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Jovens acompanhantes: “puta de vida que me fez puta”

percursos e discursos

7. Jovens acompanhantes: “puta de vida que me fez puta”

Tinha acabado de almoçar e, enquanto saboreava o café, folheando o Diário de

Notícias, reparei que, na secção de anúncios classificados, duas jovens universitárias

se ofereciam para convívio íntimo. Hesitei no contacto, mas acabei por marcar o número de telemóvel que aparecia no anúncio. Disse ao que vinha. Não pretendia o convívio íntimo que ofereciam, mas, tão somente, desvendar um pouco das suas histórias de vida. Do lado de lá da linha telefónica respondeu-me Inês, uma jovem estudante de Antropologia, que se manifestou apreensiva quando lhe disse que era professor de Sociologia. Depois de uma vacilação inicial, e segura de que não estava perante um professor da Universidade que frequentava, pediu-me que lhe ligasse daí a uns 10 minutos, tempo necessário para contactar Joana, a amiga, estudante de Arquitectura que a acompanhava nos “encontros íntimos”.

Passados 15 minutos voltei a contactar Inês que me afirmou a disponibilidade de se encontrar comigo, acompanhada de Joana: podia ser à noite ou ao fim da tarde desse mesmo dia. Aproveitei a embalagem e marcámos encontro para o mesmo dia, à porta da Reitoria da Universidade de Lisboa. À hora combinada (18 horas), aproximei-me lentamente da Faculdade de Letras para que pudessem identificar o meu carro, cuja marca, cor e matrícula lhes havia referenciado. Nisto, vejo que uma jovem, acompanhada de outra, me acena a mão, em sinal de reconhecimento.

Fiquei na dúvida. Serão estas? Não parecem prostitutas – vacilei, ingenuamente. Menos mal que, na dúvida, ocorreu-me uma outra hipótese, bem mais oportuna: as cabeças dos sociólogos não são imunes aos preconceitos. De facto, tinha na minha cabeça um tipo-ideal de prostituta e, à força, procurava encaixar a realidade nesse tipo-

ideal. Ora o que deveria saber é o que toda a gente sabe sem saber. As mulheres

socializam--se para evitarem parecer putas. E também as que trabalham como prostitutas optam, com frequência, por não parecer o que são, designadamente se, para além de putas, são universitárias e combinam encontrarem-se, à porta da Reitoria, com um professor universitário.

Todas as putas que trabalham com Inês e Joana saberão, certamente, que as minhas “jovens acompanhantes” são estudantes universitárias, mas duvido que alguma das suas colegas universitárias saiba que elas são putas. O facto de as prostitutas não se distinguirem facilmente das que não o são sugere que é absurdo atribuir qualidades inatas às putas. A diferença entre quem é ou não uma prostituta não é uma diferença

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de ser, mas de parecer. As putas que não são reconhecidas como tal escapam ao estigma de puta. O estigma surge, não por efeito da natureza das mulheres que acarretam com o estigma, mas por efeito de uma projecção, de um preconceito, mesmo quando parte da cabeça dos sociólogos.

Depois de ter correspondido à saudação de Inês e de Joana – tardei muito a reagir, embrenhado que estava na deconstrução de todos os meus preconceitos – subiram para o carro e deslocámo-nos para o parque desportivo da Cidade Universitária, local escolhido, de comum acordo, para a realização das entrevistas.

Comecei por entrevistar Inês, depressa me apercebendo de seus receios e timidez. Por vezes refugiava-se num sorriso enigmático, permanentemente aliado a um olhar “azul-acinzentado” que, inquietamente, persistia em assegurar o controlo do território que circundava o carro estacionado onde se realizava a entrevista. De vez em quando afastava os cabelos ondulados, de um castanho claro, com um gesto brusco, a que a cabeça parecia responder com um movimento igualmente repentino. Disse-me ter 24 anos, embora parecesse mais jovem, enquanto Joana aparentava ter os declarados 30 anos. Muito segura de si, Joana revelaria uma personalidade forte e uma maior desenvoltura de comunicação. Os seus lábios, avolumados por uma maquilhagem de vermelho sóbrio, rasgavam-se frequentemente num sorriso largo que deixava a descoberto a alvura dos dentes alinhados, em contraste com o negro do cabelo curto e desalinhado em gel.

