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Gunther von Hagens e sua técnica de plastinação

As exposições itinerantes, como concebidas na atualidade, só se tornaram possíveis devido ao método de conservação de cadáveres designado como plastinação, criada em 1977 por um anatomista, médico e pesquisador da Universidade de Heidelberg, Gunther von Hagens. A técnica consiste em quatro etapas distintas: a fi- xação do material, desidratação, impregnação forçada de polímeros biodur S103 e a cura.4 A completa impregnação das peças com essa

substância permite não só a conservação como também a flexibili- dade e a mobilidade das mesmas. A conservação quase intacta das estruturas permite resguardar as características dos tecidos, ca- madas e estratos (Rodrigues, 2010, p.221 -5).

O método da plastinação é protegido por um número conside- rável de patentes na Alemanha, Inglaterra, Bélgica, África do Sul, Austrália e Estados Unidos, e, no campo acadêmico, é considerado revolucionário, sobretudo no âmbito da Anatomia, já que produz corpos e peças extremamente duráveis, atóxicas e inodoras, supe-

3. O biodur S10 consiste numa mistura de borracha de silicone de baixa viscosi- dade, criada, patenteada e comercializada pelo prof. Von Hagens, através de suas empresas, que também comercializam o método e equipamentos necessá- rios à plastinação.

4. Refere -se ao processo de impregnação do biodur S10. Geralmente ocorre em temperatura ambiente, podendo ser acelerada pelo grau de umidade do ar (ideal em torno de 50%).

rando, assim, a maioria das dificuldades e incômodos gerados pelos métodos de conservação tradicionais. O impacto da plastinação na renovação das técnicas anatômicas permitiu a Von Hagens a criação de duas empresas: a Biodur Products, que detém a patente e co- mercializa os polímeros biodur S10,5 e a Body Worlds – The Ori-

ginal Exhibition of Real Human Bodies, um projeto criado para a exposição das peças preparadas pelo anatomista e seus colabora- dores, através do Instituto de Plastinação da Universidade de Hei- delberg, fundado em 1993.

Conhecido por sua personalidade extravagante, as obras de Von Hagens situam -se em um campo intermediário entre os feitos e contribuições científicos, e a arte à qual ele aspira, e que se concre- tiza através das exposições itinerantes do corpo humano realizadas no contexto mundial pela Body Worlds. Segundo o site oficial da empresa, o objetivo principal das exposições é “educativo”, ou seja, proporcionar ao público conhecimentos em anatomia e fisiologia do corpo, salientando a importância da preservação da saúde e, so- bretudo, democratizando um conhecimento que foi incorporado com exclusividade pelas comunidades médicas e científicas mo- dernas (Body Worlds, 2011).

Os corpos utilizados pela Body Worlds provêm de uma lista de doadores que destinam seus corpos, em vida, ao Instituto de Plasti- nação (Institute of Plastination – IfP). Essas doações teriam supe- rado a margem de 8 mil corpos, no final do ano de 2010, segundo o

site da empresa (Plastinarium, 2011).

Em 2006, Von Hagens inaugurou o primeiro instituto de ensino anatômico do mundo, o Plastinarium, na cidade de Guben, no qual os visitantes, através de monitores, podem aprender um pouco da história da Anatomia, sobre as técnicas de conservação anatômica, assistir a minicursos/workshops e observar animais plastinados do acervo da Body World Animals dentre outras atividades.

5. Substância impregnada na última fase do processo de plastinação, permitindo que as propriedades do corpo sejam preservadas intactas.

Tanto o site do Plastinarium quanto o da Body Worlds possuem

link para uma loja, a Gubener Plastinate GmbH, na qual são nego-

ciados catálogos, vídeos, dentre outros artigos exclusivos da marca. Peças anatômicas estão disponíveis em catálogos especiais e sua co- mercialização é permitida com base no formulário de doação de corpos, no qual consta uma cláusula informando sobre a possibi- lidade de venda das peças anatômicas preparadas pelo IfP. Vale res- saltar que o comércio desse material é restrito a estabelecimentos de ensino e pesquisa. No catálogo da Gubener Plastinate GmbH de 2010, o preço de uma m.cabeça,6 em janeiro de 2011, variava em

torno de 8.600 a 14.500 euros.

A Body Worlds possuía, em outubro de 2010, quatro exposi- ções itinerantes que já tinham sido visitadas por mais de trinta mi- lhões de pessoas ao redor do mundo: a “Body Worlds I”, que objetivou através de suas peças uma intersecção entre Medicina, Anatomia e ciência tendo, portanto, a função de divulgação cientí- fica; a “Body Worlds II”, que, em uma proposta animista, buscou ser “alegre e dinâmica”, com cadáveres representando atividades da vida cotidiana; a “Body Worlds III”, que foi uma edição come- morativa dos trinta anos de trabalho do prof. Von Hagens, na qual ele retratou corpos em posições que aludiam a obras renascentistas e, enfim, a “Body Worlds IV”, destinada à exposição de corpos de animais plastinados.

A técnica da plastinação foi popularizada no contexto brasileiro em 2007, com a apresentação, em São Paulo, da exposição “Corpo Humano”, idealizada pelo dr. Roy Glover, diretor -chefe do Labo- ratório de Preservação Polímera da Universidade de Michigan. A exposição contou com 16 cadáveres e 225 peças plastinadas, e foi visitada por aproximadamente 450 mil pessoas, dentre elas, os alunos entrevistados na pesquisa. Retornou ao Brasil em 2010, tra- zendo algumas inovações, como os corpos dotados de simuladores

6. O plano sagital mediano refere -se ao corte vertical, nesse caso da cabeça, em duas partes: direita e esquerda. Cada uma delas pode ser designada na lin- guagem anatômica por “m.cabeça” (metade de uma cabeça).

de movimento. Em entrevista ao jornal Tribuna do Brasil, o dr. Glover discorreu sobre a importância da exposição:

Esta exposição é sobre a vida. O ser humano necessita aprender sobre o funcionamento de seu corpo, seu desenvolvimento e como ter uma vida saudável e muita longevidade. Mostramos aqui as consequências de vícios, má alimentação e sedentarismo. Preci- samos nos conscientizar e valorizar nosso bem mais precioso, nosso corpo, que hospeda vida e não morte. (Exposição? Corpos?, 2010)