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DIVERSIDADE DE GÊNERO E PRÁTICA PEDAGÓGICA CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONTEXTO BRASILEIRO

Carla Rezende Gomes1

RESUMO

O estudo discute, sob a abordagem de gênero, a prática pedagógica de professores das quatro primeiras séries do ensino fundamental, destacando as diferenças em sala de aula, no processo de construção das identidades de gênero em seus alunos. Gênero, como categoria analítica, traz embutida a idéia de separação entre o que é biológico e o que é construído culturalmente. A pesquisa qualitativa foi realizada no Brasil, por meio do Estudo de Caso em uma unidade de ensino do Município de Aracaju, capital do estado de Sergipe. Foram privilegiados para a coleta de dados: observação participante e entrevistas semi-estruturadas.

A amostra da pesquisa foi composta por seis professoras(es), quatro professoras da primeira à quarta série, uma de cada série e dois professores de Educação Física, um homem e uma mulher. Foram realizadas seis sessões de observação de duas horas cada, totalizando doze horas de observação participante em sala de aula, para cada docente. Percebe-se a existência de uma lacuna na inserção dessa perspectiva, na formação profissional das professoras, as quais reproduzem os estereótipos sociais influenciando a construção da identidade das crianças.

Os dados levantados apontam para o fato de que os estereótipos de gênero ainda são reproduzidos para as crianças, de uma maneira contínua e irrefletida, pela grande maioria dos sujeitos desta pesquisa. Também pode-se perceber um número menor de situações em que a prática pedagógica tenta romper com preconceitos e idéias ancoradas em estereótipos de gênero dentro da sala de aula. Discutir a questão da diversidade não se limita às questões de gênero, mas espera-se ter levantado questionamentos que levem a um repensar das práticas educativas e ao

1 Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe, Brasil e pela Universidade do Porto, Portugal. Bolsista do

Programa Institucional Doutorado Sanduiche- PDSE. Professora do curso de Psicologia da Faculdade Estácio de Sergipe. rezendecarla@hotmail.com

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reconhecimento de sua devida importância na formação da identidade daqueles que a ela se submetem no decorrer da sua história de vida.

Palavras -chave: diversidade, educação; gênero; identidade

ABSTRACT

The study discusses, under the gender approach, pedagogical practice of teachers of the first four grades of elementary school, highlighting the differences in the classroom, in the construction of gender identities in their students process. Gender as an analytical category, brings in the idea of separation between what is organic and what is culturally constructed. The qualitative research was conducted in Brazil, through the Case Study in a teaching unit of the municipality of Aracaju, capital of the state of Sergipe. Were privileged to data collection: participant observation and semi-structured interviews.

The survey sample consisted of six teachers (s), four teachers from first to fourth grade, one in each series and two physical education teachers, a man and a woman. Six observation sessions of two hours each were conducted, resulting in twelve hours of observation in the classroom for each teacher. Perceives the existence of a gap in the inclusion of this perspective, the training of teachers, which reproduce social stereotypes influencing the construction of the identity of children. The data obtained point to the fact that gender stereotypes are still played for the children, an ongoing and thoughtless way, the vast majority of subjects in this research. Also can perceive fewer situations where pedagogical practice tries to break prejudices and ideas rooted in gender stereotypes in the classroom. Discuss the issue of diversity is not limited to gender issues but is expected to have raised questions that lead to a rethinking of educational practices and the recognition of its due importance in shaping the identity of those who submit to it in the course of its history life.

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INTRODUÇÃO

A prática pedagógica é o que caracteriza o trabalho do professor. Para Bourdieu (1999), a prática resulta do habitus como sinal da incorporação de uma trajetória social, ou seja, o habitus, como estrutura estruturada e estruturante, integra, nas práticas e nas idéias, os esquemas práticos de elaboração oriundos da incorporação de estruturas sociais resultantes do trabalho histórico de sucessivas gerações. Para ele, a ação pedagógica é caracterizada pelo poder de comandar a prática, tanto em nível inconsciente, através dos esquemas constitutivos do habitus

