ou menos o tipo de turma em que eu tava inserido. Pá, chumbei outra vez! (risos) Chumbei outra vez!

A mãe do Lúcio que não tinha mão nele, começou a ver que a mão pesada do pai também não o conseguia moldar. Foi então que se lembrou de o colocar na Casa Pia de Lisboa.

A minha mãe aqui viu que eu andava completamente atarantado, o dia inteiro sozinho, e que as soluções que o meu pai tinha para mim, que eram muito boas, no fundo eram bem piores que aquelas da minha mãe. Então voltei para cá, com quinze anos. Voltei para Lisboa, concorri para a Casa Pia, fiz uns testes psicotécnicos para entrar, escolhi a área, por acaso foi a área que eu escolhi que entrei porque há pessoas que depois pelos testes vão parar a outros sítios. Fazes testes manuais e escritos, trabalhos manuais tipo enfiar parafusos, ver quantos é que consegues enfiar e preguinhos, aquela porcaria toda. Desenhos, um monte de testes, eles fazem-te um monte de testes para tu entrares para lá, tanto que apesar de se dizer ‘A Casa Pia, aquela escola assim

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e assado’, não: há uma fila enorme para lá entrar que não entra, todos os anos. Há um monte de pessoas que fazem os testes, só algumas é que passam, só algumas é que entram. A Casa Pia, quando eu cheguei à Casa Pia acendeu-se uma luz na minha vida, um objectivo, algo palpável para eu fazer. Era o tal curso dentro de uma área que eu gostava ‘Pá, tenho aqui algo a que me agarrar, não tou a estudar por estudar’ que era aquilo que eu via até à altura. ‘Tou a estudar para quê?’ Era aquela idade, ‘Tou a estudar aquela matéria massuda! Eles gostam é de martelar a cabeça às pessoas e eu tou-me aqui a lixar para isto!’ Então havia qualquer coisa palpável. ‘Vou tirar um curso tecnicoprofissional, chego ao fim dos seis anos tenho uma carteira de técnico de electrónico e tenho alguma coisa para me pôr no mercado de trabalho’ (...). Eu gostei, fiz os testes e entrei (...) e fiz assim os seis anos lá. Sem chumbar, porque como vi alguma coisa a que me agarrar e qualquer coisa que eu gostava de tar a fazer, foi um instantinho. Em seis anos fiz aquilo, era o mínimo tempo que eu conseguia fazer, não havia possibilidade de fazer em menos. Em semi- internato. Das oito da manhã às seis da tarde. Eles não deixam sair da escola, mas a gente arranja sempre maneira de sair, como é óbvio! À hora de almoço, comer uns pastelinhos de Belém! Pronto passei seis anos assim.

Lúcio saía da Casa Pia às 6 da tarde, comia à pressa qualquer coisa, mais um pastel de Belém ou um rissol, uma imperialzita, e ia para a Amadora. Aí arranjara o seu primeiro emprego, em part-time, a distribuir pizas, das 7 às 11 da noite. E foram uns anitos a distribuir pizas. Deixou a distribuição de pizas por ter tido um conflito com a gestora de turnos, queria que ele fizesse estafetas mais rápidas quando tinha acabado de ter um acidente de motorizada e Lúcio não queria andar sempre no chão...

O Pizza Hut foi o meu primeiro emprego, saí porque tive um acidente e depois tive uns conflitos com a gestora que lá estava porque... foi uma coisa um bocado estúpida, posso dizer mesmo, estúpida. Ela entrou numa de... era um bocado parvinha também, tanto que ela já lá nem tá, saiu quase logo a seguir a mim. Eu vinha de um acidente, vinha com calma, não era aquele estafeta do ‘Faço tudo, faço as entregas todas e mais algumas!’ (...) Antes era o gajo que entregava mais pizas, e entretanto isso passou um bocado. Eu queria era não andar sempre no chão... Há sempre aquela altura de adaptação quando tu cais, ou quando tu tens um acidente, de te adaptares de novo. E eu tava nessa adaptação. Andava devagar, mais devagar. Pronto, fazia as entregas, não foi por causa das entregas que eu saí, foi mesmo por conflito com o chefe de turno que não devia ir muito com a minha cara.

