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Carlos Frederico Bernardo Loureiro é um conceituado militante, professor, pesquisador, consultor e educador ambiental brasileiro, que se destaca por sua atuação e por inúmeros livros e artigos publicados cuja temática central é a Educação Ambiental Crítica (EAC). Este autor foi inserido na pesquisa por ter uma conduta esquerdista em uma sociedade historicamente marcada pelo predomínio de políticas e políticos de direita, por acreditar em uma EA transformadora e se apoiar para isso principalmente, em pressupostos freirianos e na Teoria Histórico-crítica marxista. Desse modo Loureiro dará uma enorme contribuição para repensarmos a educação e a EAC. Ele avalia que o modelo conservador de educação acaba por reproduzir a ideologia dominante, fortalecendo a manutenção de uma economia de mercado que tem uma visão estritamente utilitarista da natureza e das pessoas, que visa somente o acúmulo de capital, independente dos resultados e menospreza que estamos situados historicamente e socialmente no espaço e justamente por isso, a cultura representa e define valores que são consequências de como a sociedade se mantém e se organiza.

A EAC não conseguirá solucionar todos os problemas que emergem da adoção do sistema capitalista, mas oportuniza reflexões, ações e mudanças que podem ser consideradas “drásticas”, mas que se adotadas irão cooperar para pensarmos e darmos início a uma proposta de sociedade mais justa e igualitária, onde não existam opressores e oprimidos. Vale ressaltar que, mudança requer tempo, portanto é algo moroso. “A educação é um ato político e intencional, e para nós, críticos, sua finalidade está na supressão das formas de dominação e expropriação que determinam as injustiças sociais e ambientais contemporâneas e que reduzem a vida a mercadorias [...]” (LOUREIRO, 2015, pág. 36).

Loureiro possui uma vasta bibliografia, no entanto, optamos por nos dedicarmos a duas obras que julgamos serem cruciais para a pesquisa.

Frederico Loureiro em seu livro Trajetória e Fundamentos da Educação

Ambiental (2012) nos instiga a refletir sobre alguns conceitos e categorias teórico-

metodológicas que são utilizadas de maneira recorrente na fundamentação de projetos e ações de cunho ambiental. Não raro, esses fundamentos podem tender a generalizar ideias e princípios dos educadores ambientais, como se todos eles fizessem parte de uma grande comunidade que possui as mesmas concepções teóricas, pedagógicas e práticas, mas atuam em setores sociais diversos. Ao contrário, o autor defende que não deve existir um modelo padrão para que todos o sigam, desse modo estaríamos minimizando as contradições e a dimensão que envolve todo processo educativo. Não somos somente cidadãos brasileiros, seres sociais, mas, sobretudo somos seres planetários. A EA é congruente quando ela valoriza a diversidade, a pluralidade de ideias, as diferentes concepções e percepções de mundo, porém se fortalecendo como um meio de resistência, de mudança social, de sobrepujar qualquer tipo de supremacia.

Numa perspectiva transformadora e popular de Educação Ambiental, nos educamos dialogando com nós mesmos, com aquele que identificamos como sendo de nossa comunidade, com a humanidade, com os outros seres vivos, com os ventos, as marés, os rios, enfim, o mundo, transformando o conjunto das relações pelas quais nos definimos como ser social e planetário (LOUREIRO, 2012, p. 28).

Loureiro evidencia algumas práticas exercidas nas esferas públicas brasileiras e as mesmas demonstram que alguns programas acabam por não atingir suas metas e a comunidade por serem baseados em aportes conservadores e tecnocráticos, negligenciando as peculiaridades locais. Destaca a importância da EAC dispor de uma práxis dialógica, engajada não somente com a mudança individual, mas coletiva, objetivando o bem comum, restabelecendo a conexão homem-natureza.

