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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 EDUCAÇÃO NÃO FORMAL

Gohn (2010 apud TRILLA, 1993) aponta que Montesquieu, já no século XVIII distinguia a educação em três formas distintas: a recebida pelos pais, a recebida pelos professores na escola e a recebida pelo mundo. Entretanto, o reconhecimento e a popularização de outras formas de educação, desenvolvidas fora da escola, são atribuídos a Croombs (GOHN, 2010). Esse autor, inicialmente, não distinguia a educação não formal da informal, mas posteriormente, em trabalho mais amplo com Ahmed, esses autores passaram a usar os termos “educação formal, não formal e informal”. A partir de 1975 (Gohn, 2010 apud Trilla), o termo “educação não formal” começou a ser difundido em âmbito internacional e passou a fazer parte da linguagem pedagógica. Mas foi a partir de 2000, que a expressão ganhou um maior reconhecimento e foi se alastrando em países como França, Alemanha, Espanha, Chile e outros, com publicação de livros, dissertações e teses acerca do tema.

Gohn (2010) aponta que um dos grandes desafios da educação não formal é definir o que ela representa. Muitos autores discorrem sobre essa concepção de ensino em comparação com a educação formal e a informal.

Vieira, Bianconi e Dias (2005) consideram que a educação não formal ocorre fora da Instituição escolar e é intencional. Com isso, consideram que a educação não formal permite a aprendizagem de conteúdos da educação formal, mas em espaços fora da escola, como Museus, Centros de Ciências ou outros, em que as atividades sejam direcionadas, com objetivo definido. Já a educação formal é a desenvolvida dentro da escola, e a educação

informal é transmitida pelos pais, amigos e outros, decorrentes de processos naturais e espontâneos.

Gadotti (2005, p. 2) também faz uma reflexão a respeito da educação formal e não formal.

A educação formal tem objetivos claros e específicos e é representada principalmente pelas escolas e universidades. Ela depende de uma diretriz educacional centralizada como o currículo, com estruturas hierárquicas e burocráticas, determinadas em nível nacional, com órgãos fiscalizadores dos ministérios da educação. A educação não-formal é mais difusa, menos hierárquica e menos burocrática. Os programas de educação não-formal não precisam necessariamente seguir um sistema seqüencial e hierárquico de “progressão”. Podem ter duração variável, e podem, ou não, conceder certificados de aprendizagem.

Além disso, Gadotti (2005) aponta que a educação não formal também é uma atividade educacional organizada e sistematizada, mas fora do ambiente formal. É caracterizada pela flexibilidade de tempo e espaço, e se dá de forma a respeitar as diferenças e as capacidades de cada indivíduo. Como exemplos de espaços onde pode ocorrer a educação não formal, ele cita a própria escola, as Organizações não Governamentais, as igrejas, os sindicatos, os partidos políticos, as mídias, as associações de bairros, entre outros.

Oliveira e Moura (2005) consideram que a educação não formal ocorre em espaços que vão além da sala de aula, permitindo todas as possibilidades de interações, troca de conhecimentos e experiências. Dessa forma, a educação não formal “tem a intenção de criar e buscar ambientes e aplicar metodologias que permitam ao aluno adquirir ou aprimorar seus conhecimentos, de uma forma lúdica, criativa e participativa” (OLIVEIRA; MOURA, 2005, p. 47). Os autores destacam que os espaços não formais, como museus, feiras científicas e tecnológicas, laboratórios, ambientes virtuais, parques ecológicos e temáticos, entre outros, têm sido estudados, e que em todos se detecta uma melhoria na aprendizagem dos alunos por meio da prática, da vivência, do trabalho em grupo e da percepção através dos sentidos.

