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PARTE II FASE DE PLANEJAMENTO

CAPÍTULO 2 GEOLOGIA: CONSTITUIÇÃO E EVOLUÇÃO DA EAD

2.1 EAD: UM AGENCIAMENTO COMPOSTO DE VÁRIOS TERRITÓRIOS

No contexto brasileiro, a produção de material didático para mediação pedagógica em EaD assume relevância acentuada a partir de 2004 com a contribuição dos investimentos na ampliação da oferta dessa modalidade. Percorrer o histórico e características da EaD, com destaque para o processo de elaboração e implementação de material didático, pode contribuir no esclarecimento das implicações da performance docente na mediação pedagógica.

Tendo em vista o objetivo de investigar a performance docente no processo de elaboração de materiais didáticos, evidenciando suas implicações na mediação pedagógica, opta-se por situar o contexto de desenvolvimento e utilização dos materiais didáticos no desdobramento de duas abordagens que tratam da minimização da distância geográfica e comunicativa entre professores e estudantes: a tecnológica e a didática.

Em relação à primeira, toma-se como parâmetro o quadro organizado por Rodrigues (2004), que ilustra as gerações da EaD, mapeado a partir do desenvolvimento e incorporação das tecnologias de comunicação. Importante destacar que esses modelos ou gerações não se sobrepõem, uma vez que as/os subseqüentes incorporam e aperfeiçoam as/os anteriores.

Geração Início Características

1ª Até 1970

Estudo por correspondência. A comunicação se dava pelo uso exclusivo de material impresso, geralmente um guia de estudo com exercícios enviados pelo correio.

2ª 1970 Surgem as primeiras Universidades Abertas, com design e

implementação sistematizados de cursos a distância, utilizando, além do material impresso, transmissões por televisão aberta e rádio; fitas de áudio e vídeo, com interação aluno-tutor por telefone ou nos centros de atendimento.

3ª 1990 O uso de computadores, com estações de trabalho multimídia e redes de conferência.

4ª 2000 O aumento da capacidade de processamento dos computadores e da

velocidade das linhas de transmissão interfere na apresentação do conteúdo e interações. Acesso a bancos de dados e bibliotecas eletrônicas.

5ª 200? Uso de agentes inteligentes, equipamentos wireless e linhas de

transmissão eficientes. Organização e reutilização dos conteúdos. Quadro 1: Gerações em Educação a Distância conforme Rodrigues (2004).

No que se refere à segunda abordagem, opta-se pela sistematização apresentada por Peters (2001), em cinco modelos didáticos: a) correspondência, b) conversação, c) professoral, d) tecnológico de extensão, e) tutorial.

O histórico da EaD no Brasil é recente, se comparado com outros países latino-americanos. Os processos de regulamentação e reconhecimento da modalidade são tardios. Embora inúmeras experiências de mais de meio século possam ser destacadas, é somente a partir da década de 90 que a modalidade atinge índices de instituições, estudantes, regiões e financiamentos mais consideráveis. (FRANCO, 2006).

A EaD suscita discursos em relação ao desenvolvimento de um processo de “aprendizagem mais autônomo”, “permanente”, “ao longo da vida”, enfim, “centrado nos interesses dos estudantes”. Peters (2001) trata o conceito de “educação permanente” enquanto exigência das transformações econômicas, técnicas e sociais. A educação profissional e complementar assume novas características, porque se dá ao longo de toda vida. Com o desenvolvimento econômico ao longo

dos tempos, o processo educacional não se restringe mais à infância e juventude, avançando também para maturidade.

A EaD, como possibilidade que amplia o acesso e compartilhamento da formação pelas mediações e metodologias que ultrapassam os limites espaço- temporais da sala de aula convencional, assume um lugar estratégico nesse cenário. Dois movimentos se complementam: por um lado, uma grande demanda de pessoas que procuram cursos e programas de formação, capacitação, atualização e, por outro lado, um considerável número de instituições que propõem respostas a prazos longos, médios ou curtos.

Sob o ponto de vista mais comum, a EaD é, muitas vezes, compreendida como complementação ao ensino presencial. De um ponto de vista, mais criterioso e rigoroso fica evidente que é uma modalidade com políticas, metodologias e projetos específicos. Existe uma variada lista de termos com a pretensão de contemplar uma definição unificadora. Vários autores têm-se ocupado com o registro sistemático das diferenciações entre Educação a Distância, Ensino a Distância, Aprendizagem Aberta, Educação On-line e E-learning.

Keegan (1996) elabora um extensivo trabalho de revisão da terminologia, definições e teorias sobre EaD sistematizado no Quadro 2.