Critica a educação bancária, dado que, ela se apresenta como conservadora, onde a figura do educando se configura como aquele que não possui nenhum conhecimento e precisa que o professor lhe instrua, lhe recomende o que ele deve fazer ou não, como agir, o que pensar. Um exemplo utilizado pelo autor foi alguns programas de EA do Governo Federal dirigidos a populações que vivem no entorno ou no interior de Unidades de Conservação (UC's). Esses programas não dialogam com a comunidade, os técnicos não passam alguns momentos in loco para entender como eles vivem, que relação eles possuem com o ambiente, desconsidera todo um modo de vida que foi construído durante décadas de ocupação territorial. Os órgãos governamentais na qual ele se refere, possuem um arcabouço teórico que coaduna com a educação ambiental crítica e popular, porém o material produzido e a abordagem acabam sendo incoerentes com a teoria. Loureiro comenta que tradicionalmente esses órgãos governamentais seguem uma linha mais técnica que educativa. No tocante as comunidades tradicionais, a investigação busca constatar a possibilidade dos saberes tradicionais poderem contribuir para uma prática da EAC nas unidades escolares de Cariacica, a fim de conciliar saberes populares que fazem parte do cotidiano de inúmeros alunos e bairros onde se localizam escolas municipais aos saberes acadêmicos.

A educação Ambiental não atua somente no plano das ideias e no da transmissão de informações, mas no da existência, em que o processo de conscientização se caracteriza pela ação com conhecimento, pela capacidade de fazermos opções, por se ter compromisso com o outro e com a vida […]. A educação é feita com o outro que também é sujeito, que tem sua identidade e individualidade a serem respeitadas no processo de questionamento dos comportamentos e da realidade (LOUREIRO, 2012, p. 33).

Outro ponto relevante no livro é a Educação Ambiental no Brasil, onde é possível por meio de um breve histórico entender em que contexto ela surge, quais foram as influências e o porquê ainda conservamos resquícios de que preservar a natureza é mantê-la intocada, propiciando um distanciamento entre homens e mulheres dos ambientes naturais, como se não pertencêssemos a este universo. A EA não era o tema central nos debates e nas ações desenvolvidas pelo Estado, e talvez por isso, ainda seja secundarizada em inúmeros órgãos e entidades públicas e privadas. É essencial entendermos qual importância era facultada a EA, já que, a história nos fornece elementos que nos auxiliam no entendimento de fatos presentes, sem fazermos análises pontuais e sim complexas, considerando todo contexto passado e atual, mesmo que tenham ocorrido significativas mudanças e avanços, comentados pelo próprio autor.

A Educação Ambiental se constituiu de modo precário como política pública em educação, algo que se manifesta até hoje na ausência de programas e recursos financeiros que possam implementá-la como parte constitutiva das políticas sociais, particularmente a educacional, como uma política de estado universal e inserida de forma orgânica e transversal no conjunto de ações de caráter público que podem garantir a justiça social e a sustentabilidade (LOUREIRO, 2012, p. 90).

O movimento ambientalista no Brasil ocorreu tardiamente, mas em meio a governos militares e ditadores, e a governos “democráticos” surgiram programas, leis, documentos e ações consideráveis, como a Programa Nacional de educação Ambiental, os Parâmetros Curriculares Nacionais, a Política Nacional de Educação Ambiental, dentre tantos outros que poderiam ser mencionados. Mesmo apresentando fragilidades, contrassensos, esses acontecimentos se sobressaem por legitimarem qual é a importância da EA para o país e por possibilitar debates sobre o tema. “[...] A Educação Ambiental ainda não se consolidou em termos de política pública de caráter democrático, universal e includente [...]” (LOUREIRO, 2012, p. 97).

A EA destacada na obra é a Educação Ambiental Transformadora, que considera que é preciso haver mudanças na esfera individual e coletiva, com cidadãos situados socialmente, e na concepção de Loureiro é entender e levar em conta que os sujeitos possuem nomes, história, vontades, paixões, sonhos, desejos, interesses e

necessidades próprias. Para superarmos o modelo de sociedade existente é primordial que os cidadãos entendam o seu papel social e quais são as influências da sociedade no seu modo de vida. O autor fala ainda da educação como práxis social que auxilia na construção de uma sociedade concebida por novos patamares civilizatórios e societários diferentes dos atuais. Ou seja, o exercício de reconhecer e levar em conta os sujeitos pode gerar um sentimento de pertencimento aquela comunidade, de diálogo entre o universo escolar e social, onde será possível apreender que os saberes familiares passados de geração em geração são importantes e são reconhecidos.