Jacobucci (2008) faz a diferenciação utilizando o local onde se dá o aprendizado e não o seu tipo. Assim, diferencia espaço formal de espaço não formal. Quando a autora se refere a espaço formal, ela aponta “que está relacionado às Instituições Escolares da Educação Básica e do Ensino Superior, definidas na Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional” (JACOBUCCI, 2008, p. 56). Ou seja, o espaço formal é a escola, e todas as suas

dependências: salas de aula, laboratórios, quadras de esportes, biblioteca, pátio, cantina, refeitório. Porém, com relação ao espaço não formal, a autora destaca que “é qualquer espaço diferente da escola onde pode ocorrer uma ação educativa” JACOBUCCI, 2008, p. 56). Desses espaços fora da escola, ela estabelece duas categorias (JACOBUCCI, 2008, p. 56):

[...] locais que são Instituições e locais que não são Instituições. Na categoria Instituições, podem ser incluídos os espaços que são regulamentados e que possuem equipe técnica responsável pelas atividades executadas, sendo o caso dos Museus, Centros de Ciências, Parques Ecológicos, Parques Zoobotânicos, Jardins Botânicos, Planetários, Institutos de Pesquisa, Aquários, Zoológicos, dentre outros. Já os ambientes naturais ou urbanos que não dispõem de estruturação institucional, mas onde é possível adotar práticas educativas, englobam a categoria Não-Instituições. Nessa categoria podem ser incluídos teatro, parque, casa, rua, praça, terreno, cinema, praia, caverna, rio, lagoa, campo de futebol, dentre outros inúmeros espaços.

Gohn (2010) também destaca que outros autores usam diferentes concepções de educação como sinônimos de educação não formal. Entre essas concepções, a autora destaca: educação não escolar, educação extraescolar, educação alternativa, educação de adultos, educação popular, educação social, educação comunitária, educação sociocomunitária, educação permanente, educação para a vida, educação integral e educação social. No entanto, Gohn (2010) enfatiza que a concepção de educação não formal que ela discute vai além dessas concepções citadas acima, porque busca compreender de uma forma mais ampla os processos educativos que ocorrem além dos espaços das instituições escolares, em qualquer nível de ensino e independente do grau de instrução dos indivíduos.

Dessa forma, e educação não formal se articula com a educação cidadã, pois busca formar cidadãos livres, emancipados, com seus direitos assegurados e seus deveres para com os outros assumidos, por meio da democratização do acesso à escola, do conhecimento e da gestão. O conceito adotado por Gohn (2010, p. 33) é que a educação não formal:

É um processo sociopolítico, cultural e pedagógico de formação para a cidadania, entendendo o político como a formação do indivíduo para interagir com o outro em sociedade. Ela designa um conjunto de práticas socioculturais de aprendizagem e produção de saberes, que envolve organizações/instituições, atividades, meios e formas variadas, assim como uma multiplicidade de programas e projetos sociais.

Quando Gohn (2010, 2006) defende a formação para a cidadania, ela aponta que essa proposta de educação incorpora a educação voltada para a justiça social, para os direitos humanos, sociais, políticos e culturais, para a liberdade, igualdade e diversidade cultural, para a democracia, as manifestações das diferenças culturais e contra a discriminação. É

importante destacar que por dialogar com a alfabetização científica e com o enfoque CTSA, a educação não formal nesse trabalho será abordada segundo a perspectiva dessa autora.

Para melhor exemplificar a educação não formal, a autora faz uma comparação com a educação formal e a informal, segundo alguns critérios:

1. Quem é o educador em cada campo de atuação do qual estamos tratando? Em cada campo, quem educa ou é o agente do processo de construção do saber?

2. Onde se educa? Qual é o espaço físico territorial onde transcorrem os atos e os processos educativos?

3. Como se educa? Em que situação, em qual contexto?

4 Qual a finalidade ou objetivos de cada um dos campos de educação assinaladas?

5. Quais são os principais atributos de cada uma das modalidades educativas que estamos diferenciando?

6. Quais são os resultados esperados em cada campo assinalado?

Quadro 2 - Comparação entre a educação formal, informal e não formal, segundo Gohn (2010).

