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Ecologia: ciência das inter relações

Podemos pensar, nesse contexto, um ambiente que influencia e é influenciado pelas entidades que o constituem (bióticas e abió- ticas). Além disso, temos outros dois aspectos a considerar: o meio de uma espécie e o próprio indivíduo modificam -se e estão sujeitos às leis de seleção natural, e as inter -relações entre organismos con- tribuem para o sucesso ou extinção de dada espécie. No entanto, como e quais seriam essas relações, como se estruturam, o que exa- tamente pode atuar sobre um indivíduo de maneira a interferir em seu processo evolutivo? Como os grupos de animais e vegetais se organizam? Muitas respostas ainda não seriam esclarecidas; novos conceitos ainda necessitavam ser elaborados.

Em 1875, o geólogo austríaco Édouard Suess propõe o termo “biosfera”, definido como um lugar que envolve a vida no planeta com as condições de temperatura, constituições químicas, etc. (Drouin, 1991). Incluía assim, espacial e logicamente, o conjunto das formas vivas que estão inseridas em um mundo e não no uni- verso. “Dessas condições resulta que a biosfera é um fenômeno li- mitado não só no espaço, mas também no tempo” (Suess, 1875, apud Drouin, 1991, p.69). O mundo agora possui uma unidade, a biosfera, cujo estudo caberá à Ecologia.

Embora Suess tenha utilizado esse neologismo, foi Vernardsky que, em 1923, deu à biosfera outra perspectiva. Influenciado pelos trabalhos químicos e genéticos do solo e atuando em estudos de mi- neralogia, Vernardsky representará essa unidade ecológica como um mecanismo cósmico, harmonioso e desprovido de acaso; é o do- mínio da crosta terrestre ocupado por organismos transformadores que modificam os raios cósmicos em energia terrestre ativa. Nesse

sentido, e pautado em estudos fisiológicos, as transformações ocor- ridas na biosfera envolveriam a migração dos elementos químicos através da matéria viva (Deléage, 1993).

Observamos na representação da biosfera a presença de um modelo de meio ambiente no qual os elementos vivos e não vivos estão incluídos e, ainda, inter -relacionados mediante a troca de ma- téria. Assim como mudanças nas representações do meio ambiente favoreceram a elaboração das unidades de habitat e biosfera, os mesmos contribuirão para o surgimento de novas terminologias, ampliando o modelo teórico de meio ambiente.

Karl Möbius, em seu estudo de mitilicultura6 e ostreicultura

aliado às análises econômicas da época, demonstrou em 1877 que não se podia compreender a abundância ou rarefação de uma es- pécie considerando apenas aspectos intrínsecos como a taxa de fe- cundidade (Drouin, 1991). A concorrência existente quando duas espécies habitantes do mesmo local usufruem do mesmo alimento, pode afetar um determinado grupo de organismos. A esse conjunto de relações o zoólogo deu o nome de “biocenose”.7 Nesse contexto,

temos um neologismo para determinar uma comunidade biótica, na qual estão incluídas as relações de competição, predação, dis- puta de espaço e alimento, além daqueles elementos físicos. De acordo com Deléage (1993), Möbius dizia que, num dado lugar e num dado instante, existe um quantum de vida ou massa viva re- presentado por certo número de indivíduos. Supomos que, nesse contexto, representar o meio ambiente incluiria necessariamente os elementos bióticos e suas inter -relações.

6. Criação de mexilhões e outros bivalves da família dos mitilídeos.

7. “A Ciência não dispõe ainda de um termo para designar uma tal comunidade de seres vivos, uma tal seleção e um tal número de espécies e de indivíduos corres- pondem à média das condições exteriores de vida, que se influenciam mutua- mente e se mantêm através da reprodução de forma durável numa zona delimitada. A uma tal comunidade, chamo biocenose (de bios, a vida, e de koi-

noein, ter qualquer coisa em comum) ou comunidade de vida” (Möbius, 1877,

Some -se ainda que, além de o meio constituir -se de um local geo gráfico, de elementos vivos e físicos, ele terá uma extensão va- riada na medida em que considerarmos o papel de cada indivíduo numa dada comunidade (seu nicho), suas relações com os demais elementos e também o seu processo de estabelecimento conside- rando o fator espaço -tempo.

Ao considerar a interação entre populações vegetais e animais, o zoólogo Charles Elton passa a investigar as relações alimentares den- tro da comunidade. Assim, acaba por propor quatro conceitos, os quais permitirão ampliar os estudos de Ecologia: o conceito de cadeia e de ciclo alimentar, o de posição na cadeia, o de nicho e o de pirâ- mide de números (Deléage, 1993). Nesse sentido, estar em determi- nado ambiente não é apenas localizar -se nele, mas sim relacionar -se com os demais integrantes da comunidade, ou seja, ocupar uma po- sição na hierarquia trófica.

Utilizando o conceito de nicho a partir de 1923, referindo -se a uma relação funcional, Elton permitiu destacar um paralelismo entre comunidades totalmente separadas no espaço. “Com a de- finição que Elton dá de nicho ecológico, cada espécie possui enfim o seu lugar no grande esquema global da vida”, afirma Deléage (1993, p.100).

A unidade ecológica seguinte a despontar será proposta por Geor ges Arthur Tansley em sua teoria dos ecossistemas de 1935 (Acot, 1990; Drouin, 1991). Criticando a ideia de holismo, sob uma concepção de que o todo é igual à soma das partes, Tansley apontará a fragilidade desse princípio. Para ele, “a soma das partes não passa de uma abstração, que se forja com o único fim de a cri- ticar, quando toda a realidade complexa só existe pela justaposição e interação dos seus componentes” (Drouin, 1991, p.77). Nesse sentido, a noção de comunidade biótica lhe parecia artificial e propõe que se fale em “sistema ecológico”, ou “ecossistema”, to- mando o termo “sistema” no sentido empregado na Física, ou seja, como um conjunto de elementos interconectados no qual as re- lações podem se dar por fluxo de matéria ou energia.

Embora a noção de sistema tenha contribuído para o estudo do comportamento das entidades físicas e químicas ao adotar o prin- cípio da conservação e transformação de energia, ela não foi inicial- mente aplicada às relações naturais. É com Lindeman que se abre uma nova perspectiva: o conceito de energia permitirá introduzir novas noções em Ecologia, tais como produtividade, rendimento e nível trófico (Deleáge, 1993).

Lindeman, em seu artigo de 1942, buscou identificar as relações entre os mecanismos tróficos e o processo de sucessão. Considerava como arbitrário separar o estudo da comunidade viva do meio físico -químico e, assim, utilizou o conceito de ecossistema (Drouin, 1991). Procurou, então, traduzir em equivalente energético não apenas as quantidades de matéria orgânica transferida em cada um dos níveis tróficos (produtores, consumidores, etc.), mas também em cada estágio da sucessão. O ecossistema passa a ser entendido como uma unidade de troca de energia que ocorre na natureza.

Construindo um modelo teórico de