A Educação Ambiental transformadora é aquela que possui um conteúdo emancipatório, em que a dialética entre forma e conteúdo se realiza de tal maneira que as alterações da atividade humana, vinculadas ao fazer educativo, impliquem mudanças individuais e coletivas, locais e globais, estruturais e conjunturais, econômicas e culturais […] (LOUREIRO, 2012, p. 99).

No livro Sustentabilidade e Educação um olhar da ecologia política (2012), Loureiro inicia a apresentação falando sobre sua motivação para escrever mais um livro e essa motivação foi a difusão do termo desenvolvimento sustentável, utilizado por inúmeros agentes sociais em seu discurso. O termo está sendo empregado sem problematizações, e isso causa uma certa inquietação. Estamos vivenciando uma grave crise ambiental planetária, posto que, os índices de poluição estão alarmantes, as evidências e impasses sobre o aquecimento global estão sendo alvo de debates em convenções, conferências, organismos governamentais e ONG's, e cada vez mais urge a demanda de repensarmos condutas e preceitos pré- estabelecidos. Mas além de tratar sobre sustentabilidade e educação, o livro apresenta também o conceito e a história da ecologia política, para que possamos entendê-la, extrapolando o senso comum.

É uma obra que apresenta dados estarrecedores de concentração de riquezas e inúmeros questionamentos sobre a sociedade contemporânea, os mesmos nos permite refletir e fazer indagações sobre o cenário de exclusão, disparidades entre países, classes sociais, e pobreza, criado por um sistema econômico que se baseia na acumulação de capital por um número ínfimo de pessoas, se considerarmos a

população mundial. Há um enorme abismo que se estabeleceu entre os países ricos e pobres, e entre a classe dominante e operária.

No que concerne a ecologia política, esta evidencia os conflitos dos atores sociais que, surgem a partir do uso e apoderamento dos bens naturais. Verificam-se suas características dos anos 1960, onde o ponto crucial da questão não se centrava na capacidade humana de provocar mudanças na natureza, mas sim que meios eram utilizados e para quais fins. A necessidade de sobrevivência é um fato, porém é preciso tomar cuidado ao analisar os problemas ambientais e os responsáveis pela constituição destes. Podemos correr o risco de condenar a espécie humana isolando-a do todo que a cerca e na qual ela está envolvida, uniformizando os indivíduos e grupos sociais, assim como julgando a ação humana subjetivamente.

Do ponto de vista histórico, é inaceitável culpar o humano como algo homogêneo, já que o que qualifica a ação predatória não é a ação humana abstratamente, mas modos específicos de relações sociais que determinam formas de uso e apropriação da natureza, pautadas na exploração intensiva do trabalho e dos recursos vitais disponibilizados pela natureza. Portanto, não faz sentido afirmar que a transformação da natureza é um problema, mas faz sentido sim afirmar que modos específicos de produção, territorialmente determinados, levam a transformações insustentáveis sob o prisma social e ecológico (LOUREIRO, 2012, p. 24-25).

As atividades econômicas se desenvolvem em uma base natural, premissa para a execução do trabalho, mas esse trabalho vai caracterizar a economia, a cultura e o estilo de vida de um determinado agrupamento humano. Estamos falando de comunidades tradicionais, que é o foco da pesquisa, onde cada comunidade e grupos socioculturais diversos possuem uma relação própria entre eles e o ambiente, se contrapondo ao modelo de desenvolvimento econômico capitalista. Esses grupos são considerados minoria dentro da sociedade, e frequentemente ocupam as partes periféricas das cidades, mas isso não significa que vários deles não tenham muito a nos ensinar sobre sustentabilidade. Além disso, a ecologia política nos permite compreender que constantemente as populações tradicionais acabam sofrendo impactos ambientais, promovidos por grandes empreendimentos econômicos. Mas Loureiro ressalta que, não existe um modelo a ser seguido para a solução da problemática ambiental, visto que, instaurar o novo, requer ruptura e modificação das condições viventes e das subjetividades.

