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Parte I – Enquadramento Teórico

3. Doenças de Origem Alimentar

Nos Estados Unidos, as doenças de origem alimentar afetam anualmente cerca de 48 milhões de pessoas, sendo cerca 128000 pessoas são hospitalizadas, com subsequente ocorrência de cerca de 3000 óbitos (Gould et al, 2013). Podem ser definidas como um conjunto de patologias de natureza infeciosa ou tóxica causadas pelo consumo de água ou alimentos contaminados por microrganismos patogénicos, denominada, comummente, como doenças de origem alimentar (Soares, 2007).

Considera-se então que ocorre um surto alimentar quando duas ou mais pessoas apresentem o mesmo conjunto de sintomas após a ingestão de um mesmo alimento (Gould et al., 2013).

Na maioria dos casos, raramente é possível determinar o alimento que esteve na origem da doença, sendo por isso essencial a vigilância dos surtos alimentares, aspeto que fornece informações vantajosas sobre os agentes patogénicos, tipos de alimentos e ingredientes comprometidos e, ainda, o respetivo processo de transmissão (Gould et al, 2013).

Existem cerca de 250 tipos de bactérias e as suas toxinas, vírus e parasitas causadores de enfermidades alimentares, onde os sintomas mais habituais compreendem vómitos e náuseas, diarreia, dores abdominais e, por vezes febre, apresentando-se como um padrão de sintomas, comummente, conhecidas como gastroenterites ou doenças diarreicas (Soares, 2007; Oliveira et al., 2010).

A tabela 1.3 enumera os principais microrganismos envolvidos nas doenças de origem alimentar e os alimentos frequentemente envolvidos. Apresenta, igualmente, alguns alimentos em que esses microrganismos tenham sido notificados pelo RASFF, um sistema de alerta rápido para a notificação de alimentos contaminados abrangendo os Estados Membros, a Comissão Europeia e a EFSA.

Tabela 1.3 Principais microrganismos envolvidos nas doenças de origem alimentar. Fonte: Veiga et al. (2009) e Gould et al., (2013).

Microrganismos implicados nas doenças de origem alimentar

Microrganismos Alguns alimentos associados Alimentos notificados no RASFF Bactérias associadas a infeções alimentares

Campylobacter Alimentos proteicos crus ou

pouco cozinhados, lacticínios Coelho, frango e manteiga

Escherichia coli Água ou alimentos com

contaminação fecal

Carne de vaca e produtos à base de leite

Listeria Leite e derivados, saladas Sushi, queijo de leite cru e paté Salmonella spp Carne de aves e ovos Frango, pato, peru e ovos

Vibrio spp Peixe, marisco e moluscos crus

ou pouco cozinhados Camarão

Yersinia Leite cru, aves carnes e marisco ---

Bactérias associadas a intoxicações alimentares

Staphylococcus aureus Carne, leite ovos e derivados Marisco, peixe e queijo de leite cru

Clostridium perfringens

Alimentos sujeitos a práticas de manipulação e confeção

inadequados

---

Clostridium botulinum

Carnes insuficientemente curadas, conservas caseiras de

carne ou vegetais

Coelho e frango

Bacillus cereus Arroz, cereais, pratos de carne e

vegetais. Cacau, massas e peixe Parasitas

Trichinella Porco ---

Cryptosporidium Leite, água e vegetais ---

Giardia Alimentos ou água sujeitos a

contaminação fecal ---

Vírus

Norovírus Água Framboesas e ostras cruas

Rotavírus Fruta e salada ---

Vírus da Hepatite A Água, marisco e saladas ---

Em relação aos priões, salienta-se a BSE, mais conhecida como “Doença das Vacas Loucas”, uma doença neurológica degenerativa progressiva, que resulta da infeção do gado bovino por priões. Esta patologia teve uma particular importância, devido às grandes consequências económicas e de saúde que acarretou III.