Termos Características

Conventional education. Oral education; Group-based education;

Face-to-face. Non-traditional education; Open education; Flexible learning; Adult education; Correspondence education/study; Home study; Independent study; External studies;

Distance teaching or teaching at a distance; Distance learning or learning at a distance; Distance education.

Quase-permanente separação entre professor e estudante;

Influência de uma organização educacional na preparação de materiais didáticos; Uso de meios tecnológicos;

Comunicação bi-direcional; Estudo individual.

Quadro 2: Termos e características para EaD conforme Keegan (1996).

A partir da revisão de literatura sobre esse assunto, realizada por Moraes (2004a), pode-se elaborar o Quadro 3.

Definições Critério de classificação

aprendizagem aberta características de acesso (aberta e/ou fechada)

aprendizagem flexível oferta (contínua/descontinuada)

aprendizagem distribuída instituição (formal/informal)

Quadro 3: Definições e características da EaD conforme Moraes (2004a).

Diante das tecnologias incorporadas à EaD a partir da terceira geração, Rodrigues (2004) apresenta onze nomenclaturas diferentes conforme os autores por ela consultados conforme o Quadro 4.

Termo Nomes Autores

Cyber Cyber learning Navarro e Shoemaker (1999)

Digital Digital Learning Environments Petters, O. (2000, 2002)

Distributed Distributed Education Oblinger, Barone, Hawkins (2001)

e- E-Learning, E-moderating Salmon (2000), Khan (2000)

Flexible Flexible Learning Collis e Moonen (2001)

Internet-Based Education Holt, M. (1998) Internet

Internet-Based Distance Education

Eastmond, D. (1998)

On-line Education Schrum, Lynne (1998), Harassim

(1990); Mason (1998), Paulsen (2002) On-line

OnlineLearning Environment Smith, Murphy and Teng (2001)

System (LMS) Learning Management

Systems

Hall, B. (2000)

Learning Technology Roger e Hewer (1996)

Technology

(LT – ET) Educational Technology Bruce e Levin (1997)

Virtual (VLE) Virtual Learning Environments Tschang e Della Senta (2001), Britains e Liber (2000).

Web Based Learning Aggarwal, A.(2000) Robinson, P.

(2000); Khan (2000); Beshears (2000) Web-Based Education Brusilovsky e Miller (2001)

Web (WBL - WBE WLE)

Web Learning Environments Martinez e Bunderson (2000) Quadro 4: Nomenclaturas de 3ª, 4ª e 5ª gerações conforme Rodrigues (2004).

Os quadros 2, 3 e 4 podem ser complementados e atualizados por definições dentro das 4ª e 5ª gerações de EaD. Especialmente a partir de 2000 surge uma variedade de termos e definições que dizem respeito à incorporação das tecnologias de informação e comunicação em situações específicas de ensino-aprendizagem. Quatro anos após a publicação dos trabalhos de Moraes (2004a) e Rodrigues (2004), elaborou-se uma síntese a partir das especificidades das nomenclaturas dos ambientes virtuais, objetos de ensino-aprendizagem, competências necessárias às

equipes multidisciplinares, padrões internacionais de indexação de conteúdos, repositórios de conteúdos e oferta de cursos na modalidade a distância.

Termo Nomenclatura Referências

Blended Blended Learning Mallmann et al (2007).

Mediação Educação Mediada por

Computador

De Bastos e Müller (2004).

Hipermídia Ambientes Hipermidiáticos Valverde e Viza (2006); Pereira,

Santos e Ulbricht (2006).

Telemática Ambientes telemáticos De Bastos, Abegg e Müller (2006).

Interactive Computer Paulsen (2002).

Interactive

Interactive learning Starr (2003).

Sistema de Gestão da Aprendizagem

Keegan (2002). Gestão

Sistema de Gestão de Conteúdos Keegan (2002).

AVEA Ambientes Virtuais de Ensino-

Aprendizagem

Mallmann (2004); Catapan, Mallmann e Roncarelli (2006); Roncarelli (2007).

Learning Objetcs Instructional Objects

Willey e Gibbons (2000). Objetos de Ensino-Aprendizagem Mallmann et al. (2007). Objects

Objetos Escolares De Bastos, Abegg e Müller (2006).

Instructional Design/ Design instrucional

Filatro (2004); Rezende (2001); De Oliveira (2007).

Web Design Koper e Tattersall (2005).

Learnig design Koper e Tattersall (2005).

Design

Interactive Design Preece, Rogers e Sharp (2005).

Virtual Virtual classrooms by satellite Keegan (1996). Learning Work-based learning

Electronic learning Móbile learning M-learning

Starr (2003).

Quadro 5: Atualização de termos e características para EaD.