[...] acabam se tornando forte objeto de estudos e sujeitos da prática política ambientalista as chamadas comunidades e populações tradicionais e grupos outros cujos modos de vida se definem claramente na relação com a natureza e se contrapõem a visões de mundo que mercantilizam a vida e dicotomizam sociedade-natureza (quilombolas, pequenos agricultores, extrativistas, ribeirinhos, caiçaras etc.) (LOUREIRO, 2012, p. 30).

O conceito de sustentabilidade suscita debates e controvérsias entre grupos ambientalistas de correntes filosóficas diversas. O autor nos conduz a um olhar crítico do desenvolvimento sustentável, apresentando e argumentando sobre as suas incompatíveis interpretações, haja visto que, o termo está carregado de significados como ambiental, econômico, ecológico e social.

Sem dúvida, o conceito de sustentabilidade é instigante, complexo e desafiador. Faz-nos pensar sobre múltiplas dimensões e suas relações. Mas o que houve de mais interessante ao se trazer um conceito biológico para a política e a economia foi não só admitir a dinâmica do contexto ecológico como uma condição objetiva de qualquer atividade social, mas também pensar um desenvolvimento que fosse duradouro e atribuir responsabilidade pela vida das pessoas no futuro a partir do que o cidadão realiza no presente. Em um momento de tanta ênfase no imediato e na efemeridade, propor o inverso é algo consideravelmente radical e tem seu mérito (LOUREIRO, 2012, p. 57).

Algumas vezes a sustentabilidade irrompe como uma expressão de respeito: aos ciclos naturais, a capacidade de suporte e regeneração de um ecossistema, as outras espécies que não a espécie humana, a satisfação das necessidades vitais dos seres humanos, ao limite de produção e reprodução da natureza. Desta maneira denota que tudo ocorre harmoniosamente. Mas em alguns casos ela é incorporada ao discurso de crescimento econômico como se esse crescimento fosse ponderado, porém inevitável para que todos possam prover suas necessidades.

Um dos conceitos mais refutados é o de desenvolvimento sustentável, já que desenvolvimento está aliado a um curso evolutivo, todavia o autor destaca que esse conceito é procedente das ciências biológicas e retrata crescimento e evolução naturais de um organismo. Contudo, quando conduzido para a esfera econômica há um entendimento de que as sociedades podem crescer intensamente, mas esse desenvolvimento está associado a bens materiais, posses, no qual se usa como referência o progresso alcançado pelas sociedades europeias. Sendo assim, essas

ideias não condizem com as propostas ambientais em que os diálogos apontam para o rompimento com paradigmas antigos e construção de novas formas de interação com ambiente, de viver e ser feliz.

É preciso inteirar-se da história da humanidade, para entender como determinados modos de agir, pensar e se organizar, acabaram por se tornar um protótipo da sociedade ideal, pois parece ser inato passarmos por algumas etapas até alcançarmos a evolução ou o modelo civilizatório europeu.

Não há menor dúvida de que este foi o entendimento e projeto político dominante e, nesse sentido, o uso do conceito desenvolvimento é absolutamente impertinente aos debates ambientais e à busca de qualquer sustentabilidade, uma vez que se pauta em modelo único de organização e de riqueza material, no caso, reduzida a mercadorias a serem geradas e consumidas. Ainda que atualmente hajam índices outros acoplados, que procuram enfatizar aspectos mais subjetivos de satisfação, a atividade econômica é naturalizada e o crescimento é visto como inexorável e condição de aprimoramento do modo de produção capitalista (LOUREIRO, 2012, p. 59).

A EA presente no texto é emancipatória, inclusiva, comprometida com mudanças reais dos padrões sociais vigentes, problematizadora, que não desagrega o indivíduo da sociedade e do meio.