O relatório resumo da União Europeia sobre as tendências e origem das Zoonoses, agentes zoonóticos, e surtos de origem alimentar em 2011 da EFSA e CDC (European Centre

for Disease Prevention and Control), refere que cerca de 64,2% do número total dos surtos

relatados, o agente causador é conhecido, onde 26,6% destes são causados pela Salmonella, seguida das toxinas (12,9%), da Campylobacter (10,6%) e de vírus (9,3%). Os restantes agentes representam cerca de 2% do número total de surtos de origem alimentar.

Em 2011, a maior parte dos surtos ocorridos estão associados com alimentos de origem animal, sendo mais comuns nos ovos e ovoprodutos (21,4%), mistura de alimentos (13,7%), peixe e produtos de pesca (10,1%), mariscos (6,0%) e legumes, sumos e produtos derivados (5,3 %) (EFSA & CDC, 2013).

A contaminação dos alimentos poderá ocorrer nas diferentes etapas da cadeia alimentar, desde da produção primária até a cozinha. Habitualmente, esta ocorre nas últimas fases de processamento do alimento devido à utilização de matérias-primas contaminadas, às condições inadequadas de higienização, às práticas impróprias de confeção, à contaminação cruzada e à permanência de géneros alimentícios na zona de perigo de temperatura (Veiga et al., 2009; Oliveira et al, 2010; Gould et al, 2013).

Quando existem práticas inadequadas de fabrico e de manipulação, aumenta a probabilidade de ocorrência de contaminação cruzada, que consiste na transferência de substâncias ou microrganismos patogénicos de uma fonte de contaminação para um alimento não contaminado. Tal pode acontecer devido a alimentos, utensílios, superfícies de trabalho e outros equipamentos contaminados, que encontram em contacto com alimentos não contaminados, bem como pelas mãos dos operados que se encontram mal higienizados (Baptista & Linhares, 2005).

Para que exista o desenvolvimento de uma doença de origem alimentar não basta apenas a presença de microrganismos patogénicos, é necessário que exista a quantidade suficiente de microrganismos patogénicos para causar uma infeção ou para produzir toxinas, que o alimento seja capaz de suportar o crescimento dos microrganismos, que para tal tem que permanecer na zona de perigo de temperatura por tempo suficiente para que os microrganismos se multipliquem e / ou produzam toxinas. Por outro lado, está igualmente dependente da suscetibilidade do individuo, ou seja a quantidade de microrganismos no alimento tem que ser a suficiente para ultrapassar o limiar de suscetibilidade do individuo (Baptista & Venâncio, 2003).

De acordo com a agente patogénico em causa pode originar um processo de infeção ou um processo de intoxicação (Soares, 2007).

O processo de infeção resulta da ingestão de alimentos contaminados com microrganismos patogénicos vivos em quantidade suficiente para que seja possível ultrapassar a barreira gástrica. Após ultrapassar a acidez do estômago, os microrganismos multiplicam-se e desenvolvem-se no intestino delgado, originado o aparecimento dos sintomas, após um período de incubação (Soares, 2007).

O processo de intoxicação consiste na ingestão de um alimento com elevado número de toxinas, produzidas pelo próprio alimento, toxinas de origem química ou, então, devido crescimento de microrganismos produtores de toxinas (Soares, 2007).

Poderá ocorrer, igualmente, o processo de toxinfeção que resulta da ingestão de microrganismos patogénicos, que ao colonizar-se e multiplicar-se no intestino produzem toxinas responsáveis pelos sintomas.

As doenças de origem alimentar constituem um problema de saúde pública, com uma elevada magnitude, porém apenas uma pequena fração dos casos são notificados aos órgãos de inspeção de alimentos, de controlo e às agências de saúde, desconhecendo a verdadeira realidade da situação. Tal acontece, pois as doenças de origem alimentar podem apresentar variadíssimos graus de severidade, passando por sintomas brandos, fazendo com que a vítima não procure auxílio médico (Forsythe, 2002; Soares, 2007).

Compreende-se que as doenças de origem alimentar têm um grande impacto na saúde dos consumidores, não só debilitando-os, mas como podem também poderá causar a sua morte. Para além de danos na saúde, existe igualmente perdas financeiras e económicas com os gastos nos serviços de saúde, sendo absolutamente necessário aplicar medidas de controlo dos perigos alimentares, principalmente dos perigos biológicos.