Os pais de Inês são funcionários públicos, pequena burguesia executiva com ascendências rurais; os avôs eram pequenos agricultores da região de Chaves. Inês nasceu em Lisboa e vive com os pais, num 2.º andar de um prédio da Amadora. Anda na vida que agora leva já lá vão três anos, mas antes tinha tido alguns biscates. Começou a trabalhar aos 17 anos, numa empresa de serviços informáticos, por períodos que nunca ultrapassavam os seis meses:

Despediam-me e depois voltavam-me a chamar, passados uns meses, pois não queriam fazer contrato. Trabalhava das 8 às 2. Depois tive um mês na Zara, atendendo ao público. Isto tudo trabalhos normais (sorrindo)... Depois estive a trabalhar na FIL, em stands de algumas exposições, um amigo convidou-me (...). Entretanto, nesses intervalos, comecei a fazer outras coisas (sorrindo...). Eu sempre estudei, não é? E já chumbei, por isso é que estou com 24 anos. Chumbei dois anos. Bom, agora é assim, tenho alguns amigos, está a perceber... pronto, eu telefono-lhes, eles telefonam-me, e a gente combina aí uns encontros (diminuindo o tom de voz), está a ver...

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Pedi-lhe então que me contasse como tudo começou, nesta sua nova forma de ganhar dinheiro que é tida como a mais velha profissão do mundo. Inês tinha a cabeça cheia de morais e princípios orientadores, tinha um montão de conselhos que lhe deram e outros tantos que a si mesma se poderia dar. Mas estava de férias, queria divertir-se e não tinha dinheiro.

Começou tudo num Verão. Uma vez, no jornal, comecei a ver que pediam acompanhantes, mal sabia que aqueles anúncios, que aquelas coisas... pronto, que era isso! Depois comecei a ver que ofereciam 600 contos, assim uma coisa... por mês! E comecei a ver... ei!...por mês! Naquela altura, no Verão, pronto, a gente começa a pensar, comecei a procurar arranjar um part-time, pronto, todos nós, jovens, pensamos assim, durante as aulas não, mas chegando às férias, pronto, depois comecei a pensar assim: acompanhantes... bom, acho que deve ser assim acompanhar, sei lá, os velhos, não sei, quer dizer, eu não sabia bem que tinha (baixando a voz) a parte de sexo, mas sabia que havia aí qualquer coisa de maldade, pronto! E então o que acontece? Vi o telefone e telefonei, e disseram-me... (interrompendo-se e abrindo os olhos de espanto) Bom, ainda por cima foi um sítio que é conhecido (rindo muito). Eu não sabia onde era e comecei a perguntar: olhe, sabe onde é que é a rua tal, número tal? E as pessoas assim a olharem para mim... toda a gente sabia que eu ia... ali, na Columbano... Bordalo Pinheiro... O Sr. Dias era o dono da casa, o que pedia acompanhantes... eu fui lá, ainda me lembro de uma senhora que era assim uma loira, toda espada, assim com umas calças muita justas, então comecei a pensar, bom, já sei o que aquilo é. Então ela entrevistou-me e... ai, não sei o quê e aaaah, pois, não sei o quê, tu tens que... (baixando a voz), isto é a trabalhar, pois, sexo, e teve a explicar-me e eu... claro comecei a perceber o que era, mas mesmo assim, bem, já tinha tido namorado e já sabia como era, não é? E então pensei assim... “isto deve ser giro, não deve ser assim muito diferente, eh pá, ganha-se muito dinheiro!” (...). Era quinze (mil escudos) e nós ficávamos com 7,5. Foi há três anos.

Os sociólogos raramente se perdem nessas ruelas do aleatório em que se corre o risco de se perder não apenas a identidade como também o futuro. Mas um dia passei pela Columbano Bordalo Pinheiro e procurei a casa. Vi homens impacientes, rondando as proximidades do edifício. Movido pela força da curiosidade decidi entrar. Mas, quando já estava defronte da porta da casa ladeei-a e segui em frente, acelerando o passo. Era a primeira vez, em toda a minha vida, que rondava uma casa de prostituição. Depois de ter caminhado uns largos metros, voltei para trás, decidido a entrar e a vencer a minha própria impaciência. E entrei.