Tempos duros, estudando e trabalhando ao mesmo tempo. Mas sentia necessidade de dinheiro para as suas despesas pessoais e não queria sobrecarregar a mãe; por outro lado, desejava mostrar aos outros e a si próprio que tinha capacidade para trabalhar, que seria capaz de vencer na vida.

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É preciso compreender uma coisa, porque é que eu fui trabalhar? Eu sempre vivi à conta da minha mãe, a minha mãe é uma pessoa sozinha, sempre me criou sozinha. E eu sempre tentei de alguma forma ‘pendurar-me’ o menos possível nela, e isto não porque ela não me desse tudo o que eu queria, porque dava. Era porque eu acho que quando eu quero uma coisa tenho que ser eu a comprar essa coisa e se eu quero ter certas e determinadas coisas tenho que ir trabalhar para comprar essas certas e determinadas coisas. E foi por isso que eu... para poder ter a minha mota, para poder ter a minha conta, para poder ter aqueles gastos do dia--a-dia, de ir ao café comer um bolo, com os amigos, tar a conversar e ser sempre eu a pagar. Não ter que estar todos os dias, que era uma coisa que eu não gostava nada, ‘Mãe, dá-me mil paus. Mãe, dá-me quinhentos paus. Mãe, dá-me...’

Quando terminou o curso de técnico de electrónica na Casa Pia, tinha já então abandonado a distribuição de pizas, arranjou o primeiro emprego a tempo inteiro numas bombas de gasolina, mas poucos meses esteve nas bombas pois seria chamado para a tropa onde lhe deram um trabalho de responsabilidade, guardador de material de guerra, dada a sua experiência de lidar com dinheiro na venda de pizas ou de combustível.

Saí da escola fui trabalhar para a bomba. Durou cerca de sete, oito meses, porque depois, entretanto, tive que ir para a tropa (...), fiz os quatro meses de tropa em Cascais. Na tropa também o cargo que eu ocupava era de quarteleiro de material de guerra. Mas isto tem uma lógica. Quando tu entras, sabes que a quantidade de analfabetos que vão para a tropa é incrível. Uma parte tem o 9.º ano e a maior parte nem o 9.º ano tem, então eles chegam lá e fazem uma selecção. Quem tem o 12.º, quem tem mais que o 12.º e quem tem menos que o 12.º. De quando eu entrei em Cascais, depois da recruta era eu e outro que tínhamos o 12.º. Só havia duas pessoas. E então desempenhámos funções, lá dentro, de responsabilidade. E destacaram-me para um sítio onde se guardam coisas de muita responsabilidade, em que é preciso muitos protocolos, por causa das armas, não faltar nada. Eles escolheram mesmo pela profissão que eu tinha, de trabalhar com muito dinheiro na bomba. Primeiro, escolheram logo porque tinha o 12.º, meteram-me logo de parte, a mim e a outro rapaz. Depois, pela profissão, como lidava com muito dinheiro, acharam que tinha mais responsabilidade e meteram-me a guardar as G-3!

Saído da tropa, para a qual fora chamado sem se fazer rogado, Lúcio fica sem saber o que fazer. Perdera o emprego das bombas porque, compulsivamente, o puseram a guardar as “G-3”; tinha experiência de lidar com dinheiro a troco de pizas e combustíveis e, mais relevante ainda, tinha uma qualificação, dispendera seis anos de vida para obter um curso de electrónica. Agora tinha de mostrar a si próprio que era capaz de conquistar a sonhada autonomia. Lúcio sabe que, numa sociedade crescentemente competitiva, a capacidade de autonomia é fomentada e valorizada como estratégia de obtenção de

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emprego. No entanto, o mercado de trabalho acaba por reflectir essa luta entre

autónomos provocando, como corolário, uma inevitável anomia. Para não se perder na

pior das anomias, o desemprego, decide-se pelo primeiro biscate que lhe aparece, num bar de Alcântara.