Formal Informal Não formal

1 Professores Pais, família, amigos, vizinhos, colegas de escola, igreja paroquial, meios de comunicação de massa

O “outro”, aquele com quem interagimos ou nos integramos 2 Território das escolas, são

instituições

regulamentadas por lei, certificadoras, organizadas segundo diretrizes nacionais

Espaços educativos demarcados por referências de nacionalidade, localidade, idade, sexo, religião, etnia, como, a casa onde se mora, a rua, o bairro, o condomínio, a igreja e outros

Em territórios que acompanham as trajetórias de vida dos grupos e indivíduos, fora das escolas, em locais informais, locais onde há processos interativos intencionais. 3 Em ambientes normatizados,

com regras e padrões comportamentais definidos previamente.

Em ambientes espontâneos, onde as relações sociais se desenvolvem segundo gostos, preferências, ou pertencimentos herdados.

Em ambientes e situações interativos construídos coletivamente, segundo diretrizes de dados grupos, usualmente a participação dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá ocorrer por forças de certas circunstâncias da vivência histórica de cada um.

4 Relacionado ao ensino e aprendizagem de conteúdos historicamente sistematizados, normatizados por leis Socializa os indivíduos, desenvolve hábitos, atitudes, comportamentos, modos de pensar e de se expressar no uso da linguagem,

segundo valores e crenças de grupos que se freqüenta ou que pertence por herança, desde o nascimento.

Capacita os indivíduos a se tornarem cidadãos do mundo, no mundo, por meio do conhecimento sobre o mundo que circunda os indivíduos e suas relações sociais. São construídos no processo interativo, gerando um processo educativo.

5 Requer tempo, local específico, pessoal especializado, organização de vários tipos, sistematização seqüencial das atividades, disciplinamento,

regulamentos e leis, órgãos superiores. Divide-se por idade/classe de conhecimento

Não é organizada, os conhecimentos não são sistematizados e são repassados a partir das práticas e experiência anteriores. Atua no campo das emoções e sentimentos

Não é organizada por séries/ idade/conteúdos; atua sobre aspectos subjetivos do grupo; trabalha e forma a cultura política de um grupo. Desenvolve laços de pertencimento. Ajuda na construção da identidade coletiva do grupo. Fundamenta-se no critério da solidariedade e identificação de interesses comuns e é parte do processo de construção da cidadania coletiva e pública do grupo.

6 Aprendizagem efetiva, além da certificação e titulação que capacitam os indivíduos a seguir para graus mais avançados

Os resultados não são esperados, eles simplesmente acontecem a partir do desenvolvimento do senso comum nos indivíduos, que orienta suas formas de pensar e agir espontaneamente.

Consciência e organização de como agir em grupos coletivos; (re)construção de concepções de mundo e sobre o mundo; contribuição para um sentimento de identidade com uma dada comunidade; forma o indivíduo para a vida e suas adversidades; resgata o sentimento de valorização de si; os indivíduos adquirem conhecimento de sua própria prática por aprenderem a ler e interpretar o mundo que os cerca

Gohn (2010) destaca que a educação não formal não compete nem substitui a educação formal. Ela deve ser complementar, no sentido de que permite o desenvolvimento de campos de aprendizagens e saberes específicos, e devem ser trabalhados em conjunto. Esses saberes desenvolvidos pela educação não formal estão relacionados ao aprendizado das diferenças, onde se aprende a conviver com os demais, socializando-se o respeito mútuo; a adaptação do grupo a diferentes culturas por meio do reconhecimento dos indivíduos e do papel do outro; a construção da identidade coletiva de um grupo; e o balizamento de regras éticas relativas às condutas aceitáveis socialmente.

Com relação ao método utilizado na educação não formal, Gohn (2010, 2006) enfatiza que surge da problematização da vida cotidiana dos indivíduos envolvidos, no qual os temas emergem a partir das necessidades, desafios, ou ações a serem realizadas naquele meio. O método não pode ser rígido, subordinado às estruturas burocráticas porque vai sendo construído ao longo do processo, de forma dinâmica e visando a formação integral dos indivíduos.