A dona da casa recebeu-me e apresentou-me algumas raparigas. Fixei-me numa que fazia tranças com o cabelo, como se fizesse tranças no entrançamento que a vida é. Fazendo tranças, o pensamento é livre e todos os príncipes encantados podem passear no pensamento. Mas de que serve sonhar com príncipes, quando o que conta

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é o entreabrir da porta que deixa entrever um cliente qualquer, cujo único encanto é a sua predisposição a pagar? A Gabriela das tranças depressa descobriu a minha timidez e, para me desinibir, calculo, disse-me que a “comesse toda”, que estava com “tusa” e outras coisas obtusas. Mais inibido fiquei ao não saber como reprimir-lhe um gesto que parecia insinuar afecto. Excessos tais baralharam as minhas convicções sociológicas. Provavelmente, no universo imaginário masculino, as prostitutas mostram-se famintas de sexo e, por isso, elas não se fazem rogadas a mostrar a sua fome. Puro equívoco. A prostituta dá-se a comer apenas por ter fome de dinheiro. A Gabriela das tranças – se a história contada não foi inventada – é mãe solteira, confessou-me, abotoando dois botões da blusa desabotoados por engano. De nacionalidade brasileira, tinha um namorado português com quem pretendia “ajuntar-se” logo que juntassem algum dinheiro. Com nostalgia recordou-me tardes em bancos do Jardim da Estrela e evocou corações e setas que inscreveram em algumas árvores do jardim, inscrições que procuravam eternizar uma relação cujo destino ali ficava traçado, nos troncos de árvore. Mas quis o destino que o destino fosse outro. E o que ficou da relação foi uma gravidez e um filho para criar, sem saber com que meios, pois todos a abandonaram, incluindo o pai do filho.

A iniciação da Inês no mundo da prostituição não foi tão dramática, embora a necessidade de dinheiro fosse uma causa determinante. O dinheiro com que o pai lhe migalhava os bolsos em mais migalhas se tornaram quando viu os bolsos cheios de notas que outros homens lhe davam. A sociedade industrial criou um modelo de integração social baseado, fundamentalmente, no emprego assalariado. Contudo, os jovens encontram no mercado de consumo um domínio marcante de integração social. Para alguns jovens, pouco importa de onde vem o dinheiro, garantida que seja a satisfação dos seus sonhos de consumo.

Inês tinha um namorado, mas acabou por iniciar-se sexualmente com alguém que fortuitamente encontrou na rua. Um desconhecido, um encontro casual que parece ter- -lhe aberto as portas para novos encontros casuais. Não me perguntem se é certo que, quando uma mulher não pode desfrutar do sexo do companheiro, se sente atraída por outros. No caso de Inês parece que sim.

Eu já tinha tido namorado e era da minha rua. Foi assim, eu quando andava com ele, andava com ele, não sei quê, nunca tinha tido outro namorado. Tinha aquelas coisas, mas nunca tinha feito assim nada mais íntimo, percebe? Eu já andava farta dele. Andava naquela fase em que queria experimentar outras coisas... Mas também não era capaz de... de... pronto!... de... ter assim uma

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relação como outras pessoas (...). Esse rapaz que eu namorei, não foi com ele, foi com outra pessoa! (risos) Por acaso muito mais giro que ele! Foi assim: foi uma pessoa que andava a meter coisas no correio, aqueles papéis (publicidade) (...). E então começámos a falar, não sei quê, pronto, e às vezes convidava-me durante o dia, não tem mal, a gente não tem nada que fazer, anda a passear... e então ehhhh... prontos, foi com ele. Foi uma experiência má (...). Foi logo com aquela pessoa que... eu nem gostava dele, não é? e acho que ele não gostava de mim porque... foi uma coisa tão parva, prontos, olhe. Aconteceu! (...).