Depois da tropa andei uns tempos a trabalhar à noite num bar ali em Alcântara. Durante três meses. Isto foi há dois anos. Trabalhei pouco tempo porque o trabalho à noite é muito cansativo. Entrava às dez da noite, saía às sete da manhã. Era saturante, não era aquilo que eu queria fazer. (...) Engraçado. Quando eu acabei o curso e não fui trabalhar dentro do curso que tirei, fui trabalhar para uma bomba de gasolina, e eu sabia que se ia pôr a tropa e eu dificilmente arranjaria um emprego, porque a tropa também é um estorvo, dificilmente arranjaria um emprego em que eles me quisessem porque eu acabei as aulas em Junho-Julho e em Janeiro ia para a tropa. Então arranjei um emprego, fui para a bomba de gasolina para tar aquele tempo enquanto não fosse para a tropa (...). Passou-se aquele tempo todo e eu saí da tropa e... ‘Mas eu não vou para electrónica!’ Perdi-me um bocado também, fui para a noite, perdi-me um pouco. Serviu-me como experiência de vida, conheci gente do arco-da-velha, mas que não interessa a ninguém, e foi quando eu cheguei ao ponto de dizer ‘Isto não interessa a ninguém! Isto é um modo de vida para os meus colegas que estão aqui porque é isto que eles gostam, é isto que eles sabem fazer (...), não têm ambições, gostam de tar aqui, gostam de tar bêbados, gostam de se embezanar todos os dias.’ E para mim foi uma experiência, eu sabia que não era aquilo que eu queria, foi uma passagem.

Os tropeções da vida devem tomar-se com algum optimismo. Se não se cometessem erros, como se poderiam corrigir? Até que lhe apareceu a oportunidade de trabalhar numa imobiliária, vendendo casas. Depois passou para a venda de automóveis. Finalmente, decidiu voltar à estafetagem, mas por conta própria, tendo formado sociedade com um amigo.

Depois disso saí para ir trabalhar para uma imobiliária. Vendedor. Vender casas. Tive a trabalhar um ano na imobiliária. Entrei como comissionista, cheguei ao fim de seis meses passei a gestor de imobiliário. Depois houve uns conflitos e eu saí da imobiliária e fui trabalhar para outro lado, para um stand de automóveis. Estava como vendedor, no Cacém. Depois estive lá só dois meses porque entretanto abri a empresa em que estou agora.

Os trabalhos que Lúcio foi arranjando resultaram de contactos de amigos ou de respostas a anúncios de jornal.

O das pizas, acho que foi por jornal. Vi, fui lá e inscrevi-me, e depois chamaram-me para ir trabalhar com eles. O da bomba foi por intermédio de uma amiga (...). O da imobiliária foi também através de outras pessoas amigas. O bar foi através de um grupo de amigos que trabalhava à noite, uns

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tinham uns bares e eu tava a sair da tropa e falei com um deles e disse que tava a precisar agora de um emprego, que queria trabalhar, e ele meteu-me a trabalhar nos bares dele. Depois disso é que foi a imobiliária, através de umas pessoas amigas (...). Depois foi o stand (...). Isso não foi por intermédio de ninguém. Anúncio de jornal, fui fazer a entrevista e fui aceite passado dois dias (...). E depois foi a empresa, eu ‘tava a trabalhar no stand e entretanto um amigo meu (...) fez-me uma proposta de ser sócio dele visto que ele já tinha começado a empresa com um outro rapaz. E eu aceitei.

Lúcio faz questão de sublinhar que um jovem que queira trabalhar acaba sempre por encontrar trabalho porque, em sua opinião, falta de emprego há, mas não de trabalho. Para quem interpreta o mercado de trabalho como um “canal” que processa pessoas com uma “entrada” e uma “saída”, quando o canal se satura bloqueia-se, não dando entrada a todos que a desejam, nomeadamente os mais jovens, aqueles que nunca nele tiveram entrada. Um modo de aliviar a saturação do mercado de trabalho é acelerando a saída dos mais velhos para dar lugar aos mais novos. Mas Lúcio pensa que, no desemprego, os jovens não têm tantas dificuldades de arranjar trabalho quanto os mais idosos.

Eu tenho esta teoria, até posso estar errado: nós somos jovens, temos mais facilidade de encontrar emprego do que uma pessoa com uma certa idade, que já só sabe fazer certas e determinadas coisas, e quem quer trabalhar consegue sempre emprego ou trabalho. Já não falo em emprego mas trabalho, quem quer consegue porque trabalho há, há é falta de emprego (...). Muita gente tá a estudar, muita gente acaba o curso e muita gente quer emprego logo. Problema número um: arranjar emprego para aquela gente toda não é fácil, todos os anos sai imensa gente com um curso