cultivado, como em nível consciente, através da obediência aos modelos explícitos. Rodrigues (2002) acrescenta que o habitus é particular, é genérico, por estar em toda atividade humana, e que o habitus pedagógico também o é, por estar em toda atividade educativa, especialmente na formação de professores e em sua atividade pedagógica. Nesse contexto, as práticas pedagógicas da/o professora/or têm, simultaneamente, um caráter particular e genérico pois se estruturam a partir do habitus por eles apropriados na trajetória familiar, estudantil, profissional, exteriorizados na sala de aula, que se constitui num espaço privilegiado, onde fragmentos do cotidiano e da história oficial tecem-se para a construção de uma história particular. Com isso, pode-se perceber uma contradição nas relações profissionais e sociais da prática pedagógica de professores/as. Como profissionais, eles/as internalizam representações objetivas (habitus pedagógico), através do currículo escolar e do processo de formação que expressam outra visão de classe. Como indivíduos, pertencentes a um outro grupo social, eles reinterpretam, através da prática pedagógica, essas representações objetivas dos currículos escolares e da formação, por meio de habitus incorporados nas relações particulares de classe, isto é, que podem gerar e regular novas práticas independente de regras orientadas para um fim. Isso implica um processo em que o/a professor/a internaliza, em seu processo de formação profissional, o genérico do cotidiano social para exteriorizá-lo pelo particular do cotidiano de classe. Rodrigues (2002) conclui disso tudo que o

habitus das relações particulares de classe, também contido no habitus genérico do social mais amplo, cunha no/a professor/a uma identidade tendente a determinar a constituição de habitus pedagógicos ulteriores.

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Estudar as práticas pedagógicas do cotidiano escolar e da sala de aula de professoras/es é buscar compreender dimensões e sentidos particulares das ações que ocorrem no contexto genérico social e educacional e como elas se articulam com a realidade mais ampla. (Rodrigues, 2002).

Este estudo permite, também, identificar como nas relações interpessoais da vida habitual, naquilo que é aparentemente banal e rotineiro, que já não causa nenhum estranhamento ou indignação, se expressam e se instituem os significados para os valores e preconceitos que sustentam os mecanismos de produção das diversas formas de exclusão e de desigualdades sociais, na e pela escola. (Louro, 2004).

Desse modo, é importante ressaltar que o/a professor/a e sua prática pedagógica trazem marcas das tensões e contradições existentes no seu cotidiano e a maneira como estas contradições são interpretadas, bem assim pela forma como as representações de educação, escola, cultura, gênero, entre outros, habitam as subjetividades dessa/e profissional. Essas representações influenciam suas escolhas metodológicas, de conteúdo e estratégias de ensino.

Não é sensato analisar a prática pedagógica sem a devida reflexão quanto às condições objetivas e materiais na qual ela acontece. Em Azevedo (1999), fica claro que a prática pedagógica da professora da escola pública não acontece desligada da forma de existir da escola, e se relaciona não só à sua formação, seu preparo técnico, fundamentos psicológicos, culturais, políticos, etc., mas é fundamentalmente influenciada pelas determinações das condições objetivas do processo de produção do conhecimento na escola, logo é também a organização social e da escola que irá encaminhar os resultados do desempenho dessas professoras.

Segundo Brabo (2000), cada cultura atribui traços característicos a seu povo, determinando idéias, valores, e comportamentos comuns a homens e mulheres. Em quase todas as sociedades o poder é atribuído ao homem. No seu cotidiano, sua identidade é formada para exercer poder, em todas as circunstancias da vida, já a identidade feminina é forjada ouvindo as palavras, castidade, humildade, modéstia, sobriedade, trabalho etc..

Políticas Educativas, Eficácia e Melhoria das Escolas 35 Sabe-se que é no campo da educação que também se constroem e se fortalecem as identidades, e que ela é uma forte contribuinte para a perpetuação dos estereótipos de papéis, bem como de suas transformações e evoluções. Nesse sentido, é fundamental a importância da escola não só para o desenvolvimento cognitivo da criança, como também para o afetivo, moral e comportamental. Desse modo, o papel desempenhado pelas professoras na estruturação das bases da construção social da subjetividade e do processo de desenvolvimento infantil como um todo assume grande relevância.