Inês arranjou depois um novo namorado, mas que a controlava excessivamente. Já estudante universitária, Inês desfrutava da companhia dos colegas e amigos, gostava de sair à noite, mas o namorado opunha-se, desconfiado. Quando os homens desconfiam das suas mulheres, o estigma de puta aparece-lhes nas cabeças e projecta- se, em ricochete, na cabeça das que são alvo de desconfiança, haja ou não razão. Embora o estigma de puta se dirija, obviamente, às prostitutas, acaba por atingir todas as mulheres que levantem comportamentos suspeitos. As suspeitas do namorado de Inês – Onde estiveste? Com quem vais? Que vais lá fazer? – arrastavam uma acusação latente, ainda que montada na dúvida. Ou seja, na cabeça do namorado, Inês foi puta antes de o ser. O estigma de puta constitui uma representação que é usada como instrumento para atacar as mulheres consideradas demasiadamente autónomas.

Com este foi assim: eu andava com ele, ao princípio gostava dele, não sei quê, mas depois comecei a fazer certas coisas que não fazia antes, pronto, sair à noite e assim, com os meus colegas, e comecei a querer experimentar com outras pessoas, já estava farta dele! E depois era assim: qualquer sítio a que eu fosse ele tinha que ir! Percebe? Às vezes queria sair com amigos meus e não queria que ele fosse! Queria estar à vontade porque senão estava lá sempre a controlar-me! E então o que acontece? Houve uma altura que, pronto, eu comecei a chatear-me com ele, depois eu disse que já não queria andar com ele.

A convivência com os amigos da Universidade arrastou Inês para sociabilidades lúdicas, próprias do universo juvenil: frequência de discotecas, conversas de café, jantaradas, etc. Começou também a preocupar-se mais com a imagem, a querer vestir à moda, a gostar de exibir marcas. Mas os pais não tinham grandes posses e equacionou a hipótese de começar a trabalhar.

Depois pensei, vou arranjar um trabalho nas férias, qualquer coisa, começar a ter o meu dinheiro... quando vi os anúncios! Foi a partir daí! (...). Eu que era uma pessoa tão coiso e não sei quê, ir fazer isso... ao mesmo tempo o que me estava a dar gozo era o dinheiro e conhecer outras

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pessoas, pronto! Eu nunca fazia com os meus amigos porque pensava que eles iam contar uns aos outros. Não queria ficar malvista. Então ali, como não os conhecia... tava à vontade!

Inês contou-me depois como foram as suas primeiras experiências de prostituta e, quando transcrevi a entrevista que lhe fiz, veio-me à lembrança o encontro com a

Gabriela das tranças, a que revelou o sociólogo atormentado pela pesquisa de campo.

Quando me despedi de Gabriela e volvi à rua, acho que quase todos os transeuntes me observavam, com ar incriminador uns, de escárnio outros, e os que não me olhavam era certamente por cortesia, para não agravarem o meu embaraço. É curioso. Enquanto que a descoberta de um homem como cliente de prostitutas corresponde à vergonha secreta de um simples homem – no caso, um sociólogo – as putas consideram-se expoente da vergonha de todas as mulheres. Certo, todos nós sabemos, Goffman ensinou-nos, que a dinâmica de diferenciação mediante a vergonha é uma característica da vida social; no entanto, no caso das mulheres, quando se lhes atribui uma diferenciação mediante a vergonha, aumenta de maneira invariável a sua vulnerabilidade ao estigma de puta151.

Enquanto que uma mulher é repudiada por ser puta, o homem é julgado – ou julga que pode ser julgado, como me aconteceu – por ser apanhado em flagrante. Quer isto dizer que, socialmente, a desonra feminina associa-se a uma identidade de puta enquanto que o indecoro masculino relaciona-se com uma conduta de cliente. Num caso, a indecência é atribuída pelo que se é; noutro caso, pelo que se faz. E porque os clientes são indecentes apenas pela forma como sexualizam ou comercializam as mulheres, eu queria a todo o custo fugir de confusões, e a forma mais expedita de o fazer era sumir-me dos olhares recriminadores dos transeuntes daquela maldita rua, onde poderia ser reconhecido por um acto comprometedor, o encontro com a Gabriela das tranças.

