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3 AS QUESTÕES ORÇAMENTÁRIAS E FISCAIS DAS PPPs

3.1 Marcos Legais, Regulamentares e Definições

3.1.1 Da própria Lei de PPP (11.079/2004)

3.1.1.2 Do Anexo de Metas Fiscais (Art 10, I, “b”)

Uma das primeiras disposições da Lei das PPPs faz menção de que as despesas criadas ou aumentadas pelo empreendimento não afetem as projeções do anexo de metas fiscais da LDO.

Dois conceitos merecem esclarecimentos: LDO e Anexo de Metas Fiscais. A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) é um dos instrumentos de planejamento orçamentário, e considerada uma das grandes inovações do texto constitucional de 1988, por reforçar o aspecto de planejamento da referida lei.41

O próprio texto da CF/88 nos dá a primordial informação que a LDO é um instrumento orçamentário de estipulação de metas e prioridades da administração,

39 VALLE, Vanice Lírio do. Parcerias público-privadas e responsabilidade fiscal: uma conciliação possível. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p.39.

40 DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998. p.187.

com preferências pelas despesas de capital42; balizador da elaboração da Lei

Orçamentária Anual (LOA), e que tratará – quando necessário – das alterações na legislação tributária; ou seja, qualquer alteração na legislação tributária, deverá estar prevista na LDO.

Assim como a LOA, que trataremos mais à frente, a LDO é considerada um instrumento orçamentário de curto prazo, já que tem sua vigência restrita a um exercício fiscal.43

Quando da edição da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), este novo diploma trouxe várias disposições a regulamentar ainda mais a elaboração da LDO. Uma destas novas disposições, foi a de que a partir de então a LDO deveria trazer – todo ano – três anexos: o de Metas Fiscais, o de Riscos Fiscais e um terceiro específico para a União (que não importa para nosso objetivo nesse trabalho).

O Anexo de Metas Fiscais (AMF) – que é o que nos importa mais de perto – foi estabelecido e tem descrição minuciosa na própria LRF e reforça a característica de instrumento de planejamento da LDO, quando exaustivamente fala em “metas” em seus dispositivos, talvez até em redundância com seu próprio nome.

Assim, o Anexo de Metas Fiscais deverá dispor sobre estas “metas” de planejamento, especialmente sobre as receitas e despesas, os resultados nominal e primário44 e o montante da dívida pública; e para o exercício a que se refere, e

42 A classificação das despesas públicas é dada pelo artigo 12 da Lei n.º 4.320/64, em despesas correntes e despesas de capital. Basicamente, esta é a classificação que importa para as leis orçamentárias.

As despesas correntes “São as despesas contínuas, que, a depender da realidade financeira do ente, não representam ganho de patrimônio e se referem a serviços realizados pela Administração Direta, Indireta ou àqueles que recebem recursos públicos para atender a despesas desta natureza. Dito de outro modo, são as despesas destinadas à manutenção da máquina, como pagamento de pessoal, despesas de consumo, pagamento de juros, dentre outras.”

Já as despesas de capital “São despesas eventuais, marcadas por uma operação financeira relativa a uma aquisição patrimonial (obras, bens móveis ou imóveis, etc.) ou a uma redução da dívida pública.”

LEITE, Harrison. Manual de direito financeiro. 6.ed. Salvador: JusPodivm, 2017. p.306-309. 43 Valdecir Pascoal nos lembra que, a priori, a LDO vigora por mais de um ano, já que como ela é

aprovada geralmente na metade do ano, orienta a elaboração da LOA no segundo semestre e vigora até o fim do exercício seguinte, haveria vigência por mais de um ano. Entretanto, em que pese prestigie o rigor do próprio instrumento, isto não retira da LDO a característica de peça orçamentária de curto prazo, o que interessa por ora ao presente trabalho.

PASCOAL, Valdecir. Direito financeiro e controle externo. 9.ed. São Paulo: Método, 2015. p.47. 44 “Resultado Primário é a diferença entre as receitas e as despesas NÃO financeiras. [...] É um

indicador da ‘autossuficiência’ de recursos públicos para cobertura das despesas. Por outro lado, demonstra o quanto o ente público depende de recursos de terceiros para a cobertura das despesas. [...]

para os dois seguintes. Ou seja a LDO, mesmo sendo um instrumento orçamentário de curto prazo, com a regulamentação pela LRF passa a apresentar uma visão mais ampla do andamento das finanças do ente, já que todo ano poderá se ver a projeção para o ano em curso e para os dois próximos.

Portanto, quando for instituir um projeto de PPP, a Administração deve avaliar se aquelas despesas que aparecerão por muito tempo nos orçamentos do ente não irão contra o já disposto pelo Anexo de Metas Fiscais, ou mais precisamente, se não influirão negativamente nos resultados nominal e primário e no montante da dívida pública.

A Secretaria do Tesouro Nacional (STN), com fins a regulamentar e padronizar a elaboração do Anexo de Metas Fiscais vem editando sistematicamente manuais para elaboração destes anexos. A regulamentação atualmente em vigor é a Portaria STN n.º 389 de 14 de junho de 2018, com parâmetros para a elaboração do respectivo anexo.