Apesar de ser uma abordagem promissora, os estudos e as publicações sobre a educação não formal no Brasil ainda são recentes e pouco utilizados. Os autores Alves, Passos e Arruda (2009) fizeram uma revisão bibliográfica de artigos publicados em seis periódicos de âmbito nacional da área Ensino de Ciências pertencentes ao campo da educação não formal no período de 1984 a 2008. Os periódicos selecionados pelos autores foram: Revista Brasileira de ensino de Física; Caderno brasileiro de ensino de Física; Ciência & Educação; Investigações em ensino de Ciências; Ensaio: pesquisa em educação em ciências e Revista Brasileira de pesquisa em educação em ciências. O objetivo dos autores foi verificar os principais problemas e temáticas dos artigos que tratavam da educação não formal.

Dos 33 artigos encontrados, dentre 1061 artigos das 149 revistas, Alves, Passos e Arruda (2009) concluíram que 36% apresentam as relações entre museu/escola/sociedade; 28% valorizam atividades de campo, como excursões, educação ambiental, ciências naturais, projetos e interdisciplinaridade; 24% investigam a prática de professores no ensino não formal, referente à formação e metodologias utilizadas pelos professores; e 12% discutem a interação entre educação formal, informal e não formal. Além disso, de acordo com as temáticas dos artigos, os autores as agruparam em algumas categorias, sendo elas: as percepções e concepções de professores iniciantes e em exercício; metodologias de coleta e

análise de dados em ambientes em que a Educação não formal se faz; discussões de atividades e propostas de disciplinas; trabalhos colaborativos; pesquisa-ação; trabalho com projetos; utilização da história e da filosofia da Ciência como tema gerador e/ou motivador do processo de abordagem; utilização da teoria do conhecimento para a análise da aprendizagem nesses espaços.

Com relação aos conceitos e definições da educação não formal, Alves, Passos e Arruda (2009) observaram formas variadas apresentadas pelos autores dos artigos. E por fim, os autores destacam que as pesquisas foram situadas em contextos de ensino, aprendizagem e formação, tendo como referências as disciplinas presentes no aprendizado formal, estruturas de cursos temporários e regulares nos moldes e em formatos similares aos da educação formal, e a realização de atividades seguindo os mesmos passos e planejamento daquelas conhecidas nos espaços escolares.

E, em 2010, os mesmo autores realizaram uma nova investigação nos mesmos seis periódicos de âmbito nacional da área Ensino de Ciências, pertencentes ao campo da educação não formal, no período de 1979 a 2008. O objetivo dos autores nessa nova investigação foi compreender a educação não formal, assim como evidenciar movimentos e tendências nesse campo de investigação. Nos 273 exemplares das revistas, totalizando 2315 artigos, foram encontrados apenas 45 artigos sobre a temática. Os autores destacam que o primeiro artigo com a temática surgiu em 1984 (no artigo publicado em 2009, os autores não consideram esse fato) e que, a partir de 1995, houve um aumento na incidência dessa temática, fato esse ilustrado pelo quantitativo de 95,5% dos artigos pertencerem ao período de 1995 a 2008. Além disso, os autores se posicionam com relação ao que consideram ser aprendizagem formal, não formal e informal (ALVES; PASSO; ARRUDA, 2010, p.5):

Aprendizado formal: aprendizado fornecido tipicamente por uma instituição de educação ou treinamento, estruturado (em termos de objetivos de aprendizagem, tempo de aprendizado e sustentação) e que leva a uma certificação. É intencional, do ponto de vista do aprendiz. Aprendizado não formal: não é fornecido por uma instituição educacional ou de treinamento e não leva à certificação. Entretanto, é estruturado (em termos de objetivos, tempo e suporte à aprendizagem). É intencional do ponto de vista do aprendiz. Aprendizado informal: resulta das atividades do dia a dia, relacionadas ao trabalho, família e lazer. Não é estruturado (em termos de objetivos, tempo e suporte à aprendizagem) e normalmente não leva a uma certificação. O aprendizado informal pode ser intencional, mas na maioria das vezes é não intencional ou incidental.