Iam lá uns homens, não sei quê, a gente via-os, apresentávamo-nos (...), algumas pessoas a gente olha e: ihhh!... Com um estilo! Umas botas! Eu antes de ir p’ra lá pensei assim: ‘bem, mas eu tenho de ter cuidado, se eu encontro alguém conhecido’... então perguntei se podia antes ver as pessoas, então disseram-me – esconde-te ali atrás daquela porta – então eu espreitava sempre (...). Vem uma de cada vez. A gente arranja outros nomes. Eu era a Mariana. O cliente está numa sala e vai lá uma de cada vez. Ali éramos muitas. Umas 8! O cliente vê todas, depois, ao fim – é aquela, não sei quê. Quando uma já trabalhou algumas vezes, então tem de dar vez às que ainda não

151 Ver, a propósito, Gail Pheterson, The Prostitution Prism, Amsterdam University Press, Amsterdam, 1996.

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trabalharam (...). Parecia que eu estava noutro mundo. Não era que eu gostasse ou deixasse de gostar. Estava assim um bocado... o que é que eu estou aqui a fazer (...). Então eu fazia sempre com a mão e também (baixando a voz) sexo oral. E então o que acontece? E eles não se queixavam! Pronto, eu pensava que podia ser assim. Só que (baixando de novo a voz) eu devia fazer sexo, penetração, e não fazia. Então essa senhora, que era a Ana, começou a dizer – ‘Ah,

não sei quantos, Mariana, tens que começar a’... – ehhh... granda bronca – ‘tu... não... não sei quê’...– tinha que ver se começava a coiso, quer dizer, chamaram--me a atenção que eu não

fazia... hum! (...). Eles viam que eu também estava assim um bocado inibida...

Inês começou depois a relacionar-se mais facilmente com as companheiras e os clientes, a “socializar-se”, como me diria, evocando um conceito que aprendeu numa cadeira em que abordou as “teorias de socialização”. Na sala de espera é frequente que as prostitutas falem dos clientes mais assíduos: dos seus desejos, taras, vulnerabilidades, ideias, ambições. As novatas vão-se socializando com as mais experientes e, paulatinamente, vão descobrindo o “à vontade” possível para, quantas vezes contra-vontade, entregarem o seu corpo a um corpo desconhecido.

Começa-se a falar um bocadinho, p´rá aí uns cinco minutos, a apresentação – ‘então, não sei quê, então estás aqui’... - aaa..aaa... depois começamo-nos a despir, ele despe-se, eu também me dispo, as pessoas começam logo a meter-se à vontade (rindo)... Aquilo é quase instantâneo, a pessoa já sabe, chega ali, já sabe o que é que (baixando a voz)...

E enquanto se espera por clientes:

Há televisão... Fala-se... Elas falavam conversas parvas (...). Elas estão sempre a discutir, a falar alto, e depois tocam os telefones, depois atendem os telefones... e depois uma a discutir com outra... conversas parvas..., nem sei de que é... elas estão sempre a discutir (...). Eu via elas com telemóvel... Foi na altura que pensei comprar um telemóvel. Eu apercebia-me das conversas delas! Tenho que comprar um telemóvel! Às vezes pedem-me o contacto... quando estive lá conheci algumas pessoas, fiquei com o contacto delas, e gostava delas, gostava de sair com elas... depois, quando comecei já a não ter problemas em estar com as pessoas, eu até gostava de lá estar, gostava daquilo tudo, só que depois houve uma altura em que comecei a ficar com receio dos meus amigos porque, de vez em quando, saíamos e encontrava alguém (um cliente) e começava a corar: ‘Ei, que andas aqui a fazer, nunca mais te vi, não sei quê’... E eu: ‘Ai, e agora que vou

dizer?’

Inês decidiu então abandonar a casa da Bordalo Pinheiro. Há um ano que fazia a casa. Ficou com contactos de alguns clientes. Tinha telemóvel e os clientes facilmente a podiam contactar. Alguns tornaram-se amigos e fizeram pressão para que ela