A regulamentação estabeleceu a necessidade dos entes federados elaborarem 8 documentos, chamados de demonstrativos e que comporiam o AMF: a) Metas Anuais; b) Avaliação do Cumprimento das Metas Fiscais do Exercício Anterior; c) Metas Fiscais Atuais Comparadas com as Metas Fiscais Fixadas nos Três Exercícios Anteriores; d) Evolução do Patrimônio Líquido; e) Origem e Aplicação dos Recursos Obtidos com a Alienação de Ativos; f) Avaliação da Situação Financeira e Atuarial do RPPS; g) Estimativa e Compensação da Renúncia de Receita; e h) Margem de Expansão das Despesas Obrigatórias de Caráter Continuado.

No que nos interessa, merecem destaque os demonstrativos das Metas Fiscais e da Margem de Expansão das Despesas Obrigatórias de Caráter Continuado, por fazerem menção expressamente às despesas com PPPs.

É didático, e de certo modo até intuitivo trazer os modelos que a própria STN institui nestes demonstrativos:

Resultado Nominal é a diferença entre as receitas e as despesas públicas, incluindo despesas e receitas financeiras, os efeitos da inflação (correção monetária) e da variação cambial.”

Figura 3 - Demonstrativo 1 – Metas Anuais – Anexo Metas Fiscais da LDO

Fonte: Manual de Demonstrativos Fiscais, 9.ed., 2019. Portaria STN 389 - 14/06/ 2018.

Figura 4 - Demonstrativo 8 – Margem Expansão das Despesas Obrigatórias de Caráter Continuado (DOCC) – Anexo Metas Fiscais da LDO

Fonte: Manual de Demonstrativos Fiscais, 9.ed., 2019. Portaria STN 389 - 14/06/ 2018.

Vê-se que os dois demonstrativos têm disposições a respeito das PPPs, e duas informações nos chegam somente por olhar o modelo destes anexos: a) as despesas com PPPs aparecem no anexo que avalia a dívida pública consolidada, mas não compõem o cálculo, seja da dívida consolidada, seja da dívida consolidada líquida, conforme o demonstrativo das metas fiscais; e b) para a STN – e as metas fiscais – consideram-se as despesas com PPPs como despesas obrigatórias de caráter continuado.

Antes, porém, é necessário pontuar a conceituação do que sejam despesas obrigatórias de caráter continuado.

Esta classificação das despesas foi dada pela própria Lei de Responsa- bilidade Fiscal:

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

O dispositivo legal é bastante claro quanto aos requisitos para se considerar uma despesa como de caráter continuado, conforme comprovam os próprios destaques no texto normativo acima. Da leitura da norma a primeira grande característica que surge é que a lei preocupou-se somente com as despesas correntes. Ou seja, nem toda despesa corrente é de caráter continuado, mas – pelo artigo 17 – toda despesa de caráter continuado é corrente.

Os parágrafos do artigo 17 consolidam a diretiva do caput, e transformam esta parte da LRF no que se convencionou chamar de controle de fluxo das despesas dos entes.

Com efeito, a disposição do parágrafo segundo, por exemplo, que prega que se comprove que as despesas criadas/aumentadas não afetem as metas fiscais, e que seus efeitos financeiros para o futuro sejam compensados pelo aumento permanente de receitas ou pela diminuição de despesas, tem forte inspiração anglo-saxã, onde é conhecida por pay-as-you-go (ou pela sigla PAYGO);45 que tem por escopo alcançar um equilíbrio entre receitas e despesas

que suplante o curto prazo, com efeitos intergeracionais como pregou a LRF.

Assim, as regulamentações sobre a contabilização das PPPs também nos trazem insumos que devemos levar em consideração, quando do estudo do caso concreto.

As constatações acima, que os demonstrativos do Anexo das Metas Fiscais da LDO nos remetem, tem como pano de fundo um intenso e caloroso

45 RIBEIRO, Maurício Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Comentários à Lei de PPP – parceria público-privada. Fundamentos econômico-jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2007. p.99.

No mesmo sentido: GUIMARÃES, Fernando Vernalha. A responsabilidade fiscal na parceria público-privada. Revista Eletrônica de Direito Administrativo Econômico (REDAE), Salvador, IBDP, n.20, nov./dez./jan. 2009/2010.

debate na doutrina, sobre a caracterização e contabilização das despesas das PPPs pelos entes públicos.

No entanto, para fins de não comprometer a exposição conforme os tópicos delineados pela própria Lei 11.079/2004, trataremos deste debate quando examinarmos a regulamentação – também por parte da STN – da contabilização das PPPs por parte da Portaria 614/2006, já no próximo item.

Para fins deste tópico, convém pontuar que se a autoridade competente apresentar estudo técnico que ateste que o empreendimento da PPP não influirá nos índices do Anexo de Metas Fiscais, especialmente estes acima destacados, atendido estará o escopo da primeira determinação da Lei 11.079/2004 a respeito da responsabilidade fiscal.

3.1.1.3 Dos Limites de Endividamento (art. 10, I, “c”) e a Regra da STN (Art. 25)