Não há um consenso na literatura sobre o assunto. A dissonância varia conforme as abordagens pedagógicas e gestão financeira priorizada pelos autores que tratam de assuntos como materiais didáticos, influências das tecnologias de comunicação, democratização e pré-requisitos de acesso.

Priorizando os aspectos da mediação pedagógica, pode-se dizer que a diferença espaço-temporal entre professores e estudantes é um dos aspectos que sustenta essa discussão e diferenciação entre as modalidades. No modelo presencial, a relação entre estudantes e conhecimento é constantemente mediada pela fala e escrita do professor na sala de aula. Em EaD elementos como o material didático e as tecnologias de comunicação interferem na mediação sustentando o processo ensino-aprendizagem.

Essa variedade na terminologia transcorre em alguns momentos devido à demanda atendida pela EaD enquanto democratização do acesso à educação. Historicamente, os processos educacionais estão vinculados aos de trabalho e produção da existência. “As transformações acentuadas, tanto no modo de produção como no modo de consumo, determinadas pelos avanços científico-tecnológicos, alteram não só as propriedades dos objetos, mas as formas de comunicá-los”. (CATAPAN e THOMÉ, 1999, p.23).

Cada vez mais os resultados apontados pelas pesquisas sobre sociologia do trabalho indicam que o ambiente de trabalho é tratado como lugar propício para o sucesso dos mais bem motivados, dos capacitados para o exercício das multitarefas. (RICARDO, 2005).

Etges (1990) analisa:

Com a consolidação econômica e a tomada do poder político pela burguesia, a educação como um todo passará a servir de justificação das novas diferenças sociais de classe entre capitalistas e assalariados e continuidade indefinida do sistema. A lógica da função justificativa e continuadora já estava presente desde o início desta nova forma de produção de indivíduos e da sociedade [...] No mundo das separações, criado pelo capital, o lugar privilegiado para educar-instruir sua força de trabalho foi a instituição escolar. (p. 23).

A educação vem sendo forjada historicamente pelo par conceitual da liberdade-repressão. Enquanto os trabalhadores vêem na educação uma conquista de acesso e desenvolvimento cultural, ela cumpre seu papel dentro de um modelo social na medida em que não está, de modo algum, desvinculada dos sistemas de produção da existência.

A EaD é constituída e constitutiva de variadas formas organizativas dos processos ensino-aprendizagem em consonância ou não com o desenvolvimento sócio-econômico. Os sistemas educacionais se remodelam constantemente em função das demandas econômicas e inovações tecnológicas. Basta analisar os saltos quanti e qualitativos que configuram as modalidades de educação técnica e as exigências das próprias políticas públicas educacionais. Em EaD, essa discussão está mais acentuada. Talvez pelas suas dimensões de democratização do acesso e inclusão social. (PETERS, 2001).

Considerar a interface histórica entre trabalho e educação, perpassando o desenvolvimento dos modos de produção e as aceleradas transformações científico- tecnológicas, permite localizar algumas peculiaridades da EaD. É um campo amplo que não se restringe à alguns parágrafos dissertativos. Mesmo assim, uma breve incursão permite vislumbrar algumas arestas que guiam as instituições e cursos a distância, com suas estruturas bem planejadas para atender um grande número de estudantes em diferentes tempos e espaços tendo em vista as exigências de formação e capacitação para o mundo do trabalho.

A defesa de educação permanente ou ao longo da vida, que se faz atualmente em função da oferta de formação e capacitação a distância, está tomando grandes proporções e não se pode ignorá-la. Conforme Litto (2005), “a demanda reprimida para acesso ao ensino superior no Brasil aponta para necessidade de triplicar o número de vagas nos próximos anos [...] Está ficando cada vez mais claro que, sem o emprego da educação a distância, será difícil cumprir o dever social de fornecer acesso à aprendizagem a grupos até agora socialmente excluídos” (p.09). A constatação não interrompe, de modo algum, a consistência da escolarização presencial. Tomando-se a análise da EaD a partir das vantagens, percebe-se que ela pode se constituir numa alternativa de produção teórico-metodológica, na medida em que fortalecer a prática de professores e estudantes também em situações presenciais.

A relação entre trabalho e educação não se esgota neste ponto. Ainda assim, esse breve sobrevôo serve de alavanca para discutir a complexidade da organização da mediação pedagógica em EaD, ao longo de seu percurso histórico. Os materiais didáticos carregam o peso dos entraves ideológicos, políticos e econômicos que influenciam as concepções pedagógicas historicamente. As inovações na docência universitária, quer sejam no âmbito da EaD ou não, possuem ressonâncias das transformações políticas, sócio-econômicas e tecnológicas. Nessa medida, a performance docente no processo de elaboração dos materiais didáticos está implicada por todos esses fatores.